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Lavine Santos SOI V Objetivos: Rever a morfofisiologia das meninges. Estudar como ocorre o processo infeccioso do SNC. Estudar sobre a Meningite (conceito, tipos, fisiopatologia, manifestações clínicas) Compreender os mecanismos de prevenção e transmissão da meningite O SNC é completamente envolvido por membranas conjuntivas, que o isolam e protegem, denominadas meninges. Do plano mais superficial para o mais profundo, observam-se: a dura-máter (paquimeninge, espessa e resistente), a aracnoide e a pia-máter (as duas últimas, em conjunto, chamadas leptomeninges, delicadas). Dura-máter : A dura-máter é a meninge mais externa, composta por tecido conjuntivo rico em fibras colágenas. Sua inervação provém, principalmente do nervo trigêmeo, e é ricamente vascularizada, em especial pela artéria meníngea média. No encéfalo, a dura-máter constitui- se de 2 folhetos: externo: periósteo interno interno: meníngeo O folheto externo é fortemente aderido à face interna dos ossos do crânio. O folheto interno, em determinadas áreas, destaca-se do externo, formando pregas e cavidades. As pregas dividem incompletamente a cavidade craniana, e são: • foice do cérebro (septo vertical entre os dois hemisférios, na fissura longitudinal). • tenda do cerebelo (septo transversal entre os lobos occipitais e cerebelo, dividindo os compartimentos supra e infratentorial). Apresenta uma abertura por onda passa mesencéfalo, denominada incisura • foice do cerebelo (septo vertical curto, separa incompletamente os hemisférios cerebelares). • diafragma da sela (pequena lâmina horizontal que fecha incompletamente a sela túrcica, deixando um orifício de passagem da haste hipofisária). A dura-máter apresenta também cavidades: seios durais (canais venosos, recobertos internamente, por endotélio, que contêm sangue proveniente das veias do encéfalo e do globo ocular. Drenam para as veias jugulares internas) • sagital superior (mediano, acompanha a inserção da foice do cérebro. Desagua, posteriormente, na confluência dos seios) • sagital inferior (paralelo ao SSSuperior, porém na margem livre da foice do cérebro, desaguando no seio reto) • reto (mediano, no ponto de união entre a foice do cérebro e a tenda do cerebelo. Termina na confluência dos seios) • transversos (dispõem-se ao longo da inserção da tenda do cerebelo, desde a confluência dos seios até a região da parte petrosa do osso temporal, onde passam a ser designados seios sigmoides) • sigmoides (continuação dos seios transversos até as veias jugulares internas) Lavine Santos SOI V • occipital (mediano, ao longo da margem de inserção da foice do cerebelo) • cavernosos (na base do crânio, de cada lado da sela túrcica) • intercavernosos (entre os dois seios cavernosos) • esfenoparietais (ao longo da asa do esfenoide, drenam para s. cavernosos) • petrosos superiores (na porção petrosa do o. temporal, ao longo da inserção da tenda do cerebelo. Drena o s. cavernoso para s. sigmoide) • petrosos inferiores (percorre o sulco petroso, drenando o s. cavernoso para VJI) • plexo basilar (ocupa porção basilar do osso occipital, entre s. cavernoso e s. petroso inferior) No canal vertebral (ao redor da medula espinal), a dura-máter tem apenas um folheto, que corresponde a continuação do folheto meníngeo da dura-máter craniana. Aracnóide : Dispõe-se logo abaixo da dura-máter e a ela justaposta. É uma meninge delicada, com feixes de tecido conjuntivo elástico. Envia inúmeras trabéculas aracnoides, que atravessam o espaço subaracnóideo, em direção à pia-máter. Como acompanha a dura- máter, enquanto a pia-máter está aderida ao tecido nervoso, a profundidade do espaço subaracnóideo é variável, sendo que aumenta muita nas áreas de sulcos ou depressões. Nesse locais, chamados de cisternas subaracnóideas, o espaço liquórico fica dilatado, com maior acúmulo de líquor. Granulações aracnóideas : -digitações da aracnoide, com enovelados de suas fibras, para o interior dos seios durais, levando o prolongamento do espaço subaracnóideo -locais de absorção do líquor para o sangue Pia-mater: A mais delicada e a mais interna das meninges, a pia- máter está aderida ao tecido nervoso, acompanhando suas elevações e depressões. Apesar de delicada, ajuda a dar forma e resistência ao tecido nervoso. Acompanha os vasos, em especial as artérias, levando o espaço subaracnóideo ao redor dos vasos até o nível capilar. Esses espaços com líquor são chamados espaços perivasculares (de Virchow-Robin) Espaços meníngeos: Com relação aos espaços formados entre as meninges, tem-se que apenas um existe como espaço real na ausência de doença: 1. Interface dura-máter + crânio (“espaço” extradural, epidural ou peridural) não é um espaço natural entre o crânio e a lâmina Lavine Santos SOI V periosteal externa da dura-máter porque a dura-máter está inserida nos ossos. Só se torna um espaço extradural em caso de afecção (p. ex., quando o sangue proveniente da ruptura de vasos meníngeos afasta o periósteo do crânio). 