Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
O Papel dos Jogos como Recurso Didático em Programas de Educação Corporativa Autoria: Fernanda Sobrinho Arcanjo, Mariana Santos de Carvalho, Fernando de Oliveira Vieira RESUMO Este trabalho tem a intenção de estudar o papel dos jogos no processo de ensino- aprendizagem dos sujeitos sociais que compõem um ambiente corporativo. Para viabilizar o estudo, coube discorrer sobre a educação corporativa, sobre os jogos e sobre o papel desempenhado pelo profissional de recursos humanos nesse contexto. Além disso, como contribuição, apresentam-se e discutem-se dados obtidos por meio da pesquisa-ação, realizada com base na utilização de jogos de conteúdo na área técnico-operacional de uma empresa privada sediada no Brasil. Os resultados mostraram que, além dos jogos terem auxiliado no processo de ensino-aprendizagem dos empregados, eles também possibilitaram maior integração entre as pessoas, incitando a colaboração em equipe. Palavras-chave: jogos, educação corporativa, recursos humanos. 2 Introdução No ano de 2005, foi implantado um modelo educacional para o público técnico- operacional da empresa Brasil. Por fins éticos de pesquisa e para salvaguardar as fontes primárias do estudo, não mencionaremos o nome da empresa estudada. Sendo assim, durante todo o trabalho utilizaremos o nome fictício “empresa Brasil”. A empresa Brasil é de grande porte, atua na área de mineração e possui cerca de 60 mil empregados.O modelo, denominado Trilhas Técnicas, foi construído pela área de Educação Corporativa da empresa em conjunto com os profissionais especialistas das áreas operacionais e em parceria com consultorias especializadas no desenvolvimento de materiais didáticos. Um dos recursos utilizados no desenvolvimento prático desse modelo foi o jogo, e é em torno dele que será norteado o presente estudo. De acordo com Huizinga (1971), em um sentido amplo, o jogo pode ser definido como um divertimento, uma recreação, uma brincadeira, um passatempo sujeito a regras, existindo dentro dos limites do tempo e do espaço. De fato, o jogo constitui-se em um recurso lúdico que é cada vez mais utilizado nos projetos de educação corporativa – vide informações contidas na primeira etapa do estudo – desenvolvidos pela área de Recursos Humanos (RH). Nesse sentido, de acordo com Criveralo (1996), os jogos podem ser aplicados no treinamento e desenvolvimento de pessoal, no processo de mudança, na avaliação de potencial, na tomada de decisão, na seleção e integração de pessoas ou até mesmo na formação acadêmica. Entretanto, é válido destacar que o jogo representa apenas um dos recursos existentes para atingir determinados objetivos e não se constitui em um fim em si mesmo (FREITAS e SANTOS, 2005). Nessa perspectiva, o presente estudo procura analisar a utilização dos jogos de conteúdo no processo de ensino-aprendizagem dos sujeitos sociais que compõem o ambiente corporativo, mais especificamente, dos sujeitos que compõem a área técnico-operacional da empresa Brasil. Esse estudo contou com o auxílio de um método de análise de dados muito difundido nas ciências sociais: o método qualitativo. Como metodologia, foi utilizada a pesquisa-ação e como técnica de coleta de informações, utilizou-se a observação participante. A esse respeito, cabe um breve reporte ao campo da definição de pesquisa-ação, visto que maiores explicações sobre o método serão realizadas mais adiante. Recorrendo-se à definição preconizada por Tripp (2005), a pesquisa-ação constitui-se em uma “tentativa continuada, sistemática e empiricamente fundamentada de aprimorar a prática”. É por esse motivo que o método de pesquisa-ação se encaixa perfeitamente ao que se propõe o estudo: por meio de uma vivência prática da utilização de jogos de conteúdo, emerge um estudo sobre eles, que busca investigar e identificar os aspectos inerentes a essa prática que podem ser melhorados e aperfeiçoados. Com base no estudo feito seguindo os pressupostos da pesquisa-ação, o estudo estrutura-se em três etapas. Na primeira etapa, analisam-se os conceitos e fundamentos da educação corporativa, o papel desempenhado pelas universidades corporativas e as fortes relações existentes entre o Setor de RH e a educação corporativa. Em seguida, na segunda etapa, apresentam-se alguns referenciais teóricos com relação ao histórico, as principais definições e as características dos jogos de empresa. Na terceira etapa, apresentam-se os jogos de empresa na educação corporativa da empresa Brasil, analisam-se os dados e registram-se os resultados da pesquisa. Ao final do estudo, encontram-se as considerações finais e as referências utilizadas no trabalho. 1.Educação Corporativa O termo “educação corporativa” surge, principalmente, a partir da década de 1990, quando as ações de T&D mudaram paulatinamente sua esfera de atuação, passando a permear a organização como um todo. 3 Essa mudança de atuação pode impactar no contexto interno das organizações que, por sua vez, necessitam concentrar esforços para saírem de um modelo de gestão marcado pelos preceitos do taylorismo e fordismo e passarem a atuar de forma em que o foco está nas pessoas. Como consequência desse novo foco, a atenção maior é voltada para as pessoas que fazem parte da organização e não mais para a estrutura, cargo ou linha de produção (Bonilauri e Karam, 2.004). As transformações ocorridas no contexto interno permitem que as organizações estejam preparadas para acompanharem com facilidade as mudanças que ocorrem no cenário externo. Para tal, o papel a ser desempenhado pelo modelo de gestão da empresa deve promover o compartilhamento de conhecimento e a comunicação entre as pessoas. Para que todas essas mudanças sejam compreendidas de uma forma contextualizada, é necessário apresentar as bases que as sustentam. Partindo-se desse princípio, destacam-se as cinco forças preconizadas por Meister (1.999): emergência da organização não hierárquica, enxuta e flexível, advento e consolidação da economia do conhecimento, redução do prazo de validade do conhecimento, novo foco na capacidade de empregabilidade e mudança no mercado da educação global. A emergência da organização não hierárquica, enxuta e flexível permitiu que os países desenvolvidos começassem a se atentar ao fato de que o conhecimento seria – e realmente é – a mola propulsora para o crescimento da economia. Em um primeiro momento, na sociedade agrícola, a produção dependia completamente do homem, pois era baseada nos trabalhos manuais e artesanais. Nessa época, o conhecimento era visto como crescimento individual, ou seja, voltado para a satisfação e a sabedoria individuais. Tempos depois, com a revolução industrial ocorrida a partir do século XVIII, o padrão artesanal foi substituído por um padrão de cunho tecnológico e dependente da máquina além do homem. Entretanto, de acordo com Cavalcanti, Gomes e Pereira (2001), a economia da sociedade industrial alienava o homem, pois ele realizava o mesmo trabalho, todos os dias, da mesma forma e em grande quantidade. Porém, na sociedade do conhecimento esse contexto muda paulatinamente. As organizações começam a enxergar o conhecimento como elemento crucial para o crescimento da economia e acreditam que o valor de produtos e serviços depende da inovação, tecnologia e inteligência a eles incorporados (CAVALCANTI, GOMES e PEREIRA, 2001). Considerando-se que o momento atual está inserido no contexto da sociedade do conhecimento, é fato considerar-se também que o contexto vivenciado é da economia do conhecimento. De acordo com a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), pode-se afirmar que a economia do conhecimento refere-se à economia cujo aspecto central das decisões e do crescimento econômico baseia-se na criação e no uso do conhecimento. A consolidação da economia do conhecimento está intimamente ligada ao surgimento de várias tecnologias que geraram produtos com alto valoragregado, mudando, portanto, a forma com que os negócios são concebidos. Toda essa percepção de mercado não veio por acaso. Foi preciso investir muito na educação continuada dos empregados para que se chegasse ao cenário que permeia os dias de hoje. Mais do que isso: foi preciso entender que o prazo de validade do conhecimento está cada vez mais reduzido, ou seja, o conhecimento é altamente “perecível”. Diante de todo esse cenário, a capacidade de empregabilidade ganhou um novo foco. Não existe mais segurança no emprego e sim oportunidade de aprendizado. Os empregadores oferecem uma oportunidade de desenvolvimento e, em troca, os empregados oferecem produtividade e comprometimento quanto à missão da empresa. Consequentemente, muda-se também o paradigma no mercado da educação global. Fronteiras antes bem delimitadas, que dissociavam o período de educação escolar do período de educação pós-formatura, foram rompidas. O que os empregadores esperam dos empregados é que o aprendizado seja contínuo 4 ao longo de toda a sua carreira. Para que o aprendizado ocorra de forma contínua e sabendo-se que o conhecimento é fator chave para o diferencial competitivo, as estratégias da educação corporativa devem estar bem definidas, caso contrário, as empresas investirão em grandes planos com nenhum retorno significativo e ainda irão desestimular os empregados. Segundo Goulart e Pessoa, o empregado deve enxergar coerência entre o discurso de valorização do conhecimento e da competência e sua prática na empresa, alinhados às suas necessidades de desenvolvimento e de desempenho, se não, a educação corporativa pode ser encarada como feita por “aquele pessoal que viaja na maionese”. (GOULART e PESSOA, 2004, p. 96). As estratégias da educação corporativa devem propiciar o desenvolvimento integral do indivíduo por intermédio da utilização de ferramentas que possam servir de suporte à disseminação do conhecimento e possam atribuir inovação e criatividade aos processos e aos produtos. Daí que surge a ideia das universidades corporativas. Elas representam, segundo Eboli (2004), uma passagem do modelo de treinamento e desenvolvimento (T&D) – marcado pelo tradicionalismo – para um modelo centrado em preocupações mais amplas com a educação de todos os indivíduos de uma organização. As universidades corporativas surgiram no século XX como desdobramento de ações iniciadas a partir de 1914. As ações iniciadas a partir desse ano constituíram-se em uma tentativa por parte das organizações e das indústrias em atenderem suas necessidades internas. A solução vislumbrada era que as próprias organizações e indústrias criassem seus próprios departamentos de treinamento e desenvolvimento. O intuito da criação desses departamentos era fornecer aos empregados um espaço para que eles tivessem oportunidade em desenvolver as habilidades necessárias para que desempenhassem suas atividades dentro da empresa de forma eficiente. De acordo com esse intuito, os departamentos de treinamento e desenvolvimento das organizações passaram a ter em mente e colocar em sua pauta este objetivo: fazer com que os empregados desempenhem seus trabalhos de forma eficiente e satisfatória por meio do aprendizado de padrões e rotinas. Esse pensamento só foi se transformando em meados do século passado quando a economia dos Estados Unidos passava por grandes mudanças. O país estava em transição entre uma economia industrial – baseada essencialmente e fundamentalmente em habilidades – e uma economia da informação – com foco no conhecimento. A partir desse ponto, a validade daquele objetivo colocado na pauta das ações de treinamento e desenvolvimento foi questionada quanto a sua real eficácia, pois prezava a instrução em detrimento da aprendizagem. Sendo assim, a área de T&D de Recursos Humanos passava por dificuldades no atendimento às necessidades das organizações. A cultura de habilidade que era cultivada pela área não é mais válida, mas a cultura do conhecimento sim. Por isso, as estratégias das áreas de desenvolvimento do RH precisavam ser revistas, pois recebiam muitas críticas por parte das organizações que as julgavam dispensáveis, ineficazes e dispendiosas. Nesse processo de revisão e na tentativa de retirar a imagem negativa criada, a área de T&D passou a recorrer aos modelos de administração para tentar lidar com os processos de aprendizagem que ocorrem dentro da empresa. Houve o reconhecimento de que alguns fatores cruciais para o sucesso foram deixados de lado como a estratégia e o valor. Um bom treinamento no âmbito empresarial deve fazer conexões com a missão, os objetivos e as estratégias da organização e mostrar que está contribuindo decisivamente para que a organização alcance de forma satisfatória o cumprimento desses três pontos. Além desse histórico que contextualiza o surgimento das universidades corporativas, existe ainda um fenômeno que está extremamente ligado ao processo: o surgimento da Educação a Distância (EAD), que corresponderia ao terceiro estágio histórico pelo qual a universidade passava. Neste caso, o termo “universidade” foi colocado de forma abrangente, 5 ou seja, não estamos tratando especificamente de universidades corporativas e sim de universidades de forma geral. De acordo com Marcos Formiga, historicamente, a universidade passou por vários estágios. No primeiro estágio, a Igreja Católica ocupou o papel principal criando as primeiras universidades. Com relação ao segundo estágio, o protagonista foi o Estado após ter implementado as primeiras democracias modernas. Nessa época, surgiram as primeiras universidades estatais, viabilizadas pelo fato de a educação superior ter se tornado pública. O terceiro estágio, muito conhecido por nós, preconiza a responsabilidade das empresas, uma vez que entrou em cena a EAD, que evoluiu e perpassou por inúmeras formas – correspondência, rádio, televisão, computador – até seu ápice que foi a internet. O mix de educação com a evolução dos meios de comunicação culminou em um novo conceito de universidade, também com o apoio do Estado, que fomentou a ideia de universidade corporativa. Ao que tudo indica, a primeira empresa que transformou sua tradicional organização abrindo espaço para o surgimento da universidade corporativa foi a General Electric (GE). Esta e outras empresas que foram aderindo ao conceito e às práticas de educação corporativa serviram como exemplo, inclusive, para influenciar as universidades particulares. Com a globalização educacional sustentada pela força que estava assumindo a educação a distância, nos anos 1990, ocorreu o boom das universidades corporativas e o surgimento das universidades virtuais. Todo esse movimento foi iniciado nos EUA, mas logo ganhou aderência em outros países. No Brasil, o surgimento das primeiras universidades corporativas data o final do século XX. Primeiro, as empresas estatais tiveram a iniciativa. Em um segundo momento, foi a vez do setor privado. A partir do histórico relatado, faz-se necessário pontuar a proposta da universidade corporativa e desmistificar alguns pensamentos existentes. De acordo com Meister (1999), embora a palavra “universidade” remeta a uma estrutura física e a um corpo docente formado e consolidado, a versão corporativa é totalmente diferente. A universidade corporativa representa um processo que envolve todos os empregados de uma organização em uma aprendizagem contínua, a fim de que eles possam melhorar seu trabalho e agregar valor a ele, além de poderem contribuir para atender à missão, aos objetivos e às estratégias da empresa em que trabalham. Possuindo ou não campus físico, sendo virtual ou não, as universidades corporativas contam com uma estrutura básica para que possam garantir o desenrolar de suas atividades. Para Abbad e Vargas (2006), dentre os elementos que são importantes na estrutura de uma universidade corporativa, destaca-se a forma com que os conteúdos são organizados. Nessesentido, observe o Quadro 1: CURRÍCULOS CARACTERÍSTICAS Básico Envolve competências ou áreas de conhecimento que todos os empregados devem saber, independentemente do nível hierárquico a que pertençam Transversal Envolve competências ou áreas de conhecimento comuns a muitas unidades ou áreas da empresa Específico Envolve competências ou áreas de conhecimento específicas das unidades ou áreas da empresa Quadro 1 Exemplo de organização de conteúdos. Fonte: Adaptado de Abbad e Vargas (2006). Compreendendo-se mesmo que de maneira sucinta o histórico do surgimento da universidade corporativa e a estrutura básica que a compõe, busca-se agora caminhar rumo ao 6 campo da definição que permeia o termo “universidade corporativa”. Uma das definições mais recorrentes sobre universidade corporativa é fornecida por Allen (2002). Ele afirma que a universidade corporativa constitui-se em uma entidade educacional que atua como uma ferramenta estratégica elaborada com o fim de auxiliar a organização-mãe a atingir sua missão, por meio da condução de atividades que incentivem a sabedoria, o conhecimento e as aprendizagens individual e organizacional. Meister (1999) acrescenta que existem muitas diferenças entre as universidades corporativas e a tradicional área de treinamento. Embora as universidades corporativas tenham o intuito de treinar, desenvolver e assegurar o aprendizado contínuo de toda cadeia de valor envolvida no ambiente organizacional – clientes, empregados ou fornecedores – elas trazem em seu bojo um objetivo muito maior: desenvolver conhecimento, habilidades e atitudes imprescindíveis para o sucesso atual e futuro no trabalho. As organizações, com o intuito de atingirem os seus objetivos estratégicos, devem promover o aprendizado contínuo dos empregados para que eles possam dar sustentação a esses objetivos. Todavia, de que forma as empresas podem promover esse aprendizado? Quais os métodos de aprendizagem que podem ser utilizados? Para a resposta dessas perguntas, insere-se perfeitamente a figura do profissional de RH. Antes de colocar em prática qualquer tipo de metodologia de aprendizagem, o setor de RH analisa todas as formas e tecnologias existentes no mercado. Ele também estabelece as necessidades de aprendizagem: que tipo de aprendizado a organização pretende e qual recurso tecnológico pode ser utilizado para que ela possa alcançar esse fim. Entretanto, nem sempre o profissional da área de RH foi visto como um elemento importante para a organização. Em uma abordagem histórica, de acordo com Schirato (2002), primeiramente surgiu o Departamento Pessoal (DP), com o objetivo de assegurar que todas as demandas oriundas da relação entre trabalhador e empresa fossem atendidas. O DP teria surgido a partir de Taylor, Fayol e Ford em suas tentativas na constituição de um departamento organizado capaz de fazer com que a produção do trabalho ocorresse de forma satisfatória. Porém, esse passado do DP não obteve muito sucesso. A finalidade essencial do departamento era de mero registro e arquivamento de informações dos trabalhadores e pesquisa de perfis que atendessem e conseguissem acompanhar a produção da indústria. Passado algum tempo, surgiu outro elemento no DP: o assistente social. Para que as máquinas da indústria nunca parassem, o assistente tinha como principal função prover condições de moradia, de deslocamento da moradia ao trabalho e de alimentação. A área de RH, em cada época e de acordo com o contexto vivenciado no período, enfatizou o desenvolvimento, as ações de comunicação, a tecnologia da informação, a remuneração, a pesquisa de clima e assim por diante, até chegarmos aos dias de hoje em