Buscar

Etica ambiental principais perspectivas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 3, do total de 32 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 6, do total de 32 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 9, do total de 32 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Prévia do material em texto

1 
 
 
 
ÉTICA AMBIENTAL: PRINCIPAIS PERSPECTIVAS TEÓRICAS E A 
RELAÇÃO HOMEM-NATUREZA1 
 
 
Fagner Guilherme Rolla2 
 
 
RESUMO: O presente artigo tem por escopo abordar a questão da Ética Ambiental através das 
principais perspectivas teóricas, a saber, antropocentrismo, ecocentrismo e ecologismo 
personalista. Busca descobrir em cada cosmovisão qual o valor atribuído à natureza e como o ser 
humano se percebe na relação com a natureza. A busca pela fundamentação do valor instrumental 
atribuído pelo antropocentrismo à natureza e do valor intrínseco atribuído a ela pelo ecocentrismo 
também é alvo da investigação da presente pesquisa, onde se conclui que o antropocentrismo 
considera o ser humano como superior aos outros seres porque ele tem capacidade de pensar, 
articular símbolos com seus significados e conseqüentemente gerar cultura. Da mesma forma, é 
um objetivo a apreciação das questões que diferenciam antropocentrismo em sentido estrito e 
ecologismo personalista (outra espécie de antropocentrismo), onde este enxerga o ser humano 
enquanto pessoa e aquele vê o homem enquanto indivíduo. Os conceitos de pessoa e indivíduo 
são brevemente confrontados e assim compreende-se que a diferença entre as duas correntes 
teóricas decorre da constatação de que enquanto para o antropocentrismo o ser humano está 
separado da natureza, para o personalismo o ser humano é integrante da natureza, tem lugar e 
função própria dentro dela. 
 
 
Palavras-chave: direito ambiental. ética ambiental. antropocentrismo. ecocentrismo. 
fisiocentrismo. biocentrismo. ecologismo personalista. personalismo. 
 
 
INTRODUÇÃO 
 
O ser humano é definitivamente o animal que mais transforma o seu ambiente. Esta 
capacidade humana de interferir no ambiente, de alterá-lo, nós chamamos de antropogenia.3 
 
1 Artigo extraído do Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como requisito parcial para obtenção 
do grau de Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais da Faculdade de Direito da Pontifícia Universidade 
Católica do Rio Grande do Sul, aprovado em grau máximo pela banca examinadora composta pelo orientador Prof. 
Elton Somensi de Oliveira, Prof. Clarice Beatriz da C. Sohngen, e Prof. Wambert Gomes di Lorenzo, em 02 de julho 
de 2010. 
2 Acadêmico do Curso de Ciências Jurídicas e Sociais da PUCRS. Contato: fagner502@hotmail.com 
3 Antropogenia: “[...] capacidade humana para alterar ambientes e substâncias [...].” WALDMAN, Maurício. Meio 
ambiente & antropologia. São Paulo: Editora Senac São Paulo, 2006, p. 36. 
2 
 
 
 
Ao gerar cultura o homem encontra uma nova forma de relacionamento com a 
natureza. O Homo sapiens é uma espécie única capaz de uso de uma linguagem articulada (Homo 
loquens), capaz de fabricar instrumentos e artefatos (Homo faber), capaz de criar e fazer uso de 
símbolos (Homo symbolicus) e capaz de fazer uso de sua criatividade, de seu imaginário (Homo 
ludens). Por óbvio não se esquece de seu equipamento biológico, todavia quando se trata de uma 
espécie como a nossa, com características totalmente diversas das demais, não se pode reduzir a 
relação com o ambiente como mera relação entre organismos biológicos. 4 
Ao usar sua capacidade de usar símbolos e o imaginário, as sociedades humanas vão 
construindo códigos culturais e formas específicas de representações da realidade, imprimindo 
“ao meio que habitam, com base na sua percepção de mundo, toda sorte de transformações. Tais 
representações [...] são decisivas para a modelagem do espaço habitado e a ordenação do tempo 
social”.5 O meio natural é percebido então através do conjunto de símbolos que integram essas 
representações em cada sociedade. Toda sociedade cria uma forma de se relacionar com a 
natureza, dá significado ao meio natural conforme seus valores. “Toda sociedade possui uma 
teoria da natureza que lhe é própria, que se expressa em suas configurações intelectuais, senão 
igualmente em complexos de símbolos, de instrumentos e de práticas”.6 
As formas de se relacionar com o meio ambiente podem variar entre as diferentes 
culturas. 
Não existe uma “ecologia humana” única. Pelo contrário, podemos notar “uma multitude 
de distintas ecologias, cada uma das quais, incluindo a que pertence à ciência ocidental, 
foi gerada por uma experiência distinta de mundo, cada uma das quais encarnando por si 
mesma seu próprio e único modo de compreendê-lo”.7 
 
Sem a pretensão de listar as mais variadas formas de ver a natureza ou mesmo de 
esgotar o tema, o presente trabalho propõe-se a investigar a relação entre o ser humano e a 
natureza através das principais perspectivas teóricas que fundamentam a ética ambiental. 
 
 
1 ANTROPOCENTRISMO 
“Penso, logo existo”
8 
 
Na perspectiva antropocêntrica o homem é o centro das preocupações ambientais. Os 
entes gravitam ao redor do ser humano, ganhando importância para o Direito Ambiental 
conforme se tornam mais úteis e necessários à vida humana. Anthropos, termo grego, significa 
 
4 WALDMAN, Maurício. Meio ambiente & antropologia. São Paulo: Editora Senac São Paulo, 2006, p. 37-38. 
5 Ibidem, p. 39. 
6 BALANDIER, Georges. Modernidad y poder: el desvio antropológico. p. 194 apud WALDMAN, Maurício. Meio 
ambiente & antropologia. São Paulo: Editora Senac São Paulo, 2006, p. 40. 
7 MILTON, Kay. Ecologias: antropologia, cultura y entorno apud WALDMAN, Maurício. Meio ambiente & 
antropologia. São Paulo: Editora Senac São Paulo, 2006, p. 41. 
8 DESCARTES, René. Discurso do método. Tradução de: Maria Ermantina Galvão. 2. ed. São Paulo: Martins 
Fontes, 1996, p. 38. 
3 
 
 
 
homem, no sentido de ser humano, homem como espécie. Centrum, centricum, do latim, significa 
o centro, o cêntrico, o centrado.9 
De acordo com esta visão, um bem que não seja vivo, material ou imaterial, assim 
como uma vida que não seja humana, poderá ser tutelado pelo direito ambiental na medida em 
que for relevante para a garantia da sadia qualidade de vida do ser humano, visto ser este o único 
animal racional e por isto, destinatário das normas jurídicas. Cabe ao homem a preservação das 
espécies, incluindo a espécie humana.10 
Faz-se importante notar que o ser humano é considerado o centro devido à sua 
capacidade de pensar, capacidade esta que o torna, dentro do panorama antropocêntrico, superior 
aos outros seres. Nesse sentido Fiorillo assevera: “Não há, por assim dizer, como não se ver que o 
direito ambiental possui uma necessária visão antropocêntrica. Necessária pelo motivo de que, 
como único animal racional que é, só o homem tem possibilidades de preservar todas as espécies, 
incluindo a sua.”11 
É da capacidade de raciocínio que deriva a capacidade humana de refletir, tomar 
consciência e, em razão de seu poder de abstração, dar significado aos símbolos, reconhecer “o 
outro” (como um fim em si mesmo), criar, aprender e transmitir hábitos, comportamentos e 
conhecimentos, reconhecer-se como indivíduo, diferenciando-se dos outros seres e de tudo o que 
está no seu entorno, inclusive afirmar-se como diferente da natureza, possibilitando o surgimento 
da cultura. À medida que o ser humano se desenvolve intelectualmente, reconhece-se como 
indivíduo e integrante da sociedade, atribui assim aos significantes, significado. Neste processo 
de individuação, a reflexão faz com que o ser humano dê ao significante natureza, significado. 
Baseado nesse processo ele formula conceitos de natureza, para que possa elaborar um sistema de 
relacionamento entre ambos. A humanidade sempre buscou auxílio no conceito de natureza para 
solucionar os problemas humanos e para que esse conceito seja formulado, é necessário que o ser 
humano tenha atingido um grau de desenvolvimento intelectual, um grau de reflexão e 
especulação intelectual que viabilize a compreensão de que a humanidade participa e compõe o 
meio “natural” de maneira diferenciada dos outros seres animados.12 
A noção de natureza é fundamental para que, maisrecentemente (século XX), seja 
introduzido o conceito de meio ambiente e com ele seus respectivos desdobramentos jurídicos. 
Esse conceito de natureza se transforma conforme a cultura. No pensamento helênico, o conceito 
filosófico de natureza era adaptado em razão da evolução das relações mantidas entre o homem 
 
9 MILARÉ, Edis; COIMBRA, José de Ávila Aguiar. Antropocentrismo x ecocentrismo na ciência jurídica. Revista 
de direito ambiental, São Paulo: Revista dos Tribunais, ano 9, n. 36, out./dez. 2004, p. 10. 
10 FIORILLO, Celso Antônio Pacheco. Curso de Direito Ambiental Brasileiro. 7. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: 
Saraiva, 2006, p. 16. 
11 FIORILLO, Celso Antônio Pacheco; RODRIGUES, Marcelo Abelha; NERY, Rosa Maria Andrade. Direito 
processual ambiental brasileiro. Belo Horizonte: Del Rey, 1996, p.132-133 apud SILVA, Olmiro Ferreira da. Direito 
ambiental e ecologia: aspectos filosóficos contemporâneos. 1. ed. Barueri: Manole, 2003, p. 27. 
12 ANTUNES, Paulo de Bessa. Dano ambiental: uma abordagem conceitual. 1. ed. Rio de Janeiro: Lumem Júris, 
2002, p. 5. 
4 
 
