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2020 2 - Bloco 02 - Literatura Contemporânea 3

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Literatura Contemporânea - Unidade Nº 3 - Tendências e Narrativas Curtas 
 
 
 
Literatura 
Contemporânea 
 
 
Unidade 3 - Tendências e Narrativas Curtas 
 
 
 
Leonora Gerardino 
 
 
Literatura Contemporânea - Unidade Nº 3 - Tendências e Narrativas Curtas 
 
 
Introdução 
Caros alunos, vocês já pararam para pensar a respeito das tendências 
contemporâneas na literatura brasileira? Já comparou um enredo de prosa de outras 
épocas literárias com a atual e percebeu diferenças na construção do texto? Você sabia 
que temos técnicas inovadoras denominadas como “mini-textos”? O percurso e as 
aventuras de obras e escritores ao longo da história da literatura nos conduziram à 
contemporaneidade, em que o rigor das estruturas eruditas deram lugar a tradições 
muito mais ligadas à experimentação e a inovação formal como regras. 
Além disso, atualmente, vemos a literatura adentrar e discutir universos 
temáticos muito mais abundantes, em que escritores, bombardeados pela profusão 
de informações da era digital, aceitam se arriscar por campos antes inusitados da 
criação. 
Nesta unidade, iremos dar destaque as tendências que observamos na literatura 
ao adentrar no mundo globalizado, digitalizado e informacional, descobrir novas 
técnicas e contextos textuais. 
Bons Estudos! 
1. Temas e formas da poesia contemporânea: antologia de 
autores diversos 
 Ao falarmos de modernidade e contemporaneidade, é importante ressaltar a 
grande diversidade de possibilidades de produção de poesia no contexto atual, 
considerando, inclusive, o universo da poesia digital. E, diante disso, faz-se necessário 
abordar aqui, também, as novas tecnologias na literatura e de que forma elas estão 
sendo incorporadas nos processos de produção, como assevera Ribas: 
Pensar em poesia digital implica focalizar não somente os recursos e técnicas da escrita, 
mas, tendo em vista o modus operandi destes poetas- voltado à incorporação das 
novas mídias -, demanda estudar a sua utilização, manuseio e condições subjetivas e 
objetivas de produção; e, conforme sinalizamos na introdução, tentar compreender a 
relação das palavras com as coisas a que parecem remeter – e, até mesmo, a perceber 
se há algum movimento ou proposta de remissão. (RIBAS, 2013, p.48) 
 A era digital construiu um imaginário em que se prevaleceu o desenvolvimento 
técnico e tecnológico da sociedade. Tal imperativo, ocorrido a tantos campos da 
atividade humana, atingiu, também, o campo literário. Como coloca Walter Benjamin, 
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em a Obra de arte na era da reprodutibilidade técnica, a ascensão das revoluções 
tecnológicas impõs uma maior rapidez para as produções literárias e, sobretudo, criou 
uma mentalidade em que os indivíduos foram domesticados a desejar obras de arte 
que, ao contrário do que pressupõe a tradição literária, deveria, não conduzir à 
reflexões, mas entreter o leitor, feito em consumidor, nos seus momentos de descanso 
das aceleradas rotinas dos grandes centros urbanos. 
 O enredamento social em contextos de interação e vivência 
predominantemente digitais fortaleceu essa relação. Como consequência disso, 
vemos, no espectro largo da criação literária, obras que visam reproduzir efeitos de 
obras anteriores e amplamente apreciadas pelo público. 
 Por outro lado, temos uma evolução do construtivismo, pois a nova poesia - 
acompanhada das novas tecnologias - possibilitou que essa poesia visual pudesse 
apresentar um caráter mais interativo, fazendo uso dos recursos digitais que temos 
hoje. 
 Apresentaremos adiante alguns autores que, rebatendo-se contra as limitações 
e regras colocadas à literatura na contemporaneidade, buscam definir novos caminhos 
para a literatura: 
● Roberto Corrêa dos Santos: 
 
Roberto Corrêa dos Santos - Fonte: Blog do IMS 
Leia um trecho de seu poema Transbordamento: 
 A cama do hospital navega./ Sonha-se com as velocidades por sobre 
azuis e verdes líquidos./ Tombam os organismos, jamais a vida./ E um homem, 
maravilhosamente exagerado na imanência do mundo, dorme./ Ondas e 
páginas, ondas em páginas. 
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 Sobre Roberto Corrêa dos Santos, por meio do trecho apresentado, 
observamos que há uma desorganização do que já fora organizado, uma exploração 
das possibilidades poéticas e a saída da zona de conforto. 
 