2. Interface dura-máter + aracnoide- máter (“espaço subdural”) não é um espaço natural entre as duas camadas, surgindo em virtude de traumatismo, como um golpe forte na cabeça (hematoma subdural). 3. Interface aracnoide-máter + pia- máter (“espaço subaracnóideo”), único espaço real que contém LCS, células trabeculares, artérias e veias e que se manifesta normalmente, sem necessidade de de coleção sanguinolenta. Existem basicamente três regiões que podem abrigar patógenos e desenvolver síndromes infecciosas no sistema nervoso central (SNC): ↪ Meninges e espaços subaracnoides: meningites; ↪ Parênquima encefálico: encefalites; ↪ Parênquima medular: mielites. Além dessas síndromes, há também o acometimento conjunto do espaço subaracnoide com o parênquima encefálico, denominado meningoencefalite. As manifestações clínicas das infecções do SNC resultam do efeito direto do patógeno e da reação inflamatória do hospedeiro. Assim, as definições de doenças infecciosas do SNC englobam o conceito de inflamação juntamente à ideia de dano tecidual como um todo. O SNC pode ser afetado por diferentes patógenos: vírus, bactérias, fungos e parasitas. Cada um desses agentes pode manifestar-se clinicamente de diversas formas, com predileção por determinados tipos de acometimento. -As bactérias geralmente apresentam como manifestação meningites e abscessos. -Os vírus costumam manifestar-se por encefalites e meningites. Encefalite Encefalite é a inflamação do parênquima cerebral; a etiologia pode ser dividida em causas infecciosas e não infecciosas. Os vírus são responsáveis por aproximadamente 90% dos casos . As causas pós-infecciosas/pós-vacinais representam um processo imune mediado e acredita-se que sejam responsáveis por aproximadamente 1/4 dos casos de encefalites. Já os fungos acometem mais frequentemente em pacientes imunocomprometidos, na forma de meningite ou abscesso. As infestações parasitárias apresentam, como exemplo mais conhecido no Brasil, as lesões parenquimatosas da cisticercose. As infecções do SNC podem se apresentar de forma aguda, subaguda ou crônica, dependendo do agente etiológico, da sua virulência, do local da infecção e da imunidade do hospedeiro. A suscetibilidade é geral na população, entretanto o grupo etário mais vulnerável são as crianças menores de cinco anos, com ênfase para as menores de um ano, e adultos maiores de 50 anos, bem como os pacientes imunodeprimidos e viajantes para áreas de risco. O período de incubação varia de algumas horas até 3 ou mais semanas (na raiva, pode durar meses), dependendo da idade do paciente e da etiologia. Lavine Santos SOI V O quadroclínico inicia com pródromos inespecíficos: mal-estar, anorexia, cefaleia, fotofobia e vômitos, geralmente acompanhados de febre de baixa intensidade. Após um período variável, instala-se o quadro neurológico, com intensificação dos sintomas prodrômicos, associados a sinais meníngeos, alterações mentais, alteração da consciência, convulsões e sinais neurológicos focais. As alterações mentais são importantes, mesmo sem ou com discreto comprometimento de consciência: desorientação, mudanças no comportamento, déficit de memória e delirium. -Sinais meníngeos ocorrem em 1/3 dos casos, com rigidez da nuca e sinais de irritação meningorradicular. -Convulsões são mais frequentes em crianças, podendo ser focais ou generalizadas. -A febre, embora não ocorra em todos os casos, nessa fase quase sempre elevada, é mais frequente nos primeiros dias da doença. -Pode haver sinais piramidais como hipertonia, hiperreflexia e Babinski. Vários tipos de sinais focais podem surgir, como mono, hemi ou tetraparesia, paresia facial central ou periférica, paralisia oculomotora, afasia, ataxia e alterações sensitivas. A evolução é monofásica, sendo raras as recidivas. -O prognóstico é variável, e a maioria evolui bem, sem sequelas, principalmente em