 
 
grego e a natureza. Conforme essas relações se modificavam, modificava-se também o conceito 
de natureza. 13 
Inicialmente, para os gregos, a natureza como conjunto de flora, fauna e os outros 
elementos do mundo físico, não foi alvo de cuidados especiais, porquanto imperava a idéia da 
infinitude de recursos naturais em função da pouco presente degradação ambiental. Porém, foi na 
Grécia Antiga que se pensou sobre os fenômenos naturais e seus desdobramentos em relação ao 
ser humano. Posteriormente, esse pensamento influenciaria o mundo ocidental. 
Nas antigas obras poéticas gregas, a natureza desempenhava um papel de 
fundamental importância. Homero coloca o ser humano como incapaz de lidar com a imensa 
força do destino. O mundo mítico mostra um ser humano sem condição de prever acontecimentos 
e sem aptidão para controlá-los, buscando explicações em um passado remoto, podendo-se dizer 
até mesmo hipotético, que colaborava para conservar situações que desde sempre estavam 
estabelecidas. A natureza era um fato demasiado extraordinário, incompreensível, cabendo à 
humanidade aceitar os desígnios do destino. Até esse ponto, não há condições para uma 
construção racional14 pois “um dos principais elementos que definem a racionalidade é a 
capacidade de previsão e controle”15. 
Foi necessária uma atitude filosófica diante da natureza para que houvesse a 
possibilidade de formular regras gerais. A busca pela universalidade, busca por aquilo que há em 
comum em diferentes pessoas e diferentes sociedades, busca pela essência da vida, exigiu uma 
postura filosófica que questiona a realidade a partir da intensa observação dos fenômenos físicos. 
No momento que esses fenômenos físicos puderam ser generalizados tornou-se possível a 
formulação de regras gerais que permitiam a previsão de acontecimentos, previsão esta ausente 
no momento anterior à indagação filosófica. Portanto, podemos afirmar que para a cultura grega 
desenvolver o conceito de natureza, foi necessária a generalização (dos fenômenos físicos) e a 
universalização (do ser humano e da natureza, tomando consciência das suas respectivas 
necessidades, particularidades e exigências). Para que a noção de natureza tornasse-se viável era 
imprescindível que o ser humano tomasse consciência de seu papel especial na natureza, e essa 
tomada de consciência só é possível através da filosofia. Assim o ser humano descobre que, 
conquanto integre o meio “natural”, integra-o diferenciadamente dos outros seres. Reconhece-se 
como diferente.16 Quanto a essa diferença, Bessa escreve que: “O Homem é o único dos seres 
vivos dotado de capacidade para alterar conscientemente o ‘status quo’ do mundo natural.”17 
[grifo nosso] 
Continua Bessa acerca do mesmo assunto, citando célebre afirmação de Hegel: “O 
que o homem possui de mais nobre do que o animal, possui-o, graças ao pensamento: tudo 
 
13 Ibidem, p. 3. 
14 ANTUNES, Paulo de Bessa. Dano ambiental: uma abordagem conceitual. 1. ed. Rio de Janeiro: Lumem Júris, 
2002, p. 6 et seq. 
15 Ibidem, p. 8. 
16 Ibidem, p. 7 et seq. 
17 Ibidem, p. 9. 
5 
 
 
 
quanto é humano, de qualquer forma que se manifeste, é-o na medida em que o pensamento age 
ou agiu”.18 [grifo nosso] 
O ser humano, criando um conceito de natureza como elemento integrante do mundo 
da Cultura, já não é mais refém do destino, tranforma o mundo natural conforme suas 
necessidades. Através da filosofia ele “descobre” a natureza, reconhece-se como diferente, 
reconhece o outro como diferente e descobre a natureza ao pensar a sua sociedade. O conceito de 
natureza só é possível quando o ser humano consegue diferenciar-se dela. A Filosofia era então 
baseada na experiência concreta, em fenômenos sensíveis e verificáveis na realidade. 
Com a criação do conceito de natureza, viabilizou-se a construção de modelos sociais 
de acordo com a natureza observada. A natureza que fala a filosofia grega não é mais um 
conjunto de leis, elementos físico-químicos, flora e fauna. “A natureza era para os gregos a 
análise das leis que universalmente podiam ser extraídas da observação do mundo natural e a sua 
aplicação ao mundo político, à pólis.”19 
Essa posição possibilita a construção do conceito de um direito natural, que adquiriu, 
anteriormente, significação social e cultural na tragédia Antígona, de Sófocles, onde a introdução 
de termos como equilíbrio e justo termo dão à humanidade uma nova dimensão, onde o ser 
humano começa a esboçar sua posição de senhor do mundo natural. Ele começa a ser o elemento 
central. Supera-se as explicações míticas, buscando, na razão, as origens primeiras das coisas.20 
Sófocles mostra a luta de Antígona como uma luta pela liberdade e dignidade do ser 
humano, buscando fundamentos na natureza. Na obra citada, o autor expressa essa idéia quando o 
Coro afirma: “De tantas maravilhas, mais maravilhoso de todas é o homem.”21 
Com Platão e Aristóteles, o privilegiamento do ser humano e da idéia de 
superioridade em relação à natureza ganha maior consistência. Os termos como sofista e retórica, 
a arte da argumentação tão cultivada pelos sofistas, passam a ser termos pejorativos.22 Para 
Aristóteles (384-322 a.C.), que seria retomado e relido posteriormente por Tomás de Aquino 
(1225-1274), “o homem está no vértice de uma pirâmide natural, em que os minerais (na base) 
servem aos vegetais, os vegetais servem aos animais que, por sua vez, e em conjunto com os 
demais seres, servem ao homem”.23 
Posteriormente, a separação entre ser humano e natureza ganhará maior dimensão 
com a tradição judaico-cristã.24 A assimilação aristotélico-platônica pelo cristianismo cristalizará 
 
18 Ibidem, p. 9. 
19 ANTUNES, Paulo de Bessa. Dano ambiental: uma abordagem conceitual. 1. ed. Rio de Janeiro: Lumem Júris, 
2002, p. 26. 
20 Ibidem, p. 17 et seq. 
21 SÓFOCLES. Antígona. Tradução de: Donaldo Schüler. Porto Alegre: L&PM, 1999, p. 28. 
22 GONÇALVES, Carlos Walter Porto. Os (des)caminhos do meio ambiente. 2. ed. São Paulo: Contexto, 1990, p. 31. 
23 MILARÉ, Edis; COIMBRA, José de Ávila Aguiar. Antropocentrismo x ecocentrismo na ciência jurídica. Revista 
de direito ambiental, São Paulo: Revista dos Tribunais, ano 9, n. 36, out./dez. 2004, p. 11. 
24 Sobre a influência da tradição judaico-cristã: “O versículo 28 do capítulo 1º do Livro de Gênesis: ‘Crescei e 
multiplicai-vos e enchei a Terra, e subjugai, e dominai (...)’, sendo interpretado fora do contexto do gênero literário 
em que foi vasada a Bíblia, com o passar dos séculos foi-se tornando um axioma do relacionamento Homem-
Natureza, reforçado por uma cosmovisão religiosa ou religioso-política.” MILARÉ, Edis; COIMBRA, José de Ávila 
6 
 
 
 
a separação entre espírito e matéria. A perfeição de Deus fará oposição ao imperfeito mundo 
material.Com o cristianismo, os deuses não habitam este mundo como acontecia na concepção 
dos filósofos pré-socráticos. Foi durante a Idade Média que se iniciou a dissecação de cadáveres, 
decorrente da concepção de que após o falecimento, o corpo pode ser visto como objeto de 
estudo, pois aquilo que o anima (do grego ânima, alma), já não está mais presente no corpo sem 
vida. Aquilo que dá vida ao corpo foi para outro lugar (céu, inferno, purgatório), podendo então o 
corpo virar objeto.25 
Os avanços científicos e tecnológicos ganham proporções até então inimagináveis, 
especialmente a partir da revolução científica (associada aos nomes de Copérnico, Galileu, 
Descartes, Bacon e Newton), séculos XVI e XVII. A visão de mundo medieval, aristotélico-
cristã, sofreu imensa e radical mudança. O universo que até então era visto como orgânico, vivo e 
espiritual, deu lugar a uma visão de um mundo equiparado a uma máquina. Máquina esta, que se 
tornaria a metáfora da era moderna.26 
O elemento primordial da razão renascentista era a glorificação do ser humano e 
estando ele no ápice da cadeia da vida, deveria dominar o conhecimento sobre a natureza da 
forma mais ampla possível. É pelo domínio do conhecimento que será possível a preservação do 
gênero humano. Era natural para esse pensamento que ele voltasse os frutos do conhecimento 
para si mesmo. A ciência começa a se tornar uma nova religião, prometendo um mundo novo a 
todos os seres humanos. Visto que os recursos naturais eram entendidos como infinitos, não havia 
motivo para uma visão crítica desta atitude. 
A oposição homem-natureza, espírito-matéria, sujeito-objeto se tornará mais plena 
em Descartes e se constituirá no centro do pensamento moderno e contemporâneo. Através do 
método científico Descartes afirma que seria possível chegar a conhecimentos muito úteis à vida. 
O objetivo do conhecimento era dominar incondicionalmente a natureza que agora é fonte de 
recursos para a satisfação humana, um objeto, diante daquele que seria o verdadeiro sujeito, a 
alma (mente, pensamento), a res cogitans. Fica evidente a relação de subordinação entre res 
cogitans e natureza. O corpo é parte da natureza, e dentro deste contexto, o ser humano se 
distancia da natureza, percebendo o corpo como res extensa.27 Há assim uma característica 
dualista.28 
O caráter pragmático e antropocêntrico que marcará a modernidade ficará manifesto 
quando Descartes afirma que 
 
Aguiar. Antropocentrismo x ecocentrismo na ciência jurídica. Revista de direito ambiental, São Paulo: Revista dos 
Tribunais, ano 9, n. 36, out./dez. 2004, p. 11. 
25 GONÇALVES, Carlos Walter Porto. Os (des)caminhos do meio ambiente. 2. ed. São Paulo: Contexto, 1990, p. 32. 
26 CAPRA, Fritjof. A teia da vida: Uma nova compreensão científica dos sistemas vivos. São Paulo: Cultrix, 1996, p. 
34. 
27 BALLESTEROS, Jesús. Ecologismo Personalista. Madri: Tecno, 1995, p. 14. 
28 “[...] significa ainda algo mais do que a independência recíproca entre corpo e espírito: significa a separação entre 
sujeito e objeto”. SILVA, Franklin Leopoldo e. Descartes: A metafísica da modernidade. 2. ed. São Paulo: Moderna, 
1993, p. 6. Além do dualismo, o idealismo e a subjetivismo também são características do pensamento cartesiano. É 
a partir do sujeito, entendido como pensamento, que Descartes diz que é possível constituir o verdadeiro 
conhecimento. Temos primeiramente representações que posteriormente serão atestadas pela realidade. 
7 
 
 
 
Ao invés dessa filosofia especulativa ensinada nas escolas, pode-se encontrar uma 
filosofia prática, mediante a qual, conhecendo a força e as ações do fogo, da água, do ar, 
dos astros, dos céus e de todos os outros corpos que nos rodeiam, tão distintamente 
como conhecemos os diversos ofícios de nossos artesãos, poderíamos empregá-las do 
mesmo modo em todos os usos a que são adequadas e assim nos tornarmos como que 
senhores e possessores da natureza. Isso é de se desejar não somente para a invenção de 
uma infinidade de artifícios que nos fariam usufruir, sem trabalho algum, os frutos da 
terra e de todas as comodidades que nela se encontram, mas também, principalmente, 
para a conservação da saúde, que é, por certo, o bem primordial e o fundamento de todos 
os outros bens desta vida.29 [grifo nosso] 
 
