Prévia do material em texto
Teoria da literatura II Aula 4: O Formalismo Russo Apresentação No século XX, surgiu, na Rússia, uma importante escola de crítica literária que se denominou Formalismo Russo e que objetivava o estudo da linguagem poética como ela se apresenta. Os acadêmicos que �zeram parte dessa escola, como Viktor Chklovsky, Vladimir Propp, Yuri Tynyanov e Roman Jakobson propunham estudar a especi�cidade e a autonomia da linguagem literária. Nesta aula, compreenderemos que as propostas formalistas são diversi�cadas, portanto, a escola não indica uma única doutrina a ser aplicada aos estudos do texto literário. Assim, será importante estabelecer as semelhanças e diferenças entre cada uma das visões formalistas que se identi�cam através de seus críticos. Objetivos Identi�car os pressupostos do Formalismo Russo e discutir os seus conceitos fundamentais. Formalismo Universidade Estatal de Moscou - É uma das universidades mais antigas e a mais importante da Rússia. Aqui surgiu o Círculo Linguístico de Moscou. | Fonte: Alexander Smagin on Unsplash Origens do Formalismo Russo – O Círculo Linguístico de Moscou e a OPOJAZ 1914 - O INÍCIO A origem do Formalismo Russo encontra-se na Universidade de Moscou, quando, em 1914-15, um grupo de estudantes fundou o Círculo Linguístico de Moscou e se dedicou a desenvolver estudos de linguística e de poética. Entre seus fundadores, destaca-se Roman Jakobson, importante linguista que se dedicou à análise estrutural da linguagem de um modo geral, e da poesia em particular. 1916 - A OPOJAZ Em 1916 é fundada a OPOJAZ – Sociedade para o Estudo da Linguagem Poética, projeto de linguistas e estudiosos de Literatura que tinha como �nalidade consolidar os estudos formalistas. No entanto, uma forte corrente marxista começou a fazer oposição a esse grupo de pesquisadores, valendo-se da força política que, na época, favorecia uma ideologia que vinculava a produção artística a con�itos sociais. Como os formalistas opunham-se a essa visão que, no seu entendimento, limitava a arte, foram perseguidos e se dispersaram pelo ocidente, desenvolvendo trabalhos individualizados. 1 1917 Em 1917, Viktor Chklovsky formulou o ensaio “A arte como procedimento”, no qual propõe uma compreensão da literatura a partir de conceitos linguísticos, baseando-se no argumento de que a língua poética é um desvio da língua cotidiana. 1955 - A REPRESENTAÇÃO A projeção do Formalismo Russo no ocidente também se deve a Victor Erlich, autor da obra Russian Formalism (1955), e Tzvetan Todorov, responsável por coligir textos dos formalistas russos. Este livro, do autor Critovão Tezza, faz uma síntese do pensamento de Bakhtin e apresenta as linhas fundamentais da concepção formalista de poesia. Leitura Entre a prosa e a poesia: Bakhtin e o formalismo russo. Este livro, do autor Critovão Tezza, faz uma síntese do pensamento de Bakhtin e apresenta as linhas fundamentais da concepção formalista de poesia. Marxismo X Formalismo Clique nos botões para ver as informações. • A obra literária é a expressão de seu tempo; • A arte, direta ou indiretamente, re�ete a vida dos homens; • A poesia lírica não se vincula ao espírito social de uma época. Marxismo • Não se importavam com a motivação social da obra; • Defendiam a abordagem morfológica da obra; • O objeto investigado era a própria obra. Formalismo Contrário ao Marxismo, o Formalismo Russo caracterizou-se pela recusa de abordagens sociológica, política e �losó�ca que serviam de base para muitos estudos literários da época. Para os formalistas, a análise literária deveria ser efetuada apenas por meios estéticos, sem relevar aspectos externos da obra. Conceitos fundamentais do Formalismo Russo: estranhamento e literariedade O Formalismo Russo reagiu contra os estudos geneticistas da Literatura, negando uma visão cientí�ca e determinista do texto literário. Os formalistas consideravam a autonomia da obra de arte como objeto de investigação, o que já havia sido esboçado pelos