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Doenças do Estômago 1 Doenças do Estômago Revisão geral O estômago é dividido anatomicamente em 5 regiões: Em relação à histologia, o estômago possui quatro camadas: 1. Mucosa: é a camada mais interna, apresentando importante papel na secreção gástrica Doenças do Estômago 2 a. Muscular da mucosa 2. Submucosa: composta de tecido conjuntivo denso 3. Muscular externa: dividida em três camadas a. Camada oblíqua interna (exclusiva do estômago) b. Camada circular média c. Camada longitudinal externa 4. Serosa: composta por tecido conjuntivo frouxo e tecido adiposo A unidade anatomofuncional da secreção gástrica é a fovéola gástrica, que são invaginações do epitélio da mucosa que se conectam às glândulas gástricas Essas unidades são compostas por 5 tipos celulares: Células mucosas (da superfície ou do colo): secretam muco Doenças do Estômago 3 Células parietais (ou oxínticas): produção de ácido clorídrico e fator intríseco Células principais (ou zimogênicas): secreção de pepsinogênio e lipase gástrica Células enteroendócrinas (ou células G): secreção de gastrina Células semelhantes às enterocromafins (ou células ECL): secretam histamina ✏ As células mucosas recobrem TODO o estômago, as principais e as parietais estão em grande quantidade no fundo e no corpo, enquanto as enteroendócrinas estão no antro Assim, o suco gástrico resultante é formado e regulado por algumas substâncias: Ácido clorídrico: digestão química dos alimentos e proteção contra agentes biológicos 💭 O omeprazol é da classe dos inibidores da bomba de prótons, então impede a secreção de H+ para o lúmen gástrico e posterior formação de HCl Fator intríseco: liga-se à vitamina B12 para facilitar a absorção no duodeno ✏ Em pacientes com gastrite autoimune, ocorre destruição das células parietas e consequente deficiência do fator intríseco, resultando na anemia perniciosa Gastrina: estimula a secreção de histamina pelas células ECL Histamina: estimula a produção de ácido clorídrico pelas células parietais Doenças do Estômago 4 💭 Por isso, em alguns casos, utilizam-se anti-histamínicos no tratamento de produção excessiva de ácido clorídrico Prostaglandinas (PgE2 e PgI2): protegem a mucosa gástrica por diversos mecanismos (aumento da secreção de muco e bicarbonato, renovação do epitélio, diminuição da secreção de ácido clorídrico) 💭 O uso de anti-inflamatórios não esteroidais (AINEs), como o ácido acetilsalicílico e ibuprofeno, inibe as prostaglandinas, podendo levar à formação de úlceras gástricas Gastropatias e gastrites As gastropatias são um conjunto de condições que causam inflamação no estômago, porém SEM a presença de componentes inflamatórios As gastrites são doenças que envolvem a inflamação do epitélio gástrico COM a presença de componentes inflamatórios 💭 Na clínica: azia com desconforto abdominal = dispepsia funcional / quadro histopatológico de inflamação da mucosa gástrica = gastrite Gastropatias Podemos dividir as gastropatias em duas categorias: Gastropatia aguda: predominam lesões degenerativas, com focos hemorrágicos e intensa inflamação do epitélio Gastropatia crônica (ou reativa): evolução de uma gastropatia aguda com persistência dos agentes agressores; predominam alterações regenerativas, como a hiperplasia gástrica (tortuosidade e alongamento das fovéolas), edema e fibrose Doenças do Estômago 5 Gastrites Podemos classificar as gastrites em duas categorias: Gastrite aguda: ocorre principalmente por causas infecciosas (H. pylori), mas é pouco diagnosticada na prática pela discreta situação clínica; caracteriza-se por edema (perda das pregas gástricas), degeneração do epitélio e infiltrado mononuclear neutrofílico Gastrite crônica: é a forma mais comum de inflamação gástrica, sendo discutida mais a frente Patogenia As principais causas das gastropatias e das gastrites são: Anti-inflamatórios não esteroidais (AINEs): inibem a COX-1 e a COX-2, impedindo a síntese de prostaglandinas Álcool: promove a dissolução do muco, agredindo o epitélio gástrico; pode ocorrer liberação intensa de histamina, causando aumento da permeabilidade vascular e hiperemia Nicotina: promove vasoconstrição, que ocasiona leve isquemia na mucosa, acarretando na redução da secreção de bicarbonato Refluxo biliar: a entrada de bile em excesso no suco gástrico agride o epitélio, levando à inflamação Gastrite crônica Caracteriza-se pela reação inflamatória na mucosa, com infiltrado polimorfonuclear linfoplasmocitário difuso evidente, além do infiltrado mononuclear Em relação à topografia, classificamos a gastrite crônica em: Gastrite antral Gastrite de corpo Em relação à etiologia, existem duas origens: Gastrite por Helicobacter pylori (muito comum) Gastrite aguda Doenças do Estômago 6 Pangastrite (atinge todo o órgão) Gastrite autoimune (rara) Gastrite crônica por