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Monografia Andre completa 18-12

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO
DEFESA E GESTÃO ESTRATÉGICA INTERNACIONAL
ANDRÉ FELIPE FIGUEIREDO DE FREITAS GUIMARÃES
A EVOLUÇÃO DO TRATAMENTO AOS REFUGIADOS: UM BREVE ESTUDO A CERCA DOS REFUGIADOS ANGOLANOS MORADORES DO RIO DE JANEIRO PROVENIENTES DA GUERRA CIVIL ANGOLANA
ORIENTADORA: Prof. Ana Luiza Bravo e Paiva
Rio de Janeiro
2014
ANDRÉ FELIPE FIGUEIREDO DE FREITAS GUIMARÃES
A EVOLUÇÃO DO TRATAMENTO AOS REFUGIADOS: UM BREVE ESTUDO A CERCA DOS REFUGIADOS ANGOLANOS MORADORES DO RIO DE JANEIRO PROVENITES DA GUERRA CIVIL ANGOLANA
Monografia apresentada ao Departamento do Centro de Ciências Jurídicas e Econômicas, Universidade Federal do Rio de Janeiro, para obtenção do grau de Bacharel em Defesa e Gestão Estratégica Internacional.
Orientador:
Prof. Ana Luiza Bravo e Paiva
Rio de Janeiro 
2014
ANDRÉ FELIPE FIGUEIREDO DE FREITAS GUIMARÃES
A EVOLUÇÃO DO TRATAMENTO AOS REFUGIADOS: UM BREVE ESTUDO A CERCA DOS REFUGIADOS ANGOLANOS MORADORES DO RIO DE JANEIRO PROVENIENTES DA GUERRA CIVIL ANGOLANA
Monografia apresentada ao Departamento do Centro de Ciências Jurídicas e Econômicas, Universidade Federal do Rio de Janeiro, para obtenção do grau de Bacharel em Defesa e Gestão Estratégica Internacional.
COMISSÃO EXAMINADORA
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Prof. XXXXXX
Universidade XXXXXX
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Prof. XXXXXX
Universidade XXXXXX
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Prof. XXXXXXXX
Universidade XXXXXX
DEDICATÓRIA
 
Dedico este trabalho a minha família, que tanto contribuiu para minha formação.
AGRADECIMENTOS
Hoje eu só quero agradecer! A vocês, que estiveram ao meu lado nas horas que chorei e nas horas que sorri. Agradecer pelo sorriso diário, carinho, conselhos e palavras reconfortantes. Hoje quero agradecer, porque quem fez, faz e fará sempre parte de minha história!	
Primeiramente a minha família que é a base de tudo que tenho. A educação que vocês me dão é algo maravilhoso. Tudo que conquistei e ainda vou conquistar estará atrelado a isso por toda a minha vida. Pai e mãe, vocês são os melhores exemplos que eu poderia ter ao lado. Espero conseguir um dia alcançar todas as expectativas que vocês têm por mim, sei que não são poucas. Arthur e Alberto, meus irmãos queridos, vocês são meus maiores companheiros, estaremos sempre juntos. Tuany, ao lado de um grande homem há sempre uma grande mulher, seu incentivo é fundamental. Vocês cinco são meu porto seguro, obrigado pelo apoio incondicional.
	Aos amigos que a faculdade me deu a oportunidade de fazer. “UFRJ BACANA”, vocês são diferenciados. Foram quatro anos de alegrias e aflições, mais conquistas do que derrotas. E juntos nós conseguimos nos tornar a primeira turma de Defesa e Gestão Estratégia Internacional do Brasil. Espero que essa amizade dure além UFRJ. 
Também aos amigos mais próximos que sempre me incentivaram a conquistar tudo que anseio. Obrigado pelo carinho sincero e a amizade verdadeira. Mariana Cordeiro, obrigado por toda a ajuda, você é uma ótima amiga. 
	E por último, e não menos importante, a minha mestra e orientadora Ana Paiva. Obrigado pelo conhecimento passado e pela paciência. Você abraçou a ideia sem nem me conhecer. Está sendo fundamental para a minha formação. Sou muito grato por isso. E desculpa a demora nas entregas dos capítulos.
	Obrigado a todos. 
RESUMO
O presente estudo tem por objetivo principal analisar, por meio de entrevistas e depoimentos, a vida dos refugiados angolanos, provenientes da Guerra Civil Angola, no estado do Rio de Janeiro, bem como as razões que os impulsionaram até aqui, procurando entender o contexto social em que estão inseridos, além de verificar os problemas que têm enfrentado. Serão, também, ponderados, por meio de uma análise do Direito Internacional dos Refugiados (observando e interpretando as normas de direito interno e de direito internacional, assistidos pelo CONARE e ACNUR respetivamente), os mecanismos existentes no ordenamento jurídico brasileiro para garantir proteção a essas pessoas que se encontram em situação bastante vulnerável.
Palavras-chave: Refugiados; Direito Internacional dos Refugiados; Guerra Civil Angolana; ACNUR; CONARE. 
ABSTRACT
The present study has for main objective to analyse, through interviews and depositions, the lives of Angolan refugees from Angola's Civil War, in the State of Rio de Janeiro, as well as the reasons that drove up here, seeking to understand the social context in which they are inserted, in addition to checking the problems they have faced. Will be weighted, too, through an analysis of international law on refugees (observing and interpreting the norms of domestic law and international law, assisted by CONARE and UNHCR respectively), existing mechanisms in the Brazilian legal system to ensure protection to those people who find themselves in a very vulnerable situation.
Keywords: refugees; International refugee law; Angolan Civil War; UNHCR; CONARE.
ABREVIATURAS E SIGLAS
ACNUR – Alto Comissário das Nações Unidas para Refugiados
ADUS – Instituto de Reintegração do Refugiado – Brasil
ASAV – Associação Antônio Vieira
BBC – British Broadcasting Corporation 
CC – Comissão Conjunta 
CE – Conselho da Europa
CEIPAR – Comitê Estadual Intersetorial de Políticas de Atenção aos Refugiados
CICV – Comitê Internacional da Cruz Vermelha
CDDH – Centro de Defesa dos Direitos Humanos 
DUDH – Declaração Universal dos Direitos Humanos
DPU – Defensoria Pública da União
FESA – Fundação Eduardo dos Santos
IMDH – Instituto Migrações e Direitos Humanos 
FNLA – Frente Nacional da Libertação de Angola
IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
IRS – Iniciativa de Reintegração Sustentável 
MPLA – Movimento Popular de Libertação de Angola
OAB - Ordem dos Advogados do Brasil
OEA – Organização dos Estados Americanos 
OIM – Organização Internacional para as migrações 
OIR – Organização Internacional para os Refugiados
ONG – Organização Não Governamental 
ONU – Organização das Nações Unidas 
OUA – Organização da Unidade Africana 
PAM – Plano de Ação do México 
RNE – Registro Nacional de Estrangeiros
SEASDH – Secretaria de Estado de Assistência Social e Direitos Humanos
SENAC – Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial
SENAI – Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial
SEPPIR – Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial 
SESC – Serviço Social do Comércio
UA – União Africana 
UNITA – União Nacional para a Independência Total de Angola
UNRRA – United Nations Relief and Rehabilitation Administration 
SUMÁRIO
1.	INTRODUÇÃO	9
2.	O HISTÓRICO DOS REFUGIADOS NO MUNDO	17
2.1	CONCEITO E DEFINIÇÃO	17
2.2	EVOLUÇÃO DO TRATAMENTO	19
2.3	O CONCEITO E A APLICAÇÃO DO INSTITUTO: AS CLÁUSULAS DE INCLUSÃO, CESSAÇÃO, PERDA E NÃO INCLUSÃO	26
3.	O BRASIL E OS REFUGIADOS	29
3.1	O DESENVOLVIMENTO HISTÓRICO	29
3.2	O PROCEDIMENTO PARA SOLICITAÇÃO E CONCESSÃO DE REFUGIO NO BRASIL:	34
3.3	AUXILIOS E DIFICULDADES ENFRENTADAS	37
4.	OS REFUGIADOS ANGOLANOS NO RIO DE JANEIRO	43
4.1	A GUERRA CIVIL ANGOLANA E SEUS REFUGIADOS	43
4.2	A RESIDÊNCIA PERMANENTE	47
4.3	ENTREVISTAS	49
4.3.1 METODOLOGIA	49
4.3.2 ENTREVISTAS E AVALIAÇÕES	50
4.4	ASSISTÊNCIA NO RIO DE JANEIRO E O FUTURO	55
CONCLUSÃO	59
BIBLIOGRAFIA	63
APÊNDICE	67
1. INTRODUÇÃO
Muitos amigos foram mortos, os que ficaram pedem ajuda. Não imagino como estão todos lá. Penso muito neles, principalmente na hora das refeições. Pois não sei se eles estão comendo também. Eu que sustentava a minha família. Minha família foi dispersa. Não tenho informações deles. Cheguei aqui sem nada, tudo que tenho me foi doado. Sofrimento demais não poder defender a política certa no país que nascemos. Não poder lutar sobre o seu direito. Lá não temos direitos, direitos humanos, democracia. É muita corrupção. A cada dia mais pessoas morriam. Todo dia via alguém morto nas ruas. Aqui nunca vi um óbito. Qual é a sensação de deixar o país que você nasceu? Não é uma opção nada feliz. Crianças e mulheresmorrendo, sendo estupradas. Não tem nem lugar para enterrar os mortos. As cidades estavam todas destruídas. (Josué, entrevistado, refugiado angolano no Brasil há 20 anos). 
Vidas marcadas por uma guerra civil. Sentimento de impotência, e tristeza estampada em seus rostos. Pessoas que podem cruzar com você a qualquer momento, os refugiados chegam aos milhares no Brasil. Angolanos, que ao conseguirem fugir da guerra, respiram mais aliviados, mas sem emprego e muitas expectativas, a adaptação é outra luta. Com precários acampamentos em seus países vizinhos, muitos enxergaram a melhora e o sonho de recomeçar a vida na “nova terra prometida”, o Brasil.
Sofrendo com choques culturais e abandonados à própria sorte, dependem do governo e das ONGs, que os auxiliam na emissão de documentos, busca de emprego, ajudas de custo e doações, para que possam se manter vivos e com dignidade. Perderam amigos e familiares, mas não perdem a esperança de dias melhores. E isso é só o começo de uma grande batalha em busca do reconhecimento e afirmação. 
Um dos temas mais debatidos na atualidade em relação ao Direito Internacional é a proteção à vida humana, inaugurada com a Carta das Nações Unidas[footnoteRef:1], em 1945, com o fim da Segunda Guerra. Naquele momento a relação entre os direitos humanos, a segurança e a paz passou a ter uma relação direta. Diante deste contexto e considerando o avanço de questões relacionadas ao Estado de Direito e aos Direitos Humanos, é necessário identificar onde se encaixam os refugiados. [1: Assinada em São Francisco a 26 de junho de 1945, é o acordo que forma e estabelece a organização internacional alcunhada Nações Unidas, documento que, logo após a Segunda Guerra Mundial, criou a Organização das Nações Unidas em substituição à Liga das Nações como entidade máxima da discussão do Direito internacional e fórum de relações e entendimentos supranacionais. ] 
São tidos como refugiados aquelas pessoas que são forçadas a fugirem de seus países devido a questões políticas, religiosas, militares ou quaisquer outros problemas, como definido na Convenção de Genebra de 51[footnoteRef:2]. Assim, qualquer pessoa poderia reivindicar esse direito, conforme conceitua Barbosa e Hora (2007): [2: Convenção das Nações Unidas relativa ao Estatuto dos Refugiados, assinada em Genebra, sob a chancela do ACNUR.] 
Nos termos do Direito Internacional a definição de refugiado tem um sentido muito mais específico. O conceito foi cunhado pela Convenção de 51, determinando que se aplicasse a toda pessoa que, devido a fundados temores de ser perseguido por motivo de raça, religião, nacionalidade, grupo social ou opinião política, encontra-se fora de seu país de nacionalidade e que não pode ou em virtude desse temor, não quer valer se da proteção desse país.
Os grandes deslocamentos forçados começam a serem notados no século XV[footnoteRef:3], entretanto, foi somente no século XX que os refugiados passaram a ter um status internacional legalmente definido. Durante a Segunda Guerra Mundial, essa questão tomou grandes proporções, e com o decorrer do tempo e o surgimento de novas guerras, o fluxo de pessoas que fogem dos seus países de origem em busca de uma proteção em outros Estados ocorre cada vez mais. Sendo assim é grande a preocupação da comunidade internacional em relação a essas pessoas. [3: Primeiramente com os judeus expulsos da região da atual Espanha, no ano de 1492, em função da política de europeização do reino unificado de Castela e Aragão – iniciada após a reconquista deste da dominação turca – que levou à expulsão da população apátrida, não totalmente assimilada e que contabilizava 2% do total da população, em função de esse reino ter a unidade religiosa como uma de suas bases constitutivas. E, logo em seguida, de Portugal, país no qual buscaram refúgio.] 
Diferente das migrações regulares, os refugiados fazem parte de um fluxo[footnoteRef:4] migratório global irregular. Estes visam somente fugir de perseguições, conflitos ou violência generalizada em seus países de origem e se submetem a situações de documentação irregular ou insuficiente, entrada nos países de destino em pontos não oficiais, clandestinos, ou ainda se tornam vítimas de traficantes de pessoas. Além disso, a lógica propulsora que movimenta o imigrante regular é diferente da dos refugiados. Estes acabam indo, em sua maioria, para países vizinhos subdesenvolvidos ou em desenvolvimento em busca de sobrevivência e acesso aos mínimos direitos humanos. Enquanto que aqueles costumam migrar para países desenvolvidos para melhorar seu padrão de vida. [4: A globalização tem facilitado ainda mais esse vai e vem de pessoas. Visto que a evolução do sistema de transporte (rodoviário, hidroviário, ferroviário e aéreo) e das telecomunicações oferece uma maior mobilidade às pessoas em todo mundo.] 
No relatório Tendências Globais 2013[footnoteRef:5] mais de 50 milhões de pessoas encontravam-se deslocadas à força – segundo o Alto Comissariado da ONU para Refugiados (ACNUR) – maior número desde a Segunda Guerra Mundial.  Esse total representa um aumento de 6 milhões de pessoas deslocadas em relação aos 45,2 milhões de 2012. Destes, 16,7 milhões são refugiados: 11,7 milhões sob o mandato do ACNUR e 5 milhões de refugiados palestinos registrados com UNRWA[footnoteRef:6]. O total inclui 33,3 milhões de deslocados internos e cerca de 1 milhão 200 mil solicitantes de refúgio. [5: Disponível em < http://www.acnur.org/>, acessado em 14 de julho de 2014. ] [6: A Agência das Nações Unidas de Assistência aos Refugiados da Palestina no Próximo Oriente, também conhecida pela sigla UNRWA (do inglês, United Nations Relief and Works Agency for Palestine Refugees in the Near East), é uma agência de desenvolvimento e de assistência humanitária que proporciona cuidados de saúde, serviços sociais, de educação e ajuda de emergência aos mais de 4 milhões de refugiados palestinos que vivem na Faixa de Gaza, Cisjordânia, Jordânia, Líbano e Síria.] 
Do total de refugiados no mundo, 2,56 milhões são originários do Afeganistão, 2,47 milhões da Síria e 1,12 milhão da Somália. Os principais países de acolhimento de refugiados são o Paquistão (1,6 milhão), Irã (857.400), Líbano (856.500), a Jordânia (641.900) e Turquia (609.900). A região da Ásia e do Pacífico contabiliza o maior número de refugiados no mundo, com 3,5 milhões de pessoas, seguida pela África Subsaariana (2,9 milhões), a África do Norte e o Meio Oriente (2,6 milhões).
 
 Fonte: ACNUR[footnoteRef:7] [7: Disponível em < http://www.acnur.org/>, acessado em 25 de julho de 2014.] 
De acordo com o ACNUR, cerca de 48% dos refugiados são mulheres e 50%, menores de 18 anos. "Isso é uma nova tendência, particularmente preocupante", destacou Antônio Guterres. Ao enfatizar que os dados mostram que as famílias são as principais afetadas e nem sempre estão se deslocando conjuntamente.
A guerra na Síria é uma das principais causas do aumento dos números citados. No ano passado o conflito gerou 2,5 milhões de refugiados e 6,5 milhões de deslocados internos. Grandes deslocamentos também foram notados na República Centro-Africana e no Sudão do Sul. 
Isso demonstra que a paz está seriamente em déficit (...) Assistimos a uma multiplicação de novas crises (...). Ao mesmo tempo, antigas crises parecem nunca acabar e os problemas continuam em vários lugares do mundo. Vemos que o Conselho de Segurança [das Nações Unidas] está paralisado perante muitos problemas cruciais. Estamos com um problema cada vez maior e, ao mesmo tempo, poucos recursos para ajudar tanta gente em circunstâncias tão trágicas. Esses conflitos não geram só um desafio humanitário, mas representam hoje uma ameaça para a paz global. Quando uma resposta humanitária não pode resolver os problemas de tantas pessoas, temos que apelar à comunidade internacional parasuperar as diferenças. É a única solução que existe para deslocamentos forçados.[footnoteRef:8] [8: Disponível em <http://agenciabrasil.ebc.com.br/>, acessado em 21 de julho de 2014. ] 
Adverte Guterres, Alto Comissário das Nações Unidas para Refugiado, ressaltando a capacidade limitada do Conselho de Segurança perante as inúmeras crises humanitárias. Acontecimento que corrobora algumas tendências preocupantes, como o aumento do grupo de pessoas afetadas (hoje um número superior a 50 milhões de indivíduos nos últimos anos) e o fato de que os refugiados permanecem nesta situação por muitos anos, levando uma vida de pouca dignidade, que certas vezes vai contra os direitos humanos.
Diante de todos esses números e situações apresentados, mais o fator de que vivemos em um mundo cada vez mais transnacional, é evidente que o Direito Internacional ganhe forças, no sentindo de acompanhar a evolução da humanidade como um todo. Com isso surgem três conjuntos de normas que podem ser utilizadas para descrever os direitos dos refugiados. São documentos que apesar de serem independentes devem ser vistos de formas complementares e que juntos devem ser capazes de cobrir todos os tipos de situações em que um ser humano possa se encontrar. São eles:
· O Direito Internacional Humanitário, composto pelas quatro Convenções de Genebra e supervisionado pelo Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV) estabelece um regime de proteção do ser humano em situações de conflito armado internacional ou não internacional;
· O Direito Internacional dos Direitos Humanos, composto basicamente pela Declaração Universal dos Direitos Humanos, os dois Pactos Internacionais sobre direitos civis e políticos e sociais, econômicos e culturais de 1967, as Convenções regionais sobre direitos humanos, as Convenções contra a tortura e a Convenção contra todo tipo de discriminação contra a mulher e;
· O Direito Internacional dos Refugiados, composto basicamente pela Convenção da ONU, de 1951, relativa ao Estatuto dos Refugiados e seu Protocolo Adicional de 1967, supervisionados pelo ACNUR. 
O ACNUR, conhecido como a Agência da ONU para Refugiados, tem o mandato de dirigir e coordenar a ação internacional para proteger e ajudar as pessoas deslocadas em todo o mundo e encontrar soluções duradouras para elas. Foi criado pela Assembleia Geral da ONU em 14 de dezembro de 1950 para proteger e assistir às vítimas de perseguição, da violência e da intolerância. O ACNUR atua, junto e através de comitês nacionais, em 126 países, inclusive em regiões de conflito (como Sudão, Chade, Colômbia), zonas afetadas por catástrofes naturais e em operações de repatriação de refugiados, como em Angola e no Afeganistão. Como a Agência não possui território próprio para abrigar os refugiados, quanto mais membros e mais ajuda tiver ao redor do mundo, mais fácil fica dar assistência. 
