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FUNDAMENTOS DE QUÍMICA ORGÂNICA E INORGÂNICA Felipe Lange Coelho Conceitos e propriedades físicas e químicas de compostos orgânicos Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: � Identificar forças intermoleculares e intramoleculares. � Descrever propriedades de compostos orgânicos: solubilidade, ponto de fusão e ebulição, relacionando com sistemas biológicos. � Exemplificar acidez e basicidade de compostos orgânicos aplicados a sistemas biológicos. Introdução Neste capítulo, você vai estudar as forças de interação intramoleculares e intermoleculares, analisando como diferentes compostos orgânicos interagem entre si. As forças intramoleculares estão relacionadas com o conjunto de forças que mantém os átomos de uma mesma molécula unidos, enquanto que as forças intermoleculares estão relacionadas com as interações existentes em sistemas moleculares. As forças intermolecu- lares podem ser do tipo dipolo-dipolo, dipolo-dipolo induzido e forças de dispersão, chamadas de forças de van der Waals, forças íon-dipolo, caracterizadas por interações eletrostáticas e, por fim, as ligações de hidrogênio, que são um tipo de interação dipolo-dipolo com maior intensidade. Uma vez formulados os conceitos a respeito das forças intramolecu- lares e intermoleculares, você verá como elas estão relacionadas com as propriedades físicas dos compostos como ponto de fusão, ebulição, densidade, entre outros, aplicando a sistemas biológicos. Se todas as moléculas interagem entre si, modelos como o dos gases ideais sofrem desvios, que são quantificados a partir da análise dessas interações. O processo de condensação de um gás, onde a temperatura é reduzida, só é possível porque a energia de cada molécula é menor que a barreira de dissociação, fazendo com que fiquem unidas no estado líquido. Da mesma forma, o processo de vaporização de um líquido, onde a temperatura é elevada, ocorre porque é fornecida energia suficiente para a molécula romper as interações intermoleculares e passar ao estado gasoso. As forças intramoleculares são significativamente mais fortes que as intermoleculares, ao passo que a energia para quebrar uma ligação em uma molécula é maior que a energia para dissociar a mesma molécula de outra. Você pode mensurar isso pensando em um processo de destilação, onde as moléculas são separadas umas das outras, passando ao estado gasoso, porém, sem ocorrer nenhuma decomposição. Por fim, você estudará os conceitos de acidez e basicidade de compostos orgânicos aplicados a sistemas biológicos. Forças intermoleculares e intramoleculares As moléculas interagem entre si. Por mais simples que essa constatação seja, ela pode ser observada pela existência de estados condensados. Por exemplo, a interação entre as moléculas de água, à temperatura ambiente, faz com que permaneçam no estado líquido ou a interação entre os íons de um sal que reflete no seu estado sólido. Mas qual é a origem dessas forças de atração? Qual a sua relação com as propriedades físicas dos compostos? Por que os hidrocarbonetos butano (C4H10), hexano (C6H14) e o triacontano (C30H62) são respectivamente, gasoso, líquido e sólido? Visto que pertencem à mesma classe de compostos e são constituídos pelos mesmo elementos, carbono e hidrogênio. Nesta seção, você estudará os tipos de interação intermolecular. Forças dipolo-dipolo As forças dipolo-dipolo estão presentes em moléculas polares. A diferença de eletronegatividade dos átomos que constituem a molécula gera uma des- localização eletrônica e, consequentemente, a formação de polos positivos e negativos na molécula. Essa separação de cargas chama-se momento de dipolo. Dessa forma, o polo positivo de uma molécula interage com o polo positivo de outra gerando uma interação (ATKINS; JONES, 2013). Pense na Conceitos e propriedades físicas e