Ao contrário da filosofia especulativa, o conhecimento cartesiano tem característica 
pragmático-utilitarista, útil às aspirações e anseios do ser humano que assimila a natureza como 
um instrumento, um meio para atingir uma finalidade. O ser humano como centro do mundo é o 
sujeito em oposição ao objeto, usufruindo o método científico para desvendar os mistérios da 
natureza e à imagem e semelhança de Deus, poderia realizar qualquer feito. Tornar-se-ia o todo 
poderoso. Encontra-se aqui influência do pensamento medieval, visto que existe certo desprezo 
pela matéria, baseado na separação entre alma humana e o mundo material.30 Descortinava-se um 
novo mundo, o Ocidente racionalista31 e mecanicista,32 onde o artifício é considerado por muitos, 
superior ao mundo natural. 
Com o desenvolvimento do mercantilismo e a ascensão da burguesia, notadamente o 
movimento que proclama triunfo do ser humano sobre a natureza ganha força, sobretudo depois 
das revoluções industrial e francesa. 
Para Locke o direito de propriedade faz parte da natureza humana. Exalta o homo 
faber enquanto produtor de mercadorias que através do trabalho agrega valor à matéria bruta, à 
natureza. O ser humano é capaz de criar riqueza mediante a acumulação de bens que adiante 
poderão ser trocados conforme a vontade de cada um, afirmando o uso privado das coisas. O 
 
29 DESCARTES, René. Discurso do método. Tradução de: Maria Ermantina Galvão. 2. ed. São Paulo: Martins 
Fontes, 1996, p. 69. 
30 GONÇALVES, Carlos Walter Porto. Os (des)caminhos do meio ambiente. 2. ed., São Paulo: Contexto, 1990, p. 
33. 
31 Sobre a racionalidade do Ocidente “Ao estudarmos qualquer problema da história universal, o produto da moderna 
civilização européia estará sujeito à indagação sobre a que combinações de circunstancias se pode atribuir o fato de 
na civilização ocidental, e só nela, terem aparecido fenômenos culturais que, como queremos crer, apresentam uma 
linha de desenvolvimento de significado e valor universais. Apenas no Ocidente existe uma ciência em um estágio de 
desenvolvimento que reconhecemos, hoje, como válido. [...] É verdade que Maquiavel teve predecessores na Índia; 
mas todo o pensamento político da Índia carecia de um método sistematizado como o de Aristóteles e, de fato, de 
conceitos racionais”. WEBER, Max. A ética protestante e o espírito do capitalismo. São Paulo: Martin Claret, 2003, 
p. 23-24. 
32 Sobre o mecanicismo: “[...] enxergava a natureza como uma inerte máquina ou como um reservatório de recursos 
destinados ao bem-estar do ser humano, defendendo uma atitude instrumentalizadora e utilitarista para lidar com ele 
[...]”. NETO, Aristides Arthur Soffiati. Ecossistemas aquáticos: antropocentrismo, biocentrismo e ecocentrismo. 
Revista de Direito Ambiental, São Paulo: Revista dos Tribunais, ano 10, n. 37, jan./mar. 2005, p. 209. 
8 
 
 
 
intercâmbio de mercadorias é uma forma de diferenciação entre o homem e os animais. O 
trabalho é a fonte de riqueza do indivíduo e neste sentido, Locke antecipa Adam Smith e Marx.33 
Adam Smith lança as bases econômicas para uma sociedade engajada em um 
processo de desenvolvimento contínuo através da competição entre os indivíduos. Eles agiriam 
em interesse próprio tornando o progresso inevitável através do investimento, do aumento da 
produtividade e do acúmulo de riqueza material. A riqueza material traria a melhora da sociedade 
e o bem da sociedade seria alcançado através da busca do bem individual.34 Se o ser humano 
estava no centrodo universo, a produção de bens estava no centro da economia que em constante 
crescimento atenderia às necessidades humanas.35 
Com Adam Smith, a teoria de formação do valor, que até então concebia a natureza 
como fonte de valor e a agricultura como meio de produção, passou-se a negar a 
prioridade do trabalho agrícola e também da natureza exterior. Desse modo, a natureza 
deixou de ser o elemento central da Teoria Econômica, pois passou a ser vista como um 
obstáculo ao desenvolvimento econômico.36 
 
 O pensamento tecnocrático também se manifesta em Saint-Simon que entende a 
sociedade industrial como o caminho para o domínio da natureza. Assim a sociedade atingiria um 
ponto que implicaria o fim da luta do homem contra o homem.37 
Portanto eventual problema ecológico de caráter ético será resolvido pelo sistema 
econômico, da mesma forma que a técnica e a ciência superarão todas as questões que se 
apresentam ou se apresentarão. A ciência como expressão da razão, daquilo que torna o ser 
humano diferente dos outros seres, recebe toda a confiança da sociedade que projeta para o futuro 
a solução de qualquer dificuldade ambiental encontrada na realidade. 
 
1.1 AÇÃO MORAL FACE À NATUREZA NA TEORIA ANTROPOCÊNTRICA 
 
Para o antropocentrismo somente o ser humano será sujeito moral. Nesta concepção, 
unicamente ele é capaz de realizar atos morais e ser sujeito de direitos. A ação moral com 
relação à natureza considera o interesse do próprio ser humano visto que por ter características 
próprias, razão e o poder de liberdade de vontade, exclusivas à espécie humana, sua vontade não 
pode ser comparada a uma suposta vontade da natureza, já que somente ele tem a capacidade de 
reconhecer valores morais nos comportamentos alheios e adequar a própria conduta a um 
determinado tipo de racionalidade. Em verdade não há que se falar em “vontade da natureza” no 
 
33 SOFFIATI, Arthur. A natureza no pensamento liberal clássico. Revista de Direito Ambiental, São Paulo: Revista 
dos Tribunais, ano 5, n. 20, out./dez. 2000, p. 166-167. 
34 PONTING, Clive. Uma história verde no mundo. Tradução de: Ana Zelma Campos. Rio de Janeiro: Civilização 
Brasileira, 1995, p. 257. 
35 “[...] desde o início, os economistas concentraram a maior parte de seus estudos na organização da produção – em 
como interagiam os vários fatores responsáveis por ele (terra, trabalho e capital).” Ibidem, p. 257. 
36 OLIVEIRA, Ana Maria Soarez de. Relação homem/natureza no modo de produção capitalista. Scripta Nova: 
revista electrónica de geografía y ciencias sociales. Barcelona, v. 6, n 119 (18), ago. 2002. Disponível em: 
<http://www.ub.es/geocrit/sn/sn119-18.htm>. Acessado em 13 maio. 2010. 
37 BALLESTEROS, Jesús. Ecologismo Personalista. Madri: Tecno, 1995, p. 18. 
9 
 
 
 
que tange ao antropocentrismo, porquanto a natureza não é provida de razão, de pensamento, não 
é livre, não delibera. À natureza é atribuído um valor instrumental à proporção que o ser humano 
é livre para impor sua vontade que encontrará limites nas liberdades de outras pessoas.38 
A legitimidade humana para atos morais, também se expressa em outros fenômenos 
culturais além do reconhecimento de valores morais, “tais como a linguagem, a liberdade de 
decisão, o conhecimento científico, o desenvolvimento e o uso da técnica, a reciprocidade de 
deveres e obrigações”.39 
 
1.2 CRÍTICAS DO ANTROPOCENTRISMO 
 
1.2.1 Crítica do Antropocentrismo ao Ecocentrismo 
 
O antropocentrismo é uma característica encontrada nas diferentes sociedades 
humanas não sendo assim característica exclusiva da cultura ocidental. A suposta prepotência do 
homem ocidental não se sustenta já que dificilmente alguma sociedade se constituiu acreditando 
ser inferior às demais. A forma de perceber o ser humano como centro pode variar entre 
diferentes sociedades40 contudo em relação à natureza “[...] não se conhece organização social 
que tenha atribuído ao Homem um papel subalterno”.41 Essa característica antropocêntrica muitas 
vezes se manifesta através de um padrão etnocêntrico. 
O conceito de natureza e meio ambiente são necessariamente antropocêntricos, já que 
“sem a existência do Ser Humano não seria possível a existência de nenhum dos dois conceitos, 
pois não existiria a racionalidade capaz de elaborá-los”.42 
Os argumentos ecocêntricos atacam a forma ocidental de pensar por considerar esta 
como contrária ao meio ambiente e declaram algumas vezes um “holocausto ambiental” que seria 
evitado com uma série de medidas, entre elas, a redução do consumo. Esse pensamento 
biocêntrico pode ser considerado na verdade antropocêntrico porque corresponde ao pensamento 
de quem já superou as necessidades materiais básicas e impõe sacrifícios a quem vive em países 
em vias de desenvolvimento. É uma visão do mundo natural feita por quem não habita o mundo 
natural.43 
A redução de consumo proposta pela concepção ecocêntrica significa que o indivíduo 
precisa privar-se de sua liberdade. Ao antropocentrismo essa privação não precisa ser radical de 
 
38 KÄSSMAYER, Karin. Apontamentos sobre a ética ambiental como fundamento do direito ambiental. EOS: 
Revista jurídica da Faculdade de Direito/Faculdade Dom Bosco, Curitiba, v. 1, n. 4, jul./dez. 2008, p. 142. 
Disponível em <http://www.dombosco.com.br/faculdade/revista_direito/1edicao-2009/eos-4-2009.pdf>. Acesso em: 
13 maio 2010. 
39 Ibidem, p. 142. 
40 ANTUNES, Paulo de Bessa. Dano ambiental: uma abordagem conceitual. 1. ed. Rio de Janeiro: Lumem Júris, 
2002, p. 132. 
41 Ibidem, p. 2. 
42 Ibidem, p. 170. 
43 Ibidem, p. 121-122. 
10 
 
 
 
tal maneira que afete o desenvolvimento econômico. O mercado pode se adaptar às novas 
necessidades. 
 
1.2.2 Crítica do Antropocentrismo ao Personalismo 
 
Para o pensamento anterior a Descartes, mais precisamente o pensamento aristotélico-
tomista (influência determinante do personalismo), o conhecimento segue a trajetória que vai das 
coisas para o intelecto. A representação que aspire à realidade precisa ser primeiramente uma 
representação sensível. Em Descartes, ao contrário, parte-se primeiramente da idéia onde o 
conhecimento deve ser investigado ampla e internamente no que diz respeito à mente, para, 
posteriormente, sair da representação para as coisas. Como a experiência sensível é questionável 
o corpo não é confiável como fonte de percepção da realidade.44 
Para o antropocentrismo é a liberdade do indivíduo, é autonomia de vontade do ser 
humano que o faz ser verdadeiramente humano, exercer a sua humanidade. A liberdade 
individual está acima das relações sociais que podem simbolizar uma barreira para a vontade do 
indivíduo. O que fundamenta uma obrigação moral antropocêntrica é a razão enquanto o que 
fundamenta uma obrigação moral para o personalismo é a pessoa (eu mesmo e o outro), o que 
significa na visão antropocêntrica um retrocesso no processo de evolução da humanidade. 
 
