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Conceitos para reflexão e debate a partir do Pensamento de Mar-Tin Heidegger sobre a origem da obra de Arte

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UNIVERSIDADE ESTÁCIO DE SÁ
Linguagens da Arte E REGIONALIDADES – CEL0108
Profa. Angela Cristina de Souza Rego
Texto 02
CONCEITOS PARA REFLEXÃO E DEBATE A PARTIR DO PENSAMENTO DE MARTIN HEIDEGGER SOBRE A ORIGEM DA OBRA DE ARTE.
A questão do originário e da essência
Dizemos ser originário a estância de onde algo é e através do que é. A isso equivale a essência, ou seja, o que determina o originário de qualquer coisa. 
Também afirmamos com segurança que a obra surge através da vontade e atividade do artista. Porém, fica a questão: qual a essência do artista que o faz expressar-se como se expressa e criar as obras que cria? Sabemos sobre a relação intrínseca artista-obra de arte: um não é sem o outro. Assim, concluímos, o originário de um está no originário do outro.
Sobre a natureza da obra de arte
As obras de arte existem como existem as coisas. Um quadro se pendura como se pendura um chapéu. As obras, quando seguem para um museu, são transportadas como se transportam carvão ou gado. Hinos de Hölderlin, durante as campanhas de guerra, foram guardados em mochilas juntamente com produtos de limpeza. Assim, inquestionavelmente, todas as obras de arte têm caráter de coisa.
Contudo, as obras de arte devem ser vistas como representações de quem as vivencia.
Obra de arte: coisa, alegoria e símbolo
Estas possíveis representações é que fazem a obra de arte transpor o caráter de coisa. Surge, então, o caráter de artístico. A obra de arte se abre para um outro, algo novo não previsto totalmente antes de sua consecução. Este outro da obra de arte que se manifesta é a alegoria. Uma representação junta-se à coisa. Em grego, pôr junto com chama-se symballein [sym = com, ballein = pôr, jogar]. A obra de arte é um símbolo.
Conclusão: alegoria e símbolo caracterizam a obra de arte. Assim, forma-se outro caráter de coisa na obra de arte no qual o artista trabalha.
O ser-obra da obra e o utensílio
O caráter de coisa dos objetos imprime neles a ideia de utilidade x inutilidade. Um sapato se gasta, uma fruta se estraga, um jarro de vidro se quebra. Fatalmente, o sapato novo e útil adquire outro caráter essencial e se torna gasto e quase inútil; a fruta que seria alimento se consumida no tempo certo, vai para o lixo; o jarro de vidro tem o mesmo destino, pois já não guarda o conteúdo que nele foi depositado. Isso é uma verdade inquestionável.
No entanto, na obra de arte, todas essas coisas podem assumir um outro caráter, não mais o de coisa-utensílio, mas o de uma representação que nos coloca em um lugar no qual não costumamos estar. Não se trata, apenas, de uma visão subjetiva do artista pela qual os utensílios se apropriam de outro caráter de utilidade. É na obra de arte que o ser-utensílio surge de forma mais plena, para além do que a vida cotidiana consegue nele instaurar.
A obra como acontecimento da verdade
Vamos discutir, agora, a questão da verdade tendo em vista a obra. 
Se visualizarmos um templo grego, veremos que ele não copia nada. É uma obra arquitetônica que se ergue sobre um rochedo em direção ao céu infinito. O átrio que a ele pertence se abre a referências que não se encontram na natureza: nascimento e morte, maldição e bênção, vitória e ignomínia, perseverança e queda. 
O templo erguido extrai os elementos externos a ele (considerando a efetiva construção) a sua plena composição: a obscuridade do rochedo, a resistência contra as tempestades e as marés, o brilho e a luminosidade do sol, a extensão do claro céu ou da noite escura. A visibilidade do templo enquadra vegetação e animais e torna visível o ar invisível. Esse desabrochar em-si e no todo foi denominado pelos gregos de physis. Ao mesmo tempo, é nele que o homem funda seu morar, e a isso chamamos Terra, aquilo em que se abriga a verdade como tal ela desabrocha diante do que se vê no que se está inserido.
O mesmo processo dá-se com a obra-da-linguagem. A tragédia como obra-da-linguagem representa o narrar inaugural de um povo. Não fala sobre a luta em si, mas sobre a verdade dessa luta através da palavra essencial, decidindo sobre o que é sagrado e não-sagrado, grande e pequeno, ousado e covarde, perene e transitório, nobre e escravo.
O sagrado da obra de arte
 
Quando uma obra de arte é instalada ou exposta, ela não é apenas colocada em um determinado espaço físico, mas é consagrada e glorificada, porque o ser da obra assim o exige. A obra abre um mundo, uma nova existência e assim vigora. (v. referência ao templo.) O caráter da obra de arte significa: instalar o Mundo. A força nomeadora da palavra elabora no tangível a essência da obra. O pedreiro trabalha com a pedra, mas a desgasta; o escultor a transforma. O pintor de paredes trabalha com a tinta e simplesmente a transporta de um local a outro; o pintor de quadros faz brilhar as cores. Os usuários da língua usam as palavras para esgotar o sentido do que desejam expressar; os poetas, ao contrário, ampliam os sentidos das palavras. Em suma, o artista instala um novo mundo, a Terra que é o desabrochar em si mesmo o qual o homem habita.
A reflexão e o enigma
As reflexões aqui elaboradas dizem respeito ao enigma da arte, que, em verdade, não se resolve, mas sobre o qual se deve refletir para que possamos vê-lo na obra de arte.
Fonte: HEIDEGGER, Martin. A origem da obra de arte. Lisboa: Edições 70, 2007.

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