que o RH é visto – pelo menos em algumas empresas – como uma função estratégica para a organização, que tem foco na gestão de pessoas e equipes. Esse novo foco, que não anula nem restringe as outras funções do RH, mencionadas anteriormente, traz a ideia de que se as pessoas não estiverem satisfeitas em seu ambiente de trabalho, se não forem qualificadas e se não tiverem motivação, nenhuma organização terá sucesso porque as pessoas é que constroem a organização. Vistos os pontos de convergências, na etapa a seguir, observar-se-á um dos recursos didáticos utilizados em programas de educação corporativa, como uma das estratégias emanadas pelos profissionais de RH. 7 2. Jogos Corporativos A partir da abordagem realizada anteriormente, constata-se que as estratégias voltadas para a educação corporativa devem conter em seu bojo a missão de identificar e desenvolver competências por meio da utilização de metodologias de aprendizagem. Nesse sentido, justifica-se o estudo acerca dos jogos como uma das metodologias que podem ser utilizadas para atender essa missão. Em uma análise histórica, de acordo com Rosas e Azuaya (2006), ao que tudo indica, os primeiros jogos voltados para o desenvolvimento e a educação surgiram por volta de 3.000 a.C. como uma estratégia de guerra Wei-Hai na China. Nessa época, os jogos consistiam em uma adaptação dos simuladores da área militar para o ambiente organizacional. O uso dos jogos por parte da área militar acirrou-se ainda mais com o surgimento, em 1964, do jogo The King’s Game, em 1780, do jogo War Chess e, em 1798, do jogo New Kriegspiel. Por outro lado, autores como Tanabe (1977) e Martinelli (1987) defendem a ideia de que os jogos teriam surgido no século XIX e teriam sido desenvolvidos para o exército prussiano. Independentemente de onde os jogos tenham sido originados, passado o período das grandes guerras, eles adquiriram um novo foco: passaram a ser utilizados na batalha dos negócios, o que originou os jogos de empresa, termo muito conhecido e difundido nos dias de hoje. Em 1956, surgiu o primeiro jogo de empresa, desenvolvido pela American Management Association: o Top Management Decision Game. Com o advento e a popularização dos computadores, os jogos foram se aperfeiçoando e tornando-se mais complexos, permitindo que os dados sejam processados com maior velocidade, conferindo dinamicidade ao jogo. Em 1957, os jogos surgiram no meio acadêmico dos EUA. No Brasil, eles só chegaram por volta da década de 1970 e, mesmo assim, era utilizado por poucas instituições, como USP, UFRGS, UFRJ e PUC. A intensificação do uso dos jogos só ocorreu na década de 1990, quando o MEC sugeriu que novas alternativas metodológicas de ensino-aprendizagem fossem introduzidas nos cursos de nível superior. Saindo-se do campo histórico e reportando-se ao campo da definição, os jogos constituem-se em um método de ensino que tem o objetivo de auxiliar o aluno a integrar teoria e prática, vivenciando, de forma mais verossímil, os conceitos que foram aprendidos em sala de aula. Segundo Vicente (2001), os jogos não representam um modismo e sim uma tendência que, com o avanço tecnológico, acentua-se cada vez mais. Ele menciona, também, que apesar de estudos mostrarem que a aceitação desse recurso é elevada por parte de professores e alunos que o utilizam em sala de aula, existem ainda algumas dificuldades. No quadro 2, há uma coletânea de considerações feitas por alguns autores sobre os aspectos positivos e negativos decorrentes da utilização dos jogos no ambiente empresarial. 8 REFERENCIAIS TEÓRICOS ASPECTOS POSITIVOS ASPECTOS NEGATIVOS Freitas e Santos (2.005) • Viabiliza o processo de aprendizagem e permite a construção colaborativa do conhecimento • Auxilia no entendimento de questões mais abstratas • Não é aconselhável utilizar essa metodologia sem associá-la a outras metodologias de ensino Lopes (2.001) • Satisfação dos participantes do jogo e participação mais ativa dos alunos • Interação que favorece a discussão e construção qualitativa • Tanto os erros quanto os acertos contribuem • Dificuldades podem surgir no entendimento da estratégia do jogo • Complexidade envolvida na criação e elaboração de umjogo Protil (2.005) • Suscita o pensamento de forma sistêmica • Auxilia no estudo de aspectos teóricos • Estimula o trabalho em equipe • Tempo demandado • Custos na aquisição de um jogo • Problemas de organização Quadro 2: Aspectos positivos e negativos da utilização de jogos no ambiente corporativo. Falando-se da utilização dos jogos, quais são as principais associações que são feitas diante de perguntas que suscitam sua finalidade e público-alvo atingido? E quando as perguntas se referem ao tipo de jogo que deve ser utilizado? Longe de querer induzir as respostas a essas perguntas, provavelmente, o que se encontra na maior parte da literatura faz menção à utilização de jogos para o público que está em uma posição hierárquica elevada como gerentes, diretores ou responsáveis pela tomada de decisões. Quanto ao tipo, mencionam-se jogos comportamentais, simulações gerenciais, jogos cooperativos, jogos utilizados em processos seletivos etc. Como exemplo disso, apresenta-se, a seguir, o pensamento de alguns autores com relação ao tema “jogos de empresa”. Para Vicente (2001), os participantes de um jogo incorporam o papel de um tomador de decisões dentro da empresa, cujo objetivo é resolver um determinado problema ou tentar gerenciá-lo no tempo certo. Segundo a perspectiva de Bernard, os jogos de empresa consistem em um “método de capacidade gerencial em que os participantes competem entre si através de empresas simuladas” (BERNARD, 2006, p. 85). Convergindo com a perspectiva de Bernard, Martinelli acrescenta que, para a aplicação de jogos de empresa, são necessários alguns elementos básicos, além do professor, como “um grupo de participantes a ser subdividido em número conveniente de equipes incumbidas de administrar empresas fictícias, simulando através de um programa de computação” (MARINELLI, 1988, p. 26). Tendo em vista a perspectiva trazida por esses autores, o estudo que aqui é proposto tem o intuito de acrescentar mais uma possibilidade: a utilização de jogos de conteúdo, que se enquadram no objetivo didático preconizado por Tanabe (1977). Para o autor, os jogos possuem três objetivos gerais: objetivo de treinamento, objetivo didático e objetivo de 9 pesquisa. Enquadram-se, também, ao estudo três campos preconizados por Criveralo (1996), que explicitam onde os jogos de