adultos e crianças maiores. -As encefalites ocorrem em todas as idades, mas são mais comuns nas crianças abaixo dos 10 anos e raras acima dos 40 anos. Depois das crianças, e na faixa dos 15 aos 30 anos, os casos são mais frequentes. -Nas encefalites virais, os agentes atravessam a porta de entrada (bucofaringe, pulmão, intestinos, pele), promovendo uma viremia que difunde a infecção ao sistema reticuloendotelial. Após uma amplificação da carga viral nesse local, ocorre uma segunda viremia, que leva a infecção ao sistema nervoso central e a outras áreas. As viremias primária e secundária são caracterizadas pela presença dos vírus dentro dos neutrófilos e de células mononucleares, embora vírus livres também circulem no sangue (como os enterovírus). -A penetração na barreira hematoencefálica provavelmente ocorre por meio de células parasitadas pelos vírus que migram através dos vasos sanguíneos das meninges, plexo coroide ou do cérebro. -Uma vez no sistema nervoso central, os vírus podem disseminar-se de célula a célula pelas pontes intercelulares ou por conduítes neurais, ou então são transportados por fluxo axonoplasmático para o corpo do neurônio. -A rota neural de entrada de patógenos no SNC também é importante (como na raiva, herpes simples e, possivelmente, poliomielite). - As amebas de vida livre penetram no SNC pelas vias olfatórias, cruzando a placa cribriforme e chegando ao lobo frontal. -As células do SNC diferem quanto à permissividade da replicação viral. Alguns vírus replicam preferencialmente nos neurônios, enquanto outros, nas células da glia. Além da necrose do tecido, o grau e a localização do edema cerebral são também variáveis importantes. -Os mecanismos imunes humoral e celular interferem para abreviar a replicação viral e a resultante inflamação e o edema. -Uma exceção a essa patogênese é o desenvolvimento das encefalites pós-infecciosas que resultam de mecanismos autoimunes ou alérgicos. Tais reações podem ocorrer seguindo infecção com vírus do tipo selvagem (sarampo, rubéola) ou após inoculação com vírus atenuado (varíola, sarampo). -Uma necrose hemorrágica mais intensa e resultante edema cerebral acontecem na infecção com HSV. Lavine Santos SOI V -Os lobos temporal e frontal estão envolvidos preferencialmente, levando a achados neurológicos focais característicos. -Em alguns pacientes, encefalite por HSV pode ocorrer em associação com lesões orolabiais, com os vírus acometendo o cérebro por meio das vias olfatórias. Em outros, a encefalite pode seguir-se à reativação de vírus dormentes no gânglio trigeminal ou dentro do próprio cérebro. Nas encefalites virais fatais, ocorre uma reação inflamatória proeminente nas meninges e na distribuição perivascular dentro do cérebro. Essa reação inflamatória é composta predominantemente por células mononucleares, embora polimorfonucleares possam também ser encontrados. As células neurais mostram mudanças degenerativas e, frequentemente, fagocitose dos neurônios por macrófagos e células gliais (neuronofagia). Corpos de inclusões intranucleares ocorrem nas encefalites causadas por herpes-vírus, adenovírus e manifestações subagudas e crônicas de infecções pelo vírus do sarampo. O citomegalovírus produz mudanças patológicas características com o surgimento de células citomegálicas contendo corpos de inclusão. O vírus rábico produz os corpos de Negri. Mycoplasma pneumoniae tem sido responsabilizado por 5 a 10% das encefalites agudas da criança. -Nas doenças desmielinizantes agudas, complicando infecções virais exantemáticas ou infecções respiratórias, não se sabe se a invasão do SNC é um pré-requisito para a doença. Essas doenças comprometem tanto a mielina central (encefalite ou encefalomielite pós-infecciosa) quanto a mielina periférica (síndrome de Guillain-Barré). A patogênese dessas síndromes está relacionada com a sensibilização da pessoa infectada pela mielina. Esse mecanismo é análogo às complicações neurológicas pós-vacinais quando se utiliza a vacina antirrábica de Fuenzalida Palacios. As mudanças patológicas dessas situações são caracterizadas por infiltrado perivascular de células inflamatórias mononucleares e desmielinização perivenosa. -Doenças como panencefalite subaguda esclerosante, panencefalite da rubéola, encefalopatia do HIV, paraparesia espástica tropical e leucoencefalopatia multifocal progressiva são lentamente progressivas, com início insidioso e com ausência de febre. As doenças