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Diabetes mellitus Referência: Endocrinologia clínica, 7° Ed Introdução: O diabetes melito (DM) representa um grupo de doenças metabólicas com etiologias diversas, caracterizado por hiperglicemia, que resulta de uma secreção deficiente de insulina pelas células beta, resistência periférica à ação da insulina ou ambas. Essa doença apresenta alta mobimortalidade, principalmente por causas cardiovasculares, em virtude do dano vascular que ocorre ao longo do tempo. Classificação: - DM1 (pode ser autoimune ou, mais raramente, idiopático; destruição das células beta pancreáticas, resultando em deficiência absoluta de insulina; DM 1 é dividida em 1 A, que é autoimune, e 1B, que é idiopática) - DM2 (resultante de perda progressiva da secreção adequada de insulina pelas células beta, frequentemente antecedida pela resistência à insulina) - Diabetes melito gestacional (hiperglicemia diagnosticada durante a gravidez, geralmente surgindo a partir da 24a semana) - Tipos específicos de DM devido a outras causas, como síndromes monogênicas de diabetes (p. ex., diabetes melito neonatal [DMN] e diabetes da maturidade dos jovens [MODY]); doenças do pâncreas exócrino (p. ex., pancreatite, fibrose cística, carcinoma etc.); DM induzido por fármacos (p. ex., glicocorticoides, antipsicóticos atípicos, estatinas etc.) ou produtos químicos Obs: DM1 corresponde a 5-10% dos casos de diabetes, enquanto a DM2 corresponde por 90-95% dos casos. Fisiopatologia: Consiste em várias alterações metabólicas que levam a um estado de hiperglicemia. A glicose aumenta por que as células precisam da insulina para captar a glicose, a insulina é produzida no pâncreas pelas ilhotas de Langerhans, especificamente pela célula beta. O glucagon é o contrarregulador da insulina, faz o oposto. Na DM tipo 1 temos destruição das células beta gerando deficiência de insulina consequente à destruição autoimune ou, bem raramente, idiopática das células beta pancreáticas. Acredita-se que o processo de destruição das células beta pancreáticas seja desencadeado pela agressão das células beta por fator ambiental (sobretudo, infecções virais) em indivíduos geneticamente suscetíveis. Polimorfismos no complexo antígeno leucocitário humano (HLA; human leucocyte antigen), localizado no cromossomo 6, são os principais responsáveis pela maior suscetibilidade genética para o DM1, seguidos de polimorfismos do gene da insulina e, em terceiro lugar, por polimorfismos no gene de uma fosfatase específica dos linfócitos. Existem ainda genes que conferem proteção ao DM1, e apenas 5% dos indivíduos com alelos de alto risco desenvolvem DM1, indicando a importância de outros fatores genéticos e não genéticos. Desse modo, a agressão inicial as células beta é um processo “acidental”, uma vez que anticorpos contra algum antígeno viral acabando atacando também as células beta pancreáticas, isso acontece por algum mimetismo molecular entre antígenos virais e as células beta. Alguns autoanticorpos foram identificados como marcadores da destruição autoimune da célula beta. Os principais são os autoanticorpos anti-ilhotas (ICA) e anti- insulina (IAA), antidescarboxilase do ácido glutâmico (anti-GAD), antitirosinofosfatases IA-2 e IA-2b e antitransportador de zinco 8 (anti-Znt8). Eles geralmente precedem a hiperglicemia por meses a anos (estágio pré-diabético), e um ou mais deles estão presentes em 85 a 90% dos pacientes na ocasião do diagnóstico. Em crianças com menos de 10 anos de idade, os IAA podem preceder os demais anticorpos. Em adultos que desenvolvem DM1, o anti-GAD tem maior sensibilidade. A quantidade de autoanticorpos que deu positiva é mais importante para predizer a DM1 do que a titulação desses anticorpos. Entre os fatores ambientais que poderiam participar no desenvolvimento do DM1, incluem-se infecções virais (rubéola congênita, enterovírus, parotidite e sarampo), deficiência de vitamina D e exposição precoce ao leite bovino e ao trigo. Atualmente, apenas o papel da rubéola congênita e dos e.terovírus está confirmado. DM1 tem menor correlação hereditária do que a DM2, mas ainda assim existe correlação hereditária e o risco é maior quando o pai é afetado, em comparação à mãe. O DM1 idiopático