empresa podem ser aplicados: no treinamento, no desenvolvimento e na integração de pessoas. Os jogos de conteúdo buscam treinar pessoas para que elas possam se desenvolver e interagir entre si. No que tange à estrutura básica que os jogos, de forma geral, devem conter, Rocha (2003) propõe quatro elementos: manual, animador, processamento e jogador. No caso dos jogos de conteúdo, os elementos que melhor se aplicam são o manual e o jogador. O elemento manual preconiza a elaboração de um material de apoio que apresente uma síntese das regras de funcionamento e dos objetivos do jogo, o posicionamento do animador e as formas de comunicação entre os participantes. Já o elemento jogador refere-se à pesquisa de estratégias para vencer os demais participantes do jogo, utilizando os conhecimentos oriundos da explanação teórica da disciplina. Com um breve apanhado acerca dos aspectos inerentes aos jogos de empresas, como sua origem e suas definições, a etapa seguinte irá melhor explicar sobre os jogos de conteúdo – que correspondem a um tipo de jogo de empresa – por intermédio da experiência de aplicação na empresa Brasil, mostrada por meio do método de pesquisa-ação. 3.Jogos de Empresa na Educação Corporativa da Empresa Brasil Para melhor investigação sobre o tema proposto no estudo, apresenta-se uma pesquisa sobre a utilização de jogos na empresa Brasil. A pesquisa utilizada caracteriza-se, fundamentalmente, como uma pesquisa qualitativa, visto que apresenta como característica “o fato de se considerar o pesquisador como o principal instrumento de investigação e a necessidade de contato direto e prolongado com o campo, para poder captar os significados dos comportamentos observados” (ALVES-MAZZOTTI, 2004, p. 132). Como delineamento do estudo, será utilizado o método de pesquisa-ação que é definido por Tripp da seguinte forma: “pesquisa-ação é uma forma de investigação-ação que utiliza técnicas de pesquisa consagradas para informar a ação que se decide tomar para melhorar a prática” (TRIPP, 2005, p. 447). Pode-se compreender a pesquisa-ação como um desenvolvimento do processo de investigação-ação, uma vez que as pessoas, de forma geral, sempre tentaram investigar sua prática com o intuito de melhorá-la. A investigação-ação é um termo geral utilizado para qualquer processo no qual a prática é aperfeiçoada por meio da experiência adquirida. Observe, no Diagrama 1, um exemplo de ciclo de investigação-ação. Diagrama 1: Ciclo de investiga-ação. Fonte: Adaptado de Tripp (2005). 10 É notório que todos nós aprendemos por meio das experiências que tivemos, visto que se trata de um aprendizado que ocorre naturalmente, por erros e acertos. Identificamos na pesquisa-ação uma forma mais sistemática de realizar o estudo, pois de acordo com Tripp (2005): • todos nós planejamos ações de forma deliberada, mas podemos sistematizá-las e melhor compreendê-las; • todos nós agimos, mas questiona-se quantas vezes agimos de forma responsável; • todos nós observamos, mas poucas vezes com a devida qualidade. Mediante pesquisas, podemos obter mais dados com maior qualidade e fazermos uma observação mais sistemática; • todos nós refletimos sobre os acontecimentos, mas podemos refleti-los de forma a abrirmos um leque de possibilidades, de questionamentos de nossas próprias ideias, de reflexão mais crítica e criativa de nossos próprios atos; • todos nós, por fim, de fato aprendemos com nossas experiências, mas poucos registram o que aprendem. 3.1.Contextualização da Pesquisa A empresa Brasil é uma das maiores empresas de recursos naturais do mundo. Sua missão é transformar recursos minerais em riqueza e desenvolvimento sustentável. Contudo, quem é responsável pelo cumprimento da missão da organização? As pessoas que dela fazem parte. Nesse sentido, cabe um breve retorno ao que foi explicado na primeira etapa do estudo – o “acordo” entre o empregado e o empregador. Este deve oferecer condições favoráveis ao desenvolvimento dos empregados e, em troca, os empregados devem mostrar comprometimento quanto à missão da empresa. Oferecer condições favoráveis, ou seja, criar um ambiente de educação corporativa lembra o papel do RH, também mencionado na primeira etapa do estudo. Sabendo-se que o público técnico-operacional apresenta uma importância estratégica para a empresa Brasil, quais estratégias educacionais o Setor de RH da empresa poderia criar para desenvolver esse público de forma alinhada à missão da organização? Considerando-se esse problema de pesquisa formulado, era necessário avaliar todo o cenário que envolve o público operacional, bem como suas características, analisar a cultura da empresa e as alternativas viáveis no momento. O setor no qual a empresa Brasil atua é muito específico e são poucas as instituições de ensino que capacitam profissionais para lidarem com as especificidades do setor. Por essa frase, percebe-se quão estratégico é para a empresa prover a formação e o desenvolvimento dos empregados. O conhecimento dos empregados da área operacional é extremamente tácito, ou seja, eles o adquiriram ao longo dos anos de trabalho na área. Atualmente, com o boom da gestão do conhecimento, sabe-se que existem inúmeros métodos que podem ser utilizados para promover o compartilhamento de conhecimento: cursos on line, tutoria e mediação pedagógica, vídeos educacionais, teatro-educação, gestão de ambientes virtuais de aprendizagem, jogos etc. Porém, alguns desses métodos esbarravam tanto na cultura da empresa quanto na cultura dos próprios empregados. É importante ressaltar que, na época em que o estudofoi iniciado, era muito complicado introduzir ferramentas como comunidades de práticas, grupos de colaboração etc. Na época, ainda eram incipientes as práticas de Gestão do Conhecimento. Atualmente, com a área de gestão do conhecimento implantada e consolidada, várias metodologias de aprendizado, de colaboração em equipe, portais, dentre outros, foram implantados e são utilizados, além dos materiais impressos e dos jogos.No ano de 2005, ainda não havia uma cultura de compartilhamento formal e 11 sistematizado na organização, havia apenas compartilhamentos pontuais realizados entre os próprios empregados. Somando-se a isso, muitos empregados dessa área não possuíam familiaridade com o computador, o que tornaria difícil, naquela época, implantar qualquer metodologia que utilizasse internet, ambientes virtuais etc. Sendo assim, em síntese, temos como diagnóstico: (a) a maior parte do conhecimento dos empregados da área