químicas de compostos orgânicos2 molécula de clorometano (CH3Cl), como o cloro é mais eletronegativo que o carbono, a carga parcial negativa se localiza no cloro, conforme ilustrado na Figura 1(a), enquanto que a carga parcial positiva está localizada no grupo CH3. Nos líquidos, considere que o clorometano esteja em estado líquido, as moléculas possuem liberdade de movimento e, assim, se alinham de forma que os polos opostos possuem interação atrativa máxima, como mostrado na Figura 1(b). Figura 1. (a) Deslocalização eletrônica na molécula de clorometano. (b) Modelo de interação do clorometano. Fonte: Adaptada de Atkins e Jones (2013) e Chang e Goldsby (2013). Forças íon-dipolo Uma vez entendida a presença de momento de dipolo em uma molécula polar, as forças íon-dipolo surgem da interação entre um íon, que pode ser um cátion (íon positivo) ou um ânion (íon negativo), e uma molécula polar (CHANG; GOLDSBY, 2013). Imagine que o sal iodeto de sódio (NaI), composto por cátions Na+ e ânions I-, seja adicionado a um líquido composto por uma subs- tância polar. Como você espera que seja a interação? O cátion irá interagir com o polo negativo da substância, ao passo que o ânion terá atração pelo polo oposto. Essas interações são representadas na Figura 2. O líquido discutido nesse exemplo pode ser água, que possui o polo negativo localizado no oxi- gênio e o polo positivo espalhado pelos hidrogênios, dessa forma, explicando a solubilidade de sais em água. 3Conceitos e propriedades físicas e químicas de compostos orgânicos Figura 2. Interação íon-dipolo entre iodeto de sódio (NaI) e um solvente polar. Fonte: Chang e Goldsby (2013). A lei de Coulomb é uma outra maneira de entender as forças do tipo íon- -dipolo. A intensidade dessa interação irá depender do tamanho do íon e da sua carga (+1, +2, +3, etc.), como também do momento de dipolo e tamanho da molécula. Aplicando esses conceitos aos íons Na+ e Mg2+ e às moléculas cloropropano (C3H7Cl) e bromopropano (C3H7Br), a maior interação possível ocorrerá entre o Mg2+ e o cloropropano. Isso se deve ao fato de a carga do magnésio ser maior e o seu tamanho ser menor, assim o íon possui a carga mais concentrada. Da mesma forma, o cloro é mais eletronegativo que o bromo e, por consequência, apresentará um momento de dipolo maior, ou seja, maior polarização. Sendo assim, o Mg2+ e o cloropropano formam o par que apresenta maior atração. Dipolo-dipolo induzido e forças de dispersão Até o momento foram discutidas as interações entre espécies que possuem carga ou um momento de dipolo, onde prevalecem as forças eletrostáticas, mas como são as interações de moléculas apolares? Considere duas possibilidades, a primeira, referente à interação entre uma molécula polar com uma molécula apolar e a segunda, a interação entre duas moléculas apolares. No primeiro caso, descrito por Peter Debye, o ponto principal é o efeito causado ao composto apolar quando colocado na presença de uma molé- cula polar. A molécula apolar possui uma distribuição eletrônica uniforme (Figura 3a) que sofre uma distorção na presença de uma espécie com carga (Figura 3b). Essa distorção resulta em uma espécie de dipolo, denominado dipolo induzido (CHANG; GOLDSBY, 2013). Conceitos e propriedades físicas e químicas de compostos orgânicos4 Dessa forma, os polos existentes na espécie polar induzem a formação de polos na espécie apolar. Esse mesmo fenômeno é observado quando se considera um íon, ao invés de um composto polar. Existirá a formação de um dipolo induzido devido à interação com a carga (Figura 3c). Nesse caso, a interação entre essas espécies denomina-se interação íon-dipolo induzido. Figura 3. (a) Distribuição eletrônica uniforme de uma espécie apolar. (b) Distorção causada pela presença de um composto polar. (c) Distorção causada pela presença de um íon. Fonte: Adaptada de Chang e