bacterianas, em geral, se manifestam com um início agudo, mas algumas, como neurossífilis, borreliose e doença de Whipple, apresentam início e evolução indolente ou mesmo flutuante. Síndrome de Reye é uma encefalopatia aguda distinta, que costuma surgir após uma infecção viral em que se fez uso de ácido acetilsalicílico; afeta crianças e é caracterizada por infiltração gordurosa do fígado e edema cerebral não inflamatório. É encontrada após influenza, varicela e, possivelmente, outras infecções virais. A história, o exame físico e os achados de exames subsidiários de um paciente com suspeita de encefalite possibilitam dados para confirmar o diagnóstico e mesmo determinar o agente etiológico. Mielites As mielites são doenças do parênquima medular que apresentam manifestações de um ou mais tratos ascendentes ou descendentes. Essas condições podem ou não ocorrer concomitantemente a quadro de encefalite (encefalomielite). Os quadros de encefalites e mielites podem ser divididos em infecciosos (doença viral ativa) e pós- infecciosos (dias a semanas após a infecção inicial). Muitas vezes, o processo infeccioso e inflamatório afeta o espaço do líquido cerebrospinal, ocasionando a síndrome clínica de meningoencefalite. Como em casos de meningites agudas, o acometimento viral do SNC ocorre por diversas portas de entrada, como trato respiratório gastrintestinal, genital e nervos periféricos. A resposta inflamatória do hospedeiro desencadeia a síndrome clínica. Os sinais e os sintomas de pacientes com encefalites e mielites são os seguintes: ↪ Hipertensão intracraniana; ↪ Alterações de comportamento; ↪ Depressão do sensório; ↪ Cefaleia. O quadro clínico de mielite infecciosa ou pós-infecciosa em geral se desenvolve com a mielite transversa, em que as manifestações ocorrem devido à interrupção dos tratos ascendentes e dos descendentes da medula, com nível sensitivo e paresia/plegia abaixo do nível acometido, junto com a ocorrência de alterações esfincterianas. Hoje raramente, a poliomielite cursa com alteraçõesdo corno anterior da medula, paresia focal e atrofia muscular. Lavine Santos SOI V As encefalites e as mielites pós-infecciosas tendem a se manifestar em dias ou poucas semanas após um quadro de infecção viral ou vacinação (p. ex., sarampo). Abscesso Cerebral Bacteriano O abscesso cerebral bacteriano é definido como uma área de exsudato purulento, delimitada por uma cápsula secundária a uma infecção bacteriana do parênquima cerebral. Essa doença é relativamente rara. Os principais germes isolados nos casos de abscessos são os estreptococos, mas diversos outros agentes já foram observados. A etiologia depende, em grande parte, do modo de inoculação do germe, sendo a rota de contiguidade por infecções de ouvido ou seios paranasais, a disseminação hematogênica e a inoculação direta por trauma ou a neurocirurgia as mais comuns. Em adultos, otite média e sinusite são os principais fatores de risco para a formação de abscessos. Em crianças, otite média e doença cardíaca congênita cianótica são as principais condições associadas. Até 30% dos abscessos cerebrais são criptogênicos. Abscessos cerebrais podem ocorrer como consequência ou complicação de: ↪ Otites, mastoidites, sinusites, infecções dentárias; ↪ Trauma craniano aberto; ↪ Procedimentos neurocirúrgicos; ↪ Rota hematogênica (p. ex., infecções pulmonares, infecções de pele, osteomielite, coleções purulentas intra-abdominais e pélvicas, endocardite infecciosa); ↪ Doenças cardíacas congênitas. Geralmente, os abscessos cerebrais bacterianos apresentam um quadro clínico inespecífico, em especial no início da doença, com cefaleia, mal-estar e depressão do sensório. A ocorrência de febre é menos comum (cerca de metade dos casos). Os abscessos podem manifestar-se com sinais focais secundários ao local afetado, como paresias, afasia e déficits sensitivos. Crises convulsivas também podem ocorrer. O edema ao redor da lesão contribui para o quadro. Deve-se pesquisar outras infecções como origem da doença (sinusites, otites, infecções dentárias). A história de trauma encefálico aberto e neurocirurgia também predispõem a esse tipo de infecção. Diferentemente dos abscessos cerebrais, que acometem diretamente o parênquima, os abscessos da região espinal localizam-se geralmente no espaço epidural. As manifestações incluem dor na região da coluna e sintomas e sinais de compressão medular. Neurossífilis A sífilis é uma infecção multissistêmica