operacional é tácito e não existem instituições capazes de treinar profissionais em determinadas áreas de negócio; (b) muitas pessoas da área operacional não possuem habilidade na utilização de computadores, então, visto que urgia a necessidade de compartilhamento imediato, não seria possível elaborar uma ação que previa o uso de computadores. Com base no diagnóstico, ficou estabelecido que o escopo da pesquisa-ação deveria ser a ocorrência de treinamentos ministrados pelos próprios empregados especialistas em determinados assuntos, ou seja, dar subsídios para que eles sejam instrutores. Nesse sentido, foram definidas ações para os seguintes problemas detectados: (a) necessidade de treinamento dos empregados para que eles possam ser multiplicadores; (b) necessidade de disseminação do conhecimento entre os empregados por meio de metodologias que não utilizem computadores. Para enfrentar o primeiro problema encontrado, a ação realizada foi a criação do programa multiplicadores da empresa Brasil. Esse programa contou com o apoio de uma consultoria para dar suporte metodológico aos empregados, a fim de que eles pudessem ser instrutores, caso fosse da vontade deles. No que se refere à ação realizada para enfrentar o segundo problema encontrado, criou-se o modelo educacional Trilhas Técnicas, o qual preconiza a utilização de materiais didáticos para os alunos e para os instrutores: para os alunos, apostilas impressas; para o uso dos instrutores em sala, apostila impressa, apresentação em PowerPoint, planejamento de curso e jogo de conteúdo. Todos os materiais são preparados pela consultoria em parceria com os especialistas da área e com o instrutor do treinamento, capacitado pelo Programa multiplicador da empresa Brasil. Para mostrar como esse programa está intimamente relacionado ao modelo educacional das Trilhas Técnicas, a seguir será descrito como ocorreu a construção das Trilhas. Foi a partir das reuniões de trabalho no ano de 2.005 que surgiu o modelo educacional denominado Trilhas Técnicas. Os profissionais da área de Educação Corporativa da empresa Brasil junto aos especialistas das áreas operacionais formaram o chamado Comitê Técnico para que, juntos, pudessem dar início ao processo de construção das Trilhas. O Comitê tinha como principais objetivos: definir os perfis (cargos) das áreas, verificar as competências necessárias para o desempenho das funções dos empregados e identificar as ações de desenvolvimento (cursos) necessárias para que as competências fossem desenvolvidas. Depois de cumpridos os objetivos preconizados nas reuniões de trabalho realizadas pelo Comitê Técnico e finalizada a etapa de construção, o resultado foi a definição, por parte do Comitê, de algumas ações de desenvolvimento que poderiam ser ministradas in company. Para que as ações de desenvolvimento pudessem ocorrer dessa forma, o Comitê mapeou os empregados especialistas que, com grande expertise em determinados assuntos, poderiam contribuir fornecendo conteúdos (de forma explícita) ou compartilhando conhecimentos (de forma tácita). Esses empregados também foram indicados para participar do programa para atuarem como instrutores das ações. Após todas as informações obtidas, optamos por investigar apenas um ponto: os jogos de conteúdo no processo de ensino-aprendizagem dos alunos da área técnico-operacional. Para justificar o motivo dessa escolha, retornemos ao que foi posto na literatura sobre os jogos. As práticas dos profissionais de RH com vistas à utilização de jogos na educação corporativa privilegiam jogos comportamentais, de dinâmica de grupo, voltados para decisões 12 estratégicas e de simulação gerencial, mas pouco fazem menção aos jogos de conteúdo. Sendo assim, como informações sobre o tema ainda são incipientes, procuramos fornecer contribuição a partir de nossa experiência. Nessa perspectiva, utilizamos como técnica de coleta de informações a observação participante, pois ela “implica a interação entre investigador e grupos sociais, visando a coletar modos de vida sistemáticos, diretamente do contexto ou situação específica do grupo” (LAKATOS e MARCONI, 2004, p. 277). 3.2.Apresentação e discussão dos dados Observamos, entre 2006 e 2007, nove treinamentos que ocorreram com a utilização dos jogos de conteúdo. Pelo fato de trabalharmos em uma consultoria especializada em soluções educacionais e que presta serviços à empresa Brasil, a observação de todos esses treinamentos tornou-se mais fácil. Ainda mais que trabalhávamos a maior parte do tempo alocadas no cliente, o que facilitou ainda mais as observações. Ao longo desses treinamentos, tivemos comportamentos diferenciados com relação à turma. No primeiro treinamento assistido, tentamos – embora não tenhamos conseguido, pois a participação foi inevitável – adotar uma postura de meras observadoras. Nosso interesse nessa fase era identificar a expectativa dos alunos quanto a um elemento “novo”, que era o jogo de conteúdo. Procuramos replicar esse tipo de observação nos demais treinamentos, até porque não observamos nove turmas iguais e sim nove turmas com pessoas diferentes. A dinâmica dos multiplicadores era a mesma em todos os treinamentos, pois receberam orientações metodológicas no programa multiplicadores da empresa Brasil: havia um momento de apresentação da turma e do instrutor, no qual todos diziam o nome, cargo que ocupa, quanto tempo está na empresa e o que espera do treinamento. Posteriormente, o instrutor explica para a turma como será subdividido o treinamento. Primeiro, uma explicação teórica a qual os alunos podem acompanhar pela apostila que recebem. Ao final de cada capítulo da apostila, encontram-se exercícios de fixação que podem ser feitos ou não em sala de aula, ficando a critério do multiplicador. Em um segundo momento, é feita a aplicação dos jogos de conteúdo. Nos treinamentos observados, apenas dois instrutores optaram por não fazer os exercícios em sala, pois a carga horária era curta e o conteúdo do curso era extenso. Sendo assim, o instrutor privilegiou aplicar o jogo em vez dos exercícios de fixação. O instrutor em todos os treinamentos explicava sobre o objetivo do jogo de conteúdo, pois o que mais gerava perguntas era justamente os jogos. Aliás, o jogo significou um reforço para os alunos prestarem atenção na aula, porque eles sabiam que ao final das explicações teóricas haveria um jogo que iria explorar todo o conteúdo abordado no treinamento. O que percebemos de positivo também foi a interação dos participantes propiciada pelos jogos. De maneira geral, nem todos se conheciam. Empregados de Belo Horizonte, por exemplo, participaram do treinamento que ocorreu em Vitória. No treinamento que ocorreu em Aracaju, havia muitas pessoas de Carajás. No momento do jogo, de acordo com o que previam as regras, as pessoas organizavam-se em equipes e interagiam entre si, aprendendo coisas novas a partir de experiências de pessoas de outras localidades da empresa Brasil. Mesmo que tenhamos observadoum resultado positivo com relação à utilização dos jogos ao longo dos treinamentos, nosso intuito maior era ouvir dos participantes qual a opinião deles a respeito do recurso didático. Para isso, ao final de cada treinamento, fazíamos as seguintes perguntas: (1ª) Vocês acreditam que o jogo ajudou na assimilação do conteúdo do curso? (2ª) O que vocês viram de aspectos positivos no jogo? E quanto aos aspectos negativos? (3ª) O que poderia ser melhorado com relação ao jogo? Decidiu-se fazer essas perguntas de maneira livre, casual e informal, de forma a obtermos respostas espontâneas. Não pedimos que ninguém escrevesse no flipchart, nem anotasse em um papel propositalmente, pois o objetivo era promover um bate-papo, uma troca de ideias e sugestões. De forma geral, muitos empregados teceram comentários e 13 responderam a essas perguntas, no entanto, não descrevemos tudo o que foi dito, pois muitas declarações apresentavam o mesmo significado, apenas com outras palavras. Cabe destacar algumas respostas à primeira pergunta: 1) “Com certeza. Porque aprendemos de forma natural, sem sentir.” 2) “Sim. Eu, pelo menos, nunca aprendi dessa forma, mas gostei. Algumas coisas que você lê ou que o professor fala não dá para lembrar, mas no jogo eu lembro das situações que me fazem lembrar do conteúdo.” 3) “Acredito que ajudou também em termos conhecimentos sobre as outras ferrovias.” 4) “Ajudar, ajudou porque o aprendizado vai fluindo, mas não saberia responder às perguntas das cartas se o professor não tivesse dado aula antes.” 5) “Concordo. Só o jogo não daria não, mas com o jogo ficou melhor.” No que diz respeito às respostas encontradas para a segunda pergunta, temos: 1) “A única coisa que achei foi que esse jogo demorou muito, não sei se outros jogos são mais rápidos que esse.” 2) “A gente sai da rotina de trabalho, joga e ainda aprende!” 3) “Trabalhar e estudar é muito cansativo. O jogo quebra o cansaço porque temos que ficar atentos para não engolirmos mosca. 4) “Estimula o trabalho em equipe. O jogo só é vencido pelo resultado apresentado pelo grupo e não por uma pessoa só.” As respostas encontradas para a terceira pergunta foram: 1) “Achei o tabuleiro muito pequeno para muita gente em volta.” 2) “Embora eu tenha gostado bastante, acredito que o tempo de jogo poderia ser menor. De repente, fazer um jogo com menos cartas, algo assim.” 3) “As regras do jogo tinham que vir no tabuleiro porque toda hora alguém queria ver.” 4) “Os grupos tinham muito tempo para responder as perguntas. A ampulheta é ruim porque a areia cai muito devagar. Seria melhor um cronômetro porque poderíamos cronometrar um tempo menor.” 5) “Senti falta de alguns conteúdos no jogo.” No que se refere ao jogo como recurso lúdico no aprendizado, observa-se a fala de um dos participantes: “Com certeza. Porque aprendemos de forma natural, sem sentir”. Essa fala reforça o preconizado por Huizinga (1971) quando ele afirma que o jogo pode ser definido como um divertimento, uma recreação, uma brincadeira. Quando um dos participantes relata “Acredito que ajudou também em termos conhecimentos sobre as outras ferrovias”, observa-se que um objetivo importante para a empresa Brasil foi (ou está sendo) atendido: o intercâmbio de conhecimento entre as diversas localidades em que a empresa está presente. No que tange ao jogo como recurso didático, como complemento importante no processo de ensino-aprendizagem, note-se as falas de dois participantes: “Sim. Eu, pelo menos, nunca aprendi dessa forma, mas gostei. Algumas coisas que você lê ou que o professor fala não dá para lembrar, mas no jogo eu lembro das situações que me fazem lembrar do conteúdo” e “Concordo. Só o jogo não daria não, mas com o jogo ficou melhor”. Nesse sentido, como vimos em Freitas e Santos (2005), o jogo pode auxiliar no processo de ensino-aprendizagem, mas ele não se constitui em um fim em si mesmo. O relato dos participantes, obtido nas respostas fornecidas à terceira pergunta, reforça o método de pesquisa que utilizamos: a pesquisa-ação. Note-se que muitos sugeriram melhorias a serem feitas. As sugestões serviram para que pudéssemos melhorar a nossa prática, o que representa, justamente, o principal objetivo em se realizar uma pesquisa-ação. Além disso, a pesquisa desenvolvida corrobora com o que foi dito anteriormente sobre educação corporativa. De acordo com Eboli (2004), um exemplo de estratégia que pode ser adotada na educação corporativa é a criação das universidades corporativas. As universidades 14 corporativas, segundo a autora, devem se preocupar com a educação de todos os indivíduos de uma organização. E é justamente esse exemplo de preocupação com a educação que percebemos quando a universidade corporativa da empresa Brasil optou por utilizar os jogos como um recurso a mais de aprendizagem. Entretanto, como mencionado no início do trabalho, existem aspectos positivos e negativos decorrentes da utilização dos jogos no ambiente corporativo. No quadro elaborado sobre esses aspectos, Lopes e Santos (2001) destacam como pontos positivos a participação mais ativa dos alunos e a interação possibilitada através dos jogos. Esses dois pontos podem ser observados nas respostas dos participantes, principalmente, nas respostas fornecidas às perguntas 1 e 2. Entretanto, temos que pensar também sob outros prismas. Será que se a empresa Brasil utilizasse o jogo como instrumento de avaliação de aprendizagem, as respostas seriam as mesmas? Essa é outra questão que pode ser desdobrada e tornar-se tema de outros trabalhos sobre jogos. Considerações Finais Neste estudo, procuramos utilizar a pesquisa-ação como forma de sistematizar, dentro do contexto acadêmico, toda a experiência que tivemos – e ainda temos – como consultores na área de educação e responsáveis pelo desenvolvimento de alguns jogos de conteúdo para a área técnico-operacional da empresa Brasil. Recorrendo à literatura sobre jogos, encontramos muitas definições e informações sobre suas possibilidades de uso, entretanto, poucas preconizavam a elaboração