Goldsby (2013). A existência de um dipolo induzido não depende somente da intensidade da carga ou do polo presente na molécula, mas também na polarizabilidade da espécie apolar, onde a polarizabilidade é a facilidadecom que a distribuição eletrônica é distorcida. Quanto maior o número de elétrons presentes em uma molécula, maior será a polarizabilidade, pois menor será a atração pelo núcleo e maior será a difusão desses elétrons pela molécula. Considerando a definição de polarizabilidade, o segundo caso surge pelo movimento dos elétrons na estrutura do composto. Em determinado momento, o arranjo eletrônico, em uma molécula apolar, pode resultar na formação de 5Conceitos e propriedades físicas e químicas de compostos orgânicos um momento de dipolo, denominado dipolo instantâneo. No instante seguinte, um novo arranjo eletrônico levará à formação de um novo dipolo instantâneo e esse processo se repete inúmeras vezes. A existência desse dipolo instantâneo induz a formação de dipolos nas moléculas apolares vizinhas. Da formação desses momentos de dipolo que surgem as forças de dispersão, que são forças atrativas resultantes da interação entre os dipolos instantâneos induzidos. As forças de dispersão, descritas por Eisenschitz e London (1930), e por isso também denominadas forças de London, são mais significativas em compostos com massa molar maior, pois a estrutura possui mais elétrons e assim, maior probabilidade de existirem dipolos instantâneos. A Figura 4 ilustra as interações entre os dipolos instantâneos formados em moléculas apolares. Figura 4. Interação dipolo instantâneo-dipolo induzido em moléculas apolares. Fonte: Chang e Goldsby (2013). Ligações de hidrogênio De um modo geral, as forças intermoleculares mostradas anteriormente são universais, ao passo que as forças de dispersão se aplicam a todas as molé- culas, não dependendo de sua natureza química, as interações dipolo-dipolo dependem somente da polaridade da molécula. Porém, analisando algumas substâncias, você pode observar tendências que fogem a esse padrão. Exem- plificando, se você comparar o metano (CH4) com o tetra-hidreto de estanho (SnH4), verá que o SnH4 possui maior interação intermolecular do que o CH4, fato que é explicado pela maior massa do SnH4 e, consequentemente, forças de dispersão mais intensas. Conceitos e propriedades físicas e químicas de compostos orgânicos6 Por outro lado, as interações entre as moléculas de H2O são significativamente maiores que as interações entre moléculas de H2S. O mesmo comportamento é observado para a amônia (NH3) e o fluoreto de hidrogênio (HF), sugerindo que existam forças de interação mais fortes nesses compostos. Essas forças são chamadas, conforme descrição de Linus Pauling (1960), de ligação de hidrogênio. Essa interação está presente em compostos onde o átomo de hidrogênio está ligado a um átomo pequeno e fortemente eletronegativo, mais especificamente N, O ou F. Em moléculas que possuem a ligação H-F, H-O ou H-N, o hidrogênio de uma molécula é atraído pelo par de elétrons livres do átomos de F, O ou N presente na molécula vizinha. (ATKINS; JONES, 2013). A Figura 5 ilustra as interações por ligações de hidrogênio de moléculas de H2O, NH3 e HF. Figura 5. Ligações de hidrogênio entre água, amônia e fluoreto de hidrogênio. Fonte: Chang e Goldsby (2013). As moléculas que apresentam ligação de hidrogênio interagem mais fortemente, em comparação com as moléculas polares que possuem interação dipolo-dipolo. As interações via dipolo induzido são as mais fracas da série. 