H. pylori É uma infecção crônica adquirida na infância, de maior prevalência em regiões com baixa condição socioeconômica A intesidade da lesão está relacionada com cepas virulentas que expressam dois genes específicos: CagA: maior adesão ao epitélio gástrico e maior resposta inflamatória VacA: citotoxina vacuolizante que agrava o dano celular Além disso, predominam duas formas: Gastrite antral: associa-se com hipersecreção gástrica, produzindo úlcera péptica duodenal (gene CagA positivo), normalmente focal (única) Gastrite do antro e do corpo: inicia-se no antro e evolui rapidamente para atrofia e metaplasia intestinal em diversos pontos do corpo do estômago, originando a gastrite crônica atrófica multifocal; produz úlcera péptica gástrica e hipocloridria 🔎 Diagnóstico: o método mais rápido e barato é o teste de urease, que é a enzima que o H. pylori possui para neutralizar a acidez estomacal; quando o teste dá urease-positivo, o paciente está infectado Os achados histopatológicos são: Atrofia da mucosa Infiltrado neutrofílico Infiltrado linfoplasmocitário Doenças do Estômago 7 Focos hemorrágicos Presença de folículos linfóides na lâmina própria H. pylori aderido na superfície das células epiteliais 💊 Tratamento: inclui a combinação de antibióticos específicos (tetraciclina ou claritromicina + amoxicilina ou metronidazol) e inibidores da bomba de prótons (omeprazol) ou anti-histamínicos H2 (cimetidina ou ranitidina) Gastrite crônica autoimune É uma anomalia rara do sistema imunológico que produz anticorpos anti-células parietais A doença apresenta evolução lenta e assintomática, chegando a décadas sem manifestações clínicas A patogenia da doença inicia pela destruição das células parietais, o que acarreta a baixa produção de ácido clorídrico (hipocloridria) e fator intríseco, o que leva a duas importantes repercussões: Hipergastrinemia: a baixa produção de ácido clorídrico estimula a secreção em excesso de gastrina; essa condição pode ocasionar hiperplasia das células ECL, que pode complicar em tumor carcinóide gástrico Anemia perniciosa (anemia megaloblástica): tem desenvolvimento lento e surge da deficiência de vitamina B12 pela falta de fator intríseco, resultando em diversas complicações sistêmicas, como neuropatias O estado de inflamação da gastrite autoimune se restringe ao corpo e antro do estômago, que Focos de metaplasia intestinal (setas) Doenças do Estômago 8 apresentam focos difusos de atrofia da mucosa e metaplasia intestinal Complicações Atrofia da mucosa: ocorre perda das glândulas gástricas existentes na mucosa Metaplasia intestinal: ocorre substitução do epitélio gástrico por um epitélio similar ao existente no intestino 🔬 Podemos evidenciar a metaplasia intestinal através da presença de células caliciformes no exame histopatológico Doença ulcerosa péptica: ocorre pela cronicidade da gastrite, será discutida a seguir Doença ulcerosa péptica Surge da agressão contínua do epitélio pelo suco gástrico, contendo ácido e pepsinas É uma complicação importante das gastrites crônicas,principalmente aquela ocasionada pelo H. pylori 💭 Após a universalização do tratamento das gastrites crônicas por H. pylori, a incidência da doença ulcerosa péptica diminuiu drasticamente As úlceras mais comuns se localizam no duodeno ou no próprio estômago Patogenia A formação de uma úlcera se inicia pelo desequilíbrio dos fatores protetores e agressores do epitélio gástrico, e segue em um processo contínuo: 1. Mucosa normal Doenças do Estômago 9 2. Erosão (restringe-se apenas a mucosa) 3. Úlcera (atravessa a muscular da mucosa) Morfologia Na grande maioria dos casos, a úlcera péptica é única e apresenta formato arredondado com bordas regulares Uma úlcera péptica pode ser dividida em quatro camadas: 1. Necrose fibrinoide 2. Infiltrado inflamatório neutrofílico 3. Tecido de granulação 4. Tecido fibroso cicatricial No processo de cicatrização de uma úlcera, as pregas gástricas convergem para o centro da ferida, originando o "aspecto estrelado" Complicações Hemorragia: é a consequência mais comum, podendo inclusive ser a primeira manifestação; resulta em hematêmese ou melena Perfuração: ocorre o atravessamento das camadas histológicas, de modo que atinja a camada serosa ou mesmo a cavidade peritoneal Estenose: ocasiona a obstrução do lúmen gástrico ou duodenal Pólipos Doenças do Estômago 10 São crescimentos de tecidos em uma membrana mucosa por causas inflamatórias, ectópicas ou neoplásicas Comumente, são atribuídos dois tipos de pólipos: Pólipo séssil: possui base larga e fixada diretamente na mucosa Pólipo pediculado: apresentam pedículo, adquirindo formato semelhante a um cogumelo Pólipos hiperplásicos São os mais comuns e ocorrem de forma séssil, pequena e múltipla, sem relação neoplásica; ocorre no antro e no corpo gástrico Originam-se de mucosas afligidas por gastrite