causada pela bactéria Treponema pallidum. É transmitida por via sexual por meio do contato com lesões primárias, por via transplacentária ou por transfusão sanguínea. A neurossífilis é definida como qualquer evidência direta ou indireta da existência do T. pallidum no líquido cerebrospinal ou no parênquima cerebral. Com a epidemia de Aids, a incidência das manifestações neurológicas da sífilis está aumentando. Diversas formas de acometimento do SNC são possíveis em casos de neurossífilis, como descrito a seguir: ↪ Neurossífilis assintomática: verificam-se líquido cerebrospinal alterado, que inclui leve aumento de linfócitos, aumento de proteínas e um teste de VDRL positivo em um paciente sem sintomas ou sinais neurológicos. ↪ Meningite sifilítica: a maioria dos casos ocorre nos primeiros dois anos após a infecção primária. O início é subagudo e predominam sintomas de hipertensão intracraniana e meningite basal. Manifestações clínicas incluem delirium, febre, cefaleia, náuseas e vômitos, rigidez de nuca, neuropatias cranianas (mais frequentemente de sétimo e oitavo nervos), déficits neurológicos focais, anormalidades de pupila e hidrocefalia. ↪ Doença cerebrovascular: a neurossífilis é uma importante causa de acidente vascular cerebral em jovens, geralmente de 4 a 10 anos após a infecção primária. A sífilis meningo vascular é a manifestação mais comum da neurossífilis sintomática. Os sinais focais de instalação súbita refletem o infarto cerebral causado pela doença. ↪ Demência sifilítica: quadro demencial que apresenta pico de incidência de 10 a 20 anos após a infecção primária. O início geralmente é subagudo, havendo curso progressivo. A doença pode afetar múltiplas funções cognitivas, ocorrendo alteração de personalidade, afeto, inteligência, linguagem e memória. Lavine Santos SOI V ↪ Neurossífilis tabética: esse quadro é raro atualmente. Pode causar doença na medula e nas raízes nervosas. A manifestação inicial dos sintomas pode ser aguda, quando há lesão vascular, subaguda, na compressão medular por granulomas, e crônica, na paquimeningite hipertrófica ou tabes dorsalis (lesão do cordão posterior da medula). A manifestação típica da tabes dorsalis sifilítica inclui ataxia de marcha sensitiva, diminuição de palestesia e tato fino. ↪ Mielite sifilítica: é uma mielopatia inflamatória rara que apresenta início gradual, 20 a 25 anos após a sífilis primária. Ouvidos e olhos: otite sifilítica (com surdez assimétrica, acúfenos) e acometimento ocular (principalmente na forma de uveítes) são variantes da forma neurológica da sífilis. Fungos e sistema nervoso central As infecções fúngicas no SNC apresentam altas taxas de morbimortalidade. O aumento da incidência nas últimas três décadas ocorreu principalmente em função da maior quantidade de pacientes que realizam transplantes de órgãos, quimioterapia potente e de pacientes graves internados em unidades de terapia intensiva. A exposição aos fungos ocorre por inalação, ingestão ou contato com a pele. A infecção começa no tecido subcutâneo ou nos órgãos invadidos, e secundariamente há disseminação hemática até o SNC. Morfologia e tamanho do fungo, dose inoculada, virulência, composição de antígeno e imunidade do hospedeiro determinam a patologia e a gravidade da doença. As manifestações como meningites e meningoencefalites são causadas principalmente pelos fungos filamentosos por meio de penetração na microcirculação e invasão do espaço subaracnoide. Já as lesões focais e os abscessos resultam de invasão arterial com arterite e subsequente embolização ou oclusão, enquanto extensão direta de seios paranasais, órbitas ou ouvido médio desencadeia abscesso ou granuloma nos lobos frontais e nos temporais. Meningite é uma doença que resulta de um processo inflamatório das meninges, que são as membranas que recobrem o encéfalo e a medula espinhal. As etiologias são diversas, podendo ser causada por bactérias, vírus, fungos e, mais raramente, parasitas (protozoários e helmintos), sendo que, algumas etiologias podem cursar com quadros graves, com alta letalidade, mesmo com o tratamento adequado, ou ainda apresentar evolução para quadros hemorrágicos, que se confundem com infecções como febre maculosa, dengue, dentre outras. A doença meningocócica (DM), causada pela bactéria Neisseria meningitidis (meningococo) e os vírus são os principais responsáveis por surtos e epidemias. A meningite meningocócica possui alta morbidade e