7Conceitos e propriedades físicas e químicas de compostos orgânicos Propriedades de compostos orgânicos Conhecendo os modos de interação possíveis entre as moléculas, a análise das propriedades físicas das substâncias fica mais intuitiva. Se uma molécula apresenta maior força de interação, maior será o seu ponto de fusão e ponto de ebulição. Da mesma forma, se a atração entre as espécies é intensa, mais próximas elas estão e, por consequência, maior será a sua densidade. Você iniciará a discussão das propriedades físicas de compostos orgânicos através da comparação de compostos da mesma classe, no caso, alcanos, cetonas e ácidos carboxílicos, e posteriormente irá utilizar esses conceitos aplicados em sistemas biológicos. Inicialmente, compare os pontos de ebulição do butano com o da butanona, e do pentano com o da pentanona. O butano e o pentano são moléculas apolares que apresentam somente dipolo instantâneo. Esse dipolo instantâneo leva à formação de um dipolo induzido instantâneo nas moléculas vizinhas e, com isso, surgem as interações intermoleculares nos alcanos. Por outro lado, as cetonas são moléculas polares, ou seja, possuem momento de dipolo. Como esse dipolo é permanente, a interação entre os polos opostos presentes nas cetonas é constante, formando uma interação mais forte. E, realmente, os dados experimentais corroboram esse pensamento. O ponto de ebulição das cetonas é maior do que dos alcanos, comparando sempre moléculas com o mesmo número de carbonos. Isso significa que é necessário haver mais energia para separar duas moléculas de cetona do que os alcanos correspondentes. Por que é importante comparar compostos com o mesmo número de carbonos? Porque a massa molar dos compostos também influencia nas propriedades físicas. Assim, o ideal é comparar compostos com massas molares semelhantes. Para embasar essa afirmação, observe que o ponto de ebulição do octano (C8H18) é 125°C, maior que o ponto de ebulição da 3-pentanona (p.e. = 102°C). Isso significa que o somatório de forças de dispersão presentes no octano (massa molar = 104 g/mol) é maior que o somatório de interações dipolo-dipolo presentes na 3-pentanona (massa molar = 86 g/mol). Você pode pensar em área de interação, quanto maior o composto. maior a área que ele interage com as moléculas vizinhas. Passando para o caso dos dois ácidos carboxílicos apresentados, as moléculas são isômeros de posição, assim possuem a mesma massa molar e diferem na posição dos substituintes no anel aromático. Enquanto o ácido 2-hidroxiben- zoico possui ponto de fusão igual a 160°C, o 4-hidroxibenzoico possui ponto de fusão igual a 215°C. Nesse caso, a explicação para essa diferença não está Conceitos e propriedades físicas e químicas de compostos orgânicos8 vinculada ao tipo de interação ou a massa molar dos compostos. O fato de o ácido 2-hidroxibenzoico apresentar a possibilidade de realizar uma interação intramolecular do tipo ligação de hidrogênio reduz as interações com as molé- culas vizinhas, fazendo com que as forças de interação intermolecular sejam menores. Veja o Quadro 1. Molécula Propriedade física Ponto de ebulição = -0,5°C Ponto de ebulição = 38°C Ponto de ebulição = 80°C Ponto de ebulição = 102°C Ponto de fusão = 160°C Ponto de fusão = 215°C Quadro 1. Propriedades físicas de alcanos, cetonas e ácidos carboxílicos 9Conceitos e propriedades físicas e químicas de compostos orgânicos A solubilidade de compostos orgânicos segue uma regra geral onde “se- melhante dissolve semelhante”. Em outras palavras, solventes polares dissol- vem moléculas polares e solventes apolares dissolvem moléculas apolares. O princípio é o mesmo, os polos positivos e negativos do soluto irão interagir com os polos opostos do solvente. Essa interação faz com que as moléculas do solvente se localizem ao redor da molécula do soluto, causando a separação entre as moléculas do soluto. Essa interação é denominada solvatação. Considere a adição de um alcano em água. Como o composto apolar não possui momento de dipolo, não haverá forças de atração com a água, que é um composto polar. Baseado nas discussões das seções anteriores, você pode imaginar que o dipolo permanente da