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SUMÁRIO Branca de Neve, Rainha Má e os Padrões de Beleza Jasmine e a Objetificação Feminina Exploração e Violência Doméstica em Cinderella Rapunzel e a Violação dos Direitos das Crianças e Adolescentes As Belas Adormecidas e a Cultura do Estupro BRANCA DE NEVE RAINHA MÁ E OS PADRÕES DE BELEZA R E P E RT Ó R I O D A A N I M A Ç Ã O A Rainha é a principal antagonista do filme de 1937 da Disney, Branca de Neve e os Sete Anões e o primeiro vilão em uma animação da Disney para os cinemas. A célebre frase da Rainha Má “Espelho, espelho meu, existe alguém mais bela do que eu?”, revela a preocupação com o estético, inerente ao homem desde os tempos clássicos. No conto infantil “Branca de Neve e os 7 anões”, a vilã da história almeja o título “a mais bela de todas” oferecido pelo espelho mágico, estando disposta a qualquer ação contra si e contra os outros para alcançar esse objetivo. Determinada a permanecer como a mais bela de todas, a rainha cria um ciúme doentio por Branca de Neve, a única cuja beleza supera a sua. Ela finalmente usa magia negra para se transformar em uma bruxa, em uma última tentati- va de acabar com sua rival. No início dos projetos do filme, ela seria uma obesa atra- palhada, mas com o passar do tempo, sua aparência mudou, para uma beleza sinistra. É a mais ameaçadora vilã da Disney. A L U S Ã O T E M ÁT I C A Se em 1937, ano de estreia de “A Branca de Neve e os 7 anões”, já existia essa busca doentia para alcançar os padrões de beleza, busca que começou com a famosa frase “Espelho, espelho meu…”, por que nos dias de hoje estaríamos livres de tais padrões? De modo semelhante à Rainha Má, a sociedade atual tem sido influenciada pelas redes sociais - espelho mágico moderno - na busca por um padrão inalcançável de bele- za, ou alcançado apenas pelos filtros mágicos que são ofertados. Em vez de espelhos mágicos, no mundo real, propagan- das midiáticas refletem padrões de beleza gradativamente mais difíceis de serem alcançados. Desse modo, a saúde é desvalorizada pelo uso de drogas e métodos alimentares que aceleram a obtenção do corpo ideal. Quando crianças aprendemos que a vaidade fora de con- trole da Rainha Má tem um preço bem alto a ser pago (lembra dela caindo, nada elegante, de um precipício no fim do filme?). Hoje em dia, além de castigos criados pelo seu próprio corpo, há também o preconceito da sociedade (que nos arrastam até precipícios emocionais). Até que ponto a mídia e a opinião de pessoas (até mesmo aquelas ao ser redor) influenciam o seu jeito de ser e agir? O mais assustador é pensar que há pessoas matando e morrendo por isso todos os dias. Ser diferente virou moti- vo para ser assassinado, para ser excluído de um grupo de pessoas, ou, pior que tudo isso, ser diferente dos outros tornou-se motivo para mudar. JASMINE E A OBJETIFICAÇÃO FEMININA R E P E RT Ó R I O D A A N I M A Ç Ã O Baseada no conto “Aladdin e a lâmpada maravilhosa”, da coletânea de contos árabes, As mil e uma noites, a ani- mação acompanha a história de Aladdin, um jovem de origem humilde que rouba para se alimentar, mas é gene- roso. Quando Jasmine, a princesa de Agrabah e filha do Sultão, decide fugir do castelo para evitar um casamento forçado, o destino dos dois se cruza. A história é originalmente ambientada em um reino na China, e a princesa Badr al-Budur, por exemplo, não assu- me tanto protagonismo quanto Jasmine. Nesse sentido, o diferencial da princesa Jasmine, na animação, reside ape- nas no fato dela ser árabe. O live-action “Aladdin” (2019) surgiu com a promessa de trazer aquele mundo da animação para mais perto, de uma forma mais palpável e cumpriu. A atualização da Jasmine, por exemplo, é fundamental para esse desejo de manter a roda girando. E, de tanto destaque, o filme merecia ter sido intitulado como “Jasmine”. Enquanto em 1992 a princesa tinha em Aladdin a salva- ção, em 2019 ela pode vencer sozinha, enfrentando de igual para igual quem quer que seja, independente do poder alheio. Jasmine, interpretada por Naomi Scott, tem voz e, a partir dessa voz, surge uma das melhores canções do filme: ao mesmo tempo em que ela (Jasmine) canta com fúria sobre a força que tem, os homens vão desaparecendo. Dos soldados ao seu pai, as vozes deles não mais importam frente à dela. É uma metáfora visual que atualiza o filme de uma manei- ra