letalidade. Entretanto a meningite viral é mais frequente que a bacteriana, sendo caracterizada geralmente por quadros benignos e autolimitados. Meningite asséptica é o termo que se refere à síndrome clínica de infecção meníngea onde não há crescimento bacteriano no líquor.Assim, são causas de meningite asséptica: infecções virais e não virais, fármacos, câncer, doenças reumatológicas e metástases tumorais. Epidemiologia A meningite bacteriana é um problema de saúde pública mundial, com incidência anual de 4-6 casos/100 mil adultos, sendo N. meningitidis e S. pneumoniae responsáveis por 80% dos casos. No Brasil, segundo o Ministério da Saúde, a taxa de incidência é 1,4 caso/100 mil habitante/ano, e letalidade de 22,2%. O meningococo é o principal responsável por epidemias no Brasil e possui vários sorogrupos, sendo o sorogrupoC o mais prevalente. A meningite meningocócica pode ocorrer de forma isolada ou associada à meningococcemia, caracterizada pela disseminação hematogênica do agente, resultando em vasculite sistêmica e fenômenos hemorrágicos fulminantes, sendo a forma mais grave da doença meningocócica. A suscetibilidade à infecção é geral, porém, os grupos de maior risco são as crianças menores de 5 anos, principalmente as menores de 1 ano, os idosos acima de 60 anos e os imunodeprimidos. A mortalidade da doença tem se Observação: A meningite está incluída na Lista Nacional de Doenças de Notificação Compulsória! Lavine Santos SOI V mantido em 18-20% dos casos, chegando a 50% nos casos de meningococcemia. Etiologia Bacteriana: Os principais agentes bacterianos são: Neisseria meningitidis (meningococo), Streptococcus pneumoniae (pneumococo), Haemophilus influenzae. Podemos citar ainda outros agentes bacterianos, como: Mycobacterium tuberculosis, Streptococcus sp. – especialmente os do grupo B, Streptococcus agalactie, Listeria monocytogenes, Staphylococcus aureus, Pseudomonas aeruginosa, Klebsiella pneumoniae, Enterobacter sp. Dentre os fatores associados à meningite bacteriana podemos citar: 1. Faixa etária, porta de entrada ou foco séptico inicial; 2. Tipo e local da infecção no sistema nervoso central (SNC); 3. Imunidade prévia; situação epidemiológica local. Etiologia de acordo com a faixa etária e fatores de risco: ↪ 5 a 50 anos: pneumococo, meningococo. ↪ Acima de 50 anos: pneumococo, meningococo, Listeria monocytogens, gram-negativos. ↪ Imunossupressão, diabetes, etilismo: pneumococo, meningococo, Listeria monocytogens, gram-negativos entéricos. ↪ Pós-neurocirurgia: Staphylococcus aureus, Staphylococcus epidermides, bacilos gram-negativos. ↪ Fístula liquórica: pneumococo, H. influenzae. Importante lembrar dos casos de meningite causados pelo M. tuberculosis. A meningite tuberculosa é uma complicação grave da infecção tuberculosa, sendo a sua principal fonte de infecção os casos de tuberculose pulmonar com escarro positivo à baciloscopia, pois há uma grande eliminação de bacilos. Viral: As meningites virais têm distribuição universal e, em geral, evolução benigna, baixa letalidade e menor risco de sequelas. São frequentemente associadas à ocorrência de surtos, podendo ocorrer casos isolados. A incidência se eleva nos meses do outono e da primavera. Fúngica: Os principais fungos causadores de meningite são do gênero Cryptococcus, sendo as espécies mais importantes a C. neoformans e a C. gattii. Outros fungos menos frequentes são: Candida albicans, Candida tropicalis, Histoplasma capsulatum, Paracoccidioides brasiliensis, Aspergillus fumigatus. A meningite criptocócica tem caráter predominantemente oportunista, acometendo principalmente indivíduos com estado imunológico comprometido (aids ou outras condições de imunossupressão). No entanto,a espécie C. gattii pode acometer imunocompetentes, residentes em áreas tropicais e subtropicais, com caráter epidêmico. Em geral, cursa com comprometimento neurológico importante, apresentando evolução grave. Associa-se a elevado risco de complicações, como hipertensão intracraniana e de sequelas, como paralisia permanente de nervos cranianos, déficit cognitivo e hidrocefalia. Outros agentes etiológicos: Existem ainda casos de meningite causados por protozoários e helmintos. Modo de transmissão A transmissão ocorre através do contato com secreções respiratórias do portador do agente patogênico (inalação de gotículas de secreção de vias aéreas), havendo necessidade de contato íntimo (moradores da mesma casa, pessoas que