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CURSO INTENSIVO PARA RESIDÊNCIAS N U T R I ÇÃO FISIOPATOLOGIA E DIETOTERAPIA APLICADA PARTE I PROFESSORAS Aline Luiza Afonso de Souza Thaynara Helena Ribeiro e Silva Medeiros Nutricionista, Graduada em 2013 com atuação na área de qualidade. Mestre em Nutrição e Saúde pela UFMG na linha de pesquisa Bioquímica e Imunologia da Nu- trição. Atualmente atua no Ambulatório de doenças do esôfago, estômago e duodeno do HC/UFMG além de atendimento clínico com ênfase em oncologia e doenças infla- matórias intestinais. Nutricionista Graduada pela UFMA, Mes- tre em Saúde da Criança e do Adulto pela UFMA , Especialista em Nutrição Clínica pela UNESA, Especialista em Nutrição Es- portiva pela UNESA. Atuação em nutrição clínica, com ênfase em doenças crônicas e emagrecimento há 10 anos e Docente da área de nutrição há 7 anos com ênfase em dietoterapia. ORGANIZADORA Gabriela Perez Supervisora dos cursos preparatórios de Nutrição da Sanar. Nutricionista graduada pela Universidade Federal da Bahia (UFBA). Mestre e Doutora em Alimentos, Nutrição e Saúde pela UFBA com período sanduíche na University of Nottingham, Inglaterra. Es- pecialista em Nutrição Clínica e Nutrição e Saúde Pública. Pesquisadora nos Grupos de Nutrição, Sistema Nervoso e Imunológico; Bases Experimentais e Clínicas da Nutri- ção na UFBA. Possui experiência atuando como Servidora Pública, Nutricionista Clí- nica, Nutricionista de home care e docência para cursos de graduação e pós graduação na área da Nutrição Clínica. Mentora, auto- ra e professora de diversas disciplinas para Concursos e Residências em Nutrição. 2020 © Todos os direitos autorais desta obra são reservados e protegidos à Editora Sanar Ltda. pela Lei nº 9.610, de 19 de Fevereiro de 1998. É proibida a duplicação ou reprodução deste volume ou qualquer parte deste livro, no todo ou em parte, sob quaisquer formas ou por quaisquer meios (eletrônico, gravação, fotocópia ou outros), essas proibições aplicam-se também à editoração da obra, bem como às suas características gráficas, sem permissão expressa da Editora. Intensivo para residências em nutrição: Fisiopatologia e Dietoterapia Aplicada - Parte I Karen Nina Nolasco Fabrício Sawczen Fabrício Sawczen Microart Design Editorial Caio Vinicius Menezes Nunes Paulo Costa Lima Sandra de Quadros Uzêda Silvio José Albergaria da Silva Título | Editor | Projeto gráfico e diagramação| Capa | Revisor Ortográfico | Conselho Editorial | Editora Sanar S.A R. Alceu Amoroso Lima, 172 - Salvador Office & Pool, 3ro Andar - Caminho das Árvores CEP 41820-770, Salvador - BA Tel.: 0800 337 6262 atendimento@sanar.com www.sanarsaude.com Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) Tuxped Serviços Editoriais (São Paulo-SP) Ficha catalográfica elaborada pelo bibliotecário Pedro Anizio Gomes CRB-8 8846 S729if Souza, Aline Luiza Afonso de. Intensivo para residências em Nutrição: Fisiopatologia e Dietoterapia Aplicada - Parte I / Aline Luiza Afonso de Souza. - 1. ed. - Salvador, BA : Editora Sanar, 2020. 95 p.; il.. E-Book: PDF. Inclui bibliografia. ISBN 978-65-86246-84-1 1. Dietoterapia. 2. Fisiopatologia. 3. Nutrição. 4. Nutrição Clínica. 5. Residências. I. Título. II. Assunto. III. Souza, Aline Luiza Afonso de. CDD 613 CDU 612.3 ÍNDICE PARA CATÁLOGO SISTEMÁTICO 1. Nutrição. 2. Nutrição. REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA SOUZA, Aline Luiza Afonso de. Intensivo para residências em Nutrição: Fisiopatologia e Dietotera- pia Aplicada - Parte I. 1. ed. Salvador, BA: Editora Sanar, 2020. EBook (PDF). ISBN 978-65-86246-84-1 LISTA DE FIGURAS Figura 1 - Representação de estômago e esôfago com hérnia de hiato e sem hérnia Figura 2 - Relação de desenvolvimento das principais doenças do estômago Figura 3 - Áreas afetadas pela inflamação nas doenças de Chron e Colite Ulcerativa Figura 4 - Ilustração representativa áreas de absorção e digestão de nutrientes no trato gastrointestinal Figura 5 - Mecanismo fisiopatológico da esteatose hepática Figura 6 - Esquema representativo do curso metabólico da esteatose gordurosa alcoólica Figura 7 - Metabolismo adequado da glicose na presença da atuação da insulina Figura 8 - Metabolismo da glicose na presença do DM1 Figura 9 - Metabolismo da glicose na presença do DM2 Figura 10 - Localização da glândula tireoide Figura 11 - Regulação da secreção hormonal tireoidiana Figura 12 - Processo de formação dos hormônios tireoidianos Figura 13 - Mecanismos fisiológicos associados à obesidade Figura 14 - Diferenças fisiológicas apresentadas nos transtornos alimentares Figura 15 - Rins e sistema urinário Figura 16 - Funções dos rins Figura 17 - Fisiopatologia da RLA Figura 18 - Fisiopatologia da perda de função nefrótica Figura 19 - Desordens metabólicas na DRC LISTA DE QUADROS Quadro 1 - Dietoterapia nas doenças gastroesofágicas Quadro 2 - Diferenças sobre as manifestações intestinais nas doenças de Chron e Colite Ulcerativa Quadro 3 - Dietoterapia nas doenças inflamatórias intestinais. Fase aguda e remissão Quadro 4 - Dietoterapia na esteatose hepática não alcoólica Quadro 5 - Dietoterapia na esteatose hepática alcoólica grau avançado (cirrose) Quadro 6 - Dietoterapia na pancreatite crônica Quadro 7 - Classificação etiológica do DM Quadro 8 - Características do DM1 e DM2 Quadro 9 - Critérios laboratoriais para diagnóstico do diabetes Quadro 10 - Dietoterapia no DM Quadro 11 - Atuação dos hormônios tireoidianos no corpo Quadro 12 - Causas, sintomas e tratamento das doenças da tireoide Quadro 13 - Dietoterapia no hipertireoidismo Quadro 14 - Expressão de proteínas relacionadas à obesidade Quadro 15 - Ação de citocinas associadas à obesidade Quadro 16 - Classificação obesidade de acordo com o IMC Quadro 17 - Risco para doenças metabólicas e cardiovasculares Quadro 18 - Recomendações nutricionais das dietas balanceadas na obesidade Quadro 19 - Outras recomendações dietéticas no manejo da obesidade Quadro 20 - Dietas da moda Quadro 21 - Recomendações dietéticas em diferentes diretrizes para a obesidade Quadro 22 - Dietoterapia na bulimia Quadro 23 - Dietoterapia na anorexia Quadro 24 - Dietoterapia na LRA Quadro 25 - Recomendação nutricional na LRA segundo a TAU Quadro 26 - Estágios de doença renal crônica de acordo com os valores da taxa de filtração glomerular, conforme as recomendações da National Kidney Foundation Quadro 27 - Dietoterapia no tratamento conservador da DRC Quadro 28 - Modificações nutricionais no tratamento conservador da DRC Quadro 29 - Dietoterapia na fase dialítica Quadro 30 - Dietoterapia na diálise peritoneal SUMÁRIO Apresentação .................................................................................... 7 1. Intervenção Nutricional nas Doenças do Trato Gastrointestinal Superior ............................................................... 8 2. Intervenção Nutricional nas Doenças do Trato Gastrointestinal Inferior ................................................................. 17 3. Intervenção Nutricional nas Doenças Hepatobiliares e Pancreáticas .................................................................................. 27 Intervenção Nutricional nas Doenças Endocrinometabólicas .. 40 5. Intervenção Nutricional na Obesidade .................................... 59 6. Intervenção Nutricional nos Transtornos Alimentares ......... 75 7. Intervenção Nutricional nas Doenças Renais .......................... 82 Gabarito ............................................................................................. 95 Referências ....................................................................................... 96 Olá, futuro (a) residente! Olá! este é o módulo de FISIOPATOLOGIA e DIETOTERAPIA APLICADA, o coração da residência para nós nutricionistas! Por aqui, vocês irão en- contrar o que há de mais atual e importante sobre as condutas nutricio- nais baseado nas principais diretrizes das patologias mais abordadas em provas de residência. Além disso, trazemos tambémos pontos-chave da fisiopatologia destas doenças, para que você consiga compreender o fundamento das abordagens nutricionais nas patologias. Ao final de cada item, sugerimos que você assista às pocket aulas, para fixar o conteúdo e facilitar a resolução das questões gabaritadas. Na hora de responder às questões, vale a pena recorrer aos quadros para revisar as recomenda- ções dietéticas. Até a aprovação! Bons estudos! APRESENTAÇÃO Clique no ícone para assistir a apresentação gravada. 8Curso Intensivo para Residências | Nutrição | Fisiopatologia e Dietoterapia Aplicada - Parte I 1. INTERVENÇÃO NUTRICIONAL NAS DOENÇAS DO TRATO GASTROINTESTINAL SUPERIOR 1.1 DOENÇAS DO ESÔFAGO 1.1.1 DOENÇA DO REFLUXO GASTROESOFÁGICO (DRGE) O refluxo gastroesofágico (RGE) é caracterizado como o relaxamento transitório do esfíncter esofágico inferior (EEI), permitindo que o con- teúdo gástrico entre no esôfago de forma independente da deglutição. A DRGE é definida como o conjunto das complicações ou sintomas de- correntes da sucessão desses episódios. Em muitos casos, os sintomas aparecem somente à noite, entretanto os impactos na qualidade de vida diária do paciente são significativos. Entre os mecanismos envolvidos na ocorrência da DRGE estão: • Aumento da pressão intra-abdominal; • Presença de hérnia de hiato; • Pressão reduzida no esfíncter esofágico inferior, levando a um aumen- to no tempo de abertura desse esfíncter de, em média 20 segundos, tempo maior que o usual para deglutição; • Retardo no esvaziamento gástrico; • Sensibilidade esofágica; • Comprometimento na depuração do ácido gástrico. SINTOMAS: O conteúdo gástrico, ao retornar para o esôfago, ocasiona uma sensação de queimação, comumente denominada azia, a pirose, que chega a causar dor no peito. Além disso, o refluxo provoca disfagia, uma 9Curso Intensivo para Residências | Nutrição | Fisiopatologia e Dietoterapia Aplicada - Parte I dificuldade na deglutição causando tosse crônica, levando à rouquidão e, consequente, dor ao deglutir, denominada odinofagia. O contato contínuo do ácido gástrico na mucosa bucal leva à perda progressiva do esmalte dos dentes. POSSÍVEIS COMPLICAÇÕES: Entre as complicações decorrentes da DRGE estão esofagite, ulcerações esofágicas, estenose e metaplasia (Esôfago de Barret), um fator de risco para o câncer esofágico. 