ou DM tipo 1B (DM1B) representa 4 a 7% dos pacientes com DM1 recém-diagnosticado e inclui casos de deficiência absoluta de insulina que não são imunomediados. Essa forma de diabetes é fortemente herdada e não está associada ao HLA.2 Indivíduos com esse tipo de diabetes cursam com cetoacidose episódica e apresentam diferentes graus de deficiência de insulina entre os episódios. A maioria dos pacientes descritos até o momento é de ascendência africana ou asiática. A patogênese de deficiência insulínica no DM1B não é conhecida, porém já foi relatado que mutações no gene da insulina podem, ocasionalmente, ser encontradas em crianças e jovens com DM1B. Diabetes autoimune latente em adutos (LADA) é uma forma de diabetes autoimune em que a velocidade de destruição das células beta pancreáticas é mais lenta do que o habitualmente observado no DM1. Em geral, o diagnostico de LADA ocorre entre 30-50 anos de idade e apresenta características clinicas semelhantes ao DM2. Trata-se de uma forma híbrida de DM, que compartilha características da DM1 (como marcadores da autoimunidade) e da DM2 (como excesso de peso e resistência insulínica). A Sociedade de Imunologia do Diabetes (IDS) define LADA pelo início de diabetes na idade adulta (> 30 anos), independência de insulina por pelo menos 6 meses após o diagnóstico e presença de pelo menos um autoanticorpo contra células beta positivo, independentemente da especificidade do título, número ou epítopo. O anti- GAD é o marcados mais sensível no LADA. Na DM 2 ocorre resistência periférica à ação insulínica nos adipócitos e, principalmente, no músculo esquelético; secreção deficiente de insulina pelo pâncreas; aumento da produção hepática de glicose, resultante da resistência insulínica no fígado. Existem ainda outras alterações que compões a patogênese na DM2, essas alterações são agrupadas no octeto ominoso de DeFonzo: o adipócito faz lipólise acelerada, o trato gastrintestinal tem deficiência/resistência incretínica, as células alfa pancreáticas liberam mais flucagon (hiperglucagonemia), o rim aumenta reabsorção de glicose pelos túbulos renais, o cérebro faz resistência à insulina, diminuição da captação de glicose pelos músculos, aumenta produção de glicose hepática. Fatores de risco para DM2: obesidade é o mais importante (principalmente com gordura abdominal), síndrome metabólica, sedentarismo, genético (filhos de pais com DM2 tem 50% de chance de desenvolver), envelhecimento (idade>40 anos) síndrome dos ovários policísticos, ingestão calórica aumentada, ganho de peso, baixo peso ao nascer, tabagismo, prévio DM gestacional. Quadro clínico: DM 1 – em geral são pessoas magras, mas se for um paciente com sobrepeso ou obesidade não podemos desconsiderar a DM1; paciente tem tendência a cetoacidose, em 2/3 das crianças a cetoacidose diabética é a menifestação inicial da doença; invariavelmente DM1 precisa de insulinoterapia; ocorre hiperglicemia de início abrupto, quadro exuberante, rápida evolução; poliúria, polidpsia, irritabilidade, desidratação; DM2 – início insidioso, assintomático/oligossintomático no início (demora 8 anos entre o inicio do quadro e o diagnóstico- doença silenciosa), no início da doença ocorre hiperinsulinemia, uma vez que as células beta tentam aumentar produção de insulina no início, com a evolução da doença é que pode ocorrer, em graus variados, a redução na produção de insulina; a hiperglicemia prolongada causa redução na produção de insulina, aumento de lipólise, aumento de reabsorção da glicose pelo sistema renal, diminuição da reabsorção de glicose no músculo, ocorre disfunção de neurotransmissores,neoglicogênese (aumento da produção hepática de glicose), aumento da secreção de glucagon. Diferenciação entre DM1 e DM2: O dm1 surge na infância e adolescência, enquanto o DM2 predomina em adultos com excesso de peso e idade maior de 30/40 anos; os sintomas clássicos de DM1(poliúria, polidpsia, polifagia) estão presentes em praticamente 100% dos casos. No DM2 muitos pacientes são assintmáticos ou oligossintomáticos, sendo diagnosticados por exames de rotina. Nos casos duvidosos, o diagnóstico se confirma pela dosagem de autoanticorpos contra antígenos da célula beta e do peptídeo C OUTROS TIPOS DE DM: Defeitos genéticos da