Lavine Santos SOI V compartilham dormitório ou alojamento, comunicante de creche ou escola, namorado). As meningites virais (especificamente causadas por enterovírus) geralmente são transmitidas por via fecal-oral. Apresenta um período de incubação de, em geral, 2 a 10 dias com média de 3 a 4 dias. Para os enterovírus, situa-se entre 7 e 14 dias. Para os casos de meningite tuberculosa, a incubação ocorre nos 6 primeiros meses da infecção. No caso das meningites bacterianas, o agente etiológico pode atravessar a barreira hematoencefálica por: • Acesso direto: fraturas de crânio, defeito congênito de fechamento do tubo neural (espinha bífida, meningocele, meningomielocele, meningoencefalocele) e iatrogênica (punção liquórica inadequada). • Contiguidade: otites médias, mastoidites ou sinusites. • Via hematogênica: ultrapassa a barreira hematoencefálica por ligação com receptores endoteliais, lesão endotelial ou em áreas mais susceptíveis, como o plexo coroide. • Derivações liquórica. A lise bacteriana e liberação da suas endotoxinas (Gram-negativas), ácido teicoico e peptidioglicano (Gram-positivas) da parede celular, induzem a produção de citocinas inflamatórias que aumentam a permeabilidade da barreira hematoencefálica, causando edema vasogênico e hidrocefalia através deste mecanismo. Por este mesmo mecanismo, há formação de edema intersticial junto com a hidrocefalia. Além disso, a migração de leucócitos resulta em degranulação e liberação de metabólitos tóxicos que geram edema citotóxico, crises epilépticas e até mesmo acidente vascular. A consequência desses eventos é o aumento da pressão intracraniana e até mesmo coma. Já a transmissão pode ocorrer até 24 horas após o início da antibioticoterapia adequada, no caso de etiologias bacterianas. No caso das meningites virais, os vírus atingem o SNC por via hematogênica (enterovírus) ou neuronal (HSV). No caso dos enterovírus, ao passarem pelo estômago, são capazes de resistir ao pH ácido e prosseguem para o trato gastrointestinal inferior. Outros vírus se replicam na nasofaringe e se disseminam em linfonodos locais. Após os enterovírus se ligarem a receptores dos enterócitos, eles se replicam em uma célula suscetível, progridem para a placa de Payer (onde ocorre replicação mais intensa) e então uma viremia atinge coração, SNC, fígado, sistema reticuloendotelial. Acredita-se que o enterovírus atinja o SNC através de junções íntimas endoteliais e posteriormente alcance o plexo coroide e o líquor. A infecção causada pelo HSV (vírus herpes simples) atinge o SNC pela via neuronal, através do nervo trigêmeo e olfatório; ou ainda nos casos de meningite asséptica, o vírus se dissemina após uma lesão genital primária, ascendendo pelas raízes sacrais até a meninge. O vírus pode ainda ficar latente nas raízes nervosas do trigêmeo e olfatório, reativando anos depois, causando encefalite ou quadros de meningite asséptica. A suscetibilidade para a infecção é geral, mas pode-se dizer que as faixas etárias mais vulneráveis são as crianças < de 1 ano e adultos > de 60 anos. Os neonatos possuem uma proteção através dos anticorpos maternos, por isso, dificilmente adoecem. Entretanto, a partir de 3 meses de idade a suscetibilidade vai aumentando devido a diminuição da imunidade. Pacientes idosos, imunossupressos ou portadores de quadros crônicos (por exemplo: síndrome nefrótica, diabetes mellitus, infecção pelo HIV, asplenia anatômica ou funcional, insuficiência renal crônica) apresentam maior risco à meningite pneumocócica. Manifestações clínicas O quadro clínico da meningite caracteriza-se por febre de início súbito, associada à cefaleia, prostração, náuseas, vômitos, hiporexia, rigidez de nuca, mialgia, agitação, fotofobia e sinais meníngeos. • Sinais de irritação meníngea: – Sinal de Kernig: flexão passiva da coxa sobre a bacia, em ângulo reto, com dor e resistência à extensão do joelho. – Sinal de Brudzinski: flexão involuntária da perna ao se tentar fletir a cabeça do paciente. • Sinais de gravidade: piora da cefaleia, rebaixamento do nível de consciência, torpor,convulsões, déficit neurológico focal, confusão mental, transtornos Lavine Santos SOI V pupilares, turvação visual, paralisias de nervos cranianos, bradicardia, nistagmo, papiledema. • Meningococcemia: prostração intensa, palidez, sinais de toxemia, exantema e/ou petéquias, sufusões hemorrágicas, hipotensão, rebaixamento do sensório, associados ou não a quadro de