simbolistas franceses, os quais propunham a “arte pela arte”, o que já havia sido proposto, no século XIX, por Edgar Allan Poe. Edgar Allan Poe (1809 - 1849). “Defino a poesia das palavras como Criação Rítmica da Beleza. O seu único juiz é o Gosto.” Fonte: Wikimedia Boris Eichenbaum (1886-1959): Interessava aos formalistas uma relação entre o texto e o leitor na qual a Literatura promova, no destinatário, a reconstituição da realidade através do “estranhamento”. Fonte: Lit fanatic 97 Também contrários à tendência marxista, os formalistas russos não se importavam com a motivação social da obra. O Formalismo ocupa-se da relação entre a mensagem e o destinatário, mas sem vínculos com o contexto social. Por esse motivo, o teórico Boris Eikhembaum propôs que se considerasse uma abordagem morfológica da obra, a �m de que se diferenciasse de outras abordagens, como a psicológica e a sociológica. Pela análise morfológica, o objeto a ser investigado seria a própria obra, enquanto pelas outras abordagens, investigar-se-iam outros aspectos que na obra se re�etem. Antes dos formalistas, na Rússia, considerava-se que a arte corresponde ao pensamento organizado por imagens. Privilegiava-se o conhecimento adquirido com a arte e, para tanto, a imagem, na arte, tinha a função de promover analogias, ou seja, estabelecer semelhanças entre coisas diferentes, o que exigia ser a própria imagem mais simples do que a mensagem que ela pretendia transmitir; além disso, o estudo das imagens estava associado ao estilo de cada autor. (1912) Obra do pintor e escritor Kuzma Petrov. No período pré-formalista considerava-se que a imagem na arte tinha a função de promover analogias. Fonte: Gallery Intell Na análise do texto literário passa a ser considerada não apenas sua a estrutura verbal, como também a percepção do leitor e o reconhecimento de uma nova forma de o autor se expressar. Clique nos botões para ver as informações. Em seu ensaio chamado “O Formalismo Russo” (vide indicação em “Atividades”), Ivan Teixeira aponta o livro Memórias Póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis, como o exemplo mais evidente de estranhamento, considerando que a obra se constitui pela visão de um “defunto autor”. O ESTUDO O leitor, logo no início do texto, passa por um processo de “desautomatização”, ou seja, deixa de ter uma compreensão automática do que lê, tendo em vista que se apresentou a ele uma proposta nova, diferente do que se havia estabelecido anteriormente para a elaboração de uma obra literária. O leitor estranha, de imediato, a “Dedicatória” elaborada pelo autor: “Ao verme que primeiro roeu as frias carnes do meu cadáver dedico como saudosa lembrança estas memórias póstumas”. A PALAVRA Pioneirismo Outro importante morfologista, Roman Jakobson, argumenta que a investigação literária não deve ter como objeto a Literatura, mas a literariedade, ou seja, a especi�cidade do objeto literário, o que privilegia o texto e não o seu autor. É com essa proposta que os formalistas russos se contrapõem a outras correntes de pensamento que também se aplicavam ao estudo literário, como o determinismo e o positivismo. Roman Jakobson (1896 – 1982) – Pioneiro da análise estrutural da linguagem, poesia e arte. Fonte: Muni100 Manifesto da Literariedade Jakobson elaborou um manifesto que esclarece o processo de literariedade: "A poesia é linguagem em sua função estética. Deste modo, o objeto do estudo literário não é a literatura, mas a literariedade, isto é, aquilo que torna determinada obra uma obra literária. E, no entanto, até hoje, os historiadores da literatura, o mais das vezes, assemelhavam-se à polícia que, desejando prender determinada pessoa, tivesse apanhado, por via das dúvidas, tudo e todos que estivessem num apartamento, e também os que passassem casualmente na rua naquele instante. Tudo servia para os historiadores da literatura: os costumes, a psicologia, a política, a �loso�a. Em lugar de um estudo da literatura, criava-se um conglomerado de disciplinas mal-- acabadas.Parecia-se esquecer que estes elementos pertencem às ciências correspondentes: História da Filoso�a, História da Cultura, Psicologia etc., e que estas últimas podiam, naturalmente, utilizar também os monumentos literários como documentos defeituosos e de segunda ordem. Se o estudo da literatura quer tornar-se uma ciência, ele deve reconhecer o 'processo' como seu único 'herói." - EIKHENBAUM, Boris et alii. Teoria da literatura: formalistas russos. Trad. Ana Mariza Ribeiro. et alii. Porto Alegre: Globo, 1978. 1. Os conceitos literariedade (literaturnost) e estranhamento (ostranenie) são as marcas especí�cas da literatura: o dizer algo de outra maneira, que leva a uma compreensão distinta da obra de arte, aquilo que se torna incomum e se afasta do dizer cotidiano. 2. Para os formalistas, a poesia e suas metáforas não estabelecem uma “economia da linguagem”, como ocorre na comunicação verbal cotidiana. Isto cria um afastamento do objeto conhecido de sua função comum. Leia um exemplo: Leitura “Agora sabes que sou verme. Agora, sei da tua luz. Se não notei minha epiderme... É... nunca estrela eu te supus. Mas, se cantar pudesse um verme, Eu cantaria a tua luz! E eras assim... Por que não deste Um raio, brando, ao teu viver? Não te lembrava. Azul-celeste O céu talvez não pôde ser... Mas, ora! en�m, por que não deste Somente um raio ao teu viver? Olho, examino-me a epiderme Olho e não vejo a tua luz! Vamos que sou, talvez, um verme... Estrela nunca eu te supus! Olho, examino-me a epiderme... Ceguei! ceguei da tua luz?” “O Verme e a Estrela”, poema do simbolista brasileiro Pedro Kilkerry (1885-1917). A perspectiva formal da análise literária A Poética A “palavra poética” é o objeto fundamental de estudos dos formalistas russos, e que melhor de�ne a perspectiva da análise literária que os teóricos �liados ao Formalismo apresentam. A Poesia Na poesia, a palavra não tem como única função a mensagem denotativa, a qual remete a uma coisa especí�ca; também não atende exclusivamente ao apelo da emoção. A Estética De acordo com a perspectiva formal de análise literária, é necessário que o leitor investigue a multiplicidade do signo, explorando todas as possibilidades de signi�cação das palavras. Por esse motivo, a semântica é um instrumento de análise da estética da poesia. Acompanhe agora a de�nição de “poética” segundo os formalistas russos: A Prosa O Autor A Obra Sua obra Morfologia do Conto Maravilhoso, publicada em 1928, in�uenciou diversos autores como Todorov, Claude Lévi-Strauss e Haroldo de Campos. Chklovsky, Eichembaum e Todorov elaboraram análises formalistas de textos em prosa, considerando o conceito de “prosa poética”, pelo qual se entende que as propriedades da poesia podem ser utilizadas na narrativa. Também deve ser destacado o nome de Vladimir Propp, teórico estruturalista que analisou os componentes básicos dos contos populares russos, a �m de identi�car os seus elementos indivisíveis, ou seja, Propp analisava os contos com o objetivo de encontrar o núcleo simples dos mesmos, comprovando a existência de uma estrutura comum em todos os contos, como a �gura do herói, a sua luta e a superação das di�culdades. Notas Marxista 1 Conjunto de concepções elaboradas por Karl Marx (1818-1883) e Driedrich Engels (1820-1895) que, baseadas na economia política inglesa do início do século XIX, na �loso�a idealista alemã (esp, Hegel) e na tradição do pensamento socialista inglês e francês (esp. O chamado socialismo utópico), in�uenciaram produndamente a �loso�a e as ciências humanas da Modernidade, além de servir de doutrina ideológica para os países socialistas. (Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa). Referências Próxima aula Métodos dos formalistas russos aplicados à análise de poemas. Explore mais Pesquise na internet, sites, vídeos e artigos relacionados ao conteúdo visto. Em caso de dúvidas, converse com seu professor online por meio dos recursos disponíveis no ambiente de aprendizagem.