1.1.2 HÉRNIA DE HIATO O esôfago atravessa o diafragma por meio do hiato, também denominado anel esofágico. Quando há um deslocamento da parte superior do estô- mago para acima do diafragma, ou seja, na parte de cima do hiato, chama- mos essa alteração de hérnia de hiato. Na ocorrência de um refluxo gás- trico, o conteúdo gástrico permanecerá na hérnia, por um período mais longo que o normal. Tipos de Hérnia de Hiato: Tipo 1 – Hérnia de Hiato Deslizante: a junção gastroesofágica é empurra- da para cima do diafragma, causando uma herniação simétrica na porção proximal do estômago. Tipo 2 – Hérnia Paraesofágica Verdadeira: o fundo desliza para cima da junção gastroesofágica. É a forma mais comum. Tipo 3 – Hérnia Paraesofágica Mista: combinação de deslizamento e pa- raesofágica. Tipo 4 – Hérnia Paraesofágica Complexa: herniação de outros órgãos como o cólon e o intestino delgado para dentro do saco herniário. Forma menos comum. 10Curso Intensivo para Residências | Nutrição | Fisiopatologia e Dietoterapia Aplicada - Parte I SINTOMAS: O paciente pode apresentar dor epigástrica alta, com conse- quente redução da ingestão alimentar. Figura 1 - Representação de estômago e esôfago com hérnia de hiato e sem hérnia A) Hérnia de Hiato. B) Redução pós-cirúrgica de hérnia. Fonte: Mahan, 2018. DICA: Sempre que se falar de doenças esofágicas atentar-se para o fato de que a DRGE pode ser tanto um fator de risco como uma consequência de outras doenças do esôfago. Todas elas evoluem para fatores de risco aumentado de câncer. Além disso, lembrar-se de que a obesidade é um fator de risco para doenças gastroesofágicas. É importante promover a perda de peso saudável quando necessária. 1.2 DOENÇAS DO ESTÔMAGO 1.2.1 GASTRITE A gastrite é definida como uma inflamação no estômago, sendo caracte- rizada pela infiltração de células inflamatórias no epitélio gástrico, as quais são visíveis na endoscopia. A longo prazo, a gastrite pode provocar a atrofia das células parietais, reduzindo a produção de HCL (ácido clorí- drico) numa manifestação denominada acloridria, dificultando a digestão de nutrientes como a proteína e podendo levar à anemia perniciosa. 11Curso Intensivo para Residências | Nutrição | Fisiopatologia e Dietoterapia Aplicada - Parte I Algumas situações comuns no dia a dia das pessoas como o uso crônico de anti-inflamatórios não esteroides (AINEs), bem como tabaco, álcool e outras substâncias erosivas, podem reduzir a produção de prostaglandi- nas, substâncias reguladoras da inflamação. As prostaglandinas têm um importante papel na produção de muco e bicarbonato no estômago, man- tendo a integridade da barreira estomacal. A quebra dessa barreira é uma das causas da gastrite. Outra causa de gastrite é a infecção por Helicobacter Pylori, uma bac- téria gram-negativa que pode ser veiculada por alimentos e água. Ela é responsável por um grande número de casos de gastrite, causando infla- mações crônicas ou a denominada gastrite atrófica, uma inflamação crô- nica com deterioração da mucosa. Os fatores de risco que podem levar a um número maior de complicações estão entre a cepa, a concentração de bactérias e outros fatores genéticos. O estado geral de saúde do indiví- duo pode interferir na progressão da doença. SINTOMAS: Os sintomas incluem náuseas, vômitos, mal-estar, anorexia e dor epigástrica. Quando os sintomas são persistentes, a gastrite é de ca- ráter crônico; por outro lado, quando ocorre apenas em casos pontuais, é denominada gastrite aguda. 1.2.2 ÚLCERA PÉPTICA As úlceras pépticas são decorrentes da gastrite crônica. Quando há uma inflamação persistente e uma falha no processo de recuperação desta, ocorre então a úlcera, uma lesão que pode se dar tanto no epitélio gástri- co quanto no duodeno. Em alguns casos, pode ocorrer a presença de melena (sangue nas fezes) ou hematêmese (vômito sanguinolento), que caracterizam uma emergên- cia, podendo ser sinais de uma obstrução ou mesmo do rompimento de vasos decorrente da úlcera (MAHAN, 2018). 12Curso Intensivo para Residências | Nutrição | Fisiopatologia e Dietoterapia Aplicada - Parte I RESUMINDO… Hérnia Hiatal ≠ Esofagite Hérnia Hiatal + Esofagite = Piora do prognóstico Figura 2 - Relação de desenvolvimento das principais doenças do estômago H. Pylori AINEs Gastrite Pode levar Úlcera Pode levar Câncer Gástrico, Duodenal ou Esofágico Fonte: Autoria própria, 2020. Quadro 1 - Dietoterapia nas doenças gastroesofágicas Nutrientes e Características da Dieta Conduta Objetivo Ingestão calórica Normocalórica 25-30Kcal/Kg peso. Hipocalórica 22-25Kcal/Kg peso. Promover a perda de peso saudável e manutenção, quando necessário. Carboidratos Normo a Hipoglicídica 45%-60% VET. Propiciar consumo adequado de fibras (25g/dia). Evitar carboidratos fermentáveis (po- lióis). Melhora no perfil da microbiota, melhora na infecção por H.Pylori. Proteínas Normoprotéica 1 a 1.2g PTN/ Kg peso Hiperprotéica -1.2 a 1.5g PTN/ Kg peso Pode ser necessário aumentar a oferta proteica em fase de úlcera em atividade, e considerar perdas absortivas a depender do grau da doença. Na DRGE a proteína estimula a produção da gastrina, aumen- tando a pressão no EEI. Lipídios Hipolipídica 15%-20% VET. Facilitar a digestão. O excesso deste nu- triente pode reduzir a pressão no EEI. Fonte: Mahan, 2018; Watson & Preedy, 2019. 13Curso Intensivo para Residências | Nutrição | Fisiopatologia e Dietoterapia Aplicada - Parte I Nutrientes e Características da Dieta Conduta Objetivo Consistência dietética Livre. Considerar alteração para branda ou pastosa, quando houver disfagiaou odi- nofagia. Distribuição ao longo do dia Reduzir o volume das por- ções e espaçar as refeições. Aguardar 2-3 horas após a refeição para deitar. Facilitar a digestão. Evitar a estase gástrica. Minimizar o risco de refluxo noturno. Imunonutrientes Ácidos graxos ômega 3, Probióticos Lactobacillus spp., Bifido- bacterium spp., Saccaromy- ces spp. Melhorar a resposta inflamatória do pa- ciente. Melhora em úlcera péptica e sintomas de gastrite, redução de H.pylori. Evitar Álcool, café, bebidas gaseificadas em geral, condimentos, pimentas, alimentos e sucos ácidos. Alimentos fermentados, bem como áci- dos, podem aumentar a erosão gástrica, além de poder causar dor no paciente. Fonte: Mahan, 2018; Watson & Preedy, 2019. NOTA: Os inibidores de bomba de prótons (omeprazol, pantoprazol e afins), comumente utilizados no tratamento da gastrite, podem levar à re- dução da absorção de vitamina B12. Considerando que o ácido aumenta a biodisponibilidade de alguns nutrientes, a hipocloridria pode reduzir a absorção de ferro e cálcio, por exemplo. A concentração sérica desses nu- trientes deve ser observada. Continuação Quadro 1 - Dietoterapia nas doenças gastroesofágicas 14Curso Intensivo para Residências | Nutrição | Fisiopatologia e Dietoterapia Aplicada - Parte I Assista agora a Pocket Aula sobre Intervenção Nutricional nas Doenças do Trato Gastrointestinal Superior clicando no ícone ao lado 01. A doença péptica do refluxo gastroesofágico pode resultar em esofagite em decorrência do contato do conteúdo intestinal sobre a mucosa do esôfago inferior. A dieta deve contribuir para reduzir a secreção ácida, devendo ser: 🅐 Hiperlipídica, para diminuir a velocidade do esvaziamento gás- trico 🅑 Hiperhídrica, com ingestão de líquidos inclusive durante a re- feição para prevenir engasgos 🅒 Hiperprotéica, estimulando a liberação de gastrina que aumenta a pressão no esfíncter esofagiano inferior (EEI) 🅓 Hiperglicídica, para favorecer a distensão abdominal 🅔 Hipolipídica, para estimular a produção de colecistoquinina e diminuir a acidez gástrica. Clique aqui para ver o gabarito da questão. 15 ANOTAÇÕES 16Curso Intensivo para Residências | Nutrição | Fisiopatologia e Dietoterapia Aplicada - Parte I 2. INTERVENÇÃO NUTRICIONAL NAS DOENÇAS DO TRATO GASTROINTESTINAL INFERIOR 2.1 DOENÇAS DO INTESTINO 2.1.1 DOENÇAS INFLAMATÓRIAS INTESTINAIS – DOENÇA DE CROHN E COLITE ULCERATIVA As doenças inflamatórias intestinais (DII) são caracterizadas por infla- mações localizadas em várias ou apenas uma parte do intestino. Entre elas estão o Crohn e a Colite Ulcerativa. Observe o quadro a seguir para memorizar as diferenças nas manifestações das doenças: Quadro 2 - Diferenças entre as manifestações intestinais na Doença de Crohn e Colite Ulcerativa MANIFESTAÇÃO Crohn COLITE ULCERATIVA Diarreia sanguinolenta X Estreitamento intestinal X Acomete o reto XX Lesões contínuas X Ocorrência de fístulas XX X Doença perianal X Parede intestinal fina X Megacólon tóxico X Má Absorção de Nutrientes X Granulomas presentes na histopatologia X Abcessos observados nas criptas X Presença de fibrose X Ocorrência de úlceras XX Pode levar ao câncer X X Fonte: Mahan, 2018; Posicionamento GEDIIB, 2019. 