 
2 ECOCENTRISMO 
“Nós não estamos no entorno, ‘nós somos o entorno’.”
45 
 
O ecocentrismo, também denominado fisiocentrismo (concede valor intrínseco aos 
indivíduos naturais, na maior parte também coletividades naturais como biótipos, ecossistemas, 
paisagens46) e biocentrismo (onde o enfoque está apenas nos seres com vida, sejam individuais e 
coletivos47), considera que a natureza tem valor intrínseco: a proteção à natureza acontece em 
função dela mesma e não somente em razão do homem. Tendo a natureza valor em si a sua 
proteção muitas vezes se realizará contra o próprio homem.48 Os ecocentristas buscam justificar a 
 
44 SILVA, Franklin Leopoldo e. Descartes: A metafísica da modernidade. 2. ed. São Paulo: Moderna, 1993, p. 10. 
45 MOLINARO, Carlos Alberto. Racionalidade ecológica e estado socioambiental e democrático de direito. 
Dissertação (Mestrado em direito) – Faculdade de Direito, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do SulPorto Alegre, 2006, p. 52. Disponível em: <http://tede.pucrs.br/tde_busca/arquivo.php?codArquivo=284>. Acesso 
em: 22 maio 2010. 
46 KÄSSMAYER, Karin. Apontamentos sobre a ética ambiental como fundamento do direito ambiental. EOS: 
Revista jurídica da Faculdade de Direito/Faculdade Dom Bosco, Curitiba, v. 1, n. 4, jul./dez. 2008, p. 136. 
Disponível em <http://www.dombosco.com.br/faculdade/revista_direito/1edicao-2009/eos-4-2009.pdf>. Acesso em: 
13 maio 2010. 
47 Ibidem, 136. 
48 AMARAL, Diogo de Freitas do. Direito ao meio ambiente. Apresentação, Lisboa, Editora INA, 1994 apud 
MILARÉ, Edis; COIMBRA, José de Ávila Aguiar. Antropocentrismo x ecocentrismo na ciência jurídica. Revista de 
direito ambiental, São Paulo: Revista dos Tribunais, ano 9, n. 36, out./dez. 2004, p. 20. 
11 
 
 
 
proteção à natureza afirmando que “dado à naturalidade um valor em si, a natureza é passível de 
valoração própria, independente de interesses econômicos, estéticos ou científicos.”49 
Toda sociedade humana constitui um conjunto de símbolos que dão sentido à própria 
sociedade. A ordem social da modernidade, emergida na Europa a partir do século XVII, tem 
como símbolos as diversas racionalidades advindas de um modelo industrial que compõe a 
sociedade de consumo e de risco. A lógica do progresso, individualismo, a noção antropocêntrica 
de mundo e a noção instrumental da natureza são elementos do que chamamos de modernidade. 
Esse modelo é imediatista e tem a racionalidade econômica orientada para a acumulação de 
capital.50 
O ritmo da sociedade moderna é de constantes mudanças. Contemporaneamente a 
realidade nos permite avaliar que “as interações do homem moderno com seu meio, munido pelo 
manancial da ciência e da técnica, foram de tal forma incríveis que acabaram gerando um 
potencial destrutivo de risco em larga escala em relação ao meio ambiente material”.51 
A crise da sociedade contemporânea52 é uma crise de seus magmas de significações. 
O conjunto de símbolos que representam a sociedade contemporânea está sendo abalado em seus 
fundamentos. A questão ambiental é um dos componentes que integram esta crise. As idéias de 
crescimento econômico, desenvolvimento, ciência, técnica e dominação da natureza estão 
abaladas. A relação sociedade-natureza se insere neste contexto de crise visto que se acreditava 
que desenvolvimento acarretava sair da natureza, dominá-la.53 
A deflagração da crise ambiental expõe a necessidade de uma nova forma de relação 
entre o ser humano e natureza, uma nova postura ética diante do meio ambiente. 
A consideração do valor intrínseco do mundo do mundo natural e dos excessos do 
antropocentrismo é fundamental, um pressuposto, para se pensar a Ética da Vida que, em 
 
49 KÄSSMAYER, Karin. Apontamentos sobre a ética ambiental como fundamento do direito ambiental. EOS: 
Revista jurídica da Faculdade de Direito/Faculdade Dom Bosco, Curitiba, v. 1, n. 4, jul./dez. 2008, p. 140. 
Disponível em <http://www.dombosco.com.br/faculdade/revista_direito/1edicao-2009/eos-4-2009.pdf>. Acesso em: 
13 maio 2010. 
50 MARQUES, Angélica Bauer. Estado de direito ambiental: tendências : aspectos constitucionais e diagnósticos. 
org. FERREIRA, Helini Silvini; MORATO, José Rubens. A cidadania ambiental e a construção do estado de direito 
do meio ambiente. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2004, p 175. 
51 Ibidem, p. 175-176-177. 
52 A excessiva competição, aceleração dos processos humanos e a desigualdade social são fatores que colaboram 
para o surgimento da depressão, sintoma da crise social da sociedade contemporânea. Neste sentido: “A depressão 
tem diversas causas, algumas delas biológicas, mas parte dessas causas vem de pressões ambientais e, obviamente, as 
pessoas pobres sofrem mais estresse em seu dia-a-dia do que as pessoas ricas, e não é surpreendente que elas tenham 
mais depressão." OMS: Depressão será doença mais comum do mundo em 2030. Estadão, São Paulo, 2 set. 2009. 
Disponível em: <http://www.estadao.com.br/noticias/geral,oms-depressao-sera-doenca-mais-comum-do-mundo-em-
2030,428526,0.htm>. Acesso em: 14 maio. 2010. No mesmo sentido: “A impressão que se tem, desde a revolução 
industrial, é que o tempo em sua dimensão cronológica vem se acelerando de uma forma exasperante. Quanto mais 
tentamos aproveitar o tempo, quanto mais dispomos das horas e dos dias segundo a convicção de que ‘tempo é 
dinheiro’, mais sofremos do sentimento de desperdiçar a vida.” ZANIN, Luiz. Depressão e capitalismo: entrevista 
com Maria Rita Kehl. Estadão, São Paulo, 22 abr. 2009. Disponível em: <http://blogs.estadao.com.br/luiz-
zanin/depressao-e-capitalismo-entrevista-com-m/>. Acesso em: 14 maio. 2010. 
53 MARQUES, Angélica Bauer. Estado de direito ambiental: tendências : aspectos constitucionais e diagnósticos. 
org. FERREIRA, Helini Silvini; MORATO, José Rubens. A cidadania ambiental e a construção do estado de direito 
do meio ambiente. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2004, p 176-177. 
12 
 
 
 
última análise, se apresenta como condicionadora da Ética do Meio Ambiente, um dos 
seus mais expressivos aspectos.54 
 
Nesta ética do meio ambiente as demais formas de vida apresentam um valor 
intrínseco e um significado próprio já que a natureza precede o homem. São expressões da 
criação, da vida, da natureza ou de Deus, conforme a crença de cada um. Ademais, “nem tudo o 
que existe foi criado para a utilidade imediata do homem; há outros fins, outras razões criadoras 
que escapam à nossa sensibilidade a aos nossos cálculos”.55 
O conceito de natureza já foi completamente diferente ao conceito formulado e 
atribuído às épocas moderna e contemporânea.56 Para os pensadores pré-socráticos a natureza 
(physis) está imbuída do elemento anímico, há espiritualidade na natureza, ela não se contrapõe 
ao psíquico como ocorre em nossos dias. O psíquico também pertence à physis. Os deuses não 
estão em um lugar distante, separado. Eles habitam a physis como forças misteriosas, se 
apresentam em tudo que está ao redor do ser humano, conferem inteligência à natureza que já não 
pode mais ser dividida em animada ou inanimada porque tudo tem alma. Esse princípio 
inteligente é reconhecido através de manifestações que chamamos de espírito, inteligência, 
pensamento, logos, etc. Physis também é gênese, é o princípio e o processo de surgimento e 
desenvolvimento das coisas. Em outro aspecto physis é a totalidade de tudo o que é. Pensar a 
physis é pensar o ser e a partir disso compreender a totalidade do real:57 “do cosmos, dos deuses e 
das coisas particulares, do homem e da verdade, do movimento e da mudança, do animado e do 
inanimado, do comportamento humano e da sabedoria, da política e da justiça”.58 
A natureza (Fisis), para os gregos, era compreendida como um grande organismo 
formado por um corpo material distendido no espaço, penetrado pelo movimento no 
tempo, homogêneo, vivo e dotado de uma alma imanente (Logos), que era o princípio do 
movimento de diversas substâncias, cada qual dotada de sua natureza qualitativa própria 
e de seu próprio modo de atuar.59 
 
Posteriormente é que a separação entre homem e natureza se consolidaria conforme a 
visão antropocêntrica. O conhecimento seria extremamente fragmentado e as conseqüências 
dessa forma de relação é que gerariam a necessidade de repensar o paradigma mecanicista.60 
No século XIX, fruto de interações interdisciplinares principalmente entre biologia, 
biofísica e química surge a ecologia. Traz consigo referenciais que proporcionam uma nova 
compreensão do ser humano, contrastando com a visão antropocêntrica (unidimensional), o 
 
54 MILARÉ, Edis. Direito do ambiente: doutrina, prática, jurisprudência, glossário. 2 ed., São Paulo: revista dos 
tribunais, 2001, p. 81. 
55 Ibidem, p. 81. 
56 GONÇALVES, Carlos Walter Porto. Os (des)caminhos do meio ambiente. 2. ed., São Paulo: Contexto, 1990, p. 
29. 
57 Ibidem, 29-30. 
58 Ibidem, 31.59 ANTUNES, Paulo de Bessa. Dano ambiental: uma abordagem conceitual. 1. ed. Rio de Janeiro: Lumem Júris, 
2002, p. 17. 
60 GONÇALVES, Carlos Walter Porto. Os (des)caminhos do meio ambiente. 2. ed., São Paulo: Contexto, 1990, p. 
100-102. 
13 
 