água poderia induzir a formação de um dipolo no hidrocar- boneto. Porém, para que o alcano se solubilizasse na água, seria necessário que o composto apolar rompesse as ligações de hidrogênio da água, que são fortes. Dessa forma, o que acontece é que os dois solventes não se misturam. A mesma explicação é aplicada à ausência de solubilidade de óleo em água. Agora pense na estrutura dos álcoois. Os álcoois são formadospor uma cadeia carbônica apolar, semelhante a um alcano, e por um grupo hidroxila, semelhante à água. Isso torna um álcool, uma estrutura polar ou apolar? A resposta está no tamanho da parte apolar. De um modo geral, álcoois com cinco carbonos ou mais são insolúveis em água, pois prevalecem as interações apolares. Ao passo que para os exemplos da Figura 6, o propanol é solúvel em água e o decanol não. Figura 6. Estrutura do propanol e do decanol. Em condições fisiológicas, a formação de ligações de hidrogênio e interações eletrostá- ticas em proteínas é governada pelos substituintes dos aminoácidos que a compõem. Substituintes polares tendem a formar essas interações e aumentar a solubilidade da proteína em água. Quanto mais grupos polares, maior a solubilidade e o inverso Conceitos e propriedades físicas e químicas de compostos orgânicos10 também se aplicam. É esperado que essa solubilidade tenha um limite, uma vez que a solvatação da proteína envolve o rompimento das interações intermoleculares da água, influenciando em fatores termodinâmicos. A Figura 7, a seguir, mostra a estrutura da alfa-endorfina onde você pode observar substituintes polares capazes de realizar ligações de hidrogênio e interações dipolo-dipolo, bem como substituintes apolares que interagem via forças de dispersão. A alfa-endorfina, em questão, é solúvel em água indicando que as interações polares prevalecem. Figura 7. Estrutura da alfa-endorfina. Fonte: Adaptada de molekuul_be/Shutterstock.com. As forças intermoleculares também explicam a desnaturação do DNA. As moléculas de DNA de vírus e bactérias, por exemplo, sofrem desnaturação quando submetidas a aquecimento em solução. Porém, cada espécie de DNA tem uma temperatura de desnaturação própria, que podemos chamar também de ponto de fusão. Quanto maior a quantidade de pares de bases guanina (G) e citosina (C), maior o ponto de fusão. Esse comportamento é observado porque os pares G-C apresentam três ligações de hidrogênio, necessitando de mais energia para serem dissociados. Os pares adenina- -timina apresentam somente duas ligações de hidrogênio, conforme ilustrado na Figura 8, a seguir. Dessa forma, pode se aplicar esses conhecimentos para estimar a composição de bases do DNA através do seu ponto de fusão (NELSON; COX, 2014). 11Conceitos e propriedades físicas e químicas de compostos orgânicos Figura 8. Bases de hidrogênio de bases nitrogenadas. Fonte: Adaptada de Nelson e Cox (2014, p. 287). Acidez e basicidade de compostos orgânicos em sistemas biológicos Para iniciar o assunto de acidez e basicidade de compostos orgânicos em sistemas biológicos e entender o efeito causado na natureza, a Figura 9 traz a ilustração de duas flores, o crisântemo (esquerda) e a centáurea-azul (direita), que possuem coloração vermelha e azul, respectivamente. O composto orgâ- nico que é responsável pela coloração dessas flores é uma flavona, também ilustrada na Figura 9, onde dependendo da forma que se encontre, protonada ou desprotonada, possui uma ou outra coloração. A simples mudança da forma ácida para a forma básica causa a modificação de propriedades físicas do composto (FOX; WHITESELL, 1997). Conceitos e propriedades físicas e químicas de compostos orgânicos12 Figura 9. Influência da acidez e basicidade na coloração das flores. Fonte: Adaptada de Naddya/Shutterstock.com, Nattika/Shutterstock.com e Fox e Whitesell (1997). Nesta seção, será utilizado o conceito