Em virtude da atuação em benefício dos refugiados e pessoas deslocadas, o ACNUR promove igualmente os propósitos e princípios da Carta das Nações Unidas: manutenção da paz e segurança internacionais; desenvolvimento de relações amistosas entre as nações; e encorajamento do respeito pelos direitos humanos e pelas liberdades fundamentais. Ficando incumbido da recepção e integração inicial dos refugiados, enquanto cabe ao governo a inserção destes nos programas de acesso à educação e a saúde. 
Contudo, diante de diversas crises mundiais, essa atuação tem sido dificultada. Entre os grandes desafios que os governantes mundiais vêm enfrentando nos últimos anos, destacam-se o crescimento demográfico, a pobreza e as desigualdades sociais. No Brasil, por exemplo, a luta interna pelos direitos humanos e cidadania, bem como a construção de uma identidade nacional dificultam ainda mais tal processo[footnoteRef:9]. [9: Diante disso o presidente Fernando Henrique Cardoso lançou, em seu primeiro mandato, o Programa Nacional de Direitos Humanos. Programa esse que veio com um atraso de quase 50 anos, se considerarmos que, em 1948, o Brasil aprovou e assinou, na ONU, a Declaração Universal dos Direitos Humanos.] 
Apesar disso, as exposições do ACNUR apontam que o Brasil se mantém na liderança na América Latina no trato dos refugiados, tanto na questão legal quanto por suas práticas. Um passo importante que impulsionou tal posicionamento em relação à questão legal foi à implementação da Lei nº 9474/97, sancionada pelo Presidente Fernando Henrique Cardoso em 22 de julho de 1997. Lei essa que direciona o processo que deve ser seguido para que um refugiado seja acolhido, garantindo que seja tratado da mesma maneira que todos os cidadãos nacionais. O procedimento consiste em passar por um processo com direito a defesa, através de convênio da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) e da ACNUR. A sua criação ocorreu, principalmente, devido ao grande fluxo migratório que aumentava cada vez mais, sobretudo vindo do continente africano. E a situação da Angola, em 1993, após sua guerra civil, foi crucial para a criação da lei. 
A Guerra Civil, iniciada em 1975, fez com que o Estado angolano se deparasse e experimentasse um enorme êxodo populacional: algo em torno de 80% dos colonos portugueses e muitos dos africanos que contribuíam para o funcionamento da economia abandonaram o país, o que intensificou a dimensão dos problemas econômicos, uma vez que o país foi deixado por sua elite dirigente. Muitos desses imigrantes se dirigiram para países dentro do continente, principalmente para países africanos fronteiriços (MENEZES, 2000). Mas havia momento em que nem o continente africano passava segurança, com isso o Brasil se tornava uma ótima alternativa, especialmente pela proximidade da língua e a existência de uma legislação acolhedora. 
Contudo, apesar da facilidade em adentrar ao território brasileiro, os refugiados angolanos têm enfrentado inúmeras dificuldades, e diariamente, têm que suportar o descaso e o preconceito de muitas pessoas. 
Apesar disso, diversas são as assistências sociais recebidas pelos mesmos. Em relação à saúde, por exemplo, estes têm direito ao uso dos hospitais públicos e acesso a medicamentos (disponíveis por verba da ACNUR). Assim como também têm acesso à educação pública. A integração na comunidade local é outro ponto importante para a garantia do respeito aos direitos humanos dos refugiados. A integração da língua é facilitada por convênio com o SESC e as Cáritas[footnoteRef:10]. Além do auxílio de diversos órgãos e instituições, que apesar de não garantirem a inserção, revelam a preocupação do governo em promover a integração trabalhista. [10: A Cáritas internacional é um órgão sem fins lucrativos da Igreja Católica, criada em 1950, com grande visibilidade em boa parte do mundo decorrente de sua destacada atuação em diversos projetos sociais, mormente ao atendimento direto às populações carentes e por isso é considerada como braço social da Igreja Católica, atuando em mais de 150 países, em todos os continentes. Devido ao reconhecido conseguido através de suas atuações, a Cáritas internacional mantém o status de observadora junto ao Conselho Econômico e Social da ONU há mais de 35 anos e, no Brasil, desempenha papel fundamental na questão dos refugiados. Em solo brasileiro ela foi criada em 1956 e encontra-se vincula da à Conferência Nacional dos Bispos – CNBB e à Pastoral Social, sendo que se destacam no atendimento e acolhida de refugiados as Arquidiocesanas de São Paulo e do Rio de Janeiro] 
Assim, pode-se considerar que o Brasil está preocupado em oferecer uma série de serviços e aportes para os que aqui chegam como refugiados. Ou seja, em um primeiro momento, é possível considerar que o país age de acordo com a defesa dos direitos humanos, pois busca tirar de uma situação de risco pessoas que se encontram desamparadas. Porém esses aportes não estão sendo suficientes, fazendo com que a Secretaria de Estado de Assistência Social e Direitos Humanos do Rio de Janeiro, por exemplo, avalie cada vez mais a criação de projetos para melhorar esse cenário dentro de sua cidade. 
Seguindoessa linha, o presente estudo tem por objetivo principal analisar a vida dos refugiados angolanos no estado do Rio de Janeiro, bem como as razões que os impulsionaram até aqui, procurando entender o contexto social em que estão inseridos, além de verificar os problemas que têm enfrentado. Serão também, ponderados, por meio de uma análise do Direito Internacional dos Refugiados (observando e interpretando as normas de direito interno e de direito internacional) os mecanismos existentes no ordenamento jurídico brasileiro para garantir proteção a essas pessoas que se encontram em situação bastante vulnerável. 
Para a fundamentação da presente reflexão, optou-se por uma linha metodológica de entrevistas, colhimento de depoimentos e análise de documentários e documentos, com pessoas ligadas a algumas das instituições que se ocupam dos problemas referentes aos refugiados, tais como Cáritas e ACNUR e assim como com os refugiados angolanos.
2. O HISTÓRICO DOS REFUGIADOS NO MUNDO
	
2.1	CONCEITO E DEFINIÇÃO
Como pode ser visto na definição da Convenção Relativa ao Estatuto dos Refugiados das Nações Unidas de 1951, ou somente, A Convenção dos Refugiados, um refugiado é toda pessoa que:
Devido a fundados temores de ser perseguida por motivos de raça, religião, nacionalidade, por pertencer a determinado grupo social e por suas opiniões políticas, se encontre fora do país de sua nacionalidade e não possa ou, por causa dos ditos temores, não queira recorrer à proteção de tal país; ou que, carecendo de nacionalidade e estando, em consequência de tais acontecimentos, fora do país onde tivera sua residência habitual, não possa ou, por causa dos ditos temores, não queira a ele regressar.
Embora a definição encontrada na Convenção dos Refugiados esteja sendo utilizada pelas organizações internacionais, como as Nações Unidas, o termo continua a ser mal empregado e erroneamente utilizado na linguagem comum do dia-a-dia. Os meios de comunicação, por exemplo, frequentemente confundem os refugiados com asilados. Com isso, primeiramente, devem-se conhecer alguns termos e definições para possibilitar maior compreensão sobre os conceitos e saber em que cenário se encaixa cada um. São eles: nacionais, apátridas, exilados, asilados, solicitantes de refúgio e refugiados. 
O primeiro termo abordado é empregado àqueles que possuem uma nacionalidade, ou seja, é aquele que possui um vínculo com um Estado, tendo este o poder (o Direito Interno) e a responsabilidade de decidir como essa nacionalidade é adquirida. O segundo termo é justamente o oposto, diferente deste primeiro termo, o segundo trata-se de cidadãos apátridas, que como o próprio nome já diz, são cidadãos que não possuem pátria. Essa condição pode ocorrer por diferentes motivos, entre eles o fato de quando um Estado deixa de existir e não é substituído por nenhuma outra entidade, o cidadão vem a ficar sem nacionalidade. É importante ressaltar que o direito à nacionalidade compõe a Declaração Universal dos Direitos Humanos (Artigo 15º), sendo a sua violação atentado à dignidade da pessoa humana. 
Já o exilado é o cidadão que está longe do próprio Estado devido à expatriação, voluntária ou forçada do mesmo, sem que tenha havido nenhum ato legal ou jurídico que de fato impila sua saída. Caso esse indivíduo receba proteção jurídica do país que o acolheu, ele passa de exilado para asilado, que é quarto termo abordado. Ao se analisar a questão do asilo, tem-se que ter em mente o termo refugiado, pois eles são complementares, mas não sinônimos, como certos autores tratam. Moreira (2006) define asilo como: 
Proteção concedida por um Estado, no seu território, à revelia da jurisdição do país de origem, baseada no princípio do non-refoulement que se caracteriza pelo gozo dos direitos dos refugiados reconhecidos pelo direito internacional de asilo e que, normalmente, é concedida sem limite de tempo. 
O solicitante de refúgio é um possível refugiado. Que está em busca de proteção, mas que corre o risco de não ser reconhecido como tal. Isso dependerá de um procedimento legal, que vai de acordo com as normas internas de cada Estado, que têm o poder de decidirem se o solicitante preenche todos os requisitos necessários para se tornar um refugiado legal. Enquanto o processo não ocorre, o indivíduo será tido apenas como um solicitante. 
E finalmente, são tidos como refugiados aquelas pessoas que são forçadas a fugirem de seus países, individualmente ou parte de evasão em massa, devido a questões políticas, religiosas, militares ou quaisquer outros problemas. 
De acordo com Artigo 1º da Convenção dos Refugiados, as causas das perseguições devem estar baseadas nos seguintes cinco pontos, qualquer outro não será ponderado:
· Raça: é utilizada no mais amplo sentido e inclui grupos étnicos e grupos sociais de descendência comum.
· Religião: também possui um amplo sentido, inclui a identificação com um grupo que compartilha tradições e crenças comuns, assim como práticas religiosas específicas.