irrepreensível. A boa atuação de Scott a esse ponto, com seus olhos de fúria e sua expressão dura e ao mesmo tempo chorosa, inclusive, tornam o comentário social ainda mais pertinente. A L U S Ã O T E M ÁT I C A Em ambas versões de Aladdin, animação de 1994 e live- -action de 2019, a Princesa Jasmine é retratada como uma peça de jogo político, a qual pode ser utilizada como moeda de troca pelo seu pai, o Sultão de Agrabah, para garantir a prosperidade do reino. Mesmo nas versões Disney, as histórias das princesas nos permitem discutir a objetificação feminina. Pense nos comerciais, filmes e séries aos quais você assis- tiu recentemente. Agora se concentre naqueles que pos- suem presença feminina. Reflita ainda mais: em quantos deles as mulheres apare- cem como um simples corpo para agradar os homens? Quantos deles contam com piadas relacionadas às apa- rências delas? Esse machismo apresentado nas campanhas publicitárias não aparece só quando se quer ganhar dinheiro pelos clientes, já foram registradas declarações de diversas publicitárias, contando do assédio e do abuso que vivem em suas carreiras, sem contar a agressão verbal e psicoló- gica que sofrem ao tentar se postar contra as propagan- das machistas das empresas nas quais trabalham. Tal representação é chamada de OBJETIFICAÇÃO. A objetificação, termo cunhado no início dos anos 70, con- siste em analisar um indivíduo a nível de objeto, sem con- siderar seu emocional ou psicológico. Vale salientar que na nova edição do filme Aladdin, lança- da em 2019, a trilha sonora conta com uma música inédita intitulada “Speechless” - versão em português intitulada “Ninguém me cala”, a qual descreve o ponto de vista de Jasmine sobre a situação de machismo e menosprezo da opinião feminina em que está inserida, tentando romper com a objetificação apresentada na dramaturgia em torno da personagem. EXPLORAÇÃO E VIOLÊNCIA DOMÉSTICA EM CINDERELLA R E P E RT Ó R I O D A A N I M A Ç Ã O A animação “Cinderella” é o décimo segundo filme ani- mado feito pela Disney, lançado em 1950, contando a história adaptada do conto de fadas de Charles Perrault, de uma jovem que, com a ajuda de sua Fada Madrinha, escapa da vida como serva de sua madrasta e irmãs para se casar com o Príncipe Encantado. A versão mais famosa de Cinderela, ou Gata Borralheira, é a do escritor francês Charles Perrault, de 1697, baseada em um conto italiano popular chamado “La gattaceneren- tola” (“A gata borralheira”), com a famosa fada-madrinha. Entretanto, a versão mais antiga é originária da China, por volta de 860 a.C. A versão dos irmãos Grimm também é bastante conhecida, mas nela não há a figura da fada-ma- drinha. Em comum, o que todas as histórias apresentam é o fato de que a Cinderella convive com sua madrasta Lady Tre- maine, e suas meias-irmãs não biológicas, sendo obrigada a trabalhar como criada para a casa, e tendo como seus amigos os animais com que convive. As cinzas nas quais a heroína dorme representam a humi- lhação e a contrição pelas quais tem que passar. O reino onde mora está agitado, devido ao baile que ocor- rerá no castelo, com a presença do príncipe. Lady Tremaine planeja levar suas duas filhas ao baile, com esperança que uma delas case-se com o príncipe. Depois de idas e vindas, sapatinhos de cristal quebrando e desaparecendo, Cinde- rella casa-se com o príncipe e tem seu “final feliz”. A L U S Ã O T E M ÁT I C A Cinderella se apaixona por um príncipe encantado evivem felizes para sempre. Entretanto, antes do final feliz, Cinde- rela experimenta um longo período de exploração e vio- lência doméstica. Isso, porque, após a morte do seu pai, a protagonista divide a casa com sua madrasta e duas meias-irmãs, Anastásia e Drizela, as quais nunca simpatizaram com ela e que se apro- veitam da ausência do seu pai para tratar Cinderela como uma servente da casa, configurando o cenário de violência doméstica. Ao contrário do que muitos acreditam sobre a violência doméstica, essa não corresponde exclusivamente à violên- cia do homem sobre a mulher, mas configura qualquer tipo de violência – física, psicológica, moral, sexual ou patrimo- nial – realizada dentro do ambiente doméstico, podendo ocorrer com mulheres, homens, crianças, adolescentes ou idosos. A protagonista de “Cinderella” sofre uma realidade de exploração e violência doméstica praticada por sua madrasta e as meias-irmãs, caracterizada