de ácido e base de Brønsted para discutir a acidez e basicidade dos compostos orgânicos. Sendo assim, um ácido de Brønsted é definido como uma substância capaz de ceder um íon hidrogênio, e uma base de Brønsted como uma substância capaz de aceitar um íon hidrogênio. A Figura 10 traz duas reações ácido-base. A primeira entre o ácido clorídrico (HCl) e o hidróxido de sódio (NaOH) onde o HCl cede um íon hidrogênio e o NaOH aceita esse íon. Nesse caso, é intuitiva a atribuição de qual espécie participa como ácido e qual participa como base. De forma análoga, a reação entre um ácido carboxílico e uma amina causa a desprotonação do ácido e protonação da amina. Com isso, concluímos que a amina atua como base enquanto o ácido carboxílico, como o próprio nome indica, é o ácido da reação. 13Conceitos e propriedades físicas e químicas de compostos orgânicos Figura 10. Reações ácido-base com compostos orgânicos e inorgânicos. Fonte: Fox e Whitesell (1997). Utilizando esse conceito, podemos identificar diversos compostos com características ácidas e básicas em sistemas biológicos. A própria estrutura dos aminoácidos é representada seguindo as características ácidas e básicas dos substituintes, representado na Figura 11. Como um aminoácido possui em sua composição um grupo COOH (ácido) e um grupo NH2 (básico), representam- -se os aminoácidos na sua forma iônica onde o íon hidrogênio está ligado ao grupo amino e não, ao grupo carboxilato (NELSON; COX, 2014). Figura 11. Representação dos aminoácidos. Fonte: Chang e Goldsby (2013). Na seção anterior, foram ilustradas as estruturas das bases nitrogenadas que compõem os nucleosídios. A presença dos grupos amino explica o porquê desses compostos serem denominados bases. Da mesma forma, os ácidos graxos recebem esse nome por possuírem um grupo carboxila (COOH), que possui caráter ácido como discutido anteriormente, além de uma cadeia alquílica, usualmente denominada cadeia graxa. Conceitos e propriedades físicas e químicas de compostos orgânicos14 A formação de produtos ácidos ou básicos durante reações enzimáticas per- mite o controle da atividade de determinada enzima ou concentração de alguma biomolécula, avaliando as alterações de pH. Por exemplo, a medida dos níveis de acetilcolina é realizada dessa forma. A acetilcolina é um neurotransmissor, ilustrado na Figura 12, que quando é hidrolisado pela acetilcolinesterase forma como produtos a colina e ácido acético, que se dissocia em acetato e um íon hidrogênio. Dessa forma, a redução do pH do meio reacional é um indicativo que a reação está acontecendo. Outros processos, como a hidrólise de ésteres fosfóricos, por enzimas fosfatases, dependem a acidez do meio reacional para ocorrerem. Assim, os ácidos e bases estão presentes nos sistemas biológicos desde o ácido clorídrico do estômago até a formação de espécies que irão interagir com determinada proteína no organismo para exercer a sua função. Figura 12. Hidrólise da acetilcolina pela enzima acetilcolinesterase. Fonte: Nelson e Cox (2014). ATKINS, P. W.; JONES, L. Princípios de química: questionando a vida moderna e o meio ambiente. 5. ed. Porto Alegre: Bookman, 2013. CHANG, R.; GOLDSBY, K. A. Química. 11. ed. Porto Alegre: Bookman, 2013. EISENSCHITZ, R.; LONDON, F. Über das Verhältnis der van der Waalsschen Kräfte zu den homöopolaren Bindungskräften. Zeitschrift für Physik, v. 60, n. 7-8, p. 491-527, 1930. FOX, M. A.; WHITESELL, J. K. Organic chemistry. 2. ed. Burlington: Jones & Bartlett Pub, 1997. NELSON, D. L.; COX, M. M. Princípios de bioquímica de Lehninger. 6. ed. Porto Alegre: Artmed, 2014. PAULING, L. The nature of the chemical bond and the structure of molecules and crystals: an introduction to modern structural chemistry. 3. ed. Ithaca: Cornell University Press, 1960. 15Conceitos e propriedades físicas e químicas de compostos orgânicos Conteúdo: