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Antropologia cultural Aula 5: O conceito de cultura Apresentação Nesta aula, veremos o desenvolvimento do conceito de cultura e analisaremos o porquê das diferenças de comportamento e da diversidade cultural entre os homens. Objetivos Identi�car os antecedentes históricos na formação do conceito de cultura. Re�etir sobre o desenvolvimento do conceito de cultura do ponto de vista antropológico. Diversidade cultural Desde a antiguidade, tem-se tentado explicar as diferenças de comportamento entre os homens, a partir das diversidades genéticas ou geográ�cas. Atualmente, esta é uma ideiacienti�camente refutada. As características biológicas não são determinantes das diferenças culturais. Se uma criança brasileira for criada na França, por exemplo, ela crescerá como uma francesa, aprendendo a língua, os hábitos, as crenças e os valores dos franceses. (Fonte: Ekaterina Pokrovsky / Shutterstock). O ambiente físico também não explica a diversidade cultural. Os lapões e os esquimós, por exemplo, vivem em ambientes muito semelhantes os lapões habitam o norte da Europa, e os esquimós, o norte da América. Era de se esperar que eles tivessem comportamentos semelhantes, mas seus estilos de vida são bem diferentes. Os esquimós constroem os iglus amontoando blocos de gelo num formato de colmeia e forram a casa por dentro com peles de animais. Com a ajuda do fogo, eles conseguem manter o interior da casa aquecido. Quando quer mudar, o esquimó abandona a casa levando apenas suas coisas e constrói um novo iglu. Os lapões vivem em tendas de peles de rena. Quando desejam se mudar, eles têm de desmontar o acampamento, secar as peles e transportar tudo para o novo local. O comportamento dos indivíduos depende de um aprendizado, de um processo chamado endoculturação ou socialização. Pessoas de raças ou sexos diferentes têm comportamentos diferentes não em função de transmissão genética ou do ambiente em que vivem, mas por terem recebido uma educação diferenciada. Assim, podemos concluir que é a cultura que determina a diferença de comportamento entre os homens. O homem age de acordo com os seus padrões culturais, ele é resultado do meio em que foi socializado. Antecedentes históricos do conceito de cultura Desde o �nal do século XVII, o termo germânico kultur era utilizado para simbolizar todos os aspectos espirituais de uma comunidade, enquanto a palavra francesa civilization referia-se principalmente às realizações materiais de um povo. Ambos os termos foram sintetizados por Edward Tylor (1832-1917) no vocábulo inglês culture. "tomado em seu amplo sentido etnográ�co [culture] é este todo complexo que inclui conhecimentos, crenças, arte, moral, leis, costumes ou qualquer outra capacidade ou hábitos adquiridos pelo homem como membro de uma sociedade." (LARAIA, 2005). Com essa de�nição, Tylor abrangia em uma só palavra todas as possibilidades de realização humana, além de marcar fortemente o caráter de aprendizado da cultura em oposição à ideia de aquisição inata, transmitida por mecanismos biológicos. O conceito de cultura, pelo menos como utilizado atualmente, foi, portanto, de�nido pela primeira vez por Tylor. No entanto, o que ele fez foi formalizar uma ideia que vinha crescendo na mente humana. John Locke (1632-1704) Em Ensaio acerca do entendimento humano (1690), procurou demonstrar que a mente humana não é mais do que uma caixa vazia por ocasião do nascimento, dotada apenas da capacidade ilimitada de obter conhecimento, através de um processo de endoculturação. Jean Jacques Rousseau (1712-1778) Em “Discurso sobrei a origem e o estabelecimento da desigualdade entre os homens” (1775), atribui um grande papel à educação aos processos de assimilação e produção cultural. Kroeber (1876-1960) Em seu artigo O Superorgânico (in AMERICAN ANTHROPOLOGIST, v. XIX, n. 2, 1917), acabou rompendo todos os laços entre o cultural e o biológico, postulando a supremacia do primeiro em detrimento do segundo. Clifford Geertz (1926-2006) Em 1973, escreveu que o tema mais importante da moderna teoria antropológica era o de "diminuir a amplitude do conceito e transformá-lo num instrumento mais especializado e mais poderoso teoricamente." Escola evolucionista Na época histórica de seu aparecimento como ciência, a antropologia sofreu a in�uência da ideia dominante no mundo cientí�co: o evolucionismo, consagrado pela publicação de A origem das espécies, de Charles Darwin, em 1859. Por isso, na segunda metade do século XIX, a nascente ciência concebeu os diferentes grupos humanos como sujeitos em desenvolvimento. Acreditavam que as distintas sociedades evoluiriam todas na mesma direção, passando por etapas e fases de desenvolvimento e diferenciação cultural inevitáveis e escalonadas, seguindo uma transformação que levaria do simples ao complexo, do homogêneo ao heterogêneo, do irracional ao racional. Para os antropólogos evolucionistas, todos