função da célula beta: MODY: é o diabetes do adulto no jovem, caracteriza-se por inicio antes dos 25 anos de idade em pelo menos um membro da família, presença de DM em duas gerações consecutivas, ausência de autoanticorpos contra as células beta, ausência de sinais de resistência a insulina e secreção endógena de insulina sustentada, evidenciada por peptídeo C detectável após 5 anos do diagnóstico de DM. Esse tipo de DM resulta de mutações em genes envolvidos no desenvolvimento e na função das células beta. A maioria dos pacientes com MODY tem peso normal, ao contrário das crianças e adolescentes com DM2, nos quais predomina a obesidade. Nos MODY 3 e MODY 1, diferentemente do MODY 2, o defeito secretório de insulina e a hiperglicemia tende a se agravar com o tempo, e muitos pacientes vão requerer hipoglicemiantes orais ou insulina. Glicosúria renal (anterior à hiperglicemia), baixos níveis de proteína C reativa ultrassensível e risco cardiovascular aumentado (a despeito dos níveis elevados da lipoproteína de alta densidade [HDL]) são outras características do MODY 3. Além disso, são comuns a doença renal do diabetes e a retinopatia diabética. Pacientes com MODY 2 têm hiperglicemia leve, assintomática e estável; raramente desenvolvem complicações microvasculares e, em geral, não requerem terapia farmacológica para tratar a hiperglicemia.43 Pacientes com MODY 5 podem apresentar anormalidades renais (cistos; aplasia, displasia ou agenesia; rins em ferradura; doença renal crônica) e urogenitais (útero bicornado; atresia dos vasos deferentes; hemiútero etc.), testes anormais da função hepática, hiperuricemia e hipomagnesemia. Segue o quadro diferenciando MODY de DM 1 e 2: DIABETES MELITO NEONATAL: hiperglicemia mantida com início antes dos 6 meses de idade, pode ser permanente ou transitória (quando entra em remissão nos primeiros anos da infância, pode ter recorrência). DM GESTACIONAL: antes da gestação a paciente não tinha diabetes, e na maioria das vezes termina após o parto; a gesta é uma condição diabetogênica; diagnóstico é em primeiro trimestre glicemia de jejeum maior que 92 ou TOTG alterado; no primeiro trimestre é realizada a glicemia de jejum, se for menor que 92 está normal e a paciente deve fazer TOTG no segundo trimestre, se der entre 92-126 a paciente possui diabetes gestacional, e maior que 126 a paciente já possuía DM antes da gestação; no TOTG após 1h deve ser até 180mg/dl e após 2h até 153mg/dl, sendo que um valor alterado já confirma o diagnóstico de diabetes gestacional. Diagnóstico: DM1 – início abrupto, hiperglicemia severa (maior ou igual a 200mg/dl), insulinopenia severa, peptídeo C pode ser menor que 0,7 quando medido em jejum (esse peptídeo C estima a massa residual de células beta pancreáticas), poliúria, polidpsia, polifagia, perda de peso (embora pacientes obesos possam ter DM1) Como diferenciar a DM1A da DM1B? A DM1A é automune, corresponde a 90% dos casos de DM, é mais comum em caucasianos, ocorre por destruição imunomediada das células beta, tem presença de autoanticorpos, forte correlação com genética, principalmente com grupo HLA. A DM1B é responsável por 10% dos casos de DM, é mais comum em asiáticos e afrodescendentes, ocorre destruição idiopática das células beta, ausência de autoanticorpos, forte correlação com genética. DM2 – muitos pacientes são assintomáticos ou oligossintomáticos, apresentando mais comumente sintomas inespecíficos, como tontura, dificuldade visual, astenia, cãibras; na DM 2 80% dos pacientes possui excesso de peso. Como memorizar os sintomas da DM1? 4Ps (POLIÚRIA, POLIDPSIA, POLIFAGIA, PERDA DE PESO) Aspectos laboratoriais: A menos que haja um diagnóstico clínico claro (p. ex., paciente em crise hiperglicêmica ou com sintomas clássicos de hiperglicemia e glicose plasmática aleatória de > 200 mg/dℓ), o diagnóstico requer dois resultados anormais de glicemia em jejum , HbA1c ou glicemia de 2 horas no TOTG da mesma amostra ou em duas amostras de teste separadas. Se um paciente tiver resultados discordantes de dois testes diferentes, deve ser repetido o teste que estiver acima do valor do ponto de corte para o diagnóstico. ***Se for uma mesma amostra, pode considerar DM com dois tipos de exames diferentes. Se for de duas