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Fernando Tremoço RELAÇÕES INTRA E EXTRATEXTUAIS – OS IMPLÍCITOS E OS SUBENTENDIDOS: PRESSUPOSTOS E INFERÊNCIAS Resumo do material das professoras: Rosane Monnerat e Ilana Rebello Viegas INTRODUÇÃO A comunicação humana se dá por meio de textos, longos ou curtos, verbais ou não verbais, e, nessa comunicação, seria praticamente impossível, além de repetitivo e fastidioso, explicitar todas as informações necessárias à interpretação das mensagens. Daí a importância do conhecimento de mundo e do conhecimento compartilhado dos sujeitos envolvidos numa troca comunicativa para a construção do sentido, no processo de compreensão dos textos. OS CONTEÚDOS SEMÂNTICOS IMPLÍCITOS Um dos aspectos mais intrigantes da leitura de um texto é a verificação de que ele pode dizer coisas que parece não estar dizendo, isto é, além das informações explicitamente enunciadas, existem outras que ficam subentendidas ou pressupostas. Para realizar uma leitura eficiente, o leitor deve captar tanto os dados explícitos quanto os implícitos. Leitor perspicaz é aquele que consegue ler nas entrelinhas. Caso contrário, ele pode passar por cima de significados importantes e decisivos ou – o que é pior – pode concordar com coisas que rejeitaria, se as percebesse. Alguns tipos de texto (humor, publicidade etc.) exploram, com malícia, esses aspectos subentendidos ou pressupostos Nem todas as informações aparecem explicitadas em um texto. Cabe ao leitor recuperar o que está nas entrelinhas. Em piadas, por exemplo, se o leitor não perceber o subentendido, não conseguirá achar graça. Os conteúdos implícitos são, portanto, tão importantes para a interpretação de qualquer mensagem, quanto aqueles que estão explicitados na linha do texto. São conteúdos implícitos os pressupostos e as inferências. OS PRESSUPOSTOS São ideias não expressas de maneira explícita, mas que o leitor pode perceber a partir de certas palavras ou expressões contidas na frase. A informação explícita pode ser questionada pelo ouvinte, que pode, ou não, concordar com ela. Na leitura e interpretação de um texto, é muito importante detectar os pressupostos, pois seu uso é um dos recursos argumentativos utilizados com objetivo de levar o ouvinte ou o leitor a aceitar o que está sendo comunicado. Ao introduzir uma ideia sob a forma de um pressuposto, o falante transforma o ouvinte em cúmplice, uma vez que essa ideia não é posta em discussão e todos os argumentos seguintes só contribuem para confirmá-la. Os pressupostos, diferentemente das inferências, são marcados linguisticamente no texto. As marcas que introduzem os pressupostos são os marcadores de pressuposição, isto é, indicadores linguísticos que ativam pressupostos. São marcadores de pressuposição: – certos conectores circunstanciais (já que, desde que, visto que etc.); – verbos que indicam mudança ou permanência de estado (continuar, começar a, tornar-se, permanecer etc.); verbos implicativos (conseguir etc.); – expressões iterativas (de novo, novamente etc.); – verbos iterativos (repetir, recomeçar etc.); – expressões temporais (depois de, antes de etc.); – certas conjunções (mas, entretanto, a despeito de, apesar de etc.); – orações adjetivas etc. As orações adjetivas são aquelas iniciadas por pronomes relativos (que, o qual, a qual, os quais, as quais, cujo, onde, quem) e sempre veiculam um pressuposto. Vejamos os exemplos 1 e 2: 1) Os políticos que são desonestos só pensam em encher o bolso à custa do povo. 2) Os políticos, que são desonestos, só pensam em encher o bolso à custa do povo. Em 1, o pressuposto é que apenas os políticos desonestos pensam em encher o bolso à custa do povo, ou seja, nem todo político é desonesto; há também aqueles que são honestos. Em 2, a vírgula destaca um enunciado (a oração adjetiva) – que são desonestos – e, com isso, estende a desonestidade a todos os políticos, ou seja, não há político honesto; todos são desonestos. A Gramática separa as orações adjetivas na base dessa distinção. O exemplo 1 corresponde à chamada “oração adjetiva restritiva”, porque restringe a atribuição, e o exemplo 2 corresponde à chamada “oração adjetiva explicativa”, porque apenas acrescenta mais um dado à atribuição, mais uma explicação – não essencial – ao enunciado. Os pressupostos fazem parte de muitos textos, tendo em vista que explicitá-los significaria, muitas vezes, informar o óbvio, o esperado em um dado contexto. Aqueles enunciados que não aparecem com algum tipo de marca linguística são classificados como subentendidos, ou simplesmente como inferências. AS INFERÊNCIAS (OU SUBENTENDIDOS) As inferências ou subentendidos são insinuações escondidas por trás das palavras. Os enunciados sugerem, mas não dizem explicitamente. A noção de inferência é muito importante no processo de leitura. A inferência é uma operação mental em que o leitor constrói novas proposições a partir de outras já dadas. São as relações não explícitas entre elementos que o receptor de um texto consegue estabelecer a partir de seu conhecimento de mundo. As inferências ou subentendidos são inteiramente contextuais e dependem de um deciframento do receptor, a quem a responsabilidade do sentido construído pode ser delegada, isto é, o subentendido é de responsabilidade do receptor do texto, pois o locutor, ao se esconder por trás do sentido literal das palavras, pode dizer que não estava querendo dizer o que o receptor entendeu. É importante lembrar, agora, que as implicaturas conversacionais geradas a partir da transgressão de uma ou mais máximas conversacionais (máxima da quantidade: “não diga nem mais nem menos do que o necessário”; máxima da qualidade: “só diga coisas para as quais tem evidência adequada, não diga o que sabe não ser verdadeiro”; máxima da relação: “diga somente o que é relevante”; e máxima de modo: “seja claro e conciso” – GRICE, 1967) constituem também casos de subentendidos ou inferências. A decodificação das inferências está ligada, portanto, ao fator de textualidade da aceitabilidade. A aceitabilidade diz respeito à nossa atitude receptiva em relação à mensagem a nós endereçada, ou seja, esperamos que o texto com que nos defrontamos seja útil e relevante, capaz de nos levar a adquirir conhecimentos ou a cooperar com os objetivos do produtor (locutor, enunciador). A operação da inferência é desenvolvida pelos leitores enquanto estão lendo o texto, ou após terminar a leitura. O texto serve, pois, como um estímulo para a geração mental de inferências. Inferência = A --------------------------------> E C Onde A é a informação antiga, B é a informação nova, C é o contexto e a seta é o processo de geração de inferência. O processo é distribuído em três partes: 1) a representação psicológica das informações A e B; 2) a operação de inferência de B extraída de A; 3) a noção de contexto C e seu efeito sobre a inferência. A informação anterior (A) apresenta um conteúdo semântico já conhecido ou que está sendo conhecido pelo leitor, enquanto a informação nova (B) é extraída a partir de (A) e, sob a influência de (C). Dessa forma, A e B são representações psicológicas individuais, mas mantêm relações passíveis de identificação. A inferência distingue-se do pressuposto, porque este, como vimos, está inscrito no texto, sendo um dado colocado como indiscutível para locutor e receptor, não cabendo ser contestado. Já a inferência, como também vimos, é de responsabilidade do ouvinte. Assim, quando observamos um fato ou ouvimos uma frase, tiramos certas conclusões a partir de dados que se encontram implícitos, ou seja, contidos no fato ou por trás da frase. Não é necessário que todas as ideias sejam explicitadas para que possamos tirar nossas conclusões
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