· Nacionalidade: inclui a cidadania dos indivíduos. Perseguição contra grupos étnicos, linguísticos e culturais segregados do resto da população também pode ser entendida como perseguição com base na nacionalidade.
· Um Grupo Social específico se refere a um grupo de pessoas que compartilham uma mesma história, hábitos ou estatutos sociais. Essa categoria frequentemente sofre alguma perseguição com base em uma ou outra das demais categorias aqui apontadas. Também pode ser aplicada às famílias capitalistas, aos proprietários de terra, aos homossexuais, aos negociantes e aos membros das forças militares.
· Opinião política refere-se às ideias que não são toleradas pelas autoridades, incluindo opinião crítica com relação aos métodos e às políticas governamentais. Incluem-se as opiniões individuais (isto é, autoridades podem considerar que uma pessoa possui determinada opinião política particular), ainda que o indivíduo não defenda de fato nenhuma opinião. Indivíduos que não expressam suas opiniões políticas até conseguirem fugir de seus países podem ser considerados refugiados uma vez que demonstrem que serão perseguidos por suas ideias se retornarem à sua pátria.
2.2	EVOLUÇÃO DO TRATAMENTO 
Apesar de hoje já existir uma estrutura para o direito dos refugiados, sua construção foi bastante espaçada e demorada, sendo iniciada, de forma indireta, em 1919, com a criação da Liga das Nações. A Liga era uma organização internacional baseada na proposta de manter a paz e a ordem mundial, evitando assim conflitos desastrosos como o da guerra[footnoteRef:11] que devastara a Europa. [11: Primeira Guerra Mundial (também conhecida como Grande Guerra ou Guerra das Guerras até o início da Segunda Guerra Mundial) foi uma guerra global centrada na Europa, que começou em 28 de julho de 1914 e durou até 11 de novembro de 1918.] 
Dessa forma dava seus primeiros passos para a efetiva proteção dos refugiados perpetrados pela guerra. Com ela, a proteção aos refugiados começava, de forma bastante inerme, a se concretizar. Ou seja, no Direito Internacional, o refugio surgia no âmbito da Liga. Que desde os primórdios já enfrentava o problema de definir a condição jurídica dos refugiados, organizar o assentamento ou a repatriação em vários países, além de realizar atividades de socorro[footnoteRef:12]. [12: Muitos dos refugiados eram vistos como estrangeiros capazes de afetar negativamente a vida local. Todavia a Liga nunca negou responsabilidade para protegê-los de forma permanente.] 
 Com a 2ª Guerra Mundial, o problema dos refugiados tomou proporções jamais vistas, com o deslocamento de milhões de pessoas por diversas partes do mundo. No ano de 1943, é estabelecida a ANUAR (Administração das Nações Unidas para o Auxílio e Restabelecimento), organização que passou a prestar auxílio para pessoas que, por motivo da guerra, precisaram se deslocar. 
Em abril de mesmo ano, realizou-se a Conferência de Bermudas, que tinha por objetivo ampliar a proteção internacional dos refugiados. Quepassariam a ser "todas as pessoas de qualquer procedência que, como resultado de acontecimentos na Europa, tiveram que abandonar seus países de residência por terem em perigo suas vidas ou liberdade, devido a sua raça, religião ou crenças políticas".
Em novembro, os Aliados[footnoteRef:13] criaram a UNRRA[footnoteRef:14] (United Nations Relief and Rehabilitation Administration)[footnoteRef:15]. A UNRRA foi criada com o objetivo de ajudar os refugiados que fugiam das agressões cometidas pelos países do Eixo[footnoteRef:16]. Ao fim da guerra, com a destruição dos solos, recursos hídricos, e mínima produção agrícola tanto nos países europeus quanto nos orientais, essa ajuda se tornou muito difícil. [13: Os Aliados da Segunda Guerra Mundial foram os países que se opuseram as potências do Eixo na Segunda Guerra Mundial. A União Soviética, os Estados Unidos e o Império Britânico eram as principais forças.] [14: Em português, Administração de Socorro e Reabilitação das Nações Unidas.] [15: Em português ANUAR (Administração das Nações Unidas para Auxílio e Restabelecimento).] [16: Composto, principalmente, pela Alemanha, Japão e Itália.] 
A fome ameaçava milhões de pessoas, fazendo com que vários países pedissem ajuda aos Estados Unidos, cujos recursos agrícolas não tinham recebido diretamente o forte impacto da guerra. Em janeiro do ano seguinte o governo dos Estados Unidos decide criar o War Refugee Board (Comissão para os Refugiados de Guerra). Mas que perante a dimensão da tarefa, obtém resultados insignificantes. 
Ante o fracasso de não ter impedir um novo conflito mundial, a Liga das Nações acabou por ser dissolvida em 1945. E com mesmos princípios básicos da Liga, foi assinado no mesmo ano, o acordo que estabeleceu a criação das Nações Unidas, entidade máxima da discussão do Direito internacional e fórum de relações e entendimentos supranacionais.
Em 1946, a Assembleia Geral das Nações Unidas teve que estabelecer princípios, próprios da condição de refugiado, para procurar melhorar a condição dos mesmos, à medida que o problema tomava proporções de abrangência e caráter internacional cada vez maiores. Entre essas medidas, a não obrigação de regresso ao país de origem diante a objeções válidas ao retorno, e o direcionamento de um órgão internacional voltado a cuidar do futuro das pessoas deslocadas, assim como estimular o retorno a seus países assim que possível. 
Em 1947, a UNRRA sofre uma grande perda, à medida que os Estados Unidos cessam o apoio financeiro a organização. Além do fato de um ano antes a OIR (Organização Internacional para os Refugiados) ter sido criada, funcionando até 1952, quando a Assembleia Geral das Nações Unidas decidiu formar o ACNUR. Que imediatamente assumiu duas importantes funções: a de auxiliar os governos nacionais que recebessem refugiados com a integração local destes em suas novas comunidades; e a de auxiliar no repatriamento destes refugiados, desde que voluntário.
 Entre esses anos surgia também uma importante ferramenta que orientaria ainda mais os refugiados, que foi a Declaração Universal dos Direitos Humanos[footnoteRef:17], criada pela ONU em dezembro de 1948. Sendo esse o primeiro documento internacional a reconhecer a perseguição e o direito pela busca de um local seguro. De acordo com o Artigo 3º: “todo indivíduo tem direito à vida, à liberdade e à segurança de sua pessoa”. Com o complemento do Artigo 14º discorrendo que “em caso de perseguição toda pessoa tem direito a buscar asilo e a desfrutar dele, em qualquer país”. Sendo estes dois artigos apresentados como base para qualquer futura discussão referente aos direitos dos refugiados. [17: Embora não seja um documento que representa obrigatoriedade legal, serviu como base para os dois tratados sobre direitos humanos da ONU, de força legal, o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, e o Pacto Internacional sobre os Direitos Económicos, Sociais e Culturais.] 
Em 14 de dezembro de 1950, criado pela Resolução n.º 428 da Assembleia das Nações Unidas, surge o ACNUR, constituindo o órgão das Nações Unidas que tinha como missão dar apoio e proteção a refugiados de todo o mundo, possuindo um mandato para protege-los e buscar soluções duradouras para os seus problemas. Sendo esse, até então, o maior passo da ONU para vigiar os refugiados. 
Por fim, em 1951, seguindo a Resolução n.º 429 V da Assembleia Geral de 1950, foi convocada em Genebra, uma Conferência de Plenipotenciários das Nações Unidas. Que tinha como intuito registrar uma organização regulatória do status legal dos refugiados, criando assim a Convenção das Nações Unidas sobre o Estatuto dos Refugiados. Adotada em 28 de julho de 1951, entrando em vigor em 22 de abril de 1954. 
 Sem discriminar raça, religião, sexo e país de origem, a Convenção aponta um conjunto de padrões básicos para o tratamento dos refugiados. Além de usar alguns instrumentos legais internacionais já existentes na época, aumentou sua abrangência e os atrelou a novos direitos. A partir desse momento os refugiados teriam mais liberdade, podendo, por exemplo, usufruir das mesmas liberdades de um imigrante legal em um determinado país, ou em certos casos, até mesmo iguais aos dos nacionais daquela nação.
De acordo com a Convenção, nenhum refugiado poderia ser penalizado por tentar entrar ilegalmente em um país, caso esteja sofrendo alguma perseguição em seu país de origem. Portanto, os requerentes de asilo ou refúgio não podem ser presos por não estarem munidos de documentos de identidade. Dos Artigos 12º a 30º, da Convenção dos Refugiados são estabelecidos os direitos, entre eles: todos os devem ser providos de papéis de identidade e de documentos de viagem os quais permitam sair do país; devem receber o mesmo tratamento dado aos nacionais do país de acolhimento especialmente com relação ao livre exercício da religião, livre acesso aos tribunais, acesso à moradia, educação básica e aos serviços públicos de ajuda e assistência, benefícios advindos do seguro social, entre outros, o direito à livre associação sindical, e a participação em outras organizações e o direito ao trabalho remunerado;
 A Convenção também estabeleceu cláusulas consideradas essenciais, como a de incluir a definição do termo “refugiado” e o chamado princípio de non-refoulement (“não devolução”)[footnoteRef:18]. Assim como foi reconhecida a necessidade da cooperação internacional entre os países, direta ou indiretamente afetados. [18: O princípio de non-refoulement, Artigo 33º da Convenção de 1951, diz que “Nenhum dos Estados Contratantes expulsará ou repelirá um refugiado, seja de que maneira for, para as fronteiras dos territórios onde a sua vida e a sua liberdade sejam ameaçadas em virtude da sua raça, religião, nacionalidade, filiação em certo grupo social ou opiniões políticas”. Ainda que o Estado receptor tenha o direito de não abrigar o refugiado, o mesmo tem a obrigação de zelar pela vida e segurança dele. É seu dever procurar outro país que o abrigue, caso contrário, a única opção é receber o refugiado e garantir o seu bem-estar. ] 
Contudo a Convenção de 1951 estava limitada no tempo, pois somente se aplicava aos refugiados que passaram a ter tal condição como resultado dos acontecimentos ocorridos antes de 1º de janeiro de 1951. Talvez por imaginarem que o problema dos refugiados acabaria depois dos eventos surgidos na 2ª Guerra Mundial. Apesar disso não foi possível uma solução em curto prazo desses problemas e, além do mais, ocorriam novos conflitos que geravam ainda mais refugiados. Consequentemente novos refugiados ficavam desemparado pela Convenção de 1951. 