pelas violências psicológica, moral e patrimonial. Acrescente-se o fato de que o nome “Cinderella” não é o nome verdadeiro da personagem. Esse foi um apelido colocado nela por sua madrasta com a união de “Cin- der”, cinza, sujo, em inglês, e “Ella”, nome verdadeiro da jovem. O apelido foi dado pela condição de Ella estar sempre com as vestes sujas de poeira, terra e cinzas. Caso a madrasta malvada, Lady Tremaine pudesse respon- der criminalmente por seus atos, seguindo a legislação brasileira, responderia por: redução e condição análoga à escravidão (art. 149, CP), com agravante de coabitação (morar na mesma casa em que comete o crime), apropria- ção indébita (parte da fortuna do falecido pai pertence à gata-borralheira). A alusão é tão clara e direta que em 2014, Cinderella e outras princesas saíram dos contos de fadas direto para uma campanha contra a violência doméstica. As princesas da Disney e outras personagens de desenhos animados, como Marge Simpson e Olívia Palito, apare- cem com hematomas e denunciam seus parceiros, na série Coward (em tradução livre, “Covarde”) do artista italiano Alexsandro Palombo. As imagens marcam o Dia Interna- cional para a Eliminação da Violência Contra as Mulheres. © aleXsandro Palombo (2014), ‘Coward’ (composite). RAPUNZEL E A VIOLAÇÃO DOS DIREITOS DAS CRIANÇAS E ADOLESCENTES R E P E RT Ó R I O D A A N I M A Ç Ã O Em um pequeno reino germânico, uma velha bruxa cha- mada Gothel é a única a ver uma gota de pura luz do sol atingir o solo, criando uma flor mágica, com a capacidade de curar os doentes e feridos, e ela a utiliza para manter- -se jovem quando canta para a Flor. Centenas de anos mais tarde, a rainha de um reino próxi- mo adoece enquanto esperava um filho. Os seus guardas, em busca de uma cura, encontram a flor misteriosa. Eles fazem uma poção com a flor, que cura a rainha e ela dá à luz a uma menina chamada Rapunzel. Gothel descobre que o cabelo dourado de Rapunzel man- tém a habilidade de cura da flor, desde que não seja cortado, por isso ela sequestra a criança e a isola numa torre, crian- do-a como sua própria filha. Todos os anos no aniversário da Rapunzel, o reino envia milhares de lanternas voadoras no céu na esperança de que um dia a princesa perdida retorne. Dezessete anos mais tarde, Rapunzel vive na torre com seu camaleão de estimação, Pascal. Rapunzel pede a Gothel para a deixá-la ver as luzes flutuantes no seu aniversário, mas Gothel nega o pedido, dizendo que o mundo está cheio de pessoas que cobiçam as suas habili- dades em benefício próprio. Esse é o enredo de “Enrolados”, o 50° longa de animação produzido pela Walt Disney Animation Studios, lançado em 2010, mais uma versão sobre a história de Rapunzel, a garotinha que é sequestrada e vive por 17 anos dentro de uma torre na Vila de Corona. A denúncia de maus-tratos psicológicos, por exemplo, aparece na animação através da música “Sua mãe sabe mais”, veja: “É um mundo assustador, sua mãe sabe mais. Você por sua conta, não vai saber se virar. Toda desleixada, imatura, tonta, eles vão te devorar. Crédula, ingênua, levemente suja, boba e um tanto vaga. E ainda por cima olha que gorducha! Eu só digo por que te amo. Sua mãe entende, quer te dar ajuda. E só um pedido faz. Não se esqueça, e obedeça: Sua mãe sabe mais!”. A L U S Ã O T E M ÁT I C A O conto Rapunzel foi publicado pelos irmãos Grimm em 1812 e narra a história de uma menina que foi presa em uma torre imensa sem portas e janelas por uma bruxa. Ficando, assim, sem contato com o mundo externo. Um símbolo muito importante do conto são as tranças de Rapunzel. O cabelo cresce infinitamente e nunca é cortado. Os cabelos podem ser interpretados como ideias e pensa- mentos muito fortes, que crescem simbolicamente e não encontram uma forma de se expressar no mundo exterior. As tranças podem ser interpretadas como o símbolo da continuação mãe-filha e, ao cortar esse cordão simbólico, o vínculo com a mãe também é cortado e a menina pode iniciar seu processo de individuação. Subordinada aos interesses pessoais doentios de Gothel, a bruxa malvada, ela teve seus direitos e parte da sua liberdade privados. Não tão diferente dessa obra, atualmente, parte das crian- ças e adolescentes sofrem abusos constantes e tem suas dignidades e infâncias perdidas. Apesar de haver uma legislação protetora dos direitos infantojuvenis, a sociedade se depara