os grupos humanos teriam de atravessar necessariamente as mesmas etapas de desenvolvimento, e as diferenças que podem ser observadas entre as sociedades contemporâneas seriam apenas defasagens temporais, consequência dos ritmos diversos de evolução. Embora, hoje em dia, as principais teses evolucionistas estejam muito superadas , é considerável a maneira pela qual continuam in�uenciando a linguagem vulgar e o próprio vocabulário especializado da antropologia. Dessa forma, às vezes, �ca difícil ao especialista descrever fenômenos antropológicos sem ter de recorrer a vocábulos viciados pelo conteúdo evolucionista que os impregnou durante muitos anos. Nesse sentido, a utilização de conceitos como "sociedades primitivas", "civilizações evoluídas" etc. pressupõem uma aceitação implícita de seu fundo ideológico evolucionista. Para evitar confusões, muitos antropólogos falam hoje de "sociedades de tecnologia simples" ou "sociedades de pequena escala", em oposição à "sociedade de tecnologia complexa" ou "sociedades industriais". Os mais in�uentes antropólogos evolucionistas foram o americano Lewis Henry Morgan, com o seu estudo sobre as etapas da evolução humana, e o inglês Edward B. Tylor, com o estudo das manifestações religiosas. Clique nos botões para ver as informações. Em 1877, Morgan publicou o estudo Ancient Society (A sociedade primitiva), no qual distinguia três etapas pelas quais passaram (ou irão passar) todas as sociedades humanas, em uma sequência obrigatória de progresso: selvageria, barbárie e civilização. De igual forma, para a formação da família, teriam se estabelecido vários estágios sucessivos, desde a promiscuidade primitiva à família bilateral moderna de tipo europeu. etapas da evolução humana Tylor, por sua vez, realizou estudos comparativos das manifestações religiosas das diferentes sociedades humanas, acreditando, depois disso, poder estabelecer três etapas na evolução da ideologia religiosa dos povos: animismo, politeísmo e monoteísmo. Embora as teses de Tylor tenham sido amplamente criticadas, a suas concepções sobre a evolução das religiões continuam presentes na linguagem vulgar. evolução da ideologia religiosa dos povos O evolucionismo materialista de Morgan in�uenciou consideravelmente as primeiras abordagens marxistas da antropologia. Em particular, foi o caso de Friedrich Engels, que escreveu A origem da família da propriedade privada e do Estado baseando-se claramente na leitura de Ancient Society. A escola evolucionista mostrou-se consideravelmente carregada de preconceitos etnocêntricos, o que levou seus representantes a considerarem a sociedade europeia como a mais evoluída e a acreditarem que todas as outras tenderiam a alcançar a mesma perfeição. Além disso, se for levado em conta que nem sempre se dispunham de conceitos su�cientemente diferenciados sobre sociedade e raça, compreende-se que a intenção de encaixar as sociedades (e as raças) em um quadro evolutivo gerasse conclusões precipitadas e errôneas. Em defesa da escola evolucionista, é preciso lembrar que a antropologiaera então uma ciência quase inexistente cujo desenvolvimento muito se bene�ciou dos estudos e esforços dos adeptos dessa escola. Quando tais teses começaram a ser abandonadas peta maioria dos antropólogos, os métodos e procedimentos da nova ciência já estavam encaminhados e ela começava a dar seus frutos. Atividade 1. Podemos dizer que a cultura é ao mesmo tempo aquilo que singulariza e distingue o ser humano. Singulariza porque é algo exclusivo do homem. Distingue porque cada povo tem sua própria caracterização cultural. Sobre o conceito antropológico, é correto dizer: a) as culturas humanas obedecem a um processo natural de transmissão. b) a cultura humana corresponde a todo comportamento natural do homem em sociedade. c) a cultura é o conjunto de saberes adquiridos e compartilhados pelos homens em sem processo histórico. d) a cultura é decorrente de um processo instintivo do ser humano, sendo hereditariamente transmitido de pai para filho. Referências DAMATTA, Roberto. Relativizando: uma introdução à antropologia social. 5. ed. Rio de Janeiro: Rocco, 2010. JOHNSON, Allan G. Dicionário de Sociologia: guia prático da linguagem sociológica. São Paulo: Jorge Zahar, 1997. LARAIA, Roque de Barros. Cultura: um conceito antropológico. 18. ed. Rio de Janeiro: Zahar, 2005. SANTOS, José Luiz dos. Que é cultura. 14. ed. São Paulo: Brasiliense, 2005. Próxima aula O contexto ideológico que condicionou o desenvolvimento do conceito de cultura; A relação entre cultura e evolucionismo, e as principais críticas ao evolucionismo; As “ampliações” ao conceito de cultura, destacando principalmente as contribuições de Franz Boas e Alfred Kroeber. Explore mais Pesquise na internet, sites, vídeos e artigos relacionados ao conteúdo visto. Em caso de dúvidas, converse com seu professor online por meio dos recursos disponíveis no ambiente de aprendizagem.