 
 
homem não está mais hierarquicamente acima dos demais seres ou em uma posição apartada 
deles. Faz agora parte de uma série de relações de interdependência entre os mais variados tipos 
de entes ambientais.61 O ser humano agora participa da teia da vida (web of life).62 
Em um contexto de interdisciplinaridade as ciências se influenciam e realizam um 
diálogo entre os conhecimentos, superando a anterior forma fragmentada de saberes. É neste 
sentido que a ciência do Direito também sofre influência de outros campos do conhecimento, 
incluindo a ecologia e de seus conceitos correlatos. 
Em 1874, “ecologia” aparece na obra Anthropogénie de Haeckel, onde podemos 
entender que ela, “pelo menos em parte, constitui-se no quadro científico e ideológico da 
economia da natureza, dos equilíbrios naturais e da adaptação dos seres vivos às suas ‘condições 
de existência’.”63 
O conjunto de grupos de indivíduos de qualquer tipo de organismo que ocupam a 
mesma área é denominado pela ecologia como comunidade. A comunidade e o ambiente não-
vivo se articulam, funcionam juntos como um sistema ecológico ou ecossistema.64 O conceito de 
ecossistema privilegia o todo colaborando assim para a superação da concepção atomístico-
individualista. O ecossistema65 é constituído pelo biótopo, que é o meio geofísico, e pela 
biocenose,66 que são as interações entre todos os seres vivos que ocupam o espaço chamado 
biótopo. Constituem assim uma unidade complexa com caráter organizador, ou simplesmente, 
um sistema.67 
Os ecossistemas são sistemas abertos, sempre havendo entrada e saída de energia. 
São espaços de qualquer dimensão onde se processam as interações entre os seres vivos e os 
outros componentes do meio, “mediante transporte e troca de matéria, energia e informação, tudo 
isto submetido a um processo de auto-regulação de modo a garantir a estabilidade ou equilíbrio 
daquele sistema”.68 Nessas interações é que se verifica a cadeia trófica, “seqüência concatenada 
 
61 SILVA, Olmiro Ferreira da. Direito ambiental e ecologia: aspectos filosóficos contemporâneos. 1. ed. Barueri: 
Manole, 2003, p. 75-76. 
62 CAPRA, Fritjof. A teia da vida: Uma nova compreensão científica dos sistemas vivos. São Paulo: Cultrix, 1996. 
63 ACOT, Pascal. História da Ecologia. Tradução de: Carlota Gomes. Rio de Janeiro: Campus, 1990, p. 28. 
64 ANTUNES, Paulo de Bessa. Dano ambiental: uma abordagem conceitual. 1. ed. Rio de Janeiro: Lumem Júris, 
2002, p. 149 
65 “Toda e qualquer unidade que englobe todos os organismos que funcionem em conjunto em uma determinada área 
geográfica, em interação com o meio físico, de maneira que um fluxo de energia seja capaz de gerar estruturas 
bióticas definidas e ciclagem de materiais, entre as partes vivas e as não-vivas, é um ecossistema.” ODUM, Eugene 
P. Fundamentos de Ecologia. Tradução de: Antônio Manuel de Azevedo Gomes. 4. ed. Lisboa: Fundação Calouste 
Gulbenkian, 1988, p. 2 apud ANTUNES, Paulo de Bessa. Dano ambiental: uma abordagem conceitual. 1. ed. Rio de 
Janeiro: Lumem Júris, 2002, p. 151. 
66 “[...] um grupamento de seres vivos que correspondem, por sua composição, quantidade de espécies e de 
indivíduos, a determinadas condições médias encontradas no meio, grupamento de seres ligados em função de 
dependência recíproca e que se mantêm, reproduzindo-se em certo lugar, permanentemente.” ANTUNES, Paulo de 
Bessa. Dano ambiental: uma abordagem conceitual. 1. ed. Rio de Janeiro: Lumem Júris, 2002, p. 151. 
67 GONÇALVES, Carlos Walter Porto. Os (des)caminhos do meio ambiente. 2. ed., São Paulo: Contexto, 1990, p. 
63. 
68 MILARÉ, Edis. Direito do ambiente: doutrina, prática, jurisprudência, glossário. 2 ed., São Paulo: revista dos 
tribunais, 2001, p. 81. 
14 
 
 
 
de seres que alimentam uns aos outros ou são por eles nutridos”.69 Referente às interações 
ecossistêmicas é relevante explicitar que “cada ecossistema é um todo que se organiza a partir das 
interações dos seres que o constituem. Assim, o todo, o ecossistema, só existe pelas interações 
entre as partes e são essas complexas interações que o constituem”.70 
Em meio a todas essas trocas e interações em busca de equilíbrio e estabilidade há 
ainda a interferência humana. Além dos fatores abióticos (ar, água, minerais e energia) e bióticos 
(plantas, vegetais em geral, os animais e os microorganismos) que compõem um ecossistema71 
natural, pode ainda haver o fator cultural, ou seja, o sistema ambiental pode sofrer a influência da 
ação humana. Assim, no ecossistema cultural as alterações ocorrem pela combinação da ação da 
natureza com a intervenção humana, seja ela consciente ou inconsciente.72 
O ser humano é integrante das íntimas relações que existem em todo o mundo natural. 
A ecologia despertou nele a compreensão na qual o homem é apenas mais um ente entre tantos 
outros, ele é mais um elo do repertório ecológico. Há uma inter-relação de mútua dependência 
entre os entes da natureza.73 
A cadeia trófica, bem como a mútua dependência dos entes ambientais, apontam para 
as inter-relações na forma de interdependência ou interconvivialidade, assim entende-se que há 
paridade entre os entes do repertório ambiental que caso seja desconsiderada causará prejuízo ao 
inter-relacional ambiental.74 Em suma, interconvivialidade é um inter-relacional que sofreu 
interferência humana organizada na busca da sobrevivência possível e ideal.75 
Nesse contexto notamos que o direito vai ao encontro de outras ciências para auxiliar 
e ser auxiliado no intuito de superar conceitos que não colaboram para a solução de questões 
atuais. É imperioso constatar nesse sentido o quão amplo e complexo é o conceito de meio 
ambiente76. Envolve “todos os tipos de relações estabelecidas entre os homens individualmente 
considerados e, na relação entre os mesmos e o espaço onde vivem”.77 “É um todo que engloba 
 
69 Ibidem, p. 82. 
70 GONÇALVES, Carlos Walter Porto. Os (des)caminhos do meio ambiente. 2. ed., São Paulo: Contexto, 1990, p. 
64. 
71 Há um conceito normativo de ecossistema: “’Ecossistemas’ significa um complexo dinâmico de comunidades 
vegetais, animais e de microorganismos e o seu meio inorgânico que interagem como uma unidade funcional.” 
BRASIL, Decreto Legislativo nº 2, de 03 de fevereiro de 1994, artigo 2º. Disponível em: 
<http://www.anbio.org.br/legis/decretoleg2.htm>. Acesso em: 17 maio. 2010. 
72 ANTUNES, Paulo de Bessa. Dano ambiental: uma abordagem conceitual. 1. ed. Rio de Janeiro: Lumem Júris, 
2002, p. 152. 
73 SILVA, Olmiro Ferreira da. Direito ambiental e ecologia: aspectos filosóficos contemporâneos. 1. ed. Barueri: 
Manole, 2003, p. 78. 
74 Ibidem, p. 80. 
75 Ibidem, p. 81. 
76 “O conceito de meio ambiente há de ser, pois, globalizante, abrangente de toda a natureza original e artificial, bem 
como os bens culturais correlatos, compreendendo, portanto, o solo, a água, o ar, a flora, as belezas naturais, o 
patrimônio histórico, artístico, turístico, paisagístico e arqueológico.” SILVA, José Afonso da. Direito ambiental 
constitucional. São Paulo: Malheiros, 1997, p. 20. 
77 MEDEIROS, Fernanda Luiza Fontoura de. Meio ambiente: direito e dever fundamental. Porto Alegre: Livraria do 
Advogado, 2004, p. 27. 
15 
 
 
 
elementos naturais, artificiais, culturais e do trabalho”.78 Pode-se dizer que existem vários “meio 
ambientes” que interagem, são interdependentes. 
É na dimensão da transdisciplinaridade e interdisciplinaridade que o direito se socorre 
de outras áreas do conhecimento para compreender o que é meio ambiente, de que forma ele 
funciona e como o ser humano deve relacionar-se com seus elementos constituintes.79 Tendo 
instrumentos conceituais que permitamreorganizar os conhecimentos podemos compor um 
quadro com os diversos saberes das mais diversas ciências, percorrendo permanentemente um 
trajeto que vai das partes ao todo e do todo às partes a fim de descobrir um conhecimento 
global.80 O direito se insere nessa dinâmica uma vez que “se o direito se nutre de outros saberes e 
precisa interagir com outras ciências, deve forçosamente metabolizar conquistas e aceitar as 
transformações que se impõem na cadeia de evolução do mundo. [...] Não pode avançar 
tortuosamente.”81 
Inseridos nesse diálogo entre conhecimentos a cisão do pensamento que interroga 
deve ser refutada. A cisão implica dualismo, fracionando o objeto a ser apreendido pelo sujeito 
que na verdade comporta o dualismo. O dualismo está na verdade na cisão interior do sujeito. As 
divisões entre mente e corpo, sujeito e objeto, natureza e cultura, já não fazem sentido quando na 
realidade estes se relacionam, são interdependentes. 82 
Entende-se que pelo ponto de vista do sujeito, objeto é quem emite a informação. O 
sujeito é aquele que recebe as informações sendo então sujeito do conhecimento. Inconcebível 
torna-se a idéia de puro sujeito visto que se este apenas recebesse informações não teria nem a si 
mesmo como objeto de seu conhecimento. Admitindo-se como sujeito cognoscente afirmaria que 
apenas receberia informações, nunca emitiria, não seria objeto. Tão inconcebível quanto o puro 
sujeito é a idéia de puro objeto, que seria um eterno irradiador de informações e nunca receptor 
delas.83 Na realidade sujeito e objeto se exigem complementar e reciprocamente, emitem e 
recebem informação, se unem e essa unificação deve ser buscada “na constituição de cada um 
deles (nas suas relações interiores), vale dizer, nas constituições recíprocas dos entes que são, 
cada um, por si mesmos, inseparavelmente sujeitos e objetos”.84 
 