diariamente com crianças e adolescentes cujos direitos foram ameaçados ou violados. É importante saber identificar essas situações e a quem recorrer para que a ameaça ou violação deixe de existir. E, se a bruxa má, Gothel, fosse responder judicialmente (no Brasil) por seus crimes, deveria responder por seques- tro e cárcere privado (art. 148, CP), acrescidos de duas circunstâncias agravantes: ser crime contra uma criança e motivação fútil e torpe. AS BELAS ADORMECIDAS E A CULTURA DO ESTUPRO R E P E RT Ó R I O D A A N I M A Ç Ã O De acordo com o conto primitivo da Bela Adormecida, a princesa espeta o dedo em um espinho venenoso e cai em um sono interminável. Um jovem rei a encontra ador- mecida e ao perceber que não existem meios de acordá- -la, decide aproveitar-se da moça e nove meses depois ela dá a luz a gêmeos, enquanto continua adormecida. Um dos gêmeos que busca o seio da mãe para se alimen- tar acaba acidentalmente chupando o espinho do dedo da mãe e a desperta. Quando o rei fica sabendo que a bela acordara, acaba a forçando a casar-se com ele. O conto da Branca de Neve registrado pelos irmãos Grimm, em 1812, dá conta que a Rainha Má é mãe da Bran- ca de Neve e, ao mandar um caçador dar cabo da vida da princesa, ela não quer só o coração da garota, mas também as tripas e os fígados para comê-los no jantar. Mais tarde, desfalecida, Branca não acorda por causa de um beijo de amor, mas por causa do trotar do cavalo do Príncipe, que a estava levando desacordada para um cas- telo. Ocorre que o príncipe encontrou a princesa desacor- dada, pensou se aproveitar da situação dela e, escondido, decide levá-la aos seus aposentos. Com o trotar do cava- lo, a moça acorda, fica agradecida ao príncipe por tê-la salvado e casa-se com ele. Mas você deve estar lembrando das versões Disney que assistiu e pensando que isso não acontece lá. No entanto, embora nas versões originais o “estupro” seja mais evi- dente e a objetificação das Princesas, também, as versões “infantis” também são questionáveis, veja: Aurora é a protagonista de “A Bela Adormecida”, um clás- sico conto de fadas cuja personagem principal é uma prin- cesa, que é enfeitiçada por uma maléfica feiticeira por um dedo picado pelo fuso de uma roca de ficar. Ela cai num sono profundo, até que um príncipe encantado a desperte com um beijo provindo de um amor verdadeiro. “Branca de Neve e os sete anões” conta que a rainha malvada morre de ciúmes da beleza da princesa Brancade Neve e manda matá-la. Logo, descobre que a jovem não morreu e está morando na floresta com sete amigos anões. A princesa então é envenenada pela rainha com uma maçã e só o beijo de amor verdadeiro de um príncipe pode salvá-la. A L U S Ã O T E M ÁT I C A Você já parou para pensar que desagradável seria se você estivesse dormindo e um estranho começasse a beijar sua boca? Mais ainda: se você fosse obrigado a se casar com essa pessoa depois? Pois um beijo não consensual é o destino (e ironicamen- te o final feliz) para Branca de Neve e Bela Adormecida. Ambas são salvas por príncipes que não as conhecem e resolvem beijá-las. Na internet, as princesas da Disney são frequentemente objeto de análise feminista. Narrativas que durante déca- das foram naturalizadas não são mais toleradas. No caso de “A Bela Adormecida”, o ponto mais sensível é o beijo do príncipe Philip em Aurora, enquanto ela está desacor- dada. Em um momento de muito debate sobre assédio e con- sentimento, passagens como essa causam grande reper- cussão. Mas, ainda existem muitas pessoas que não vêem problema na perpetuação dessas imagens e desses con- ceitos e o que está por trás disso é a chamada “cultura do estupro”. O termo foi cunhado na década de 70 por feministas ame- ricanas e, de acordo com o Centro das Mulheres da Uni- versidade Marshall, nos Estados Unidos, é utilizado para descrever um ambiente no qual o estupro é predominante e no qual a violência sexual contra as mulheres é normali- zada na mídia e na cultura popular. Ao disseminar termos que difamam as mulheres, permi- tem a objetificação do corpos delas e glamurizam a vio- lência sexual, a cultura do estupro passa adiante a men- sagem de que a mulher não é um ser humano, e sim uma coisa, como ocorre as princesas em questão. desenvolvido por https://www.instagram.com/disney.prof/ https://diztu.com.br/
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