amostras, os dois testes tem que ser iguais para considerar DM. -Glicemia: dois valores superiores ou iguais a 126 mg/dℓ, obtidos em dias diferentes, são suficientes para estabelecer o diagnóstico de diabetes melito; níveis entre 100-125 caracterizam glicose alterada e o paciente tem que fazer TOTG; a hiperglicemia inequívoca (glicemia jejum maior que 250/300) com descompensação metabólica aguda u sintomas óbvios de DM torna desnecessária a repetição do exame em outro dia para confirmação. (JEJUM MAIOR QUE 8H E MENOR QUE 16H) -Teste oral de tolerância a glicose (TOTG): níveis de glicemia de 2 horas menor que 140 considera-se tolerância normal a glicose; entre 140-190 considera-se tolerância diminuída a glicose, e maior que 200 considera-se diabetes melito. A tolerância diminuída a glicose e a glicemia de jejum alterada caracteriza o pré-diabetes, que é uma situação com risco elevado de progressão para DM. -Hemoglobina glicada: representa 4-6% da hemoglobina total, é produto da reação não enzimática entre a glicose sanguínea e a hemoglobina, é uma reação irreversível e de intensidade diretamente proporcional à glicemia (ou seja, quanto mais glicose no sangue, maior a hemoglobina glicada). Os valores da HbA1c refletem a média das glicemias durante os últimos 2 a 3 meses, que é o tempo de sobrevida das hemácias; quanto maior a concentração de glicose plasmática e maior o período de contato, maior a porcentagem da HbA1c. A hemoglobina glicada é pradrão-ouro para avaliação do controle glicêmico, devendo ser realizada a cada 3-4 meses nos pacientes que ainda não atingiram controle glicêmico; a meta é valores menores que 7%; quando já atingiu controle glicêmico pode-se fazer duas vezes por ano monitoração da hemoglobina glicada; indivíduos com glicada maior que 6,5% já são considerados diabéticos, enquanto aqueles com valores entre 5,7-6,4% podem ser considerados pré- diabéticos. (A hemoglobina glicada não é muito boa para diagnosticar DM1, uma vez que se o diagnostico de DM1 é recente não terá aumento de glicada) -Frutosamida: é uma proteína glicada, constituída principalmente de albumina, que reflete o controle glicêmico dos últimos 7-14 dias, visto que a meia vida da albumina é de 14-20 dias; utiliza-se a frutosamida quando o paciente possui condições que alteram a hemoglobina glicada ou caso se queira avaliar mudanças a curto prazo na glicemia (por exemplo durante a gravidez). -Glicosúria: método com baixa sensibilidade, pois só surge glicosúria com glicemia maior que 180 -Pesquisa de corpos cetônicos: níveis altos de corpos cetônicos aumentam suspeita para cetoacidose diabética, que é uma situação grave e que necessita de intervenção imediata. -Dosagem do peptídeo C: a capacidade secretória do pâncreas pode ser analisada por meio da dosagem no plasma do peptídeo C, que é secretado na circulação porta em concentrações equimolares com a insulina, sendo ambos originados da clivagem daproinsulina; como ponto de corte para classificar os pacientes, deve ser considerado que níveis do peptídeo C > 0,9 ng/mℓ no basal e > 1,8 ng/mℓ após glucagon indicam uma reserva de insulina compatível com DM2, valores inferiores confirmam o diagnóstico de DM1 -Dosagem de autoanticorpos contra a célula beta: encontrados no DM1 e LADA; dosagem desses anticorpos permite distinção com DM2; o de maior utilidade é o anti- GAD. Rastreio: -Pacientes com sintomas -Pacientes acima de 45 anos ou até mais jovens quando há fatores de risco (IMC ≥ 25 kg/m2, hipertensão, história familiar de diabetes, dislipidemia, diagnóstico prévio de DMG etc) -Pacientes com esteatose hepática -Indivíduos que fazem uso de glicocorticoides, diuréticos tiazídicos, alguns medicamentos para HIV e antipsicóticos atípicos -Em pacientes com fibrose cística deve-se fazer triagem anual com TOTG a partir dos 10 anos de idade -Transplantado tem que rastrear para diabetes por meio do TOTG -Ratreio em crianças bianualmente a partir dos 10 anos (ou no inicio da puberdade) quando houver sobrepeso, quando houver historia familiar de DM2, em sinais de resistência insulínica (acantose nigricans, hipertensão, dislipidemia, SOP ou RN baixo peso) -Historia materna de DM ou DMG na gestação da criança
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