78 DEEBEIS, Toufic Daher. Elementos de direito ambiental econômico. São Paulo: Max Liminad, 1997, p. 20 apud 
MEDEIROS, Fernanda Luiza Fontoura de. Meio ambiente: direito e dever fundamental. Porto Alegre: Livraria do 
Advogado, 2004, p. 27. 
79 MEDEIROS, Fernanda Luiza Fontoura de. Meio ambiente: direito e dever fundamental. Porto Alegre: Livraria do 
Advogado, 2004, p. 18-19. 
80 MORIN, Edgar (org.). A religação dos saberes: o desafio do século XXI. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2001, p. 
491. 
81 MILARÉ, Edis; COIMBRA, José de Ávila Aguiar. Antropocentrismo x ecocentrismo na ciência jurídica. Revista 
de direito ambiental, São Paulo: Revista dos Tribunais, ano 9, n. 36, out./dez. 2004. p. 31-32. 
82 MOLINARO, Carlos Alberto. Racionalidade ecológica e estado socioambiental e democrático de direito. 
Dissertação (Mestrado em direito) – Faculdade de Direito, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul 
Porto Alegre, 2006, p. 33-34. Disponível em: <http://tede.pucrs.br/tde_busca/arquivo.php?codArquivo=284>. 
Acesso em: 22 maio 2010. 
83 Ibidem, p 57. 
84 Ibidem, p 58. 
16 
 
 
 
“Ambiente [...] é relação. Ambiente – no sentido de meio ambiente – pode ser 
definido como um lugar de encontro.”85 Encontrar86 é descobrir, achar, disputar. É neste lugar de 
encontro (de descoberta, de disputa, de tomada de consciência) que o sujeito/objeto (agora em 
união) encontra o outro, com ele se relaciona, interage e interdepende. Encontra o outro no 
ambiente e encontra no outro o ambiente.87 
Ecologia é relação, inter-ação e dialogação de todas as coisas existentes (viventes ou 
não) entre si e com tudo o que existe, real ou potencial. A ecologia não tem a ver apenas 
com a natureza (ecologia natural), mas principalmente com a sociedade e a cultura 
(ecologia humana, social, etc.). Numa visão ecológica, tudo o que existe coexiste. Tudo 
o que coexiste preexiste. E tudo o que coexiste e preexiste subsiste através de uma teia 
infinita de relações omnicompreensivas. Nada existe fora da relação. Tudo se relaciona 
com tudo em todos os pontos.88 
 
 Encontrar o outro é também encontrar o ambiente e nessa relação de 
complementaridade e reciprocidade, o outro é todo organismo de toda espécie, orgânico ou 
inorgânico com quem o ser humano está vinculado ao relacionar-se com o ambiente. 
Essa visão ecocêntrica concebe o mundo natural em sua holodimensão, em sua 
complexa totalidade, como um ser vivo. Une todas as espécies em um sistema único atribuindo à 
natureza um valor em si mesma.89 
São relações de complementaridade que unem todas as espécies num único sistema de 
sustentabilidade do mundo, onde a responsabilidade de todos e de cada um está na 
satisfação de necessidades atuais sem fraudar as perspectivas das gerações futuras, pois é 
nelas que reside a compreensão da nossa geração, e é desde elas que nos atormenta a 
angustia da incompletude em preservá-las.90 
 
2.1 AÇÃO MORAL FACE À NATUREZA NA TEORIA ECOCÊNTRICA 
 
Esta cosmovisão “concede um valor próprio à natureza (natureza como fim em si 
mesma) e busca ultrapassar as fronteiras da visão antropocêntrica, fazendo emergir uma nova 
ética, a ética da natureza.”91 
 
85 Ibidem, p 55. 
86 MICHAELIS. Moderno dicionário da língua portuguesa. Versão digital, São Paulo: Editora Melhoramentos. 
Disponível em: <http://michaelis.uol.com.br/moderno/portugues/index.php?lingua=portugues-
portugues&palavra=encontrar>. Acessado em: 23 maio 2010. 
87 MOLINARO, Carlos Alberto. Racionalidade ecológica e estado socioambiental e democrático de direito. 
Dissertação (Mestrado em direito) – Faculdade de Direito, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul 
Porto Alegre, 2006, p. 55. Disponível em: <http://tede.pucrs.br/tde_busca/arquivo.php?codArquivo=284>. Acesso 
em: 22 maio 2010. 
88 BOFF, Leonardo. Ecologia, mundialização espiritualidade: a emergência de um novo paradigma. 3. ed., São Paulo, 
Editora Ática,1999 apud DURÀN, José Duran y. Comissão Nacional dos Diáconos. Alteridade na sociedade 
contemporânea desde o ponto de vista teológico. Disponível em: < 
http://www.cnd.org.br/art/duran/alteridade.asp#nota2 >. Acesso em: 22 maio 2010. 
89 Ibidem, p. 64-65. 
90 Ibidem, p. 65. 
91 KÄSSMAYER, Karin. Apontamentos sobre a ética ambiental como fundamento do direito ambiental. EOS: 
Revista jurídica da Faculdade de Direito/Faculdade Dom Bosco, Curitiba, v. 1, n. 4, jul./dez. 2008, p. 140. 
17 
 
 
 
A ética da natureza confere ao ser humano responsabilidades em relação ao meio 
ambiente e dentro de uma concepção dialética da relação homem-natureza, a questão da oposição 
entre a necessidade de restabelecer equilíbrios naturais e salvaguardar interesses humanos 
mostra-se resolvida porquanto equilíbrios naturais são interesses humanos. O ser humano está 
ligado à natureza em um equilíbrio simbiótico.92 O homem “não se situa no exterior da natureza, 
mas é dela um componente essencial. O logos reencontra a oikos num enlace, numa dialética 
fundamental que liga o homem à natureza de maneira indissociável”.93 
À natureza é atribuída relevância moral capaz de justificar uma ação moral em seu 
benefício. Já que o equilíbrio natural é um interesse humano, a ação ética considera os elementos 
que constituem o ambiente com todas as suas inter-relações e ainda os “interesses humanos atuais 
e futuros, que reclamam proteção erga omnes”.94 
Baseado nessa forma de relação o ambiente pode ser considerado sujeito e objeto do 
direito, afirmação esta que pode ser recebida com certa estranheza, contudo podemos lembrar que 
no direito encontramos “muitos sujeitos que não são humanos, as pessoas jurídicas, as 
universalidades de direito, os órgãos formais destituídos de personalidade jurídica, e outros”.95 
Enquanto sujeito de direito o ambiente “é uma universalidade de bens naturais e culturais que são 
[...] adjetivações da relação natureza/cultura”;96 como objeto, “está representado por um conjunto 
de recursos naturais, renováveis e não renováveis, e pelo agir humano sustentado pela relação 
natural/cultural”.97A preservação do ambiente mostra-se relevante e a produção normativa pode garantir 
condições para a continuidade e renovação de sistemas naturais promovendo um ambiente 
equilibrado e sustentável para as atuais e futuras gerações.98 
Enquanto bem jurídico a ser tutelado, o ambiente recebe da visão ecocêntrica uma 
dignidade autônoma. O direito fixaria os limites da ação humana vedando arbitrariedades que 
possam impedir que a relação ecológica/ambiental seja interrompida. Uma tutela qualificada 
desta forma promove “a proteção jurídica da natureza por seu próprio valor, onde subjace [...] o 
 
Disponível em: <http://www.dombosco.com.br/faculdade/revista_direito/1edicao-2009/eos-4-2009.pdf>. Acesso em: 
13 maio 2010. 
92 OST, François. A natureza à margem da lei: a ecologia à prova do direito. Lisboa : Instituto Piaget, 1995, p. 310-
311. 
93 NAIM-GESBERT, Eric. Les dimensions scientifiques du droit de l'environnement: contribuition à l'etude des 
rapports de la science et du droit. Bruxelas: Bruylant; VUBpress, 1999, p. 29 apud MILARÉ, Edis; COIMBRA, José 
de Ávila Aguiar. Antrpocentrismo x ecocentrismo na ciência jurídica. Revista de direito ambiental, São Paulo: 
Revista dos Tribunais, ano 9, n. 36, out./dez. 2004. p. 30. 
94 MOLINARO, Carlos Alberto. Racionalidade ecológica e estado socioambiental e democrático de direito. 
Dissertação (Mestrado em direito) – Faculdade de Direito, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul 
Porto Alegre, 2006, p. 98. Disponível em: <http://tede.pucrs.br/tde_busca/arquivo.php?codArquivo=284>. Acesso 
em: 22 maio 2010. 
95 Ibidem, p. 98. 
96 Ibidem, p. 98. 
97 Ibidem, p. 98. 
98 Ibidem, p. 98. 
18 
 
 
 
respeito à vida em toda a sua manifestação [biótica-abiótica], e também, [...] a vida da natureza 
em si”.99 
 
2.2 CRÍTICAS DO ECOCENTRISMO 
 
2.2.1 Crítica do Ecocentrismo ao Antropocentrismo 
 
O ecocentrismo responsabiliza a visão antropocêntrica por dar ao homem o papel de 
dominador da natureza que dela pode usufruir sem limites uma vez que ele foi colocado em um 
pedestal e “[...] nenhuma cultura colocou o ser humano em pedestal tão elevado quanto a 
ocidental”.100 “Enquanto o humanismo supervalorizou a posição do ‘homem’ no universo, o 
mecanicismo coisificou e instrumentalizou a natureza não-humana.”101 
Vivemos uma crise de paradigma. É na ausência de limites que o indivíduo se 
hipertrofia e consequentemente a crise ambiental se alicerça. Já não conseguimos discernir o que 
nos distingue do animal, do que tem vida, da natureza. Também não conseguimos discernir o que 
nos une a eles, vivendo também uma crise de vínculo.102 
O modelo mecanicista nos impõe uma visão fragmentada da realidade, do 
conhecimento, seja do conhecimento dos outros ou de nós mesmos. A crise da civilização é 
também uma crise existencial, do indivíduo. A visão instrumentalizadora da natureza condiciona 
o comportamento humano de tal forma que à relação ser humano/ser humano é conferida a 
mesma dinâmica que é dada à relação ser humano/natureza, ou seja, a relação ser humano/ser 
humano tornar-se uma relação sujeito/objeto. O ser humano passa a ser coisa, é reificado. O 
homem não reconhece o outro e não se reconhece no outro. É um indivíduo em busca de “coisas” 
que lhe proporcionam satisfação. 103 
Daí derivam também as formas de dominação exercidas por uma cultura sobre a 
outra, sobretudo da civilização ocidental antropocêntrica, como o domínio do europeu branco 
sobre os outros povos, o domínio do homem sobre as mulheres, preponderância das classes mais 
abastadas sobre as menos favorecidas, entre outros exemplos. 
Exposta dessa forma a crise ambiental supera a questão da crise ecológica, é uma 
crise de valores, é uma crise de uma sociedade e sua cosmovisão. A questão ambiental também 
engloba preocupações sociais visto que bilhões de pessoas da comunidade global têm 
necessidade de desenvolvimento socioeconômico para ter acesso ao ambiente sadio que viabilize 
o desenvolvimento humano e uma vida digna. Como é ilusório pensar que toda a humanidade 
poderá viver conforme os padrões do primeiro mundo, a humanidade, levada pelo 
 
99 Ibidem, p. 101. 
100 NETO, Aristides Arthur Soffiati. Ecossistemas aquáticos: antropocentrismo, biocentrismo e ecocentrismo. 
Revista de Direito Ambiental, São Paulo: Revista dos Tribunais, ano 10, n. 37, jan./mar. 2005, p. 204. 
101 Ibidem, p 205. 
102 OST, François. A natureza à margem da lei: a ecologia à prova do direito. Lisboa : Instituto Piaget, 1995, p. 9. 
103 MILARÉ, Edis; COIMBRA, José de Ávila Aguiar. Antropocentrismo x ecocentrismo na ciência jurídica. Revista 
de direito ambiental, São Paulo: Revista dos Tribunais, ano 9, n. 36, out./dez. 2004. p. 35-36. 
19 
 
 
 
desenvolvimento da ética do meio ambiente, deverá adotar mudanças no estilo de vida e de 
civilização.104 
Para aqueles que pensam a questão ecológica [...] tal ética somente poderá surgir a partir 
da superação da visão de mundo que tentou reduzir todos os seres à condição de objetos 
cujo valor reside no lucro que podem produzir. Essa ética [...] implica uma mudança 
radical em nossa maneira de compreender a nossa identidade enquanto humanos e o 
nosso lugar no Cosmos, o nosso lugar entre os outros seres.105 
 
As propostas do liberalismo, do conservadorismo e do socialismo por uma 
perspectiva ecocêntrica são variantes de um mesmo projeto político iluminista, que por sua vez 
era uma versão sofisticada do mecanicismo, expressam “um naturalismo mecanicista, 
reducionista, dualista e utilitarista que tratava os ecossistemas como entidades inanimadas postas 
a serviço das antropossociedades”.106 
Mesmo considerando outros elementos da crise do paradigma atual, a questão 
ambiental é que “colocou em xeque os pensamentos e as ações humanas, do foro íntimo até os 
grandes sistemas em vias de globalização”.107 Podemos dizer então que a maior contradição do 
antropocentrismo ocidental é a longa guerra travada contra a natureza não-humana. “Da guerra de 
todos contra todos, presumida por Hobbes, passou-se ao que Michael Serres chamou de guerra de 
todos contra tudo.”108 
 
2.2.2 Crítica do Ecocentrismo ao Personalismo 
 
No que diz respeito ao personalismo o ecocentrismo considera que sua matriz 
notamente judaico-cristã separa o homem e a natureza da mesma forma que acontece na visão 
antropocêntrica. Assim o personalismo também vê o homem como superior hierarquicamente em 
relação aos animais, reforçando a idéia de uso instrumental da natureza. Ao contrário de uma 
perspectiva holística, o personalismo nega que o princípio primordial dos fenômenos do mundo é 
imante à natureza. Este princípio primordial estaria fora da natureza, seria então transcendente. 
Assim os seres humanos não são vistos como parte do mundo natural. Foram colocados por Deus 
 
104 MILARÉ, Edis. Direito do ambiente: doutrina, prática, jurisprudência, glossário. 2. ed. São Paulo: revista dos 
tribunais, 2001, p. 85. 
105 Nancy Mangabeira Unger, O Encatamento do Humano: Ecologia e Espiritualidade. São Paulo: Loyola, 1991, p. 
71. apud MILARÉ, Edis; COIMBRA, José de Ávila Aguiar. Antropocentrismo x ecocentrismo na ciência jurídica. 
Revista de direito ambiental, São Paulo: Revista dos Tribunais, ano 9, n. 36, out./dez. 2004. p. 36. 
106 NETO, Aristides Arthur Soffiati. Ecossistemas aquáticos: antropocentrismo, biocentrismo e ecocentrismo. 
Revista de Direito Ambiental, São Paulo: Revista dos Tribunais, ano 10, n. 37, jan./mar. 2005, p. 205. 
107 MILARÉ, Edis. Direito do ambiente: doutrina, prática, jurisprudência, glossário. 2. ed. São Paulo: revista dos 
tribunais, 2001, p. 85. 
108 HOBBES, Thomas. Leviatã ou matéria, forma e poder de um Estado eclesiástico e civil. São Paulo: Abril 
Cultural, 1974; SERRES, Michel. O contratonatural. Rio de janeiro: Nova Fronteira, 1991 apud NETO, Aristides 
Arthur Soffiati. Ecossistemas aquáticos: antropocentrismo, biocentrismo e ecocentrismo. Revista de Direito 
Ambiental, São Paulo: Revista dos Tribunais, ano 10, n. 37, jan./mar. 2005, p. 205. 
20 
 
 
 
acima dos outros seres. “O que importa, acima de tudo, é o relacionamento com Deus e não com 
o mundo natural.”109 
Aquilo “que é tido como sagrado tem mais probabilidade de ser tratado com respeito 
e cuidado”110 e negando essa característica à natureza ela está aberta à exploração. Deus está 
acima e separado do mundo e ao homem foi conferido o direito de usar a natureza conforme seus 
interesses.111 
Com a irrupção do monoteísmo hebraico e seu desdobramento no cristianismo e no 
islamismo, foi dado o passo inicial para a dessacralização da natureza na acepção atual. 
[...] tudo se passou como se a divindade incriada e criadora absorvesse a sacralidade do 
mundo e a concentrasse na sua pessoa absoluta, onipotente, onipresente e onisciente.112 
Daí em diante, Deus e Natureza tornam-se realidades distintas e separadas, ocupando o 
‘homem’ posição intermediária entre ambas. Lançam-se, assim, as raízes do 
teocentrismo-antropocentrismo e da história.113 
 
Para o ecocentrismo, o personalismo além de separar o ser humano e a natureza, 
fundamenta sua racionalidade em dogmas que foram superados pelas descobertas científicas e 
pelo método científico. Assim é um retrocesso à medida que coloca o homem acima dos outros 
seres, nesse sentindo assumindo uma visão antropocêntrica, sem aceitar os benefícios alcançados 
pela humanidade com as descobertas científicas. 
 
 
3 ECOLOGISMO PERSONALISTA 
“[...] el hombre es un don que ama.[...] 
El hombre es imago Dei en cuanto ama.”
114
 
 
O ecologismo personalista é um pensamento de inspiração monoteísta que considera 
a relação entre homem e natureza como uma relação de colaboração, simbiótica, de cooperação. 
O ser humano é superior aos outros seres, mas continua sendo dependente do meio em que vive. 
O homem está dentro da natureza, depende dela, porém ao mesmo tempo é dotado de uma 
superioridade própria, de uma perfeição que o distingue dos outros seres. O homem é corpo 
pessoal,115 “formado de la tierra y al mismo tiempo como imagen de Dios”.116 
 
109 PONTING, Clive. Uma história verde no mundo. Tradução de: Ana Zelma Campos. Rio de Janeiro: Civilização 
Brasileira, 1995, p. 241. 
110 MILARÉ, Edis; COIMBRA, José de Ávila Aguiar. Antropocentrismo x ecocentrismo na ciência jurídica. Revista 
de direito ambiental, São Paulo: Revista dos Tribunais, ano 9, n. 36, out./dez. 2004. p. 37. 
111 PONTING, Clive. Uma história verde no mundo. Tradução de: Ana Zelma Campos. Rio de Janeiro: Civilização 
Brasileira, 1995, p. 241. 
112 PAPAIOANNOU, Kostas. La consecration de l’histoire. Paris: Champ Libre, 1983; ELIADE, Mircea. O sagrado 
e o profano. Lisboa: Livros do Brasil, s/d; e Aspecto do mito. Lisboa: Edições 70, s/d apud SOFFIATI, Arthur. A 
natureza no pensamento liberal clássico. Revista de Direito Ambiental, São Paulo: Revista dos Tribunais, ano 5, n. 
20, out./dez. 2000, p. 161. 
113 SOFFIATI, Arthur. A natureza no pensamento liberal clássico. Revista de Direito Ambiental, São Paulo: Revista 
dos Tribunais, ano 5, n. 20, out./dez. 2000, p. 161. 
114 BALLESTEROS, Jesús. Ecologismo Personalista. Madri: Tecno, 1995, p. 98. 
115 Ibidem, p. 35-36. 
21 
 
 
 
Persona, do latim significa máscara. Até o advento do cristianismo persona era a 
máscara que os atores usavam para ampliar a voz e se comunicar com o público, designando 
também um papel na peça teatral. É com o cristianismo que o homem é percebido em uma nova 
dimensão, a dimensão da pessoa humana. A formulação do conceito de pessoa foi decisivamente 
influenciada pelos estudos ocorridos por ocasião de disputas teológicas que versavam sobre os 
mistérios da Trindade e da Encarnação.117 
O uso da palavra persona para designar o indivíduo humano foi introduzido pelo Direito 
Romano. Mas a pesquisa do conceito de pessoa como ente distinto do fisiopsiquismo 
humano (ausente em Aristóteles e na demais Filosofia grega) é iniciativa da filosofia 
patrística. A palavra personalitas, bem como o correspondente conceito, é criação 
exclusivamente escolástica.118 
 
A mais conhecida definição de pessoa nos é dada por Severino Boécio onde diz que 
“persona est rationalis naturae individua subtantia” (“a pessoa é uma substância individual de 
natureza racional”).119 Para São Tomás “a pessoa significa o que de mais nobre há no universo, 
isto é, o subsistente de uma natureza racional”.120 Substância é aquilo que é em si e não em outra 
coisa. É essencialmente independente; para subsistir não depende de estar em outro sujeito. A 
referida independência chamamos de subsistência. Subsistência, então, é a aptidão para ser sem 
dependência.121 
O ser humano que é um composto psicossomático, corpo e psique (ou alma), dispõe 
da própria natureza para livremente realizar-se. A pessoa, ser em si, além de corpo e alma tem 
uma personalidade, que é própria de cada ser humano. Pessoa é ser humano em relação, precisa 
do outro para perceber-se como pessoa. A pessoa é um fim em si mesmo e reconhecendo a si 
mesmo e ao outro como pessoa, reconhece que o outro é um fim em si mesmo. Então o outro, que 
é pessoa, não pode ser coisa. A relação entre pessoa com os outros tem essencialmente o caráter 
de diálogo. Na relação pessoa e coisa imperam a posse, a utilização, fatalidade, arbítrio. Quando 
estas características se fazem presente na relação entre pessoas, na relação eu-tu, a pessoa já não 
é mais pessoa. O outro passa a ser uma coisa. Interrompe-se a possibilidade de diálogo, de 
descoberta do outro e conseqüentemente do ser humano enquanto pessoa.122 
 
