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Tuberculose: Definição e Fisiopatogenia

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Eduarda Miot Panazzolo
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TUBERCULOSE
Definição
· É uma doença infectocontagiosa que pode ser causada por qualquer uma das sete espécies do complexo Mycobacterium tuberculosis.
· A etiologia mais importante é o M. tuberculosis, cuja principal característica é a preferência pelo parênquima pulmonar e a transmissão de pessoa a pessoa através da inalação de partículas de aerossol contaminadas (tosse, espirro ou fala do paciente bacilífero).
Ps: paciente bacilífero é aquele que elimina bacilos no escarro, o que só acontece na TB de vias aéreas (pulmonar ou laríngea.
· A maioria dos indivíduos infectados pelo BK (prova tuberculínica positiva) não é bacilífera, logo, não transmite a doença. Apenas os que desenvolvem tuberculose-doença podem eliminar bacilos e transmiti-los. Ainda, dos que adoecem nem todos eliminam bacilos. 
a) Multibacilíferos: presença de baciloscopia positiva no escarro (BAAR positivos); são os principais responsáveis pela transmissão da tuberculose. 
b) Paulibacilíferos: baciloscopia do escarro negativa, mas cultura positiva. 
c) Não baciliferos: representados pelas formas extrapulmonares da tuberculose.
Fisiopatogenia
1. Instalação da primo-infecção:
· A primo-infecção ou infecção primária define os eventos decorrentes do primeiro contato com o agente infeccioso. 
· Ao alcançar o espaço alveolar, o bacilo da tuberculose é fagocitado por macrófagos locais. Esses são incapazes de destruir ou mesmo inativar o bacilo, que então se prolifera em seu interior.
· Após acumular muitos bacilos, a célula se rompe e morre, liberando-os para infectar outros macrófagos. Assim, forma-se um pequeno foco pneumônico. A imunidade específica ainda não se instalou, portanto, a proliferação bacilar é alta.
· Os bacilos são drenados para linfonodos hilares e mediastinais, onde continuam se proliferando dentro do macrófago e depois atingem a corrente sanguínea, sendo semeados para diversos órgãos.
2. Surgimento da imunidade:
· Após 2-10 semanas, a imunidade celular específica se desenvolve plenamente, permitindo uma defesa eficaz contra o M. tuberculosis. 
· Os linfócitos TCD4 específicos contra antígenos bacilares se proliferam (memória imunológica) e tornam-se capazes de ativar os macrófagos pela liberação de interleucinas. Os macrófagos aumentam seu citoplasma e sua capacidade bactericida, e se acumulam em volta dos focos de infecção, sendo que em 95% dos casos a infecção tuberculosa é controlada, mantendo o paciente assintomático.
· A reunião de macrófagos circundados por um infiltrado de linfócitos compõe o granuloma (hipersensibilidade tipo IV), que contem em seu interior células de Langerhans. No caso da tuberculose, no centro da reação granulomatosa surge uma área de necrose sólida do tipo caseosa. O foco granulomatoso pulmonar é chamado de foco primário ou de nódulo de Ghon.
3. Mecanismo de doença:
· O desenvolvimento da tuberculose-doença depende da “guerra” bacilo x hospedeiro. A lesão tecidual é decorrente da resposta imunológica do hospedeiro e não de um efeito direto do bacilo, que é desprovido de toxinas de alto poder lesivo.
· Quando a carga de bacilos é muito grande, a resposta imunológica tende a ser exacerbada, formando focos maiores de granuloma caseoso. Em alguns pacientes, as células do granuloma conseguem conter o processo (focos regressivos), mas em outros a lesão inflamatória progride (focos progressivos).
· No cáseo, os bacilos se proliferam com dificuldade devido à baixa tensão de O2 e pH ácido. Se o cáseo for mantido, o processo tem mais chance de estabilizar. Porém, pode ocorrer a liquefação caseosa, que é quando há liberação excessiva de enzimas líticas (destrutivas) pelos macrófagos do granuloma. Os produtos da degradação do cáseo aumentam a osmolaridade local, puxando água do tecido circunjacente, transformando em um meio de cultura excelente. 
· Se a lesão atingir um brônquio, erodindo sua parede e permitindo a comunicação com o espaço aéreo, rico em O2, a proliferação bacilar se axacerbará ainda mais. Surge, assim, a caverna tuberculosa, ambiente propício para o acúmulo de BK. Isso pode culminar em disseminação endobrônquica da tuberculose, além de facilitar a contaminação.
· Existem três tipos de lesão parenquimatosa na tuberculose: proliferativa, exsudativa e mista.
Prova tuberculínica (PT) ou “PPD”
· Identifica indivíduos infectados pelo BK, ou seja, infecção latente (ILTB) ou infecção-doença (TB).
· PPD é uma fração proteica purificada a partir cultura de BK, que contém os principais antígenos do M. tuberculosis.
· Pessoas infectadas pelo BK desenvolvem após 2-10 semanas uma memória imunológica, pela seleção de linfócitos TCD4 específicos contra o BK. A partir desse momento, ao injetarmos o PPD na derme do paciente, surge uma lesão indurada e eritematosa cerca de 48-72 horas após injeção, pois os linfócitos determinaram uma reação tipo IV (hipersensibilidade tardia).
Síndrome da Tuberculose
· A doença se desenvolve em apenas 10% dos infectados. Em 5% dos casos, a primo-infecção evolui diretamente para a tuberculose primária, que ocorre dentro dos primeiros 3 anos da infecção (período de incubação: um mês a três anos). Nos 5% restantes, a doença se desenvolve após 3 anos da primo-infecção, tuberculose pós-primária, podendo ser decorrente da reativação de um foco latente da primo-infecção ou simplesmente de uma reinfecção.
· Enquanto a tuberculose primária é a forma clássica da doença em crianças pequenas, a tuberculose pós-primária ocorre quase que exclusivamente em pessoas com mais de 15 anos.
1. Tuberculose pulmonar primária:
· O quadro clínico clássico é encontrado principalmente em crianças recém-infectadas e pode ser comparado ao quadro de uma pneumonia atípica, as vezes confundido com uma gripe prolongada.
· Os sintomas mais frequentes são: febre baixa (38-39) e tosse seca.
· A dor pleurítica sugere pleurite tuberculosa.
· A ativação do sistema imunológico na tuberculose primária pode levar, na minoria dos pacientes, a três tipos de reação à distância: eritema nodoso, conjuntivite flictenular e síndrome poliarticular.
· O exame radiológico revela tipicamente uma adenopatia hilar e/ou mediastinal.
· Complicações possíveis: atelectasia, pneumonia tuberculosa, evolução para forma linfo-hematogênica (miliar), evolução para forma primária progressiva.
2. Tuberculose pulmonar pós-primária:
· É a forma crônica da tuberculose pulmonar, típica em indivíduos entre 15-40 anos, responsável pela transmissão da doença na população.
· Ocorre em infectados há mais de 3 anos, que já desenvolveram memória imunológica, PPD positivos.
· Em reinfecção ou reativação, a resposta imunológica é imediata, mas ineficaz. Macrófagos ativados junto com linfócitos T helper reagem intensamente para formar o infiltrado granulomatoso, evoluindo geralmente para necrose caseosa. No cáseo, o bacilo se prolifera pouco, mas logo ocorre liquefação e surge a caverna tuberculosa (paciente multibacilífero).
· A maioria dos pacientes é oligossintomática, a principal queixa é tosse crônica seca, mucoide ou com expectoração purulenta, associada ou não a hemoptoicos.
· Os exames laboratoriais podem revelar uma anemia leve, normocítica normocrômica, aumento importante de VHS, raramente leucocitose neutrofílica ou linfocítica, monocitose ou monocitopenia, elevação de enzimas hepáticas e eventualmente hiponatremia por SIADH.
· A presença de linfadenopatia hilar e/ou mediastinal NÃO é característica do quadro pós-primário.
Diagnóstico
1. Teste Rápido Molecular (TRM-TB):
· É um teste de amplificação gênica que usa a técnica de PCR. 
· Ele detecta especificamente a presença de DNA do M. tuberculosis ao mesmo tempo que sinaliza a existência de genes que conferem resistência à rifampicina, e o resultado fica pronto em 2 horas.
Ps: mais de 80% dos BK resistentes à rifampicina também são resistentes à isoniazida.
· Atualmente, é o método de escolha para a pesquisa de tuberculose no Brasil.
· O TRM-TB detecta o DNA de bactérias vivas e mortas. Logo, NÃO serve para acompanhar a resposta ao tratamento, uma vezque a persistência de sua positividade não necessariamente significa falha terapêutica (podemos detectar o DNA de micobactérias mortas, mesmo com tratamento eficaz). O acompanhamento deve ser feito com baciloscopias mensais.
2. Baciloscopia:
· Consiste na pesquisa direta do BK através do exame microscópico. O método Ziehl-Neelsen é a técnica de coloração mais utilizada. 
· Quando o material analisado for escarro, devem ser coletadas duas amostras em momentos distintos. Também pode ser feita em outros materiais, como outros fluidos orgânicos ou tecido de biópsia. Uma baciloscopia positiva em qualquer amostra indica tuberculose ativa.
· A baciloscopia é o exame de escolha para acompanhar a resposta ao tratamento.
3. Cultura + TSA:
· A cultura para BK possui elevada sensibilidade e especificidade, podendo ser realizada em meios sólidos ou líquidos.
· Com a cultura positiva, a identificação da espécie deve ser feita por técnicas bioquímicas, fenotípicas ou biomoleculares.
· Toda cultura positiva deve ser submetida ao TSA (teste de sensibilidade antimicrobiana).
Tratamento
· Qual esquema de tratamento inicial para TB pulmonar? Associação RIPE por 6-9 meses.
· Princípios básicos: associação de drogas + tempo prolongado + monitorização resposta.
· DOT: tratamento diretamente observado.
· Tratamento usual para tuberculose pulmonar e ganglionar:
· Fase intensiva: diminuir a população bacilar incluindo os resistentes (rifampicina + Isoniazida + Pirazinamida + Etambutol, durante 2 meses).
· Fase de manutenção: eliminação de bacilos latentes ou persistentes e diminuição de chance de recidiva (rifampicina + isoniazida, durante 4 meses).
· Monitorização da resposta: clínica/radiológica e microbiológica.
Clínica/radiológica: febre (até 6 meses), ganho de peso (semanas), rx alterado (final do tratamento).
Microbiológica: baciloscopias mensais (positivas até 2 meses).
· Intolerância digestiva: geralmente náusea, vômito, diarreia transitórios.
Rifanpicina: urina alaranjada, fenômenos imunomediados (rash cutâneo, lúpus-like, etc).
Isoniazida: depleção de B6 e neuropatia periférica, alteração de comportamento, hepatotoxicidade.
Pirazinamida: hiperuricemia, gota, dor articular.
Ps: em caso de depleção de B6, fazer reposição em gestantes, neuropatias periféricas, etilismo, DM, desnutridos.
· O tratamento sob regime de internação hospitalar é indicado em: meningocefalite tuberculosa, intolerância aos medicamentos incontrolável em ambulatório, mau estado geral, intercorrências clínicas ou cirúrgicas, vulnerabilidade social.
Prevenção de contactantes
1. Quimioprofilaxia primária (RN): 
· Contato com mãe bacilífera
· Não faz BCG
· Inicia isoniazida xarope por 3 meses
· Após 3 meses fazer prova tuberculínica (PPD): 
· PPD ≥ 5mm: manter o tratamento por mais 3 meses ou 1 e não vacinar com BCG.
· PPD < 5mm: suspender o tratamento e vacinar com BCG.
2. Crianças (<10 anos) com contato:
· Fazer PPD.
· Investigar TB ativa (rx, escarro, etc).
· Quimioprofilaxia com isoniazida durante 9 meses.
3. Adultos:
· Assintomáticos: investigar Tb ativa, rx de tórax e PPD.
· Assintomáticos HIV+: sempre tratar ILTP.
· Sintomáticos: investigar TB ativa.
· PPD > 5mm: fazer rx de tórax.
· Rx normal: tratar ILTB (isoniazida durante 9 meses).
· Rx alterado: continuar investigação de TB ativa.
· PPD < 5mm: repetir PPD após 8 semanas.
· Sem conversão (aumento < 10mm): negativo para TB ativa, tratar ILTB.
· Com conversão (aumento > 10mm): investigar TB ativa, se positiva tratar com RIPE, se não tratar ILTB.
Dose isoniazida: 5mg/kg/dia, por 9 meses, dose máxima 300mg/dia.
4. PPD > 5mm independente de contato: sempre fazer isoniazida.
· HIV+.
· Uso de anti-TNF.
· Uso de corticosteroides > 15mg/dia.
· Terapia imunossupressora pré-transplante.

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