Você sabia? Assista ao vídeo de Roberto Corrêa dos Santos declamando a sua obra 
“Zeugma”, acesse o link a seguir: <https://www.youtube.com/watch?v=JvYvbAgp1tc>. 
 
● Alckmar Santos: 
 
Alkmar Santos - Fonte: UFSC 
 
Poesias Digitais , 1999 , Alckmar Luiz dos Santos 
https://www.youtube.com/watch?v=JvYvbAgp1tc
http://enciclopedia.itaucultural.org.br/pessoa204041/alckmar-luiz-dos-santos
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Registro fotográfico Sérgio Guerini 
 Alckmar utiliza-se do hibridismo entre a literatura e hipertextos, 
mesclando ferramentas oferecidas pela nova tecnologia com o texto em si, desde a 
preparação até o resultado final. Alckmar gosta bastante de mesclar os textos barrocos 
com as tecnologias atuais, e um grande exemplo disso é a obra Memory, elaborada 
como um objeto interativo em Flash. 
● Antônio Risério: 
 
Antônio Risério - Fonte: Revista Cult 
 
Risério, Antônio - Filhos de Luso (1996) 
 Risério explora e valoriza o uso das novas tecnologias para moldar seus textos 
e, com essa exploração tecnológica, valoriza a mensagem que quer expressar. Risério 
afirma que, em as suas obras, a lógica digital e computacional são uma das matrizes 
obrigatórias para a criação literária. 
 
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Segundo o autor: 
[...] ao atuar em sistema informático, a poesia não só desautomatiza nossa visão desses 
fenômenos contemporâneos, como promove uma aproximação desmistificadora, 
mostrando que no campo das novas tecnologias, as cartas não estão definitivamente 
marcadas – nem o jogo foi decidido (RISERIO, 1998, p. 202). 
● Ernesto Manoel de Melo e Castro: 
 
Ernesto Manoel de Melo e Castro - Fonte: Folha 
 
todos os poemas são visuais 
porque são para ser lidos 
com os olhos que veem 
por fora as letras e os espaços 
mas não há nada de novo 
em tudo o que está escrito 
é só o alfabeto repetido 
por ordens diferentes 
[…] 
ilusões fechadas para 
os olhos abertos verem 
Melo e Castro - “ilusões fechadas para/ os olhos abertos verem” 
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● Marcelo Sahea: 
 
 
Marcelo Sahea - Fonte: Bandcamp do Autor 
 
 
SAHEA, Marcelo. Ego 
 Marcelo Sahea começou na poesia muito cedo. Já aos 15 anos, ilustrava, 
compunha suas poesias e apresentava em locais públicos, como em ônibus. O poema 
Ego, apresentado acima, retrata a forma de um ovo constituído pela palavra “egg” 
(ovo, em inglês), repetidas vezes, conotando o espaço individual do ser humano e, 
assim, demarcando o egocentrismo. Notamos também um trabalho melódico, dada a 
proximidade sonora com a palavra inglesa e a terminologia “ego”. Sahea utiliza a 
concepção da poesia verbivocovisual, por meio da qual o autor explora conceitos 
líricos, visuais e sonoros nas suas obras. 
 
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Você quer ver? Saiba um pouco mais sobre o conceito de literatura verbivocovisual. 
Assista ao poema “Lixo Eletrônico (Spam)”, do autor Marcelo Sahea, acessando o link 
a seguir: https://www.youtube.com/watch?v=pf1uB5lcL14 
 
2. O romance em versos e o diálogo com a tradição: 
Omeros, de Derek Walcott 
 Estamos muito acostumados com os enredos poéticos provenientes de 
escritores de linhagem europeia, com suas diversas formas e trejeitos linguísticos, que 
já são clássicas nas produções literárias. 
 Mas o que dizer sobre as culturasdos povos de etnias afrodescendentes e 
indígenas? Por que não conhecer mais a respeito dessas culturas? O grande fato é que 
as culturas afro e indígenas são consideradas subculturas, uma vez que é a cultura do 
homem branco que predomina. 
 No entanto, opondo-se a este pensamento, apresentamos o autor Derek 
Walcott. 
 
 
Derek Walcott - Fonte: Metrópolis 
 Derek Alton Walcott, caribenho da cidade de Castries, nasceu no dia 23 de 
Janeiro de 1930 e faleceu em 17 de Março de 2017. Começou a escrever suas obras 
aos 18 anos, iniciando com Twenty Five Poems, em 1948. 
https://www.youtube.com/watch?v=pf1uB5lcL14
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 Walcott era descendente de negros, ingleses e alemães e trazia consigo estas 
variedades étnicas para elaborar a busca pela identidade em suas obras, apresentando 
uma poesia transcultural (misturando elementos clássicos da literatura e a cultura afro 
caribenha). Walcott propõe uma grande reflexão com relação às experiências de seu 
povo em Santa Lúcia, tratando com saudosismo sua identidade e herança cultural. 
 Uma das suas obras mais conhecidas é Omeros, lançada em 1990, relatando a 
temática e cultura africana. 
 Para que possamos analisar a obra, vamos começar pelo seu nome: Omeros, de 
Walcott, significa “interesse pelo mar” e vem de Homero, poeta das Ilíadas. Aqui, 
temos os personagens que fazem referências à obra grega, são eles: Achille (Aquiles), 
Philoctele (Filoctetes), Heitor e Omero (Homero). 
 O próprio personagem Achille é a busca de Walcott pela sua identidade, sua 
autoaceitação da herança híbrida de etnias. Isso confirma-se no momento em que 
Achille retorna ao passado para poder se reconhecer e se conectar com suas origens 
africanas. 
 Os personagens da obra não são caracterizados como heróis, deuses 
mitológicos ou monstros, e sim são representados por pessoas normais que 
caracterizam o povo caribenho. Temos a união do povo nativo da ilha (os pescadores), 
e o turista - apresentamos aqui um traço bastante marcante de contemporaneidade. 
Essa união entre o turista e o nativo visa construir uma equivalência valorativa, 
no plano narrativo, entre turista (representando a elite, o branco, o europeu) e o nativo 
(representando o oprimido, o negro, o afrodescendente), oferecendo ao leitor um 
imaginário que, talvez, não esteja habituado a conceber em seu cotidiano. 
 Como já citamos, o tema central é a busca pela própria identidade, além disso, 
vemos que, em Omeros, Walcott revela-se bastante patriota (ao trazer a beleza de sua 
terra natal), faz uma grande crítica ao fardo do colonialismo e à fragmentação da 
identidade caribenha - visto que os colonizadores, de todos os países que foram 
apropriados, tendem a perder seus costumes e identidade (vide povos negros e 
indígenas). 
Walcott fora um herói na construção da obra, pois deu voz àqueles que 
sofreram com os ditames escravocratas na América e fez uma obra que difundiu 
elementos que enfatizam os mitos e relembram os contos e lendas tradicionais. Além 
desse cuidado com o contexto, preocupou-se em detalhar os tipos de conversas, 
histórias, minúcias e descrições de espaço. 
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O foco da obra é restaurar a identidade e a cultura nativa das territorialidades 
em questão, bem como da consciência negra, em geral. Tal identidade cultural é 
aproveitada para divulgar a cultura afrodescente e resgatar seu valor. 
Sobre a estrutura da obra, separa-se da seguinte maneira: 
● 192 cânticos com metáforas, estrutura de Terza Rima e com 
versos brancos e rítmicos. 
● Versos feitos em hexâmetros (6 métricas) e estrofes em tercetos 
(3 métricas). 
● Linguagem coloquial; 
● Referências a elementos externos, não provenientes da cultura 
afro, como o escritor Edgar Allan Poe, Homero e até mesmo aos 
Beatles. 
 Walcott faleceu em 2017 e com certeza deixou uma obra imensamente 
inovadora para os leitores. 
 
Você quer ler? Leia a obra “Omeros”, de Derek Walcott, e descubra o mundo mágico 
caribenho proporcionado pelo autor. 
 
3. Tendências da Prosa Contemporânea 
Antes de nos aprofundarmos na prosa na contemporaneidade, vamos descobrir 
do que se trata este modalidade literária, como definimos um texto como prosa e 
quais as suas características. Primeiramente, a prosa é classificada como um texto 
predominantemente narrativo, originado das antigas contações de história e, 
portanto, abarca acontecimentos (ação sobre o tempo) em uma determinada 
localidade (ação sobre espaço). Desta forma, percebemos que o central na prosa é que 
as palavras dão forma, fazem mimese da ação humana sobre o mundo real. 
 Temos dois tipos de prosa, a saber: 
 
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- Prosa Narrativa: para textos históricos e de ficção; 
- Prosa Demonstrativa: para ensaios, cartas e oratórias. 
 Também é possível classificar a prosa de acordo com a função que 
desempenha: prosa narrativa, informativa, dramática, contemplativa e 
argumentativa. Veja alguns exemplos de cada uma delas: 
 - Prosa Narrativa: Conto; 
 - Prosa Informativa: Reportagem; 
 - Prosa Dramática: Peça de Teatro; 
 - Prosa Contemplativa: Ensaios; 
 - Prosa Argumentativa: Tratados. 
Outra categoria bastante peculiar à prosa é a prosa poética. Tal termo foi 
criado pelo linguista Roman Jakobson em plena época do simbolismo francês. A prosa 
poética é desenvolvida às últimas consequências centralmente por escritores que 
buscavam empregar o chamado “fluxo de consciência”. Tal técnica consiste em 
descrever a maneira como ocorreria os pensamentos de uma personagem e/ou 
narrador. Ainda assim, nem só neste contexto vemos seu emprego. Tal característica 
consiste, sobretudo, num trabalho mais apurado com a escolha de palavras e 
composição de frases, aproximando a estética tradicional da prosa, mais descritiva e 
objetiva, à da poesia, mais sugestiva e subjetiva. 
Vamos focar agora nas tendências da prosa contemporânea brasileira. Dentre 
os temas mais abordados, temos: 
● A Prosa Regionalista: 
 Cujo cenário retrata o homem do campo, ou o homem do interior, e o meio em 
que vive. Destaque para o escritor Luiz Antônio de Assis Brasil. 
 
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Luiz Antônio de Assis Brasil - Fonte: Companhia das Letras 
● Prosa Política: 
 Neste cenário temos uma denúncia à violência política no país - como 
resquícios de momentos passados, como a Ditadura Militar, por exemplo. Um dos 
escritores em destaque é Josué Guimarães. 
 
Josué Guimarães - Fonte: UPF - Universidade Passo Fundo 
● Realismo Fantástico: 
 São situações que unem o real e o imaginário. Obteve uma forte influência do 
surrealismo. A América do Sul tem um grande destaque na temática do realismo 
fantástico - citaremos a seguir Julio Cortázar, como um grande representante da 
Argentina. A metáfora é uma figura de linguagem bastante utilizada nesse cenário, 
para poder aproximar a fantasia da realidade. No Brasil, merece destaque o escritor 
Moacyr Scliar. 
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Moacyr Scliar - Fonte: Companhia das Letras 
● Romance Reportagem: 
 Aqui, temos um tipo de prosa que relata temas do cotidiano - bem como 
noticiários que vimos em telejornais e folhetins. A linguagem apresentada é mais 
direta, e o autor traz o real dentro da ficção. Destaque para o jornalista e escritor 
Rubem Fonseca. 
 
Rubem Fonseca - Fonte: Estante Virtual 
Por fim - e não menos importante - temos a crônica e o conto, que são as 
narrativas curtas. Iremos nos aprofundar um pouco mais sobre elas no próximo tópico, 
mas já podemos adiantar que essas são as maiores tendências atuais. 
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Começando pela crônica, que está bastante presente em jornais e revistas, 
apresenta ironia e humor como ferramentas linguísticas. Apresenta, normalmente, 
temáticas relacionadas a situações do cotidiano presente e, por isso, as crônicas são 
consideradas “textos com prazo de validade”. Autores importantes para o gênero: Luís 
Fernando Veríssimo e Martha Medeiros. 
 
 
Luís Fernando Veríssimo - Fonte: Companhia das Letras 
 
Martha Medeiros - Fonte: O Globo 
 
Você quer ler? Acesse o link da página “Refletir para Refletir” e conheça as 4 crônicas 
mais famosas de Martha Medeiros, Clique aqui: 
https://www.refletirpararefletir.com.br/4-cronicas-de-martha-medeiros 
https://www.refletirpararefletir.com.br/4-cronicas-de-martha-medeiros
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 Finalizamos o tópico explicando um pouco sobre o conto como tendência 
linguística. É uma narrativa curta, com espaço e tempo bem definidos. Dos autores em 
destaque, citaremos um grande nome do gênero, Clarice Lispector. 
 
Clarice Lispector - Fonte: Revista Cult 
Nos dias de hoje, temos ainda os minicontos (ou microcontos), que são compostos 
por, mais ou menos, 280 caracteres (desde 2017, quando antes era de apenas 140), 
com relatos do dia a dia e situações atuais. 
Podemos comparar os minicontos com postagens em redes sociais, por 
exemplo. A rede social Twitter é um grande exemplo de miniconto da atualidade. 
 
Postagem do Jornal Estadão no Twitter - Fonte: Twitter 
Os blogs virtuais e as redes sociais são as maiores ferramentas de expansão 
da literatura. Com elas, temos inúmeros escritores ao redor do mundo. No conto, por 
exemplo, é possível considerar que um relato de alguma situação que nos ocorre em 
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um determinado dia, possa ser o enredo para um conto. O surgimento desses 
minicontos deve-se pela nossa rotina dos dias atuais, já que a vida do ser humano é 
bastante corrida. 
Quando navegamos na internet e seguimos uma celebridade, temos total 
interesse em saber como essa pessoa se comporta na sua vida pessoal, ou então, 
quando acessamos nossas redes sociais, sempre observamos as postagens de nossos 
amigos. Você já parou para pensar que essas postagens nada mais são do que contos? 
E que quem o postou é o maior protagonista dessa história? 
3.1. Os novos autores da era digital 
Vivemos em um mundo bastante globalizado, com uma grande variedade de 
informações, fontes e recursos. Dessa forma, o ato de se escrever ganha novos 
territórios, construindo novas relações de comunicação, já que podemos postar 
conteúdos em blogs e redes sociais a qualquer momento para qualquer pessoa. 
Nesse sentido, temos os os famosos blogueiros e youtubers, que são, no nível 
mais popular e massificado da cultura, os predominantes produtores de conteúdos de 
e sobre “literaturas” digitais. Nos dias de hoje, a comunicação digital tem ganhado 
cada vez mais espaço no tocante aos nossos hábitos de leitura. Frequentemente 
estamos lendo postagens de nossos amigos de redes sociais, trocamos mensagens 
instantâneas em celulares, assistimos aos vídeos dos nossos canais favoritos e lemos 
blogs na internet do que pegamos um livro para ler. Esse costume deve-se pela correria 
do cotidiano e a disponibilidade digital. 
Esses produtores de conteúdo ou esses usuários digitais muitas vezes redigem 
sobre eles mesmos. Repare em suas redes sociais. Quantos amigos virtuais falam sobre 
como foram suas rotinas? O que comeram, o que beberam, pra onde foram? Essas 
postagens revelam uma realidade ficcionada de quem escreve. No caso, o autor é o 
próprio personagem da história. 
Quem redige essas publicações, necessita de um certo público para a sua 
história. Esse fato é tão evidente que, muitas vezes, eles pagam por impulsionamento 
de suas postagens. 
Nesse sentido, a "evasão de privacidade" ocupa ao mesmo tempo dois 
lugares incompatíveis: os posts falam o tempo todo em primeira pessoa, são 
verdadeiras válvulas de escape do umbiguismo, mas não garantem a 
transparência do Eu que desaparece por trás de suas performances, 
configurando o movimento simultâneo de evocação e evasão de uma 
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intimidade que faz vacilar o horizonte de expectativa de seu leitor. (AZEVEDO, 
p.45, 2008) 
 O que a autora quis dizer com a afirmação é que esses “autores” manipulam 
uma vida que não é totalmente real. Mesmo que tenha fundamentos de realidade, o 
autor sempre irá romantizar ou eufemizar a sua realidade, com o intuito de atrair 
seguidores, que são os seus leitores. 
 Ainda explorando a questão dos autores digitais, temos a vertente dos 
escritores de blogs ou produtores de conteúdo para vídeos. Neste caso, temos um 
autor que escreve para compartilhar ideias ou informações, ou seja, não são as 
postagens pessoais citadas anteriormente. Com a expansão do gênero conto e demais 
gêneros da prosa, vários blogs ou canais de Youtube exploram o conhecimento e o 
entretenimento do espectador/leitor. 
 Retornamos, portanto, ao momento em que o autor torna-se protagonista do 
seu texto. Vários produtores de conteúdos para blogs ou canais de Youtube já 
redigiram livros bibliográficos, explicitando a sua vida particular aos seguidores de 
seus textos e canais. 
4. A narrativa curta contemporânea 
 A narrativa curta é o que chamamos de contos. Este gênero textual tem a 
relação espaço-tempo bem definida e reduzida para se adequar exatamente ao 
momento em que a história é narrada. Além do curto espaço e tempo, há uma 
redução, também, no número de personagens. 
 A linguagem utilizada nos contos geralmente é simples, para que o leitor possa 
compreender exatamente qual a mensagem narrada. É bastante utilizado para 
despertar nas crianças o interesse pela leitura. 
 A estrutura dos contos - ou das narrativas curtas - é bastante recheada de 
diálogos, além da presença do narrador - mesmo que em alguns casos seja escassa. 
De qualquer forma, compõem o gênero de narração curta (conto): 
● A presença de um enredo; 
● A presença de um narrador; 
● Um ponto de vista; 
● Personagem(ns) - às vezes, o próprio narrador é o personagem. 
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 Segundo o crítico alemão Anatol Rosenfield, as narrativas curtas internacionais 
assumem diferentes formas estruturais das narrativas brasileiras, vamos a elas: 
● Short Stories: estilo de conto construído para trazer uma unidade de efeito ao 
leitor. Ex.: O Barril de Amontillado - Edgar Allan Poe. 
 
Edgar Allan Poe - Fonte: Revista Galileu 
● Tales: é a narrativa que não depende de um acontecimento central, com 
uma forma mais livre. Ex. Contos da Cantuária - Geoffrey Chaucer. 
 
 
Geoffrey Chaucer - Fonte: O Explorador 
 Ainda citando a estruturação da narrativa curta, esta precisa ter o tempo bem 
definido, com começo, meio e fim. Dois elementos fundamentais para a narrativa curta 
é a existência do clímax (momento de tensão em que a história deverá tomar um rumo) 
e a existência de diálogos. Esses diálogos podem ser estruturados no discurso direto, 
indireto e indireto livre. Vamos entender um pouco a diferença entre eles: 
➔ Discurso Direto: aqui os personagens dialogam entre si; 
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➔ Discurso Indireto: quando o narrador “conta” a fala de tal personagem; 
➔ Discurso Indireto Livre: a mistura entre o discurso direto e o indireto, em que 
a fala do narrador confunde-se com a da personagem. 
 Ainda, podemos classificar as narrativas curtas quanto ao seu foco narrativo, 
como primeira ou terceira pessoa, veja a diferença: 
 -Na primeira pessoa, o personagem principal é o próprio narrador, portanto, 
a história é narradado ponto de vista deste personagem; 
 -Na terceira pessoa, temos o narrador observador (que apenas descreve o que 
está acontecendo na história) e o narrador onisciente (que sabe de tudo sobre os 
personagens, suas vidas, seus pensamentos e temperamentos). 
 Nos dias atuais, podemos associar a criação de narrativas curtas com as 
elaborações de postagens em blogs ou redes sociais. No segmento da narrativa 
fantástica, temos as famosas Creepypastas, que são narrativas (com ou sem diálogo) 
de lendas urbanas provenientes da internet. 
 
Você quer ver? Conheça algumas Creepypastas mais famosas, assistindo ao canal 
ChocolaTV, clicando no link: https://youtu.be/rVe1bfQTBKE 
 
 Temos na literatura diversos nomes consagrados nessa modalidade das 
narrativas curtas, a seguir iremos conhecer um pouco mais sobre Julio Cortázar e a sua 
obra “O Bestiário”, adentrando um pouco sobre o conceito de narrativa fantástica. 
4.1. A arte do conto em Julio Cortázar: O Bestiário 
 Julio Florencio Cortázar, ou apenas Júlio Cortázar, foi um escritor argentino, 
nascido na embaixada da Argentina em Bruxelas. Cortázar é uma grande referência na 
literatura de gênero fantástico que, nas palavras do próprio escritor: “Quase todos os 
contos que escrevi pertencem ao gênero chamado fantástico por falta de nome melhor” 
(CORTÁZAR, 2006, p. 148). Cortázar inspirou-se em autores renomados da literatura 
fantástica, como Edgar Allan Poe. 
 
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Julio Cortázar - Fonte: El País Brasil 
Mas é válido lembrar que, mesmo existindo uma certa inspiração em Poe, nunca 
devemos confundir as suas obras como um segmento de Poe, uma vez que as obras 
de Edgar Allan Poe são de caráter policial e suspense, enquanto Cortázar se aventura 
no mistério. O escritor argentino fez suas obras de maneira genial, o que torna possível 
que se leitor não se decepcione com o enredo das obras, pois Cortázar sempre instiga 
o leitor a desvendar os mistérios do narrador e a procurar pistas no decorrer do conto 
para entender como é a real personalidade de seus personagens. Isso é o que 
denominamos como “as aparências enganam”. 
 Falaremos um pouco sobre a sua pioneira obra, O Bestiário, que conta com oito 
contos - sendo um deles o homônimo do título do livro, e é neste que iremos nos 
aprofundar durante este tópico - com características de contos curtos. 
 Antes de analisar o conto em si, é importante analisarmos o significado do 
nome do conto, Bestiário, segundo o dicionário: 
Bestiário: 
● Gladiador que, nos circos romanos, lutava contra animais ferozes; 
● Conjunto de iconografia animalista medieval, abundante sobretudo em 
escultura; 
● Literatura Obra didática da Idade Média, com descrição de animais reais ou 
fabulosos. 
Fonte: Dicionário Dicio Online 
 
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 Todas as definições acima fazem referências à obra, e há também uma alusão 
da “fauna humana”, uma vez que nós também pertencemos ao reino animal. Não 
apenas no título, mas Cortázar também utiliza simbolismos e outras nomenclaturas no 
texto, por exemplo: 
● Funes: o nome da família é bastante semelhante à palavra “fauna”, uma 
analogia interessante referente ao comportamento selvagem dos 
personagens do conto. 
● Nino: filho de Luís, o menino. Em espanhol, menino é traduzido como 
Niño. 
 Além do jogo de palavras, Cortázar transforma o real e o imaginário em dois 
universos paralelos, divididos em o que somos de fato e o que gostariamos de ser. 
 A história passa em Mar Del Plata, Argentina, e gira em torno da protagonista 
Isabel, uma garotinha que vai passar a temporada de verão junto à misteriosa família 
Funes. A família é composta por Rema, Nenê, Luís e o menino Nino, e junto a eles 
mora um Tigre. 
 Há uma forte tensão no decorrer do conto, tanto pela relação humana com os 
animais - sob a presença do tigre que inclusive ataca Nenê, pelo fato da família fazer 
experimentos com outros animais (formigas, caracóis e gafanhotos) - e os conflitos 
familiares - ao percebermos que há uma subliminaridade incestuosa de Rema com 
seus irmãos Nenê e Luís. 
 Retomando à questão dos simbolismos existentes no conto, citamos que a 
família faz experimentos científicos com outros animais (formigas, caracóis e 
gafanhotos), e esses animais não foram inseridos no conto por acaso, pois cada um 
apresenta um significado relacionado à natureza humana: 
● Formigas: qualidade laboral; 
● Gafanhotos: qualidades detalhistas, observadores; 
● Caracóis: conceito de malandragem. 
 Quanto à perspectiva do real e do imaginário, Cortázar faz um jogo com a 
realidade familiar, no sentido de desavenças, com o que é considerado estranho. Toda 
a situação e até mesmo as características das personagens nos remete a uma reflexão 
entre o real e o imaginário. 
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 A presença do tigre na residência, levando a todos os moradores se prenderem 
para ter cautela com o animal, nos faz pensar que este simboliza a repressão dos 
nossos desejos ocultos, principalmente quanto à sexualidade e à violência. Outra 
simbologia de nomenclatura vem do próprio nome do personagem Nenê, que 
representa a imaturidade do ser humano - uma vez que chamamos bebês de nenês. 
 Dessa forma, conclui-se portanto que o ambiente da obra é o próprio nicho de 
feras, que lutam pela sobrevivência. Podemos associar o personagem Nenê a um 
animal que sai à caça e Rema como a própria caça e, como o conto é narrado segundo 
a perspectiva de Isabel, ela pode representar os gafanhotos - presentes nos 
experimentos dos Funes. 
 Por fim, ao caracterizarmos o conto como gênero “fantástico”, temos nele o 
descobrimento daquilo que é “estranho”, ou “extraordinário”. Visto que os animais 
presentes no contexto não são animais convencionais de se ter, como cachorro, gato, 
pássaro etc. Além da presença do tigre, que mesmo tendo uma representação 
metafórica, foi o animal escolhido por Cortázar para representar a selvageria interior 
do ser humano. 
Síntese 
 Essa foi mais uma unidade da disciplina Literatura Contemporânea, na qual 
pudemos conhecer um pouco mais sobre as tendências literárias tanto no âmbito da 
poesia, quanto na prosa. 
● Descobrimos que as novas tecnologias estão associadas à criação da 
poesia contemporânea; 
● Conhecemos um pouco das obras de artistas como Roberto Corrêa dos 
Santos, Alckmar Luiz dos Santos e Antônio Risério (e outros artistas) e as 
suas artimanhas na junção entre literatura e novas tecnologias; 
● Conhecemos um pouco sobre Derek Wacott e a sua poesia caribenha, 
em Omeros. Nessa obra, foi possível descobrir um pouco sobre o 
nacionalismo de Wacott e as metáforas utilizadas na sua obra; 
● Aprendemos sobre as narrativas curtas e suas características; 
● Associamos essa categoria de narrativa curta com os contos; 
Literatura Contemporânea - Unidade Nº 3 - Tendências e Narrativas Curtas 
 
● Aprendemos sobre a obra de Julio Cortázar, o bestiário, e fizemos uma 
reflexão sobre o contexto da obra, procurando entender melhor sobre o 
que seriam as narrativas curtas com esse exemplo do autor argentino. 
Bibliografia 
MAGALDI, Sábato. Tendências contemporâneas do teatro brasileiro. Estudos 
Avançados. v. 10, n. 28. São Paulo: Instituto de 
Estudos Avançados - USP, 1996, p.277-289. Disponível em: 
<http://www.revistas.usp.br/eav/article/viewFile/8963/10515>. Acesso em: 
25.06.2019. 
DALCASTAGNÈ, Regina. A personagem do romance brasileiro contemporâneo: 
1990-2004. Estudos de Literatura Brasileira Contemporânea. n. 26, 2005. Disponível 
em: <http://periodicos.unb.br/index.php/estudos/article/view/2123>. Acesso em: 
25.06.2019. 
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Contexto. Universidade Federal do Espírito Santo, 2013/1, p. 39-74. Disponívelem: 
<http://periodicos.ufes.br/contexto/article/view/8244>. Acesso em: 25.06.2019. 
Perrone-Moisés, Leyla. Os heróis da literatura. Estudos Avançados. vol.25. n.71. São 
Paulo Jan./Apr. 2011. Disponível em: <http://dx.doi.org/10.1590/S0103-
40142011000100017>. Acesso em: 25.06.2018. 
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Brasileira de Literatura Comparada. n.12, 2008. Disponível em: 
<http://revista.abralic.org.br/index.php/revista/article/download/179/182>. Acesso 
em: 25.06.2019. 
Cunha Jr., Henrique, Fernandes Vieira, Lílian Cavalcanti, Derek Walcott e Omeros: 
uma discussão sobre a problemática das identidades afro-caribenhas. Revista 
Brasileira do Caribe [en linea] 2010, XI (Julio-Diciembre) : [Fecha de consulta: 26 de 
junio de 2019] Disponible en: 
<http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=159117414002>. 
CORTÁZAR, Júlio. O Bestiário. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1986. 
 
 
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Literatura Contemporânea - Unidade Nº 3 - Tendências e Narrativas Curtas

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