meningite, com risco de evolução para choque, CIVD e óbito. • Meningite viral: associadas ao quadro de meningite são comuns manifestações gastrointestinais (vômitos, hiporexia, diarreia e dor abdominal), respiratórias (tosse, faringite) e ainda erupção cutânea. Em geral, cursa com bom prognóstico e a recuperação do paciente é completa. Tende a ser autolimitada, a duração do quadro é geralmente inferior a uma semana. • Meningite criptocócica: deve ser sempre considerada em pacientes com aids que apresentam cefaleia, febre, demência progressiva e confusão mental. As meningites em que existe a necessidade de profilaxia para erradicar o estado de portador são as meningocócicas e por H.influenzae. Nestas últimas, a profilaxia para contactantes está indicada quando no domicílio existe crianças com menos de 4 anos não vacinadas ou para profissionais que trabalhem com crianças com menos de 2 anos não vacinadas. Nas meningites meningocócicas, a profilaxia está indicada para todos os contactantes íntimos, definidos como aqueles que residem no mesmo domicílio, com permanência > 4 horas/dia, nos últimos 7 dias, períodos maiores que 8 horas consecutivas nos últimos 7 dias,contatos íntimos como beijo na boca nos últimos 7 dias, contatos de creche, incluindo adultos, doenças em comunidades fechadas e contatos em sala de aula quando dois ou mais casos ocorreram em 6 meses, profissionais de saúde que entraram em contato sem equipamento de proteção individual (EPI) adequado com pacientes suspeitos, em procedimentos de intubação orotraqueal, aspiração orotraqueal e tempo prolongado. A droga de escolha é a rifampicina na dose para adultos de 600 mg 12/2 horas e crianças 10 mg/kg 12/2 horas, VO, por 2 dias para meningococo e 600 mg/dia 4 dias para o H. influenzae. Outras opções são ciprofloxacino e a ceftriaxona. Quimioprofilaxia A quimioprofilaxia é a melhor medida para prevenção de casos secundários e de surtos. Está indicada somente para os contatos próximos de casos de meningite por H. influenzae e doença meningocócica. Considera-se como contato próximo moradores do mesmo domicílio, indivíduos que compartilham o mesmo dormitório (em alojamentos, quartéis, entre outros), parceiro, comunicantes de creches e escolas, pessoas diretamente expostas às secreções do paciente, indivíduo que conviveu com o doente por quatro ou mais horas diárias, por pelo menos cinco dos sete dias que antecederam a admissão hospitalar do caso. A droga de escolha é a Rifampicina. Deve ser iniciada, idealmente, até 48 horas da exposição, podendo ser usada até 10 dias no caso de doença meningocócica ou até 30 dias no caso do Haemophilus influenza. Todos os contatos devem ser monitorados durante 10 dias. Para os menores de um ano contactantes não vacinadas, deve ser utilizada a vacina tetravalente nas meningites por H. influenzae. Indicações de quimioprofilaxia: • Todos os contatos próximos de um caso de doença meningocócica, independente do estado vacinal • Contato próximo com casos de doença invasiva por Haemophilus influenzae. • Profilaxia para o profissional de saúde: indicada somente para casos com exposição às secreções respiratórias e vômitos do doente, durante procedimentos invasivos como intubação orotraqueal, ou quando permaneceram no mesmo ambiente que o doente por um período superior a quatro horas, sem utilização de equipamentos de proteção individual (EPI). Lavine Santos SOI V Vacinação A vacinação é considerada a principal medida preventiva, sendo as vacinas específicas para determinados agentes etiológicos e utilizadas na rotina para imunização de crianças menores de 2 anos. Estão disponíveis no Calendário Nacional de Vacinação da Criança do Programa Nacional de Imunizações (PNI/MS): • Vacina conjugada Pentavalente: protege contra meningite e outras infecções causadas pelo H. influenzae tipo b, além de difteria, tétano, coqueluche e hepatite B. • Vacina BCG: protege contra as formas graves de tuberculose (miliar e meníngea). • Vacina pneumocócica conjugada 10-valente: protege contra doenças invasivas e outras infecções causadas pelo pneumococo (proteção contra dez sorogrupos). • Vacina meningocócica conjugada C: protege contra doença invasiva causada por meningococo do sorogrupo C. • Vacina pneumocócica polissacarídica 23-valente (VPP23): indicada para imunodeprimidos, portadores de doenças crônicas e população indígena acima de 2 anos de idade.
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