17Curso Intensivo para Residências | Nutrição | Fisiopatologia e Dietoterapia Aplicada - Parte I Nesta imagem, podemos observar as áreas de inflamação da Colite Ulcerativa e Doença de Crohn: Figura 3 - Áreas afetadas pela inflamação nas doenças de Crohn e Colite Ulcerativa DOENÇA INFLAMATÓRIA INTESTINAL Íleo Cólon descentente Colite ulcerativa Doença de Crohn Fonte: Pinheiro, 2020. A etiologia das DIIs não é completamente esclarecida, entretanto elas são atualmente descritas como doenças autoimunes. Os indivíduos apresen- tam suscetibilidade genética e, a depender dos genes afetados, podem apresentar maior ou menor manifestação dos sintomas. Sabe-se que uma dieta pobre em fibras e rica em alimentos ultraprocessados é um fator de risco para o desenvolvimento das DIIs. Podem ocorrer diversas manifestações extra intestinais como artrite, uveíte (nos olhos), e a ocorrência de outras doenças autoimunes posteriormente A partir de um estímulo inflamatório qualquer, seja ele uma infecção bac- teriana ou viral, por exemplo, o indivíduo apresenta uma resposta infla- matória exacerbada. Após essa situação, ele não retorna ao estado de equilíbrio inflamatório. Na DII, ocorre aumento da exposição de antíge- nos, aumento da resposta inflamatória a componentes da microbiota, re- sultando numa intolerância que reduz os mecanismos de defesa do indiví- 18Curso Intensivo para Residências | Nutrição | Fisiopatologia e Dietoterapia Aplicada - Parte I duo. Esse processo inflamatório leva ao dano epitelial, podendo este ser transmural, ou seja, em todas as camadas da mucosa, como ocorre no Crohn, ou limitado à mucosa, como acontece na Colite Ulcerativa. As do- enças inflamatórias intestinais são divididas entre a fase ativa e o perí- odo de remissão, e a conduta médica e nutricional será diferente em cada uma dessas fases. Em muitos casos, é necessário rea- lizar a ressecção intestinal para remoção de áreas em estenose ou muito lesadas. Nessas circunstân- cias, devem ser levadas em conta as partes removidas do intestino para considerar perdas absortivas ou di- gestivas. SINTOMAS: Dor abdominal persistente, diarreia persistente, melena e/ ou presença de muco nas fezes (Crohn), intolerâncias a diversos alimen- tos, perda de peso importante. DICA: Durante a fase ativa da doença, diante do constante processo inflama- tório, o indivíduo, além de apresentar taxa metabólica basal mais elevada, tende a reduzir drasticamente o consumo alimentar em virtude das diversas intolerâncias adquiridas. Esses fatores, associados à diarreia e à má absorção de nutrientes nas áreas lesadas, fazem com que esse paciente seja um forte candidato à desnutrição, bem como à anemia e deficiências de outros micro- nutrientes como Zn, Vitamina B12 e 25(OH) Vitamina D. Quando o tratamento envolver o uso de esteroides, é necessário monitorar o cálcio sérico. O moni- toramento de tais micronutrientes entretanto, deve persistir inclusive na fase de remissão. Pode ser necessária a utilização de uma bolsa de íleo ou colosto- mia, ou mesmo consi- derada a utilização de suporte nutricional oral, enteral ou parenteral a depender das circuns- tâncias e da cirurgia a ser feita. A ressecção intestinal pode atingir de 50% a 70% dos pacientes com Crohn e cerca de 20% dos pacientes com Colite. 19Curso Intensivo para Residências | Nutrição | Fisiopatologia e Dietoterapia Aplicada - Parte I Quadro 3 - Dietoterapia nas doenças inflamatórias intestinais. Fase aguda e remissão Nutrientes e Características da Dieta Fase Ativa Objetivo Remissão Objetivo Ingestão Calórica Hipercalórica 30-35Kcal/Kg peso. Alta demanda metabólica – Risco desnutri- ção. Normo (25- 30Kcal/Kg peso) a Hipocalórica (22-25Kcal/Kg peso). Promoção peso adequado. Não há aumento de demanda energética nesta fase. Carboidratos Normoglicídica 45-60%VET. Limitar lacto- se, alimentos fermentados, polióis e fibras insolúveis. Minimizar pro- dução de gases. Normoglicídica. Observar tole- rância à lactose. Reintroduzir fibras. Produção AGCC – regeneração epitelial e da microbiota. Proteínas Hiperproteica 1,2-1,5g PTN/Kg de peso. Alta demanda metabólica pela inflamação. Normoproteica 1 -1,2g PTN/Kg peso. Aumento da oferta proteica apenas em caso de estratégia para perda de peso. Reduzir consumo de carnes verme- lhas. Lipídios Hipolipídica 15-20% VET. Melhora na diarreia e facili- tar o processo digestivo e absortivo. Normolipídica 20-30%VET. Preferir AGs mono e poli-insaturados. Promover ade- quada ingestão e absorção de vitaminas lipos- solúveis. Potencial anti-in- flamatório. Consistência dietética Branda. Fácil digestibi- lidade,reduzir fibra insolúvel Avaliar tolerân- cia Livre Sem alterações orais ou gastroe- sofágicas Distribuição ao longo do dia Pequenas por- ções. Reduzir o im- pacto digestivo. Livre. De acordo com preferências do paciente. Fonte: Bischoff, S. et al. Espen, 2020. 20Curso Intensivo para Residências | Nutrição | Fisiopatologia e Dietoterapia Aplicada - Parte I Nutrientes e Características da Dieta Fase Ativa Objetivo Remissão Objetivo Imunonutrientes Evidências con- flitantes. Apenas pro- bióticos Lacto- bacillus reuteri ou “VSL#3” são indicados para indução da re- missão Não há evidên- cias robustas que recomen- dem a suple- mentação de outros probióti- cos, prebióticos e AGs ômega 3 com o objetivo de induzir a remissão. Uso de prebióti- cos, como FOS e GOS. Evidências con- flitantes sobre probióticos. Melhora na recu- peração epitelial com FOS e GOS. O uso de probió- ticos não apre- sentou melhora. Evitar Bebidas cafei- nadas, condi- mentos, fritu- ras, lácteos, leguminosas, alimentos fi- brosos, semen- tes, frutas ou vegetais com cascas, cereais integrais*. Alimentos irri- tantes* aumen- tam a dor do paciente. Gor- duras, fibras insolúveis e lácteos podem desencadear diarreia. Avaliar tolerân- cia e demais complicações do paciente. ------------ Micronutrientes Níveis séricos de Hemoglobi- na devem ser observados, além de 25(HO) vitamina D, Zn. Considerar suplementação de Fe, Vit.D, Zn. Possibilidade de perdas ab- sortivas, des- mineralização óssea. Monitorar con- centrações séri- cas de Vit D, Zn e hemoglobina. Sempre avaliar para garantir a absorção neces- sária. *Não há evidências de que evitar esses alimentos induz à remissão, entretanto a recomendação é dada baseada na melhora clínica de sintomas. Fonte: Bischoff, S. et al. Espen, 2020. 2.1.2 DIVERTICULITE A diverticulite é definida como inflamação da diverticulose, uma forma- ção de pequenas “bolsas” no cólon e uma espécie de herniação entre as mucosas e submucosas intestinais. A causa da formação das diverticu- lites ainda é desconhecida, entretanto parece estar associada a fatores como disbiose, transtorno da função sensomotora do cólon e motilidade anormal do cólon. Continuação Quadro 3 - Dietoterapia nas doenças inflamatórias intestinais. Fase aguda e remissão 21Curso Intensivo para Residências | Nutrição | Fisiopatologia e Dietoterapia Aplicada - Parte I SINTOMAS: Alguns pacientes podem não apresentar sintomas; outros podem apresentar dor, sangramento, formação de abcesso, obstrução, fístula e complicações, como a sepse por ruptura. DIETOTERAPIA: Uma dieta rica em fibras, acompanhada de boa hidrata- ção, será capaz de promover fezes bem formadas, pastosas e volumosas, sendo estas eliminadas mais rapidamente. Para tanto, a inserção das fi- bras deverá ser gradual, até alcançar a recomendação de 20 a 35g/dia, considerando parte fibra solúvel/parte insolúvel. ATENÇÃO: Acreditava-se que a formação dos divertículos era consequên- cia de uma dieta pobre em fibras. Da mesma forma, havia uma recomen- dação, sem evidências suficientes, de que esses pacientes reduzissem o consumo de alimentos, como pipoca, sementes, e fizessem uso de uma dieta de baixo resíduo em períodos de inflamação. Estudos mais recen- tes, entretanto, demonstram que não há evidências que justifiquem essa origem, bem como tais condutas (MAHAN, 2018). 2.1.3 DOENÇA CELÍACA A doença celíaca ou enteropatia sensível ao glúten caracteriza-se por uma sucessão de quatro fatores: 1. Suscetibilidade genética; 2. Exposição ao glúten; 3. Desencadeante ambiental; 4. Reação autoimune. O glúten é um peptídeo presente nas frações peptídicas encontradas no trigo (glutenina e gliadina), centeio (secalina) e cevada (hordeína). Esses peptídeos em geral são mais resistentes às primeiras etapas do processo digestivo e chegam praticamente intactos ao intestino. Em um intestino 22Curso Intensivo para Residências | Nutrição | Fisiopatologia e Dietoterapia Aplicada - Parte I saudável, esses peptídeos não seriam prejudiciais, porém, em pacientes com doença celíaca, há um aumento da permeabilidade intestinal. Por- tanto, eles entram em contato com a lâmina própria, desencadeando uma reação inflamatória e provocando o achatamento das vilosidades intes- tinais, alongamento das células de goblet (secretoras) e uma resposta imunológica geral, não apenas localizada. As porções mais comumente afetadas do intestino são os segmentos proximais e médio do intestino delgado, ocorrendo também em porções mais distais. POSSÍVEIS COMPLICAÇÕES: Quando não há tratamento adequado, a atro- fia e o achatamento das vilosidades intestinais levam à redução das dis- sacaridases e peptidases, além de outros carreadores que desempenham funções secretoras, absortivas e digestivas do intestino. Pode ocorrer intolerância à lactose, que, em alguns casos, desaparece após a cicatriza- ção das inflamações. Há relatos de manifestações extraintestinais, como anemia, perda óssea, dermatite herpertiforme e polineuropatia. SINTOMAS: Os sintomas que acometem o paciente celíaco geralmente estão entre dor abdominal, diarreia persistente ou constipação crônica e, em muitos casos, fraqueza muscular e queda de cabelo. Estes dois últi- mos sintomas estão relacionados à má absorção de nutrientes devido ao achatamento das criptas, característico da doença celíaca. DIETOTERAPIA: A dietoterapia na doença celíaca baseia-se na exclusão completa de alimentos que contenham glúten ou possam eventualmente ter contato, em alguma das etapas dos processos de colheita, até o pre- paro e distribuição, com o glúten (MAHAN, 2018). Com a exclusão do glúten, o paciente tende a ter uma dieta pobre em fi- bras e vitaminas do complexo B. Dessa forma, é necessário verificar e tra- tar, quando houver, outros fatores como constipação, diarreia, deficiência 23Curso Intensivo para Residências | Nutrição | Fisiopatologia e Dietoterapia Aplicada - Parte I de micronutrientes. As mais comumente encontradas são as vitaminas lipossolúveis A, D, E e K, e entre os minerais, o Zinco e o ferro. DICA: As doenças intestinais apresentam alguns pontos em comum, são eles: • Todas elas apresentam manifestações extraintestinais devido às limitações absortivas. Uma complicação frequente é a anemia. • Além disso, quando não tratadas corretamente, todas elas podem evoluir para o câncer, em razão de seu caráter altamente inflamatório crônico, le- vando a uma displasia. Para facilitar a identificação das perdas, dependendo da área do TGI afe- tada, observe a figura a seguir que ilustra os processos digestivos e ab- sortivos no TGI. Figura 4 - Ilustração representativa das áreas de absorção e digestão de nutrientes no trato gastrointestinal PâncreasDuodeno Vesícula biliar Estômago Esôfago Área orofaríngea Jejuno Íleo Cólon Digestão Secreção Absorção Fonte: Mahan, 2018. 24Curso Intensivo para Residências | Nutrição | Fisiopatologia e Dietoterapia Aplicada - Parte I 02. A.M.S., sexo feminino, 20 anos, solteira. Queixa e duração: em outubro de 2017, começou a apresentar diarreia (4 episódios de fezes liquefeitas ao dia); em maio de 2018, iniciou com sintomas de vômitos diariamente, dor abdominal e emagrecimento importante. Antecedentes pessoais: paciente refere que até 2017 não tinha alterações no hábito intestinal. Em consulta com gastroenterolo- gista recebeu diagnóstico de doença de Crohn. Até o momento não havia tido consulta com nutricionista. A partir das medidas antro- pométricas constatou-se uma adequação de peso de 78,8%, que se refere a uma desnutrição moderada. A paciente apresenta uma alimentação monótona. As preferências alimentares da paciente são: frituras, refrigerantes e salgadinhos. Em relação ao consumo diário, refere consumo de: produtos lácteos 3 a 4 vezes; cereais 2 a 3 vezes; grãos 1 vez; fruta 1 vez; verduras e/ ou legumes 1 vez; doces 1 vez e refrigerante 1 a 2 vezes. A dieta que deve ser orientada na fase agudaé: 🅐 Isenta de lactose e isenta de fibras. 🅑 Isenta de lactose e com pouco teor de gordura. 🅒 Isenta de sacarose e com elevado teor de gordura. 🅓 Isenta de frutose e com baixo teor de fibras solúveis. 🅔 Sem bebidas carbonatadas e com elevado teor de fibras inso- lúveis. Clique aqui para ver o gabarito da questão. Assista agora a Pocket Aula sobre Intervenção Nutricional nas Doenças do Trato Gastrointestinal Inferior clicando no ícone ao lado 25 ANOTAÇÕES 26Curso Intensivo para Residências | Nutrição | Fisiopatologia e Dietoterapia Aplicada - Parte I 3. INTERVENÇÃO NUTRICIONAL NAS DOENÇAS HEPATOBILIARES E PANCREÁTICAS 3.1 DOENÇAS DO FÍGADO 3.1.1 DOENÇA HEPÁTICA GORDUROSA NÃO ALCOÓLICA A doença hepática gordurosa não alcoólica (DHGNA) compreende as do- enças hepáticas decorrentes de outras causas, que não o abuso de álcool. Essa forma de doença hepática é bastante prevalente na população por- que envolve uma série de outros fatores associados a doenças crônicas. São estes: • Obesidade; • Diabetes Mellitus; • Dislipidemia; • Hipertensão arterial. Pacientes em uso de polifarmácia e de esteroides anabolizantes também estão sujeitos a apresentar esse agravo. Portanto, podemos dizer que a DHGNA é o componente hepático da síndrome metabólica e, quando não tratada, leva ao agravo de todas essas condições associadas já citadas. Ela é caracterizada pelo acúmulo de lipídeos nos hepatócitos, denomina- da esteatose, levando a microlesões que podem culminar em complica- ções mais graves, como a fibrose, a cirrose e, posteriormente, o carcinoma hepatocelular. De forma geral, as complicações sempre estão associadas ao estado geral de saúde do indivíduo. Observe no esquema a seguir como ocorre a fisiologia da esteatose hepática: 27Curso Intensivo para Residências | Nutrição | Fisiopatologia e Dietoterapia Aplicada - Parte I Figura 5 - Mecanismo fisiopatológico da esteatose hepática Agentes precursores: Dieta Microbiota Predisposição Genética Aumento tecido Adiposo visceral Resistência Insulínica Alteração no metabolismo de Glicose ESTEATOSE HEPÁTICA ESTEATO HEPATITE (Lesão no hepatócito) Morte do Hepatócito Necrose Apoptose FIBROSE CIRROSE CÂNCER HEPÁTICO ENCEFALOPATIA HEPÁTICA AGs Livres Alteração no metabolismo de Lipídeos Lipotoxicidade Inflamação Disbiose (endotoxinas pelo sistema portal) Liberação de Mediadores Inflamatórios Reversível Deposição de colágeno Estresse oxidativo Disfunção Mitocondrial Fonte: Adaptado de Rinella, 2015. As lesões hepáticas gordurosas são de caráter reversível e podem se manter estáveis em até 80% dos pacientes, sem apresentar complica- ções, quando há o manejo adequado. Logo, complicações como fibrose, cirrose e encefalopatia são observadas na maioria dos casos de estea- tose alcoólica, quando o indivíduo não realiza a redução do consumo de álcool. 28Curso Intensivo para Residências | Nutrição | Fisiopatologia e Dietoterapia Aplicada - Parte I Quadro 4 - Dietoterapia na esteatose hepática não alcoólica Nutrientes e Características da Dieta Conduta Objetivo Ingestão calórica Hipocalórica 22-25Kcal/Kg peso. Promover a adequação do peso (perda de peso 7% a 10% promove melhor prognóstico). Carboidratos Hipoglicídica 30%-40%VET. Reduzir consumo de frutose* e sacarose. Propiciar consumo adequado de fibras (25g/dia). Melhorar a resistência insulínica e o perfil lipídico *O consumo de frutose a ser redu- zido deve ser aquele proveniente de alimentos industrializados, e não o de frutas. Proteínas Normoproteica 1 a 1.2gPTN/Kg peso. Não há elevada demanda proteica, entretanto, pode ser interessante aumentar a oferta devido à redu- ção de carboidratos. Lipídios Hipolipídica 15-20%VET. Ofertar AGs mono e poli-insa- turados. Evitar a sobrecarga hepática. Micronutrientes Suplementar Vitamina E (pa-cientes não diabéticos). Melhora perfil enzimático, bio- químico e histológico da fibrose hepática. Consistência dietética Livre Não há restrições na consistência dietética em virtude da DHGNA. Evitar Álcool, embutidos, carboi- dratos refinados, frituras e alimentos gordurosos. Estabilizar ou reverter o processo de esteatose hepática. Fonte: Sociedade Brasileira Hepatologia, 2016; Espen, 2019. NOTA: Os protocolos de tratamento associam a dietoterapia à medica- ção, além de promover a prática de atividade física. Rhaissa Ferreira 2000mg de sódio por dia 29Curso Intensivo para Residências | Nutrição | Fisiopatologia e Dietoterapia Aplicada - Parte I 3.1.2 DOENÇA HEPÁTICA GORDUROSA ALCOÓLICA A doença hepática gordurosa alcoólica tem início na esteatose hepática e tem algumas características específicas em virtude da toxicidade dos subprodutos do álcool. Observe o esquema a seguir para compreender as alterações metabólicas quando comparadas à DHGNA: Figura 6 - Esquema representativo do curso metabólico da esteatose gordurosa alcoólica Hipovitaminemia Diminuição da ati- vação da vitamina Hepatotoxicidade Acetaldeído Hepatite Hidrogênio Álcool O Hidrogênio substitui a gordura como fonte de energia e acumula-se Fígado gorduroso Inflamação e Necrose Cirrose Fonte: Mahan, 2018. Apesar das diferentes vias metabólicas alteradas, tanto a DHGNA como a DHA podem culminar em desfechos graves, como a fibrose e, consequen- temente, a cirrose. SINTOMAS: A doença hepática é muitas vezes, silenciosa. Entretanto, al- guns pacientes em estágio mais avançado podem apresentar dor abdo- minal, hipertensão portal devido à encefalopatia hepática*, sangramento gastrointestinal em virtude da cirrose, ascite, um inchaço abdominal cau- sado pelo acúmulo de líquidos, proteínas séricas e outros eletrólitos na cavidade abdominal. 30Curso Intensivo para Residências | Nutrição | Fisiopatologia e Dietoterapia Aplicada - Parte I *A Encefalopatia Hepática é uma condição em que há acúmulo de produ- tos tóxicos, provenientes de metabolismos diversos, como a amônia, e o fígado, por não estar saudável, é incapaz de excretar tais produtos. Dessa forma, pelo sistema portal esse sangue é enviado ao cérebro, causando alterações neurológicas. ATENÇÃO para as alterações na utilização e absorção de nutrientes no paciente alcoólico: • Há um aumento na demanda energética de 18% a até 30% em indiví- duos com cirrose e falência aguda hepática quando houver ascite, acú- mulo hídrico no abdômen, o gasto energético pode ser aumentado em até 10%. • Comprometimento na captação hepática de aminoácidos, reduzindo principalmente os aminoácidos de cadeia ramificada (AACR) e síntese proteica, o que leva ao risco de desnutrição. • A utilização de lipídeos e carboidratos é comprometida, levando à re- sistência insulínica e dislipidemia. • Na ausência de ácidos biliares e constante consumo lipídico, pode ocor- rer a esteatorreia, provocando perda de vitaminas lipossolúveis. • Em consequência da redução da ingestão seguida das perdas absor- tivas, ocorre deficiência de diversas vitaminas. As mais comuns são a insuficiência de vitamina A e complexo B (destacando-se B12)., Vitami- nas C, D, E e K. • O acúmulo de líquido intra-abdominal, ascite, leva à perda de minerais, tais como: potássio, magnésio, fosfato, ferro e zinco. Neste paciente, a avaliação Nutricional por IMC não é eficaz, em virtude da ascite e da ocorrência frequente de edemas periféricos 31Curso Intensivo para Residências | Nutrição | Fisiopatologia e Dietoterapia Aplicada - Parte I Quadro 5 - Dietoterapia na esteatose hepática alcoólica grau avançado (cirrose) Nutrientes e Características da Dieta Conduta Objetivo Ingestão calórica Hipercalórica – até 32Kcal/Kg peso (complicações como ascite, cirrose grave, falência hepática). Quando obeso, utilizar máximo 27Kcal/kg peso. Considerar aumento energético 10% quando houver ascite. Promover o aporte energético necessário durante esse período de alta demanda metabólica. Carboidratos Hipoglicídica 30%-40%VET. Consumo fibras 25g/dia.Melhorar a resistência insulínica e o perfil lipídico. Proteínas Normo a Hiperproteíca (0,8g – 1,3g/Kg peso). Aumentada conforme a gravidade da doença. Avaliar balanço nitrogenado (po- sitivo ofertar ≥1gPTN/kg peso). Avaliar se há necessidade de ofer- tar suplementação de AACR.* Lipídios Hipolipídica 15%-20% VET. Priorizar AGs insaturados Evitar a sobrecarga hepática. Consistência dietética Livre. Avaliar aceitação. Outras recomendações Promover a redução (e, se pos- sível, eliminar) do consumo de álcool. Priorizar o consumo de antioxi- dantes Estabilizar ou reverter o processo inflamatório. Distribuição de refei- ções ao longo do dia Evitar períodos longos de jejum, mesmo no noturno, ofertar CHO simples antes de dormir. Melhora no metabolismo de pro- teínas. Fonte: Espen, 2019. NOTA: Na cirrose hepática ou encefalopatia hepática, o padrão de aminoácidos séricos é caracterizado pela redução de AACR e pelo aumento de aminoácidos aromáticos, sulfurosos e triptofano. Esses aminoácidos são importantes no processo de liberação de aminas. Nesses casos, a suplementação com AACR pode ser viável, sobretudo pela garantia da absorção desses nutrientes, parti- cipação na liberação de compostos nitrogenados do fígado. **Nesses casos, é preciso avaliar a necessidade de iniciar suporte nutricional oral, enteral ou mesmo parenteral. 32Curso Intensivo para Residências | Nutrição | Fisiopatologia e Dietoterapia Aplicada - Parte I 03. A doença hepática crônica (DHC) pode cursar com anormali- dades metabólicas e nutricionais, que repercutem negativamen- te sobre a morbidade e mortalidade dos pacientes. Uma reco- mendação nutricional adequada para pacientes com DHC é que o(a): 🅐 A recomendação de proteínas deverá ser de 1,5 a 2,2g/kg/dia para garantir a retenção nitrogenada 🅑 dieta deve ser hipoglicídica (<50% do VET) quando houver resistência à insulina e intolerância à glicose 🅒 A recomendação de lipídeos deverá ser maior que 40% do valor energético total (VET) devido à má absorção de lipídeos 🅓 gasto energético deve ser acrescido em 10% quando houver ascite, por este ser um compartimento metabolicamente ativo Clique aqui para ver o gabarito da questão. 3.2 DOENÇAS DO PÂNCREAS 3.2.1 PANCREATITE AGUDA A pancreatite é uma inflamação do pâncreas, caracterizada por edema, exsudato celular e necrose gordurosa. Ela pode ser causada pelo abuso de álcool, doença do sistema biliar, trauma, hipertrigliceridemia, hipercal- cemia. A pancreatite crônica tem características como leve e autolimitada, en- quanto a aguda pode apresentar sinais mais graves, como a autodiges- tão, necrose e hemorragia do pâncreas. 33Curso Intensivo para Residências | Nutrição | Fisiopatologia e Dietoterapia Aplicada - Parte I A pancreatite aguda é considerada uma condição grave, na qual a resposta metabólica é similar à de uma sepse. Por ter uma alta demanda metabó- lica e catabólica, há um elevado risco de desnutrição. Ocorre destruição extensa do tecido pancreático com formação de fibrose. Nesse momento, há uma redução das enzimas pancreáticas, o que explica a dificuldade na absorção da gordura e de outros nutrientes, causando a esteatorreia. As complicações podem estar associadas a hipotensão, oliguria e dispneia. Alterações bioquímicas: • Limitações absortivas de vitaminas lipossolúveis: A, D, E e K e micronu- trientes tais como Zn, Se e Mg. • Saúde óssea: por disfunção no paratormônio. 1 em cada 4 pacientes apresenta osteporose ou outro comprometimento ósseo. • Risco de anemia, devido à carência de Fe e vitamina B12, folato, ferriti- na e alteração nos níveis de PCR • Disfunção endócrina, necessário avaliar HbA1c e glicemia sérica. SINTOMAS: O paciente pode apresentar dor abdominal localizada ou ex- tensa, muitas vezes acompanhada de distensão abdominal, em alguns ca- sos vômito, diarreia e diarreia gordurosa, a esteatorreia. DIETOTERAPIA: Todas as limitações digestivas e absortivas da pancre- atite aguda, bem como a emergência do caso, sugerem a suspensão to- tal da dieta por alguns dias, mantendo o paciente apenas com infusão de eletrólitos. Após esse prazo, é necessário iniciar suporte nutricional, que será preferencialmente enteral, se tolerado, dieta polimérica, e quando não, avaliar dieta elementar e hidrolisada, uma vez que a dieta polimérica ou oligomérica estimula a produção de CCK (colecistoquinina). Em casos graves, quando não houver tolerância à dieta, pode ser necessário manter o paciente em dieta parenteral. Quando houver progressão para a dieta oral, este paciente deverá receber dieta hipolipídica e branda, e à partir 34Curso Intensivo para Residências | Nutrição | Fisiopatologia e Dietoterapia Aplicada - Parte I daí, evoluir para a dieta do paciente com pancreatite crônica conforme tolerância. Quando houver necrosectomia - um procedimento endoscópico de debrida- mento do pâncreas necrótico, a ingestão V.O é segura após 24 horas do proce- dimento, conforme tolerância. 3.2.2 PANCREATITE CRÔNICA Nessa condição, diferente da pancreatite aguda, o paciente pode convi- ver com a doença durante um longo período de tempo. Ela se caracteriza por episódios de dor abdominal que irradia até as costas. Em alguns ca- sos, essa dor é acompanhada de vômito e diarreia, o que prejudica ainda mais o estado nutricional do paciente a longo prazo. Portanto, o paciente portador de pancreatite crônica pode apresentar, além da desnutrição calórico-proteica, depleção de tecido adiposo, comprometimento da fun- ção imune e deficiências vitamínicas. Quadro 6 - Dietoterapia na pancreatite crônica Nutrientes e Características da Dieta Conduta Objetivo Ingestão Calórica Hipercalórica 30-32 Kcal/Kg de peso Na maioria das vezes não é possível alcançar a oferta energética necessária, podendo ser necessário suplementar, preferencialmente por via oral Carboidratos Normoglicídica 45-60% VET Propiciar oferta de carboidratos com- plexos, ingestão adequada de fibras (não ultrapassar 25g/dia) Proteínas Hiperprotéica 1.2 a 1.5g/Kg de peso Apesar de haver limitação na digestão protéica, não há recomendação da redução em virtude da alta demanda metabólica provocada pela atividade inflamatória Fonte: Espen, 2020. 35Curso Intensivo para Residências | Nutrição | Fisiopatologia e Dietoterapia Aplicada - Parte I Nutrientes e Características da Dieta Conduta Objetivo Lipídios Normolipídica 15-20% VET (quando não houver esteator- reia) Hipolipídica (40-60g/dia) Preferir TCM e AGs monoinsa- turados (azeite oliva) A redução no consumo de lipídios só deve ocorrer quando houver esteator- reia, que ocorre por redução na produ- ção de lipase Os AGs sugeridos apresentam melhor absorção Consistência Dietética Livre Evoluir consistência conforme tolerân-cia Outras recomendações Verificar necessidade de su- plementar cálcio, vit B12, e vit A, D, E e K além de Mg, Zn, Fe e Se Necrose gordurosa formada no intesti- no que impede absorção de cálcio Ausência de protease pancreática para clivar Vit B12 Quando houver esteatose pode haver deficiência de vitaminas lipossolúveis Distribuição de refei- ções ao longo do dia Em média 5 - 6 refeições/dia Minimizar o volume das refeições sem- pre avaliar tolerância Evitar Álcool e fumo Estes hábitos podem piorar o quadro inflamatório da doença Uso de enzimas pan- creáticas Associar à oferta de refeições, prescrição individualizada de 20.000- 50.000 (PhU) a de- pender da preparação A utilização de enzimas é uma estraté- gia para melhorar o consumo alimentar proporcionamento melhor tolerância aos alimentos Fonte: Espen, 2020. A Terapia Nutricional Enteral ou Parenteral pode ser usada tanto na pancrea- tite aguda quanto na pancreatite crônica, devido às limitações absortivas, de tolerância e às alterações metabólicas da doença. Imunonutrientes O uso de probióticos na pancreatite é desencorajado (grau de recomen- dação 0) pois está associado ao aumento de mortalidade nesses indiví- duos.Entretanto, o uso de ômega 3 é recomendado quando houver hiper- trigliceridemia, e pode ser usado em associação às estatinas. Continuação Quadro 6 - Dietoterapia na pancreatite crônica 36Curso Intensivo para Residências | Nutrição | Fisiopatologia e Dietoterapia Aplicada - Parte I DICA: O papel da nutrição, tanto na pancreatite aguda quanto na pancreatite crônica, tem a função de minimizar a utilização do pâncreas, promovendo o “re- pouso pancreático” com o objetivo de poupar o paciente da dor, que geralmen- te ocorre logo após as refeições, além de minimizar a esteatorreia. O uso de enzimas pancreáticas ocorre comumente como uma estratégia para aumentar a tolerância aos alimentos. 04. São características gerais da dieta oral para pacientes com afecções pancreáticas: 🅐 dieta leve com uso de dieta enteral com baixo teor proteico. 🅑 dieta hipogordurosa, com uso de triglicérides de cadeias média e curta. 🅒 dieta branda com uso de triglicérides de cadeias média e curta. 🅓 dieta geral com uso de suplemento oral proteico. 🅔 dieta hipogordurosa com uso de suplemento oral proteico. Clique aqui para ver o gabarito da questão. Assista agora a Pocket Aula sobre Intervenção Nutricional nas Doenças Hepatobiliares e Pancreáticas clicando no ícone ao lado 37 ANOTAÇÕES 38Curso Intensivo para Residências | Nutrição | Fisiopatologia e Dietoterapia Aplicada - Parte I 4. INTERVENÇÃO NUTRICIONAL NAS DOENÇAS ENDOCRINOMETABÓLICAS DIABETES MELLITUS TIPOS 1 E 2 O diabetes mellitus (DM) é um conjunto de distúrbios metabólicos ca- racterizados pela hiperglicemia persistente, resultante da alteração na produção ou na ação da insulina, ou em ambos os mecanismos. A hipergli- cemia persistente está envolvida em uma série de complicações macro- vasculares e microvasculares no indivíduo. O pâncreas é um órgão glandular que desempenha função exócrina e fun- ção endócrina. Um dos principais hormônios secretados pelo pâncreas endócrino é a insulina, que exerce papel central na homeostase da glico- se – principal substrato energético do corpo. Esse hormônio é requerido quando acontece a elevação da glicemia pós- -prandial, a fim de facilitar seu transporte na membrana celular. Ocorren- do a absorção correta da glicose sanguínea, há formação do glicogênio hepático e a inibição da gliconeogênese (produção endógena de glicose). Para ilustrar o mecanismo de ação da insulina no metabolismo da glicose, observe a figura a seguir: Figura 7 - Metabolismo adequado da glicose na presença da atuação da insulina Normal Pâncreas produz insulina Receptor de insulina Glicose entra nas células Fonte: Brassete, 2018. 39Curso Intensivo para Residências | Nutrição | Fisiopatologia e Dietoterapia Aplicada - Parte I Quando a insulina fica impedida de exercer sua função sobre a glicose plasmática, esta não é captada pela célula, ou seja, a glicose não é absor- vida adequadamente pelo nosso corpo, ocorrendo a hiperglicemia, com consequente aumento da glicogenólise hepática, lipólise e catabolismo proteico, podendo ocasionar o diabetes. No diabetes mellitus tipo 1 (DM1), os pacientes apresentam anticorpos para as células das ilhotas circulantes, para a insulina ou para outros an- tígenos das células das ilhotas, o que promoverá a destruição das células beta. A Figura 6 mostra a situação metabólica no DM1. Figura 8 - Metabolismo da glicose na presença do DM1 Tipo 1 Pâncreas não produz insulina Receptor de insulina Glicose não entra nas células Fonte: Brassete, 2018. No diabetes mellitus tipo 2 (DM2), há disfunção das células beta com a resistência à insulina (principalmente nos tecidos-alvo, sobretudo células musculares, hepáticas e adiposas), de forma progressiva, ocasionando a hiperglicemia. Figura 9 - Metabolismo da glicose na presença do DM2 Tipo 2 Pâncreas produz insulina Receptor deinsulina não funciona Glicose não entra nas células Fonte: Brassete, 2018. 40Curso Intensivo para Residências | Nutrição | Fisiopatologia e Dietoterapia Aplicada - Parte I A classificação do diabetes mellitus baseia-se na etiologia. O quadro a se- guir mostra quais são os tipos de diabetes, e os principais tipos são DM1 e DM2. Quadro 7 - Classificação etiológica do DM Tipos de diabetes mellitus 1 Diabetes tipo 1: • tipo 1A: perda de insulina por mediadores autoimunes; • tipo 1B: perda de insulina de causa idiopática. 2 Diabetes mellitus tipo 2: perda gradual da secreção da insulina associada à resis-tência a insulina. 3 Diabetes gestacional: hiperglicemia diagnosticada durante a gestação, sem diagnóstico prévio de DM. 4 Outros tipos de DM: • monogênicos (MODY); • diabetes neonatal; • secundário a endocrinopatias; • secundário a doenças do pâncreas exócrino; • secundário a infecções; • secundário a medicamentos. Fonte: Diretriz SBD, 2020. O diabetes mellitus tipo 1 (DM1) representa de 5% a 10% dos casos de DM, acometendo principalmente crianças e adolescentes e adultos jo- vens. Há dois subtipos: imunomediada (produção de autoanticorpos) e a idiopática (causa desconhecida). Em ambos os tipos, caracteriza-se pela destruição das células β pancreáticas, resultando em deficiência comple- ta de insulina. Os principais sintomas são: hiperglicemia e cetoacidose e é necessário o uso de insulina exógena. O diabetes mellitus tipo 2 (DM2) corresponde a 90% a 95% de todos os casos de DM e pode ocorrer em qualquer idade, sendo mais comum acima de 40 anos. É caracterizada pela deficiência de insulina associada à inefi- cácia das células beta, possui progressão lenta e, geralmente, é ocasiona- 41Curso Intensivo para Residências | Nutrição | Fisiopatologia e Dietoterapia Aplicada - Parte I da pela combinação de fatores genéticos e ambientais (histórico familiar, sedentarismo, obesidade, dietas ricas em gorduras). Para seu controle, a insulina exógena não é obrigatória. À medida que a hiperglicemia progri- de, ocorre aumento da resistência à insulina (RI) nos tecidos periféricos, hiperglucagonemia, gliconeogênese hepática, disfunção das incretinas, lipólise e aumento da reabsorção renal de glicose. Quadro 8 - Características do DM1 e DM2 Classificação do diabetes Causas Sintomas Complicações DM1 Idiopática Produção de au- toanticorpos Polifagia Poliúria Polidipsia Emagrecimento Cetoacidose DM2 História familiar Idade Obesidade Sedentarismo HAS Dislipidemia Diabetes gesta- cional Pré-diabetes prévio Hiperglicemia Fadiga Polidipsia Poliúria Doença cerebrovascular AVC Retinopatia diabética Nefropatia diabética Neuropatia diabética Pré-diabético Fonte: Mahan, 2018. DICA: A glicotoxicidade (ocasionada pelo aumento da produção de glicose he- pática) e a lipotoxicidade (ocasionada pelo aumento dos ácidos graxos livres) contribuem para o desenvolvimento e progressão do DM2. 42Curso Intensivo para Residências | Nutrição | Fisiopatologia e Dietoterapia Aplicada - Parte I Diagnóstico O diagnóstico do DM é feito por exames laboratoriais, pois geralmente a doença é assintomática e sabe-se que, mesmo no estágio de pré-diabe- tes, as alterações fisiopatológicas já podem estar presentes. As categorias de avaliação laboratorial do DM são: glicemia em jejum (GJ), teste oral de tolerância à glicose (TOTG) e hemoglobina glicada (Hb1AC). Os valores de normalidade e os critérios de diagnóstico estão dispostos no Quadro 9. Quadro 9 - Critérios laboratoriais para diagnóstico do diabetes Glicemia em jejum TOTG (mg/dl) Glicemia ao acaso(mg/dl) Hb1AC(%) Normoglicemia <100 < 140 - <5,7 Risco aumentado para DM ou pré- diabetes 100 a 125 140 a 199 - 5,7 a 6,4 Diabético ≥126 ≥200 ≥200 com ≥6,5 Fonte: ADA e SBD, 2019. DIETOTERAPIA NO DIABETES O tratamento nutricional no diabetes é um dos pilares do cuidado integral desse paciente, pois os níveis de H1AC podem diminuir gradativamente, num intervalo de 3 a 6 meses de seguimento do plano alimentar com ati- vidade física regular, monitoramento glicêmico e uso de medicamentos.Para que isso aconteça, a abordagem nutricional precisa ser individuali- zada e com foco na mudança do estilo de vida. Por isso, além dos cálculos nutricionais, outros fatores são levados em conta pelo nutricionista, tais como: elementos culturais, emocionais, financeiros, acesso, regionaliza- ção, preparo dos alimentos e comportamento alimentar. 43Curso Intensivo para Residências | Nutrição | Fisiopatologia e Dietoterapia Aplicada - Parte I Entre os principais objetivos do acompanhamento nutricional e da mu- dança do estilo de vida no diabético, está a manutenção/perda de peso do paciente. A ingestão de dietas com déficit energético de 500 a 750 kcal/ dia ou que forneçam 1.200 a 1.500 kcal/dia para mulheres e 1.500 a 1.800 kcal/dia para homens, adequados ao peso corporal inicial do indivíduo, pode promover a redução de 5% a 7% do peso inicial para obesos, o que melhora os níveis glicêmicos e alivia a necessidade medicamentosa. As principais recomendações de macronutrientes e micronutrientes es- tão dispostas no Quadro 10, conforme as recomendações da American Diabetes Association (ADA). Quadro 10 - Dietoterapia no DM Nutrientes Recomendação diária Carboidratos 45% a 60% *É possível usar estratégias alimentares com menor teor de carboidratos para DM2, desde que acompanhada por profissio- nal de forma individualizada Sacarose Máximo 5% a 10% do VET Frutose Não se recomenda adição aos alimentos Fibra alimentar Mínimo 14 g/1.000 kcal, 20 g/1.000 kcal para DM2 Gorduras 20% a 35% do VET; dar preferência para ácidos graxos monoin- saturados e poli-insaturados; limitar saturados em até 10% e isenta de trans Proteína 15% a 20% do VET Colesterol <300 mg Vitaminas e Minerais Seguem as recomendações da população sem diabetes Fonte: Diretrizes Sociedade Brasileira de Diabetes, 2020. 44Curso Intensivo para Residências | Nutrição | Fisiopatologia e Dietoterapia Aplicada - Parte I Carboidratos É importante se atentar para a prescrição de carboidratos e sem- pre lembrar que a OMS recomenda prescrição mínima de 130 g de car- boidratos para diabéticos, incluindo cereais integrais dentro do contexto diário da alimentação. A sacarose não é proibida e pode ser incluída dentro de uma prescrição saudável e respeitando a recomendação de 5% do VET, uma vez que, comprovada- mente, ela não eleva a glicemia mais do que outros açúcares na mesma quantidade. Fibras O incentivo ao consumo de vegetais, frutas e cereais integrais é aumen- tado, não só pelo alto teor de vitaminas e minerais, mas principalmente pelo alto teor de fibras que existem nesses alimentos. As fibras solúveis atuam no controle da glicemia e do colesterol e as insolúveis aumentam a saciedade e ajudam na perda ou controle do peso. Recomenda-se inges- tão de 20 g/1.000 kcal para diabéticos tipo 2 e 14 g/1.000 kcal para DM1 sem síndrome metabólica. Lipídios O consumo de gorduras segue as recomendações de alimentação saudá- vel (20%-35% do VET), tendo como modelos a Dieta Dash e a Dieta do Me- diterrâneo, nas quais indica-se o uso de ácidos graxos monoinsaturados e poli-insaturados, exclusão de ácidos graxos trans e consumo controlado de ácidos graxos saturados. É aconselhável limitar o consumo da sacarose em alimentos e bebidas açucarados e ultrapro- cessados e preferir o consumo de alimentos in natura, integrais e minimamente proces- sados. 45Curso Intensivo para Residências | Nutrição | Fisiopatologia e Dietoterapia Aplicada - Parte I DICA: A dieta Dash tem como característica o menor percentual de lipídios to- tais e a dieta do mediterrâneo tem maior proporção entre ácidos graxos mo- noinsaturados e ácidos graxos poli-insaturados. Vitaminas e minerais As necessidades de micronutrientes podem ser alcançadas pelo consu- mo adequado de frutas, legumes e hortaliças diariamente. Diabéticos precisam consumir o mínimo de 2 a 4 porções de frutas, pelo menos uma rica em vitamina C (frutas cítricas), e de 3 a 5 porções de hortaliças cruas e cozidas. As deficiências nutricionais devem ser avaliadas de forma individuali- zada e as mais relatadas são defi- ciência de vitamina D, B12, zinco e magnésio, mas a suplementação não deve ser prática rotineira no trata- mento nutricional. Edulcorantes Os edulcorantes (adoçantes artificiais e não nutritivos) não são funda- mentais no tratamento do diabetes, mas podem ser consumidos por dia- béticos desde que consumidos dentro das recomendações estabeleci- das. Justifica-se seu uso pela flexibilidade no plano alimentar e redução do consumo de açúcar de adição e no aporte energético da dieta. Os edulcorantes permitidos pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), no Brasil, são sorbitol, manitol, isomaltitol, maltitol, sacarina, ci- clamato, aspartame, estévia, acessulfame-K, sucralose, neotame, tauma- tina, lactitol, xilitol e eritritol. Idosos, gestantes ou lactentes, vegetarianos restritos ou aqueles em restrição calórica podem necessitar de suplementação. 46Curso Intensivo para Residências | Nutrição | Fisiopatologia e Dietoterapia Aplicada - Parte I Contagem de carboidratos A contagem de carboidratos é uma ferramenta que pode ser incluída no tratamento do diabetes, sendo sua eficácia mais comprovada para DM1. Essa estratégia possibilita ao diabético uma flexibilidade maior na ali- mentação, ou seja, consumir alimentos mais variados e, ao mesmo tempo, obter controle glicêmico a partir do momento que ele sabe a quantidade total de carboidratos que consome. Esse controle da quantidade de carboidrato pode ser feita por meio do uso de lista de substituição ou equivalentes ou pela contagem em gramas de carboidratos. Dessa forma, o paciente pode ajustar suas doses de in- sulina. 1 porção de carboidrato = 15 g de carboidrato = 1 UI de insulina rápida ou ultrarrápida. 05. Uma nutricionista recebe em seu consultório um paciente de 66 anos recentemente diagnosticado com diabetes mellitus tipo 2. Durante a anamnese, a nutricionista observa monotonia alimentar e aversão a novos tipos de alimentos e formas de preparo. Nesse contexto, considere as afirmações abaixo. I. Evidências científicas demonstram que a intervenção nutricio- nal tem impacto significativo na redução da hemoglobina glicada (HbA1c) no diabetes mellitus tipo 2 (DM2), após 1 a 3 meses de seguimento com profissional especialista, dependendo do tempo de diagnóstico da doença. II. A abordagem do manejo nutricional deve apresentar caráter mais subjetivo, de olhar comportamental, colocando o indivíduo no centro do cuidado. 47Curso Intensivo para Residências | Nutrição | Fisiopatologia e Dietoterapia Aplicada - Parte I III. O controle metabólico é apontado como a pedra angular do manejo do diabetes, pois alcançar um bom controle reduz o risco de complicações microvasculares e pode, também, minimizar as chances de doenças cardiovasculares. IV. O consumo dos macronutrientes em proporções ideais deverá ser respeitado uma vez que estudos demonstraram impacto sig- nificativo destes na redução da glicemia de jejum. As orientações presentes nas Diretrizes da Sociedade Brasileira de Diabetes 2017-2018, estão em consonância com as afirmativas: 🅐 II e III. 🅑 III e IV. 🅒 I e II. 🅓 I e IV. Clique aqui para ver o gabarito da questão. Acesse aqui o comentário das cinco questões anteriores 4.2 DOENÇAS DA TIREOIDE A tireoide é uma glândula responsável por produzir os hormônios triiodo- tironina (T3), tiroxina (T4), que contém quatro moléculas de iodo, além do T3 reverso e da calcitonina, que influenciam direta e indiretamente em todos os órgãos e tecidos do corpo humano, participando de muitos processos químicos no nosso organismo, como o metabolismo energéti- co, de macronutrientes (carboidratos, proteínas e lipídios) e da frequên- cia cardíaca. Por isso, qualquer alteração na produção de tais hormônios poderá desencadear manifestações clínicas de hipertireoidismo e hipo- tireoidismo. 48Curso Intensivo para Residências | Nutrição| Fisiopatologia e Dietoterapia Aplicada - Parte I Ela é localizada na porção anterior do pescoço e logo abaixo da cartilagem cricoide (o famoso pomo de Adão). Os lobos da tireoide (ou seja, as suas metades) unem-se pelo istmo (sua parte central), dando-lhe o aspecto de um laço ou aparência de uma borboleta. Figura 10 - Localização dos hormônios tireoidianos Glândula tireoide Lobo direito Istmo Lobo esquerdo Glândula tireoide Lobo esquerdo Lobo direito Istmo Paratireoides Fonte: Estadão, 2018. O quadro a seguir demonstra a atuação dos hormônios T3 e T4, denomina- dos hormônios tireoidianos. Quadro 11 - Atuação dos hormônios tireoidianos no corpo Local da atuação Alteração causada Transcrição genética Aumenta quantidade de enzimas e proteínas transportadoras, acelerando as reações químicas Metabolismo celular Aumenta o número e atividade das mitocôndrias Aumenta transporte de íons na membrana celular Aumenta a atividade da sódio/potássio ATPase Crescimento Ossos e cartilagem amadurecem Induzem síntese de GH Fonte: Chemin e Mura, 2008. 49Curso Intensivo para Residências | Nutrição | Fisiopatologia e Dietoterapia Aplicada - Parte I Local da atuação Alteração causada Metabolismo de carboidratos e gorduras Aumenta a absorção de carboidratos Estimula gliconeogênese Estimula secreção de insulina Aumenta mobilização de ácidos graxos Diminui a colesterolemia Gasto energético Aumenta produção de calor e gasto energético Sistema cardiorrespiratório Aumenta frequência cardíaca Aumenta sensibilidade aos receptores adrenérgicos Aumenta a frequência respiratória Sistema nervoso Produz efeitos excitatórios Fonte: Chemin e Mura, 2008. O T3 reverso é um isômero do T3 e fisiologicamente inativo, ou seja, nosso corpo é incapaz de utilizá-lo. Ele é produzido muito pouco pela ti- reoide, mas pode ser produzido por outros órgãos a partir da conversão do T4 pela enzima deionidase. Outro hormônio tireoidiano é a calcitoni- na que participa da homeostase do cálcio, regulando a concentração de cálcio no sangue. Continuação Quadro 11 - Atuação dos hormônios tireoidianos no corpo O T4 é formado em maior quantidade, mas o T3 é quatro vezes mais potente e é tam- bém mais utilizado pelo nosso corpo. 50Curso Intensivo para Residências | Nutrição | Fisiopatologia e Dietoterapia Aplicada - Parte I Figura 11 - Regulação da secreção hormonal tireoidiana Hipotálamo TRH Hipófise TSH Tireoide T3 e T4 INIBIÇÃO INIBIÇÃO Fonte: Adaptado de Chemin e Mura, 2008. Síntese dos hormônios tireoidianos Os hormônios tireoidianos são formados dentro dos folículos da tireoide mediante a captação de iodeto da corrente sanguínea e sua incorporação aos resíduos de tirosina da tireoglobulina (que é uma proteína coloide, com cadeias laterais ricas em resíduos de tirosina). O processo de forma- ção desses hormônios está resumido na figura a seguir. Figura 12 - . Processo de formação dos hormônios tireoidianos CAPTAÇÃO DO IODETO FORMAÇÃO DE T3 e T4 TRANSPORTE DO IODETO PARA O INTERIOR DO FOLÍCULO ACOPLAÇÃO IODO + TIROSINA CAPTAÇÃO DO IODETO IODETAÇÃO DA TIROSINA Fonte: Adaptado de Chemin e Mura, 2008. 51Curso Intensivo para Residências | Nutrição | Fisiopatologia e Dietoterapia Aplicada - Parte I Após a formação, o T4 será convertido em T3 para poder agir nos órgãos- alvo e esse processo ocorre pela ação das enzimas deionidases (que são dependentes de selênio) A oxidação de iodeto forma espécies reativas de oxigênio (EROs) que deve ser neutralizada pela glutationa peroxidase, que é dependente de selênio. TIPOS DE DISTÚRBIOS DA TIREOIDE 4.2.1 HIPOTIREOIDISMO É uma disfunção na tireoide, na qual ocorre baixa produção ou hipoati- vidade dos hormônios. É uma doença que acomete predominantemente mulheres, e a forma mais comum de hipotireoidismo é a tireoidite de Hashimoto, doença em que o sistema imune ataca e destrói as células ti- reoidianas. Os principais exames que detectam a situação de hipotireoi- dismo são de anticorpos anti-TPO (antitireoideperoxidase) e o anti-TGB (antitireoglobulina), ambos são marcadores que indicam se o sistema imu- ne está atacando a glândula tireoide ou algum componente da glândula. 4.2.2 HIPERTIREOIDISMO Hipertireoidismo é o aumento da síntese e liberação dos hormônios ti- reoidianos pela glândula tireoide. A elevação da síntese hormonal pode acontecer por disfunção endógena ou pelo uso exógeno de hormônios. A principal causa do hipertireoidismo é a doença de Graves, também de mecanismo autoimune, e os sintomas mais relatados no hipertireoidismo são: perda de peso, tremores e taquicardia. A seguir, temos um quadro comparativo de causas, sintomas e tratamen- to nas doenças da tireoide: 52Curso Intensivo para Residências | Nutrição | Fisiopatologia e Dietoterapia Aplicada - Parte I Quadro 12 - Causas, sintomas e tratamento das doenças da tireoide Sintomas Tratamento Hipotireoidismo - Fadiga - Esquecimento - Depressão - Menstruação intensa - Cabelos secos e grossos - Oscilação do humor - Ganho de massa corporal - Voz rouca - Pele seca e áspera - Constipação intestinal Medicamentos repositores do hormônio da tireoide (levotiro- xina) e intervenção nutricional (soja, iodo e selênio) Hipertireoidismo - Intolerância ao calor - Sudorese - Perda de massa corporal - Alterações do apetite - Evacuações frequentes - Alterações visuais - Fadiga e fraqueza muscular - Distúrbios menstruais - Comprometimento da fertilidade - Transtornos mentais - Transtornos do sono - Tremores - Aumento da tireoide - Uso de drogas antitireoidianas e betabloqueadores (quando necessário) - Suplementação vitamínica - Iodo radioativo - Cirurgia de retirada Fonte: Mahan, 2018. DIETOTERAPIA NO HIPERTIREOIDISMO: O funcionamento adequado da tireoide tem uma relação direta com a função hipotalâmica, hipofisária, suprarrenal, cardiovascular e imunológica, assim como é dependente de macro e micronutrientes. 53Curso Intensivo para Residências | Nutrição | Fisiopatologia e Dietoterapia Aplicada - Parte I As recomendações nutricionais nos distúrbios da tireoide para macro- nutrientes são as mesmas para a população não acometida pela doença. As pesquisas e as recomendações se voltam para nutrientes específicos que influenciam o funcionamento da glândula. São eles: iodo, selênio, zin- co, ferro, flavonoides, glicosinolatos e isotianatos. No quadro a seguir estão dispostos os nutrientes importantes para o bom funcionamento da tireoide. Quadro 13 - Dietoterapia no hipertireoidismo Nutrientes Ação na tireoide Iodo - Importante cofator e estimulador da enzima TPO - Excesso prejudica bloqueia a síntese hormonal e bloqueia TPO Selênio - Funcionamento das deionidases (conversão de T4 em T3) - Participa do processo antioxidante Ferro - Participa da formação da TPO Zinco - Aumenta a atividade da deiodinase tipo 2 (DI2) Glicosinolatos - Atividade antitireoidiana - O tiocianato e o isotiocianato competem com o iodeto pela entrada nos folí- culos tireoidianos Flavonóides - Inibe a vitamina D1 (localizada na tireoide) - Inibe captação de iodo Glúten - Aumento do número de anticorpos tireoidianos Fonte: Chemin e Mura, 2008. Entre todos os nutrientes estudados, o iodo tem importância central no metabolismo tireoidiano por ser a matéria-prima dos hormônios. A de- ficiência de iodo pode originar o bócio (doença que causa o aumento do volume da tireoide) e o excesso de iodo pode provocar hipertireoidismo em idosos, tireoidite autoimune e hipotireoidismo. Por isso, é importante rastrear pessoas que consomem dietas hipossódicas por longos perío- dos, assim como com alto consumo de sal, shoyu e produtos industriali- zados. Para isso, recomenda-se o exame de iodo urinário, que reflete a ingestão aguda desse nutriente. 54Curso Intensivo para Residências | Nutrição | Fisiopatologia e Dietoterapia Aplicada - Parte I Quanto ao consumo de soja, o prejuízo para a tireoidedá-se somente quando consumida em grande quantidade e de forma crônica ou sob a for- ma de suplementos de isoflavonas ou fórmulas à base de soja (caso das crianças). Os glicosinolatos estão presentes em alimentos como brócolis, couve- -flor, couve-de-bruxelas, couve-manteiga e repolho, quando consumidos crus. Assista agora a Pocket Aula sobre Intervenção Nutricional no Sistema Endocrinometabólico clicando no ícone ao lado 55 ANOTAÇÕES 56Curso Intensivo para Residências | Nutrição | Fisiopatologia e Dietoterapia Aplicada - Parte I 5. INTERVENÇÃO NUTRICIONAL NA OBESIDADE A obesidade é definida como uma doença crônica de etiologia complexa e multifatorial e caracteriza-se pelo excesso de gordura corporal (isto é, acúmulo de tecido adiposo localizado ou generalizado), mas a definição de obesidade mais utilizada é baseada no índice de massa corporal, o cha- mado IMC. O desenvolvimento da obesidade re- sulta da interação entre o estilo de vida do indivíduo, predisposição ge- nética e fatores emocionais. Entre as principais consequências dessa doença estão os fatores de risco coronariano (dislipidemia, diabetes, hipertensão e hipertrofia ventricular esquerda) e condições de morbida- de, tais como: colelitíase, esteatose hepática, osteoartrite, osteoartrose, apneia obstrutiva do sono e altera- ções da ventilação pulmonar. O tecido adiposo é um tecido metabolicamente ativo e funciona como um órgão de ações autócrinas, parácrinas e endócrinas, essencial para esto- car energia e manter o equilíbrio energético corporal. Sabe-se que a principal causa do aumento da massa adiposa e posterior instalação da obesidade é o balanço energético positivo, ou seja, um pro- cesso em que há a ingestão excessiva de calorias com relação ao baixo gasto energético durante certo período. O termo excesso de peso ou de massa corporal é relativo somente ao aumento de peso e a obesidade é referente ao aumento de gordura corporal. 57Curso Intensivo para Residências | Nutrição | Fisiopatologia e Dietoterapia Aplicada - Parte I Esse desequilíbrio energético, interagindo com fatores genéticos, am- bientais, comportamentais e socioculturais, passam a desencadear al- gumas disfunções que levam à instalação do quadro de obesidade. Es- sas disfunções são: aumento da ingestão alimentar, diminuição do gasto energético, aumento da capacidade de estocar gordura, diminuição da ca- pacidade de oxidação das gorduras. Cada um desses fatores, por sua vez, tem múltiplas causas, conforme disposto na figura a seguir. OBESIDADE Aumento da ingestão alimentar Dieta rica em gordura Privação do sono Fast- food Alimentação hedônica Fatores psicológicos Alimentos hipercalóricos Grandes porções Pouca saciedade Aumento da fome Lesões no hipotálamo/SNC Oxidação deficiente de gorduras Hipersensibilidade à insulina Menor lipólise Maior atividade de LPL Dieta com excesso de CHO Produção elevada de glicose endógena Diminuição do gasto energético Baixo GER Pouca massa magra Estilo de vida sedentário Perda ponderal Deficiências hormonais Redução da atividade involuntária Maior capacidade de estocar gordura Aumento do número de adipócitos Lipogênese aumentada Maior atividade de LPL Efeitos hormonais Fatores genéticos e fatores ambientais A obesidade é uma doença poligênica e nos seres humanos a carga gené- tica explica de 40% a 70% da diferença de peso corporal entre os indiví- duos. Os principais genes envolvidos na obesidade são: 58Curso Intensivo para Residências | Nutrição | Fisiopatologia e Dietoterapia Aplicada - Parte I Quadro 14 - Expressão de proteínas relacionadas à obesidade Gene Proteína expressa LEP Leptina LEPR Receptor de leptina POMC Pró-opiomelanocortina PCSKI Proproteína convertase 1 MC4R Receptor de melanocortinas tipo 4 NPY5R Receptor de neuropeptídio Y tipo 5 Fonte: Mancini, 2015. Todas essas expressões genéticas afetam o controle do balanço energé- tico, cuja característica é o aumento no apetite e a redução de saciedade. Além disso, é importante lembrar que a obesidade puramente genética é muito rara, logo, mesmo que se tenha o gene, é necessária a interação com o ambiente. Na maioria dos casos, é o “ambiente obesogênico” (sedenta- rismo associado a maus hábitos alimentares) que determina a obesidade, em maior ou menor grau, a depender da suscetibilidade genética. Fatores hormonais Como dito anteriormente, o tecido adiposo é um tecido metabolicamente ativo com função endócrina (entre outras atividades), pois secreta peptí- deos que são chamados adipocitocinas (ou adipocinas) e que, por sua vez, secretam hormônios que regulam a função neuroendócrina e participam da homeostase energética. tecido adiposo adipocinas hormônios -Homeostase energética - Função neuroendócrina 59Curso Intensivo para Residências | Nutrição | Fisiopatologia e Dietoterapia Aplicada - Parte I As adipocinas envolvidas na gênese da obesidade são: leptina, adiponec- tina, visfatina e resistina. Existem também algumas proteínas imunológi- cas que atuam na resposta inflamatória crônica da obesidade e, por isso, são também consideradas adipocinas (mas não estão no tecido adiposo); são elas: fator de necrose tumoral (TNF), a interleucina-6 (IL-6), a IL-1, a MCP-1 e mediadores e fatores do complemento. Quadro 15 - Ação de citocinas associadas à obesidade Citocina Ação Leptina - Citocina pró-inflamatória - Sinal de adiposidade - Reduz a expressão do neuropeptídeo Y, consumo alimentar, da gordu- ra corporal, dos níveis de glicose, insulina e cortisol plasmáticos - Aumento do gasto energético e produção de calor - Hiperleptinemia associada à hiperinsulinemia Adiponectina - Proteína com ação anti-inflamatória - Reduz a gliconeogênese hepática e a glicemia - Aumento da sensibilidade periférica à insulina e da oxidação lipídica Fonte: Mancini, 2015. Fatores metabólicos Obesos têm maiores concentrações de ácidos graxos livres circulantes, pois o tecido adiposo aumentado realiza maior lipólise de triglicérides, e a relação entre quantidade de tecido adiposo e ácidos graxos livres circu- lantes é diretamente proporcional. Nessa situação, quando há necessida- de de energia, utilizam-se preferencialmente ácidos graxos em excesso como fonte de energia em detrimento do consumo de glicose. Esse efeito, possivelmente, gera um feedback negativo sobre a ativida- de da glicogênio-sintase, levando a uma hiperinsulinemia sistêmica, pois afeta o tecido adiposo, músculo e fígado. 60Curso Intensivo para Residências | Nutrição | Fisiopatologia e Dietoterapia Aplicada - Parte I Figura 13 - Mecanismos fisiológicos associados à obesidade Macrófagos tipo M2 TECIDO ADIPOSO MAGRO EXCESSO ALIMENTAR TECIDO ADIPOSO OBESO Infiltração de Macrófagos tipo M1 Inflamação Produção de glicose hepática Ingestão alimentar Gasto Energético Captação de Glicose Oxidação de AGL MÚSCULO FÍGADO Glicogenólise Gliconeogênese Glicemia Liberação alterada de adipocinas Adiponectina AGL RBP4 Leptina TNF-alfa IL-10 Resistina IL-6 Inflamação Acúmulo ectópico de lipídeos Resistência à insulina Inflamação Acúmulo ectópico de lipídeos Resistência à insulina RESISTÊNCIA INSULÍNICA SISTÊMICA Fonte: Mancini, 2015. O excesso de ácidos graxos livres circulantes induz ao acúmulo de gordu- ra no fígado e ocasiona dislipidemia aterogênica. Níveis aumentados de triglicérides levam à redução dos níveis plasmáticos de HDL colesterol e aumentam os de LDL-colesterol. Essa cascata de reação é chamada de lipotoxicidade. A exposição prolongada à hiperglicemia em pacientes obesos pode levar à falência das células beta do pâncreas, ocasionando a deficiência na se- 61Curso Intensivo para Residências | Nutrição | Fisiopatologia e Dietoterapia Aplicada - Parte I creção da insulina. A produção e secreção aumentadas de citocinas infla- matórias em pacientes obesos podem interferir na ação da insulina sobre a supressão da lipólise.
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