116 Ibidem, p. 13. 
117 MONDIN, Battista. O homem: quem é ele?: elementos de antropologia filosófica. Tradução de: R. Leal Ferreira e 
M. A. S. Ferrari, revisão de: Danilo Moraes. São Paulo: Edições Paulinas, 1980, p. 285. 
118 MORAES, Walter. Concepção Tomista de Pessoa. Um contributo para a teoria do direito da personalidade. 
Revista de Direito Privado, São Paulo: Revista dos Tribunais, ano 1, n. 2, abr./jun. 2000, p. 191. 
119 BOÉCIO, Contra Eutichen et Nestorium apud MONDIN, Battista. O homem: quem é ele?: elementos de 
antropologia filosófica. Tradução de: R. Leal Ferreira e M. A. S. Ferrari, revisão de: Danilo Moraes. São Paulo: 
Edições Paulinas, 1980, p. 286. 
120 AQUINO, São Tomás. Summa Theologiae. I, 29, 3 apud MONDIN, Battista. O homem: quem é ele?: elementos 
de antropologia filosófica. Tradução de: R. Leal Ferreira e M. A. S. Ferrari, revisão de: Danilo Moraes. São Paulo: 
Edições Paulinas, 1980, p. 286. 
121 MORAES, Walter. Concepção Tomista de Pessoa. Um contributo para a teoria do direito da personalidade. 
Revista de Direito Privado, São Paulo: Revista dos Tribunais, ano 1, n. 2, abr./jun. 2000, p. 191-192. 
122 MONDIN, Battista. O homem: quem é ele?: elementos de antropologia filosófica. Tradução de: R. Leal Ferreira e 
M. A. S. Ferrari, revisão de: Danilo Moraes. São Paulo: Edições Paulinas, 1980, p. 288-294. 
22 
 
 
 
A pessoa se distingue das coisas. Tem liberdade e dessa liberdade decorre a 
capacidade de conhecer e transformar a natureza. É por causa da liberdade que o homem 
consegue aquilo que os animais obtêm mediante os instintos. A liberdade é condição essencial 
que faz do homem um ser cultural: é produto da natureza e da história ao mesmo tempo. Sendo o 
homem um ser cultural, a função da cultura é promover a realização da pessoa. O homem 
transforma o ambiente de modo que o entorno colabore para o desenvolvimento das suas 
potencialidades. As transformações do ambiente realizadas pelo homem (transformações 
culturais) visam a realização da pessoa.123 
Abrangendoessas características podemos considerar como conceito de pessoa 
humana 
A pessoa humana deve ser considerada como um ser concreto, visto que existe de fato. 
Ela é, igualmente, um ser individual, porque é um todo em si mesmo, não podendo ser 
considerada como mero fragmento de um todo maior. Não se pode olvidar que a pessoa 
humana tem raciocínio próprio, peculiar, estando apta para autodeterminar-se nos atos da 
vida pessoal, capacitada a viver como bem entender e habilitada a conhecer a verdade 
por si mesma, por intermédio da livre razão. Por derradeiro, deve-se considerar a pessoa 
humana como um ser social, que só consegue desenvolver-se na sua plenitude, vivendo 
em comunidade com seus pares (outras pessoas).124 
 
Resta saber qual característica define o homem como pessoa e os animais não. Qual é 
o “algo mais” que o diferencia? O que possibilita o homem fazer tantas transformações e 
compreensões? O que distingue as pessoas das coisas, no nível fenomelógico, mais 
profundamente é a capacidade de comunicação.125 
O homem é pessoa porque é dotado de um modo de ser que supera nitidamente o modo 
de ser das plantas e dos animais [...]. Ora, o que é absolutamente peculiar ao seu ser com 
relação ao das outras coisas deste mundo é que, não obstante a sua autonomia no ser, não 
obstante a sua clausura ontológica, não obstante a sua força individual, ele conserva uma 
extrema abertura intencional (tanto no conhecer quanto no querer), pela qual é capaz de 
toda sorte de comunicação com as coisas, com os outros, com Deus. Observamos, 
também, que graças a tal abertura fundamental o homem se autotranscende 
sistematicamente em todas as direções.126 
 
Para Ballesteros a característica que torna o homem superior é a intencionalidade, sua 
capacidade de projetar, sua diferença dos outros seres é procedente do reconhecimento de uma 
 
123 MONDIN, Battista. Definição Filosófica da Pessoa Humana. Tradução de: Ir. Jacinta Turolo Garcia. Bauru: 
EDUSC, 1998, p. 14-17. 
124 PALMA, Anuê do Canto. O direito de acesso e exercício de cargos públicos pelos adventistas do sétimo dia: 
privilégio ou justiça. Monografia (Graduação em Ciências Jurídicas e Sociais) – Faculdade de Ciências Jurídicas e 
Sociais, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2007, p. 15. Disponível em: 
<http://www3.pucrs.br/pucrs/files/uni/poa/direito/graduacao/tcc/tcc2/trabalhos2007_1/anue_canto.pdf>. Acesso em: 
1 jun. 2010. 
125 MONDIN, Battista. O homem: quem é ele?: elementos de antropologia filosófica. Tradução de: R. Leal Ferreira e 
M. A. S. Ferrari, revisão de: Danilo Moraes. São Paulo: Edições Paulinas, 1980, p. 296. 
126 Ibidem, p. 296-297. 
23 
 
 
 
primeira Pessoa criadora, que o criou como imago Dei. Deus dotou o homem de um pensamento 
que o torna capaz administrar a realidade para o bem do homem e da natureza.127 
Antes de proteger os direitos dos animais, o mais razoavél seria criar condições de 
vida que colaborem para a realização das pessoas. “Lo esencial no es la defensa de los derechos 
de los seres no humanos frente a los humanos, sino la garantía de condiciones de vida dignas para 
todos los seres humanos.”128 
Quatro elementos principais constituem a pessoa, a saber, autonomia quanto ao ser, 
autoconsciência, comunicação e autotranscendência. Para Mondin o elemento que melhor ilustra 
a grandeza da pessoa humana é a autotranscendência. Esta é sinal de espiritualidade e 
espiritualidade pertence somente ao homem. Esta seria, portanto, “a razão profunda pela qual o 
homem é pessoa e as coisas não o são: o homem é dotado de espírito, enquanto as coisas dele são 
carentes”.129 Outra propriedade da autotranscendência é a dinamicidade. Ela nos mostra que o ser 
humano não algo que nasce pronto e acabado e sim, é uma imensa gama de possibilidades, a 
pessoa é em grande medida uma conquista. “[...] é justamente a autotrancendência que leva o 
homem continuamente para além do que já é e possui, propondo-lhe sempre novos objetivos e 
novas conquistas.”130 
O ser humano é livre para cuidar dos outros seres e ao mesmo tempo é dependente 
dos outros seres. Somente o homem tem deveres e obrigações devido a sua dupla condição de ser 
livre e dependente.131 A principal função da ética ambiental para o ecocentrismo reside na 
consciência do ser humano em saber que proteger a natureza é proteger a si mesmo. Para que o 
homem seja superior ao resto da criação é necessário que ele preserve, cuide, administre o 
ambiente sabendo que ao cuidar do entorno está cuidando de si mesmo.132 
O ser humano tem o direito de transformar as coisas, todavia não tem o direito de 
destruí-las. Ao destruí-las não projeta o resultado de sua ação ao futuro. Esquece que ao agir de 
maneira que degrada o ambiente compromete a relação com os outros e renuncia aquilo que o 
torna superior ao outros animais. Age sem conhecer, ou ignora o que conhece, inviabilizando 
comunicações inclusive futuramente. Eventualmente pode também usar a razão para alcançar 
satisfações efêmeras que da mesma forma comprometem o futuro e a harmonia da relação com os 
outros. Essa situação se encontra nas relações de consumo que não poucas vezes atendem apenas 
a caprichos, manifestando uma crescente tendência consumista. A proteção dos indivíduos em 
situação de vulnerabilidade econômica é um compromisso do ecologismo personalista. Neste 
entendimento se afirma a responsabilidade dos países do Norte, mais desenvolvidos, e que 
 
127 BALLESTEROS, Jesús. Ecologismo Personalista. Madri: Tecno, 1995, p. 35. 
128, Ibidem,p. 37. 
129 MONDIN, Battista. O homem: quem é ele?: elementos de antropologia filosófica. Tradução de: R. Leal Ferreira e 
M. A. S. Ferrari, revisão de: Danilo Moraes. São Paulo: Edições Paulinas, 1980, p. 297-298. 
130 Ibidem, p. 298. 
131 BALLESTEROS, Jesús. Ecologismo Personalista. Madri: Tecno, 1995, p. 37-38. 
132 BALLESTEROS, Jesús. Ecologismo Personalista. Madri: Tecno, 1995, p. 39. 
24 
 
 
 
divulgam e promovem um padrão de consumo que não colabora para um desenvolvimento 
sustentável.133 
A superação do darwinismo social também é uma das prioridades do ecologismo 
personalista, visando afastar a possibilidade do retorno dos fascismos. Assim também com a 
superação, baseado na solidariedade que nasce da piedade familiar, do nacionalismo do Estado. O 
objetivo é que uma pessoa considere o outro como um fim e não como um meio.134 
A família é a primeira estrutura a favor da ecologia humana, é nela que se revela que 
o homem é um dom para si mesmo, dotado de uma estrutura dada por Deus, assim como a 
natureza e os recursos naturais. Tudo isso nos foi dado, mas não sem propósito, foi dado para ser 
bem empregado conforme o plano de Deus, e não destruído. Neste sentido nos assemelhamos 
com a natureza visto que ambos são dons com finalidade própria. Nos diferenciamos da natureza 
pela capacidade de amar. O homem é um dom que ama, e neste sentido além de nos 
diferenciarmos da natureza, nos assemelhamos a Deus. O homem é imago Dei enquanto ama.135 
 
3.1 AÇÃO MORAL FACE À NATUREZA NO ECOLOGISMO PERSONALISTA 
 
Para o personalismo a ação moral com relação à natureza considera os interesses da 
pessoa humana: ser em si, concreto, individual, de natureza humana, com personalidade própria e 
necessidade de relação e reconhecimento mútuo (alteridade), capaz de exercer sua liberdade, 
descobrir a verdade por meio da livre razão136 e dispor dos recursos naturais para a realização 
própria e dos outros que compõem o corpo social (bem-comum). 
Por ter autoconsciência, autonomia quanto ao ser, comunicação e autotranscendência, 
a pessoa desenvolve um modo de ser totalmente diverso dos outros seres. Por ter a capacidade de 
conhecer o universo de forma profunda e de transformá-lo, o homem tem direito de usufruir os 
recursos naturais. O ecologismo personalista considera que “la naturaleza está al servicio del 
hombre, dado

Mais conteúdos dessa disciplina