de jogos de conteúdo. Contudo, por nossa experiência na área, isso não quer dizer que não existam outras empresas além da empresa Brasil que utilizem esse tipo de recurso, pelo contrário, existem e muitas. O que acontece é que existem pessoas com experiência na área que não sistematizam de forma empírica o conhecimento e os resultados obtidos a partir de suas experiências com jogos de conteúdo, conforme relata Tripp (2005). Outro ponto abordado ao longo do estudo foi o papel do profissional de RH no contexto da educação corporativa. O perfil desse profissional nos dias de hoje deve ser proativo e inovador, deve necessariamente conhecer sobre o negócio da empresa, quais os principais produtos que ela produz, quem são seus clientes e concorrentes e qual é o processo de produção envolvido que gera os resultados financeiros da organização. O setor de RH deve lidar diariamente com a relação entre trabalhador e empresa, de forma a incentivá-lo e prepará-lo para o melhor gerenciamento das atividades. No que se refere à pesquisa desenvolvida, por intermédio do relato dos participantes, não só os jogos auxiliam no processo de ensino-aprendizagem como também são capazes de propiciar maior integração entre as pessoas, aproximando-as e incitando a colaboração em equipe. Através dos relatos dos participantes recebemos também impressões e feedbacks valiosos – e ao mesmo tempo participantes da pesquisa - com relação aos jogos. As perguntas e observações que fizemos foram essenciais para aperfeiçoarmos nossa prática e sabermos se estamos caminhando para a direção certa. A etapa pela qual estamos passando atualmente é justamente essa, de dar continuidade ao trabalho iniciado, realizando constantes avaliações da nossa prática. Por fim, procuramos, por meio desta pesquisa, disseminar as lições aprendidas no processo de investigação-ação que podem servirde esclarecimento para algumas pessoas e de conhecimento para outras. Esperamos, também, que sirva de incentivo aos estudantes e profissionais que desejam criar novas alternativas educativas para desenvolver empregados utilizando jogos. 15 Referências Bibliográficas ABBAD, G.; BORGES-ANDRADE, J.; MOURÃO, L. Treinamento, desenvolvimento e educação em organizações e trabalho. Porto Alegre: Artmed, 2.006. ALLEN, M. What is a corporate university, and why should an organization have one? In: ALLEN, M. (Org.). The corporate university handbook. New York: Amacom, 2.002. ALVES-MAZZOTTI, Alda Judith; GEWANDSZNAJDER, Fernando. O método nas ciências naturais e sociais: pesquisa quantitativa e qualitativa. São Paulo: Pioneira/Thomson Learning, 2.004. BERNARD, Ricardo. Métodos de jogos de empresa/simulação gerencial. In: MARION, José Carlos; MARION, Arnaldo Luis C. Metodologias de ensino na área de negócios. São Paulo: Atlas, 2.006, p. 83-114. BOUNILAURI, Ana Rosa; KARAM, Marisa Estela. Desenvolvimento de competências: conceitos e aplicações. In: MUNDIM, Ana Paula; RICARDO, Eleonora Jorge (Org.). Educação corporativa: fundamentos e práticas. Rio de Janeiro: QualityMark, 2.004. CAVALCANTI, Marcos; GOMES, Elisabeth; PEREIRA, André. Gestão de empresas na sociedade do conhecimento. Rio de Janeiro: Elsevier, 2.001. CRIVELARO, Rafael. Dinâmica de jogos aplicados às organizações – jogos de empresa: manual do instrutor. Apostila. IC-EE Interativo Consultoria – Espaço Empresarial, 1.996. EBOLI, M. Educação corporativa no Brasil: mitos e verdades. São Paulo: Gente, 2.004. FORMIGA, Marcos. Da educação a distância à educação corporativa: o que está acontecendo nas empresas e escolas do Brasil? Revista Brasileira de Educação Aberta e a Distância, 2.004. Disponível em: http://www.educor.desenvolvimento.gov.br/arq_1coletania/educacaodistanciaauniversidadeco rporativa_marcos.pdf. Acesso em: 08/02/2009. FREITAS, Sheizi C.; SANTOS, Luís Paulo G. Os benefícios da utilização das simulações empresariais: um estudo exploratório. In: Anais do Encontro Anual da Associação dos Programas de Pós-Graduação em Administração, EPQ-B, 2364. Campinas, 2.005. GOULART, Sonia; PESSOA, Eliana. Educação corporativa como base da estratégia organizacional. In: MUNDIM, Ana Paula; RICARDO, Eleonora Jorge (Org.). Educação corporativa: fundamentos e práticas. Rio de Janeiro: QualityMark, 2.004. HUIZINGA, Johan. Homo ludens. São Paulo: Editora USP, 1.971. LAKATOS, E. M.; MARCONI, M. A. Metodologia científica. São Paulo: Atlas, 2.004. LOPES, Paulo da C. Jogo de empresas geral: a perspectiva do animador com a utilização na pós-graduação lato sensu. In: Anais do Encontro Anual da Associação dos Programas de Pós- Graduação em Administração, EPA, 136. Campinas, 2.001. 16 MARTINELLI, Dante P. Utilização dos jogos de empresa no ensino da administração. Dissertação de mestrado. Universidade de São Paulo, FEA. São Paulo, 1.987. ______. A utilização dos jogos de empresas no ensino de administração. Revista de Administração, v. 23, n. 3, p. 24-37. São Paulo, Jul./Set., 1.988. MEISTER, Jeane C. Educação corporativa: a gestão do capital intelectual através das Universidades Corporativas. São Paulo: Makron Books, 1.999. PROTIL, Roberto M. Utilização de simuladores empresariais no ensino de ciências sociais aplicadas: um estudo na República Federal da Alemanha. Economia, v. 31, n. 2. Curitiba: Editora UFPR, Jul./Dez 2.005. p. 113-134. ROCHA, L. A. de G. Jogos de empresas: desenvolvimento de um modelo para aplicação no ensino de custos industriais. Dissertação de Mestrado em Engenharia da Produção. Florianópolis: Universidade Federal de Santa Catarina, 1.997. Disponível em: http://www.eps.ufsc.br/disserta97/giordano/cap3.htm. Acesso em: 10/02/2.009. ROSA, André R.; AZUAYA, Antônio Carlos A. Jogos de empresa na educação superior no Brasil: perspectiva para 2.010. In: Anais do Encontro Anual da Associação dos Programas de Pós-Graduação em Administração, 30. Salvador, 2.006. SCHIRATO, Maria Aparecida. Não sois máquinas! Homens é o que sois! Revista FAE Business, n. 4, Dez 2.002. Disponível em: http://www.fae.edu/publicacoes/pdf/revista_fae_business/n4_dezembro_2002/rh2_nao_sois_ maquinas_homens_e_o_que_sois.pdf. Acesso em: 03/02/2.009. TANABE, M. Jogos de empresas. Dissertação de mestrado. Universidade de São Paulo, FEA, 1.977. TRIPP, David. Pesquisa-ação: uma introdução metodológica. Educação e pesquisa, v. 31, n. 3, Set./Dez. 2.005, p. 443-466. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/ep/v31n3/a09v31n3.pdf. Acesso em: 15/02/2009. VICENTE, Paulo. Jogos de empresas. São Paulo: Makron Books, 2.001.
Compartilhar