crônica atrófica (principalmente associada ao H. pylori), quando não ocorre a renovação epitelial As características histológicas incluem: glândulas foveolares irregulares (aspecto de saca-rolha), lâmina própria edematosa e erosão superficial Pólipos de glândulas fúndicas São lesões sésseis, múltiplas, de tamanho entre 2 a 3 cm e localizadas no corpo e no fundo gástrico Doenças do Estômago 11 Estão relacionados com a polipose adenomatosa familiar (PAF) e uso de inibidores de bombas de prótons Não possuem relação neoplásica Histologicamente, são compostos por glândulas císticas dilatadas, recobertas por células foveolares, parietais e principais Pólipos adenomatosos São lesões únicas, sésseis ou com pedículo, localizadas no antro Estão relacionados com gastrite crônica, que apresenta atrofia e metaplasia intestinal Podem ser definidos como uma neoplasia benigna com potencial maligno Apresentam displasia de baixo ou alto grau Displasia de baixo grau (alargamento, alongamento e hipercromasia dos núcleos, aglomeração epitelial e pseudoestratificação) Displasia de alto grau (arquitetura irregular com brotamento glandular) Doenças do Estômago 12 Neoplasias malignas Adenocarcinoma É o câncer de estômago mais comum, apresentando etiologia multifatorial de interação ambiente-indivíduo, e ocorre em maior proporção nos homens Fatores de risco Infecção por H. pylori: principalmente pela cepa virulenta que apresenta proteína cagA, pois ela interfere no ciclo celular Fatores genéticos: polimorfismos nas citocinas e em seus receptores (IL-1B, TNF-alfa, IL-10, IL-8 e TLR-4), bem como em indivíduos com polipose adenomatosa familiar Dieta: dieta rica em sal, nitratos, carcinógenos nitrosos, bem como indivíduos obesos Tipos Tipo intestinal: associada à infecção pelo H. pylori, fatores da dieta, genéticos e tabaco Glândulas atípicas justapostas, sem secreção de muco e com núcleos hipercromáticos e pleomórficos Doenças do Estômago 13 Tipo difuso: patogênese desconhecida, mas relacionada com mutação no gene CDH1, codificador da E-cad Patogenia Supõe-se dois tipos de evoluções para o adenocarcinoma gástrico Com lesões pré-cancerosas: a partir da gastrite crônica, com atrofia e metaplasia intestinal, as alterações moleculares se apresentam suficiente para induzir mutações que iniciem um processo displásico carcinogênico, sempre ocasionando o adenocarcinoma intestinal Sem lesões prévias: a gastrite crônica e a infecção por H. pylori cagA+ podem ser suficientes para desenvolver mutações e induzir o adenocarcinoma, seja do tipo intestinal ou do tipo difuso Classificação De acordo com a invasão da parede, o adenocarcinoma gástrico pode ser classificado em: Precoce: a lesão neoplásica se restringe à camada mucosa Células neoplásicas isoladas contendo grandes vacúolos de mucina, criando uma morfologia de "anel de sinete" Ocorre reação desmoplásica, com enrijecimento da parede gástrica e linite plástica (estômago em cantil) Doenças do Estômago 14 Avançado: ultrapassa a mucosa, podendo atingir até a camada serosa Além disso, macroscopicamente, o tipo morfológico do tumor pode ser classificado de acordo com os critérios de Borrman: 1. Vegetante (ou polipoide) 2. Ulcerado (ou ulcerovegetante) 3. Ulceroinfiltrante 4. Infiltrante: causa a linite plástica (ou estômago em cantil) Prognóstico Ocorre invasão por contiguidade do fígado, pâncreas e peritônio A metástase possui algumas características específicas: Nódulo de Virchow: linfonodo sentinela supraclavicular palpável Disseminação hematogênica para os pulmões, fígado ou ossos Doenças do Estômago 15 Tumor de Krukenberg: tumor metastático nos ovários Sinal da irmã Maria José: nódulo palpável no umbigo Linfoma MALT gástrico É o câncer originado a partir do tecido linfoide associado à mucosa gástrica Fatores etiológicos Infecção prévia pelo H. pylori (promove a formação de infiltrado linfocitário) Fusão dos genes API2 e MLT, originando a proteína anti-apoptótica API2-MLT Inativação dos genes p53 e p16 Aspectos histológicos Lesão linfoepitelial (infiltração dos linfócitos B nas glândulas gástricas) Pleomorfismo linfocitário (linfócitos pequenos, centrócitos, células monocitoides, plasmócitos) Outras neoplasias malignas Tumor carcinoide (gastrinoma) Tem origem nas células neuroendócrinas (células semelhantes às enterocromafins), ocasionando produção excessiva de gastrina e outras substâncias endócrinas Associada à gastrite crônica autoimune Síndrome de Zollinger-Ellison: o excesso de gastrina ocasiona a produção excessiva de ácido clorídrico, formando úlceras pépticas agressivas GIST Doenças do Estômago 16 Atinge as células intersticiais de Cajal, pertencentes ao sistema nervoso entérico Associada à infecção prévia por H. pylori Ocasiona importante perda sanguínea, com possibilidade de anemia
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