Com o tempo e a emergência de novas situações geradoras de conflitos e perseguições, tornou-se crescente a necessidade de providências que colocassem os novos fluxos de refugiados sob a proteção da Convenção. Surgindo assim em 1967 o Protocolo Relativo ao Estatuto dos Refugiados. Que retirou tais limitações geográficas[footnoteRef:19] e temporais escritas no texto original da Convenção. Também nessa mesma década surgeo Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos, no qual diz que os Estados devem assegurar os direitos civis e políticos dos indivíduos dentro de seus territórios e sujeitos à sua jurisdição. Garantindo ainda mais a livre circulação. [19: Reserva geográfica e temporal foram conceitos definidos aos acontecimentos ocorridos na Europa e anteriores a janeiro de 1951, omitindo-os no Protocolo de 1967.] 
Até em 1969 surge à primeira organização continental, sendo a África a primeira a fazer a sua própria. A OUA (Organização de Unidade Africana) estabeleceu instrumentos de proteção aos refugiados locais. Em virtude dos refugiados oriundos dos conflitos que assolavam as populações de regiões e provocava a fuga de milhares de pessoas para outros países, principalmente para seus países vizinhos. A Convenção de 51 era o principal instrumento universal relativo aos refugiados, entretanto a OUA estabeleceu uma “definição ampliada” de refugiado.
Que se aplicava a qualquer pessoa que, devido a uma agressão, ocupação externa, dominação estrangeira ou a acontecimentos que perturbem gravemente a ordem pública numa parte ou na totalidade do seu país de origem ou do país de que tem a nacionalidade, seja obrigada a deixar o lugar de residência habitual para procurar refúgio noutro lugar fora de seu país de origem ou de nacionalidade. (MOREIRA, 2006)
 
Ao fazer uma análise do contexto histórico do continente africano, nota-se que a Convenção da OUA surgiu no âmbito dos diversos problemas que ocorriam no pós-colonialismo do mesmo. Época em que surgiam novos Estados, e uma cooperação se mostrava cada vez mais difícil. A maioria dos problemas se dava por conta da “colcha de retalhos” em que a África estava se transformando. Um mosaico de fronteiras arbitrárias e ilógicas, que não tinham relação com as fronteiras naturais, geográficas e principalmente étnicas e/ou culturais, sendo esse o maior legado deixado pelos os países imperialistas.
A sobreposição criou uma diferença de perspectiva entre os países africanos. A OUA teve êxito na mediação da disputa entre Argélia e Marrocos (1964-65), e nos litígios de fronteiras entre Etiópia e Somália (que tornaram a eclodir em 1977) e entre Quênia e Somália (1965-67), fracassando, porém, em sustar a guerra civil na Nigéria (1968-70). É importante ressaltar que todos os países africanos independentes pertencem à União Africana. Outro fato importante é que além dos motivos já enumerados ao longo do trabalho, a União Africana reconhece que grupos paraestatais também são causadores de perseguição.
Já nas Américas essa formulação de uma organização exclusiva, demorou mais um pouco. Na América Latina, os conflitos nas décadas de 1970 e 1980 deram origem a mais de dois milhões de refugiados e impulsionaram a elaboração de outro instrumento regional de proteção aos refugiados (MOREIRA, 2005). Assim, em 1984 foi elaborada a Declaração de Cartagena. A definição de refugiado fundamentou-se naquela da OUA, agregando a ela a ameaça de violência generalizada, a agressão interna e a violação massiva dos direitos humanos. A diferença está no fato de que o refugiado deve demonstrar relação direta entre ele e o real risco de danos, exigência essa é similar à da Convenção dos Refugiados das Nações Unidas. Tornando a Declaração de Cartagena à base política para os refugiados na região e que tem sido incorporada na legislação nacional de inúmeros Estados.
   Com o passar dos anos, foram surgindo mais protocolos e convenções que ajudavam a proteger ainda mais os refugiados. Em 1977 surge o Protocolo Adicional às Convenções de Genebra de 12 de agosto de 1949, relativa à Proteção das Vitimas de Conflitos Armados Internacionais, que diz que as pessoas que, antes do início das hostilidades, foram consideradas como apátridas ou refugiadas serão pessoas protegidas, em todas as circunstâncias. A Convenção contra a Tortura e outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanas ou Degradantes, em 1984, que oferece importante proteção aos refugiados no sentido de terem o direito de não serem devolvidos aos países nos quais temem a perseguição. A Convenção sobre os Direitos da Criança, em 1989, que assegura que a criança que solicita o estatuto de refugiado ou que é considerada como refugiada deve receber a devida proteção e assistência humanitária no gozo de seus direitos. A Carta Africana sobre os Direitos e Bem-Estar da Criança, em 1990, que estabelece provisões especiais para as crianças refugiadas e desacompanhadas de seus pais ou tutores. A Declaração sobre a Eliminação da Violência contra as Mulheres, em 1993, que reconhece a particular vulnerabilidade das mulheres refugiadas. E por último, a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência Contra a Mulher, em 1994, que leva em consideração a vulnerabilidade das mulheres e das meninas frente à violência devido a razões, entre outras, de raça ou antepassado étnico ou de condição como: imigrantes, refugiadas ou deslocadas internas. 
Além de todos os tratados citados, podemos dar destaque também para a criação e auxilio de agencias-chave de assistência, como é o caso do CIVC (Comitê Internacional da Cruz Vermelha). Que é uma organização humanitária independente que atua como uma entidade neutra na assistência e proteção às vítimas de guerra, propiciando desde os cuidados médicos até a troca de correspondência entre os familiares das vítimas. A CICV não tem a missão geral de promover a proteção e assistência aos refugiados. Entretanto, com o passar dos anos, vem providenciando a assistência limitada a certos grupos. Essas operações são feitas a partir de solicitação do Secretariado Geral da ONU ou pela Assembleia Geral a pedido do próprio país envolvido.
Atualmente a Convenção de 51 continua sendo o principal instrumento de proteção a refugiados. Sofreu adaptações e resistiu a seis décadas de grandes mudanças, e hoje enfrenta desafios sem precedentes. Em 2007, o número total era de Estados signatários da Convenção é de 144 – o mesmo número de signatários do Protocolo de 1967. O número de Estados signatários de ambos os documentos é de 141. O número de Estados signatários de um ou outro documento é de 147. Aceitando cooperar com o ACNUR no desenvolvimento de suas funções e, em particular, a facilitar a função específica de supervisionar a aplicação das provisões desses instrumentos. 
Além disso, três sistemas internacionais estão estabelecidos como defensores dos direitos humanos, podendo ser acessados quando não existe mais defesa nas instâncias internas (todas as possibilidades foram tentadas e esgotadas): a União Africana (UA); a Organização dos Estados Americanos (OEA) e o Conselho da Europa (CE). Contudo os direitos humanos precisam ser protegidos globalmente, independentes de distinções culturais e de localidade. Apesar das diversidades enfrentadas em cada Estado, a defesa dos direitos humanos deve transpassar estas barreiras continentais.
2.3	O CONCEITO E A APLICAÇÃO DO INSTITUTO: AS CLÁUSULAS DE INCLUSÃO, CESSAÇÃO, PERDA E NÃO INCLUSÃO 
A Convenção de 1951 apresenta três tipos diferentes de cláusulas: 
· Cláusulas de inclusão: definem os critérios que uma pessoa deverá preencher para ser considerada refugiada; 
· Cláusulas de cessação: condições em que um refugiado perde essa qualidade, e; 
· Cláusula de exclusão: uma pessoa, mesmo satisfazendo os critérios da cláusula de inclusão, é excluída da aplicação da Convenção de 1951. 
Para que uma pessoa possa ser considerada refugiada é preciso mais que um “temor de perseguição”. Para que a solicitação seja aceita é preciso que as situações materiais sejam evidenciadas, ou seja, tem que comprovar a veracidade do real perigo de perseguição sofrida em seu país de origem. Para isso, será feita uma avaliação caso a caso, através de uma análise de personalidade do solicitante levando em conta o histórico familiar e a situação do país de origem. Além dos motivos citados na Convenção de 51, outros tipos de ameaça podem ser levados em consideração para a concessão de refúgios, como porexemplo, medidas discriminatórias que levam ao sujeito a uma incerteza de sua existência futura no seu próprio país. 
Já a cessação explica as situações em que uma pessoa perde o status de refugiada, baseando-se no princípio da proteção internacional. No caso do Brasil, legislações internas, traçaram as principais características do refúgio, prevendo, além do seu conceito, os requisitos para sua concessão, de perda e cessação[footnoteRef:20] da condição de refugiado, assim como o procedimento a ser seguido para a sua concessão. O Artigo 38º da Lei 9.47497 enumera as cláusulas de cessação, ou seja, os motivos pelos quais o status não é mais necessário: [20: A decisão acerca da perda ou cessação da condição de refugiado é proferida, em primeira instância, pelo Comitê Nacional para Refugiados (CONARE).] 
· Voltar a valer-se da proteção do país de que é nacional;
· Recuperar voluntariamente a nacionalidade outrora perdida;
· Adquirir nova nacionalidade e gozar da proteção do país cuja nacionalidade adquiriu;
· Estabelecer-se novamente, de maneira voluntária, no país que abandonou ou fora do qual permaneceu por medo de ser perseguido;
· Não puder mais continuar a recusar a proteção do país de que é nacional por terem deixado de existir as circunstâncias em consequência das quais foi reconhecido como refugiado;
· Sendo apátrida, estiver em condições de voltar ao país no qual tinha sua residência habitual, uma vez que tenham deixado de existir as circunstâncias em consequência das quais foi reconhecido como refugiado.
A cláusula de perda ocorre quando o sujeito não tem o direito ao status, sendo verificada em dois momentos: durante o processo de determinação do estatuto do refugiado; ou após a validação do mesmo, caso as cláusulas de exclusão somente sejam verificadas depois de a pessoa ter sido reconhecida, nesse caso a cláusula exigirá a anulação da decisão inicial. Normalmente a competência para decidir sobre a aplicação das cláusulas de exclusão fica a cargo do Estado no qual o interessado procura o reconhecimento do seu estatuto de refugiado. No Brasil tal ponto fica a cargo do Artigo 39º, que diz que implicará perda da condição de refugiado:
· A renúncia;
· A prova de falsidade dos fundamentos invocados para o reconhecimento da condição de refugiado ou a existência de fatos que, se forem conhecidos quando do reconhecimento, teriam ensejado uma decisão negativa;
· O exercício de atividades contrárias à segurança nacional ou à ordem pública;
· A saída do território nacional sem prévia autorização do Governo brasileiro.
E assim como qualquer outro país, o Brasil também tem o direito de não conceder refúgio. O Artigo 3º da Lei 9.474 enumera as situações nas quais não será concedido o benefício da condição de refugiado. Essas situações estão em conformidade com o Artigo 1º da Convenção de 1951. Não se beneficiarão da condição de refugiado os indivíduos que:
· Já desfrutem de proteção ou assistência por parte de organismo ou instituição das Nações Unidas que não o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados - ACNUR;
· Sejam residentes no território nacional e tenham direitos e obrigações relacionados com a condição de nacional brasileiro;
· Tenham cometido crime contra a paz, crime de guerra, crime contra a humanidade, crime hediondo, participado de atos terroristas ou tráfico de drogas; 
· Sejam considerados culpados de atos contrários aos fins e princípios das Nações Unidas. 
O que geralmente ocorre é que os organismos de assistência e os mecanismos de proteção aos refugiados propõem três “soluções permanentes” a favor dos refugiados: 
· A repatriação voluntária: os refugiados podem, posteriormente, retornar aos seus países de origem uma vez que suas vidas e liberdade não sofram mais nenhuma ameaça;
· A integração local: os países de asilo permitem que os refugiados se integrem ao país, sendo este seu primeiro asilo, e;
· A reinstalação num terceiro país: quando a repatriação é perigosa e o primeiro país se negar em dar a integração local.
Dessa maneira os organismos focam em cessar ou diminuir as dores pelas quais um refugiado passa durante seu processo de refúgio. Em ambas as opções terá assistência, independente da opção que for escolhida pelo mesmo, desde que esta não ofereça nenhum risco de vida. 
 
3. O BRASIL E OS REFUGIADOS
3.1	O DESENVOLVIMENTO HISTÓRICO
Diante dos diversos movimentos, sejam políticos ou sociais, o Brasil passou a acompanhar a visão internacional de proteção aos refugiados[footnoteRef:21], inserindo-se, assim, nas atividades da ONU. Sempre teve um papel pioneiro e de liderança na proteção internacional dos refugiados, sendo o primeiro país do Mercosul[footnoteRef:22] a ratificar a Convenção de 1951, no ano de 1960, e um dos primeiros países integrantes do Comitê Executivo[footnoteRef:23] do ACNUR, responsável pela aprovação dos programas e orçamentos anuais da agência. [21: Na América do Sul, o Brasil foi o primeiro país a se comprometer com as normativas de proteção aos refugiados.] [22: É a união aduaneira composta de cinco países da América do Sul. Composto por Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai. ] [23: O Comitê Executivo do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ExCom, na sigla em inglês) é um órgão subsidiário da Assembleia Geral das Nações Unidas que entrou em funcionamento em 1º de janeiro de 1959.] 
O seu envolvimento se iniciou algum tempo depois que o tema foi agendado em âmbito internacional, somente com o decorrer da Guerra Fria, quando o país começa a alinhar suas ações de acordo com o Bloco Ocidental, mostrando suas preferências, ao aceitar o recebimento de refugiados em seu território. Dessa maneira, além de sinalizar suas intenções à ONU, conseguiria também atrair mão de obra qualificada (ANDRADE, 2005). 
No início de possíveis negociações para o recebimento de refugiados no Brasil, o país se mostrou apático às reais necessidades dos mesmos, colocando-se preocupado em manter a ascendência europeia como formadora da população local. Além desta restrição, identificada em 1946, colocava-se também a necessidade de proteção dos trabalhadores brasileiros frente aos possíveis imigrantes; e o recebimento de tão somente mão de obra qualificada. Em 1948, já com uma postura diferente, o Brasil foi um dos primeiros países a aceitar a possibilidade de reassentamento conjunto de país de família e seus familiares, numa tentativa de humanizar e desmercantilizar o acolhimento de refugiados (ANDRADE, 2005).
Durante o período de existência da OIR (46/47 – 52), o Brasil recebeu 29.000 refugiados, do mais de um milhão que constavam no cadastro da organização. Apesar da boa vontade do país em receber os refugiados que pudessem contribuir com o desenvolvimento do país, Andrade (2005) considera que o país pouco agiu em relação aos mesmos, resultado da burocracia lenta, da falta de parâmetros claros e de uma mentalidade racista e resistente dos governantes.
Após esta primeira fase de aproximação do país à questão dos refugiados, em 1960 o Brasil foi o primeiro país do Mercosul a assinar a Convenção de Genebra de 1951, relativa à proteção dos mesmos. O país manteve a reserva geográfica até 1989, sendo a adesão total à Convenção somente em 1990, movimento que se seguiu da regulamentação da condição de refugiado em 1991. 
É importante ressaltar que, apesar dos avanços após este período, o Brasil não reconheceu e acolheu os refugiados latino-americanos nas décadas de 1970 e 1980, devido à reserva geográfica imposta no momento da assinatura da Convenção. Entretanto impulsionou à elaboração da Declaração de Cartagena, em 1984, a fim de encontrar melhores estratégias de trabalho específicas para a região. Tornando-se a base política para os refugiados na região e tem se incorporado na legislação nacional de inúmeros Estados.
Em 1997, a Lei 9474/97 cria o CONARE (Comitê Nacional para os Refugiados), que é o órgão colegiado, interministerial e vinculado sob o âmbito ao Ministério da Justiça. Que reúne segmentos representativos da área governamental,da Sociedade Civil e das Nações Unidas, encarregado de tomar decisões em matéria de refúgio. É o CONARE que reconhece a condição de refugiado no país, além de ter por finalidade:
· Analisar o pedido sobre o reconhecimento da condição de refugiado, procurando saber se o solicitante reúne as condições necessárias;
· Deliberar quanto à cessação “ex officio” ou mediante requerimento das autoridades competentes, da condição de refugiado;
· Declarar a perda da condição de refugiado;
· Aprovar os programas e orçamentos anuais do ACNUR, quando direcionados ao Brasil.
· Promover e coordenar as políticas e ações necessárias para uma eficiente proteção e assistência aos refugiados, além do apoio legal.
· Orientar e coordenar as ações necessárias à eficácia da proteção, assistência, integração local e apoio jurídico aos refugiados, com a participação dos Ministérios e instituições que compõem o CONARE, e;
· Aprovar instruções normativas que possibilitem a execução da Lei nº 9.474/97.
E composto por representantes dos seguintes órgãos:
· Ministério da Justiça, que o preside;
· Ministério das Relações Exteriores, que exerce a Vice-Presidência;
· Ministério do Trabalho e do Emprego;
· Ministério da Saúde;
· Ministério da Educação;
· Departamento da Polícia Federal;
· Organização não governamental, que se dedica a atividade de assistência e de proteção aos refugiados no País – Cáritas Arquidiocesana de São Paulo e Rio de Janeiro, e; 
· Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados – ACNUR, com direito a voz, sem voto.
Com a Lei nº 9474/97, de acordo com Aydos, Beninger e Dominguez (2008), o Brasil manteve-se na vanguarda de auxílio aos refugiados, inclusive adicionando à definição de refugiados a aqueles que, em consequência de uma grave violação de seus direitos humanos, são obrigados a deixar seu país de origem. Apesar de não ser uma lei tão recente, é pouco conhecida. Muitas vezes prejudicando sua efetiva proteção. 
Operando junto ao CONARE, o trabalho do ACNUR[footnoteRef:24], assim como em todos os outros países em que atua, tem por objetivo proteger os refugiados e promover soluções duradouras para seus problemas. Com um escritório-sede em Brasília e duas unidades em São Paulo, o Brasil passou a ser considerado modelo de proteção aos refugiados na América do Sul. Para que essa assistência humanitária e a integração dos refugiados sejam feitas de forma mais fácil, o ACNUR atua também em parceria com diversas ONGs (Organizações não Governamentais) em todo o país. São elas: a ASAV (Associação Antônio Vieira), a Cáritas Arquidiocesana de Manaus, a Cáritas Arquidiocesana do Rio de Janeiro, a Cáritas Arquidiocesana de São Paulo, o CDDH (Centro de Defesa dos Direitos Humanos) e o IMDH (Instituto Migrações e Direitos Humanos). Além de diversas outras parcerias, como por exemplo, a SEPPIR (Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial), a Secretaria Especial de Políticas para Mulheres e com os Ministérios da Saúde, Educação, Trabalho e Desenvolvimento Social. [24: Em termos de apoio financeiro às contribuições para as operações humanitárias do ACNUR ao redor do mundo, o Brasil se consolidou como o principal doador do ACNUR entre os países emergentes, com US$ 3,5 milhões doados em 2010, US$ 3,7 milhões em 2011, US$ 3,6 milhões em 2012 e US$ 1 milhão em 2013.] 
Celebrando o 60º aniversário do ACNUR, em 2010, o país sediou um encontro onde 18 países da América Latina se comprometeram a aperfeiçoar a proteção das vítimas de deslocamentos forçados e de apátridas na região. O compromisso foi estabelecido na Declaração de Brasília para Proteção de Refugiados e Apátridas nas Américas.
Para melhorar ainda mais o tratamento dado aos refugiados, em fevereiro de 2012, o ACNUR e a DPU[footnoteRef:25] (Defensoria Pública da União) assinaram[footnoteRef:26] um memorando estabelecendo atividades de cooperação técnica entre as duas instituições, com o intuito de melhorar o conhecimento dos defensores públicos sobre o Direito Internacional dos Refugiados e Apátridas, além de facilitar a participação dos mesmos nos Comitês Estaduais de Refugiados. De acordo com o Representante do ACNUR no Brasil, Andrés Ramirez, “a parceria com a Defensoria Pública representa um passo significativo que terá um impacto real na vida dos refugiados, apoiando a proteção e integração daqueles que vivem no Brasil”. [25: A DPU tem o objetivo de facilitar a defesa dos interesses de pessoas carentes, atuando nas áreas de saúde, educação, moradia, benefícios previdenciários, consumo e assistência internacional.] [26: O memorando foi assinado pelo representante do ACNUR no Brasil, Andrés Ramirez, e pelo subdefensor Público-Geral Federal, Afonso Carlos Roberto do Prado.] 
Também em 2012, o Brasil liderou no âmbito do MERCOSUL a adoção da Declaração de Princípios Internacionais de Proteção dos Refugiados. Reafirmando o compromisso do non-refoulement e a importância da reunificação familiar, além de enfatizar a importância de se evitar políticas migratórias restritivas e a necessidade de estabelecer mecanismos de cooperação e de proteção humanitária.
Em 2013, o Brasil foi o 75º [footnoteRef:27] país com o maior número de refugiados do mundo, segundo dados do ACNUR. Atualmente possui 7.289 refugiados reconhecidos, de 81 nacionalidades distintas – incluindo refugiados reassentados. A maioria desta população (65%) vem da África, seguida pela região das Américas (21%) e da Ásia (9%). Dentre os países de maior representatividade, estão Angola, Colômbia e República do Congo. [27: Disponível em <http://g1.globo.com/brasil/noticia/2014/01/brasil-e-o-75-pais-com-mais-refugiados-do-mundo-aponta-onu.html>, acessado em 24 de setembro de 2014. ] 
 Fonte: ACNUR[footnoteRef:28] [28: Disponível em <http://refugiados-brasil.blogspot.com.br/>, acessado em 12 de julho.] 
Tanto o número de reconhecidos (status de refugiado), como número de pedidos[footnoteRef:29] de refúgio tem crescido de forma acelerada, alcançando um aumento aproximado de 1.240% entre 2010 e 2014 (de 150 para 2032 refugiados), e de 930% entre 2010 e 2013 (de 566 para 5.882 pedidos), respectivamente[footnoteRef:30]. Para o secretário nacional de Justiça, Paulo Abrão, o aumento é decorrente exclusivamente das condições internacionais. "Isso acontece devido ao agravamento da crise no Oriente Médio e dos conflitos nos países africanos e também no nosso continente" [footnoteRef:31]. E a melhora no desempenho e produtividade do CONARE tem alavancado ainda mais esses números. [29: Estes dados não incluem informações relacionadas aos haitianos que chegam ao Brasil desde o terremoto de 2010. Apesar de solicitarem o reconhecimento da condição de refugiado ao entrarem no território nacional, seus pedidos são encaminhados ao Conselho Nacional de Imigração (CNIg). Para eles, há um visto especial humanitário, que permite que os habitantes do país permaneçam no Brasil. De acordo com a Polícia Federal, mais de 39.000 haitianos entraram no Brasil desde 2010 até setembro de 2014.] [30: Disponível em <http://www.acnur.org>, acessado em 13 de outubro de 2014. ] [31: ] 
 
 Fonte: ACNUR[footnoteRef:32] [32: Disponível em < http://www.acnur.org/>, acessado em 25 de julho de 2014. ] 
Apesar de uma legislação avançada para tratar da questão dos refugiados, recebemos poucos por não sermos vizinhos a nações com grandes conflitos. Muitos refugiados preferem ficar na vizinhança, pois isso facilita um possível retorno a seu país. Mesmo os colombianos, preferem ir para o Equador, porque a fronteira com o Brasil é difícil de atravessar por causa da Amazônia. Sendo assim o número de estrangeiros reconhecidos ainda é pequeno se comparado ao de outros países. 
Nos dias 2 e 3 de dezembro de 2014, em reconhecimentoà sua importância regional, o Brasil sediou o evento Cartagena +30, em comemoração aos 30 anos da Declaração de Cartagena. Para analisar os novos desafios na região, mostrando que o governo brasileiro está se esforçando em defender a execução dos direitos humanos, sociais e econômicos através da cooperação e do diálogo entre diferentes países e instituições.
3.2	O PROCEDIMENTO PARA SOLICITAÇÃO E CONCESSÃO DE REFUGIO NO BRASIL: 
A competência para decidir sobre o pedido de refúgio no território brasileiro é exclusiva do governo brasileiro. Qualquer estrangeiro pode pedir refúgio e ao entrar com esse pedido, ele tem direito, automaticamente, a uma carteira de trabalho e a um CPF, até que o caso seja julgado. Mas, de acordo com a lei brasileira, esse estrangeiro só pode receber refúgio se comprovar que sofreu algum tipo de perseguição - política, religiosa ou étnica, por exemplo - no seu país de origem. O pedido é gratuito, tem caráter urgente e confidencial. Tem início de maneira informal, através de uma solicitação do reconhecimento da condição de refugiado, que posteriormente será transformada em um procedimento formal.
O procedimento para o pedido de refúgio no Brasil divide-se em quatro fases: a primeira fase consiste na solicitação do refúgio através da Polícia Federal nas fronteiras[footnoteRef:33]; na segunda fase ocorre a análise do pedido realizada pelas Cáritas Arquidiocesanas; a terceira fase é a decisão proferida pelo Comitê Nacional para Refugiados e dessa decisão, caso seja negado o reconhecimento da condição de refugiado, abre-se uma quarta fase que é o recurso cabível da decisão negativa do CONARE para o Ministro da Justiça que decidirá em último grau de recurso. Enquanto pendente, o processo[footnoteRef:34] relativo à solicitação de refúgio, será aplicada ao solicitante a legislação sobre estrangeiros - Estatuto do Estrangeiro Lei 6.815/80. [33: A Cáritas, quando procurada pelos solicitantes no primeiro contato, fará o atendimento inicial e encaminhará o solicitante à Polícia Federal. ] [34: Durante o processo, o refugiado estará protegido conforme o princípio de direito internacional do non-refoulement. Impedindo que seja efetuada a deportação do solicitante para fronteira de território em que sua vida ou integridade física esteja ameaçada, ainda que o solicitante tenha ingressado no território nacional de forma irregular. Suspendendo assim os procedimentos criminais e administrativos decorrentes da entrada ilegal, até a conclusão do pedido de refúgio.] 
Seguindo o Artigo 9º da Lei 9.474/97, a Polícia Federal preparará um Termo de Declaração, para dar início ao pedido de refúgio. No Termo de Declaração estarão as razões pelas quais se está solicitando refúgio e as circunstâncias da entrada do solicitante no Brasil, bem como os dados pessoais e servirá como documento para o solicitante até que seja expedido um Protocolo Provisório. A seguir, o solicitante deverá ser encaminhado à Cáritas, local onde terá início à análise do pedido de refúgio.
Essa fase tem início como o preenchimento de um questionário mais aprofundado, que será enviado ao CONARE, no qual constará os dados pessoais do solicitante, a motivação para a solicitação de refúgio e será ainda marcada uma entrevista com um advogado vinculado à instituição. Após o questionário, será elaborado um Parecer de Elegibilidade que estabelecerá a posição em relação à solicitação de refúgio. Com o Parecer de Elegibilidade em mãos, O CONARE trabalha para que seja expedido o Protocolo Provisório, que servirá como documento de identidade do solicitante de refúgio no Brasil até o término do procedimento de solicitação.
No CONARE o solicitante de refúgio submete-se a uma segunda, relatada, por meio do representante de um representante, a um grupo de estudos prévios (formado por representantes do CONARE, do ACNUR e da sociedade civil), buscando-se verificar a legitimidade da solicitação. O grupo elaborará um parecer que recomendará ou não a aceitação da solicitação do refúgio; o ACNUR e a sociedade civil tomam como base para o seu posicionamento o parecer elaborado pelos advogados que atuam no convênio Cáritas/ACNUR/OAB. O parecer é encaminhando ao plenário do CONARE para ser discutido e apreciado o seu mérito, podendo acolher ou negar a condição de refugiado ao solicitante.
A decisão de reconhecimento da condição de refugiado é ato declaratório, apenas declara o direito à proteção da qual o solicitante já era titular, posto que já era refugiado antes mesmo da decisão, e deverá ser fundamentada. Tal decisão de reconhecimento autoriza o refugiado a gozar da proteção do governo brasileiro e a viver em território nacional legalmente.
 	Após ser proferida a decisão pelo CONARE, este órgão notificará o solicitante e o Departamento da Polícia Federal, para que tomem as medidas administrativas cabíveis. A Polícia Federal deverá comunicar a decisão para que se proceda o arquivamento de qualquer processo criminal ou administrativo pela entrada irregular no país. 
O solicitante, agora considerado refugiado reconhecido pelo governo brasileiro, deverá ser comunicado para que se registre junto à Polícia Federal, assine o Termo de Responsabilidade, o qual tem como conteúdo os direitos e deveres dos refugiados, e possa, então, solicitar cédula de identidade permanente, o seu Registro Nacional de Estrangeiro.
Caso a resposta seja negativa, seja por não convencimento do órgão da existência de uma das cláusulas de inclusão previstas no Artigo 1º da Lei 9.474/97 ou pela caracterização de umas das cláusulas de exclusão (Artigo 3º da Lei 9.474/97), o refugiado poderá entrar com um recurso. No prazo de 15 dias ao Ministro do Estado da Justiça, a quem caberá decidir, em última instância, sobre o pedido de refúgio; o prazo para o recurso começa a ser contado da data do recebimento da notificação.
O recurso cabível da decisão negativa do CONARE não é revestido de formalidades, podendo ser elaborado pelo próprio solicitante. As exigências para o recurso são apenas duas: dever ser dirigido ao Ministro da Justiça e dentro do prazo de 15 dias a contar da data do recebimento da notificação.
O Ministro da Justiça tem competência para julgar, em última instância, o pedido de refúgio, portanto, da decisão do Ministro não caberá mais recurso. A decisão do Ministro deverá ser notificada ao CONARE para que seja dada ciência ao solicitante e ao Departamento da Polícia Federal, para as providências cabíveis.
Durante a avaliação do recurso, será permitido ao solicitante de refúgio e aos seus familiares permanecerem no território nacional gozando das prerrogativas do “Protocolo Provisório”.
Quando a decisão do Ministro for pela recusa definitiva de refúgio, mantendo a decisão do CONARE, ficará o solicitante sujeito à legislação de estrangeiros, não devendo ocorrer sua transferência para o seu país de nacionalidade ou de residência habitual, enquanto permanecerem as circunstâncias que põem em risco sua vida, integridade física e liberdade, salvo as situações determinadas nos incisos III e IV do Artigo 3º da Lei 9.474/97.
Neste caso de recusa definitiva e tendo o solicitante ingressado de maneira irregular no país, em função do instituto de direito internacional da deportação, o solicitante será notificado a deixar o país. Caso o recurso seja provido, haverá o reconhecimento do solicitante como refugiado e este deverá registrar-se perante a Polícia Federal, conforme procedimento já descrito anteriormente.
Ademais, das decisões do CONARE em primeira instância sobre cessação ou perda da condição de refugiado, também caberá recurso ao Ministro da Justiça, no prazo de 15 dias, contados do recebimento da notificação. A decisão do Ministro, também nestas situações, será irrecorrível.
3.3	AUXILIOS E DIFICULDADES ENFRENTADAS
Queremos chegar para trabalhar, estudar. Não somos traficantes. Imagina uma pessoa que foi obrigada a deixar a sua pátria, toda a vida que tinha lá. Fui preso e torturado por um crime que não cometi. Recomeçar do zero é muito difícil. Fugindo de um problema,chega aqui e enfrentamos outros. (Yana, refugiada angolana há 13 anos no Brasil). 
Apesar de o Brasil representar uma esperança para os refugiados, aqui também encontram dificuldades para se integrar à sociedade brasileira. A busca pela liberdade e dignidade e a obtenção da proteção humanitária, muitas vezes esbarram em diversos problemas. A assistência oferecida aos refugiados no Brasil não ultrapassa o que é oferecido para a população residente no país. Principalmente problemas como: dificuldade em conseguir emprego, acesso à educação superior e aos serviços públicos de saúde e moradia, e o preconceito que sofrem por serem de outra cultura. 
Para que os direitos humanos do refugiado sejam de fato respeitados não é preciso que sejam só recebidos, mas também que estejam inseridos na comunidade. Afinal, o direito não pode estar associado a um local ou tempo, mas à condição humana e, supostamente, as desigualdades enfrentadas (BANDEIRA DE MELLO, 2006). Essa preocupação já existia na ocasião da Conferência Especializada Interamericana sobre Direitos Humanos, em 1969 e nela foi firmado o Pacto de San José, assinado pelos delegados dos Estados membros da OEA onde consta no preâmbulo:
[...] os direitos essenciais da pessoa humana não derivam do fato de ser ela nacional de determinado Estado, mas sim do fato de ter como fundamento os atributos da pessoa humana, razão por que justificam uma proteção internacional, de natureza convencional, coadjuvante ou complementar da que oferece o direito interno dos Estados americanos. (OEA, 1969)
Embora o Brasil se mantenha na liderança na América Latina no trato dos refugiados, tanto na questão legal quanto por suas práticas, muitos reclamam e fazem protestos em relação à falta de assistência recebida da sociedade civil nas comunidades receptoras e da ausência de diálogo com as instituições, em especial com o ACNUR. Um dos elementos centrais do protesto dos refugiados é a tensão estabelecida entre a busca por liberdade e dignidade e a obtenção da proteção humanitária. 
Marcelo Mauss (1967) diz que a concessão do ‘presente-refúgio’[footnoteRef:35] reproduz um sistema de hierarquias que coloca os refugiados em uma posição de subordinação e dependência. Ocorrendo um trade-off entre a liberdade e a segurança. [35: Expressão criada pro Carolina Moulin ao explicar quer o refúgio é um favor, e dessa maneira o país que concede não deve assumir ônus que não são obrigatoriamente de sua responsabilidade. ] 
A forma que tomam usualmente é a de que o presente é generosamente dado, mas o comportamento que o acompanha é o da pretensão formal e da decepção enquanto a própria transação é baseada em obrigação e auto interesse. 
Acompanhando essa lógica, Van Wees (1998) diz que:
 
Aquele que se beneficia da generosidade do outro no intercambio reciproco está sob uma obrigação até que retorne o pagamento, e isso pode envolver certo grau de subserviência ao doador generoso. Frequentemente, a generosidade não precisa ser retribuída em bens materiais, mas sim por meio de uma subordinação no longo prazo aos seus benfeitos. 
 Esse sistema de trocas obedece a uma lógica similar à do princípio da reciprocidade, mas que pode ser interpretada de forma mais específica como uma instância da lógica de gratidão. A segurança individual é concedida aos refugiados em todo o território nacional, porém com certas limitações às liberdades individuais impostas aos refugiados. O direito de manifestação e participação política e, ainda, os direitos de mobilidade tanto interna quanto internacional são exemplos dessas limitações. Desprovido de cidadania, aos refugiados são negados não só os direitos políticos, mas algo mais fundamental – a capacidade de falar politicamente e a expectativa de que serão ouvidos (NYERS, 2006). Entretanto isso é algo que só irá melhorar através do diálogo, e regras claras e transparentes, para que os refugiados possam controlar suas vidas e tomar seus rumos. 
Vale ressaltar que os refugiados enfrentam problemas não só aqui no Brasil, como no mundo inteiro, em menor ou maior intensidade. E que apesar dos muitos problemas enfrentados, diferente de muitos outros países, os refugiados que se encontram aqui não são vistos como ameaça quando o assunto é terrorismo ou guerra. Em muitos lugares, a “Guerra ao Terrorismo” e a “Doutrina da Guerra Preventiva”, é associada também aos refugiados. Passa-se a realizar migração seletiva, baseada nas características das pessoas que buscam refúgio e o que estas podem trazer de positivo para o país (TEIXEIRA, 2009). O refugiado deixa de ser vítima e passa a ser ameaça. 
 O recebimento de refugiados, então, impõe um desafio a mais para os países que os acolhem: a necessidade de mediar às diferenças culturais entre as duas populações, de modo que os direitos humanos (neste momento, podendo ser reconhecido o direito de manter a própria cultura e seus costumes) de todos sejam respeitados. Deve-se levar em conta que, além de estarem em situação diferenciada do restante da população, os refugiados também resguardam suas próprias concepções culturais sobre o respeito aos direitos humanos.
Ao serem recebidos, é natural que exista uma busca em se igualar aos nativos, a fim de serem mais bem aceitos. Contudo, é preciso dar valor para a cultura que os mesmos carregam, a fim de que não se perca, principalmente depois que os brasileiros passam a fazer parte da vida cotidiana dos refugiados. O Artigo 22º da DUDH discorre que:
Todo o homem, como membro da sociedade, tem direito à segurança social e à realização, pelo esforço nacional, pela cooperação internacional e de acordo com a organização e recursos de cada Estado, dos direitos econômicos, sociais e culturais indispensáveis à sua dignidade e ao livre desenvolvimento de sua personalidade. (ONU, 1948.)
Então, fica claro que o direito a manter a própria cultura faz parte da afirmação dos Direitos Humanos. O Brasil tem, por senso comum, o rótulo de país acolhedor e com culturas diversificadas em cada região. Contudo, por deficiências internas, o país ainda não pode oferecer aos refugiados uma proteção total dos direitos humanos, assim como ainda falha ao proteger seus próprios cidadãos. Ou seja, para que realmente exista uma defesa total e garantida destes direitos, o Brasil precisa avançar universalmente, e não só no que tange a proteção dos refugiados. É importante ter em mente que o respeito aos direitos humanos pode variar de cultura para cultura. Quando se colocam duas culturas distintas num mesmo território, em convivência, evidentemente surgirão desavenças quanto ao tratamento que deve ser dispensado ao que é recebido. Como o autor descreve:
O que é verdade para uma cultura não é forçosamente verdade para outra. É um domínio onde as significações não são transferíveis. [...] Por exemplo, se tais direitos são considerados básicos para o exercício e o respeito à dignidade humana, é preciso que pesquisemos como uma outra cultura satisfaz a necessidade equivalente. (PANIKKAR, 1983, p. 07)
Já em relação à saúde, estes têm direito de uso dos hospitais público e acesso aos medicamentos (disponíveis por verba da ACNUR). Refugiados com problemas mentais têm tratamento específico, custeado por verba da CONARE, além de atendimento psicológico específico no Instituto de Psicologia do Hospital das Clínicas. O SESC (Serviço Social do Comércio) oferece serviços de odontologia a custos baixos, também aos refugiados. (MOREIRA, 2007).
A integração na comunidade local é outro ponto que garante o respeito aos direitos humanos dos refugiados. A integração da língua também é facilitada por convênio com o SESC e as Cáritas, que oferece aulas de português para os refugiados. 
Cursos profissionalizantes, para inserção no mercado de trabalho, são oferecidos com exclusividade para os refugiados pelo SENAI (Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial) e o SENAC (Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial). A Cáritas também tem papel fundamental através do Centro Arquidiocesano do Trabalhador, que atua na recolocação profissional

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