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MONOGRAFIA - O POPULISMO PENAL E SUAS IMPLICAÇÕES NO SISTEMA JURÍDICO PÁTRIO

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FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DE RONDÔNIA 
CAMPUS PROFESSOR FRANCISCO GONÇALVES QUILES – CACOAL/RO 
DEPARTAMENTO ACADÊMICO DE DIREITO 
 
 
 
 
ROBERVAL DE SOUZA CORREIA 
 
 
 
 
 
 
 
 
O POPULISMO PENAL E SUAS IMPLICAÇÕES NO SISTEMA JURÍDICO 
PÁTRIO 
 
 
 
TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO 
MONOGRAFIA 
 
 
 
 
 
 
CACOAL – RO 
2020 
 
 
 
 
 
ROBERVAL DE SOUZA CORREIA 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
O POPULISMO PENAL E SUAS IMPLICAÇÕES NO SISTEMA JURÍDICO 
PÁTRIO 
 
 
 
 
 
 
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao 
Departamento de Direito da Fundação Universidade 
Federal de Rondônia – Campus Professor Francisco 
Gonçalves Quiles, como requisito parcial para a 
obtenção do grau de Bacharel em Direito elaborado sob a 
orientação do Professor Doutor Bernardo Schmidt 
Teixeira Penna. 
 
 
 
 
 
 
 
 
CACOAL – RO 
2020 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação 
 Fundação Universidade Federal de Rondônia 
Gerada automaticamente mediante informações fornecidas pelo(a) autor(a) 
__________________________________________________________________________ 
 
C824p Correia, Roberval de Souza. 
 
O populismo penal e suas consequências no sistema jurídico pátrio: 
Trabalho de Conclusão de curso - Monografia / Roberval de Souza Correia. – 
Cacoal, RO, 2020. 
 
82 f. 
 
Orientador(a): Prof.ª Dra. Dr. Bernardo Schmidt Penna 
 
1.Populismo penal. 2.Garantismo. 3.Processo penal. 4.Direito constitucional . I. Penna, 
Dr. Bernardo Schmidt. II. Título. 
 
 
 Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Direito) – Fundação 
 Universidade Federal de Rondônia 
 
CDU 343.9 
__________________________________________________________________________ 
 
Bibliotecário(a) Luís Cláudio Borges CRB 8/9921 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
O Populismo Penal e suas implicações no Sistema Jurídico Pátrio 
 
 
 
 
 
 
ROBERVAL DE SOUZA CORREIA 
 
 
 
Monografia apresentada ao Curso de Direito da Fundação Universidade Federal de 
Rondônia UNIR – Campus Professor Francisco Gonçalves Quiles – Cacoal, para obtenção 
do grau de Bacharel em Direito, mediante a Banca Examinadora formada por: 
 
 
 
 
 
 
_____________________________________________________ 
Orientador: Professor Dr. Bernardo Schmidt Teixeira Penna- Presidente 
Fundação Universidade de Rondônia (Unir) Campus de Cacoal-RO 
 
 
_____________________________________________________ 
Examinadora: Professora Me. Ozana Rodrigues Boritza, 
Fundação Universidade de Rondônia (Unir) Campus de Cacoal-RO 
 
 
_______________________________________________________ 
Examinador: Professor Dr. Roberto de Paula 
Fundação Universidade de Rondônia (Unir) Campus de Cacoal-RO 
 
 
 
 
Conceito: _____________ 
 
 
 
 
Cacoal/RO,_______/__________/___________ 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Em insígnia gratulação, dedico o 
presente trabalho aos meus pais Glória 
Natália e Francisco Correia, à minha 
amada esposa Zelma Tomaz e às minhas 
queridas filhas Yasmin Nathalia e 
Ysabelle Camilla, pela convicção do 
orgulho que representa o momento. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
AGRADECIMENTOS 
 
Primeiramente a Deus, criador do universo e doador do dom da vida, sem o qual o 
impossível não seria possível, na certeza da finitude humana, da origem do pó e o retorno à 
mesma insignificância. 
A meus pais, instrumentos da dádiva de se fazer presente no universo, mesmo que 
de maneira insipiente. Pela educação, amor, carinho e incentivos, desafiadores às vezes, de 
buscar sempre o conhecimento e romper a barreira do status quo. 
À minha esposa Zelma Tomaz, pelos aguilhões diários, quando o desânimo quis 
dominar e o alvedrio de abdicar à luta era bem maior que a aptidão para prosseguir, 
prorrompendo com forças transcendentes para superar o próximo obstáculo, por mais 
liliputiano que se apresentasse. 
À minha filha Yasmin Nathália, pelo companheirismo de sempre. Por se fazer 
presente ao meu lado no prélio diurnal dividindo nas mesmas condições a sobrecarga da 
pugna na busca pelo conhecimento. Pelas palavras de incentivo: "vai ir até o fim para me dar 
exemplo de forças!" 
À minha filha Ysabelle Camilla, pelo abraços carinhosos nas partidas e nas 
chegadas. Por compreender as ausências ressentidas quando deveria estar presente. De igual 
modo, pelos encorajamentos cotidianos, calcados sempre no orgulho do triunfo em grande 
escala, representador de paradigmas a serem refletidos. 
Ao nobre professor Antônio Paulo dos Santos Filho, pelas orientações, dedicadas e 
abnegadas quando ainda o presente era praticamente uma miragem. 
Ao preclaro professor Dr. Bernardo Schmidt Teixeira Penna, pela dedicação tenaz 
impulsionadora da concretude na construção do conhecimento. 
A todos os professores, pelos donativos diuturnos de conhecimentos reptos, em um 
esforço descomunal, que só a missão de educar é capaz de deslindar. 
Aos meus colegas de turma, verdadeiros amigos, alguns filhos adotivos por 
representatividade, pelo acolhimento e imensurável aceitação das visíveis diferenças. Em 
especial: Fernando Cesar, Tércio Sobrinho, Welber Gordo, Marina Zorzi, Bruna Rodrigues, 
Hilary Pansini, em suma, todos que de algum modo contribuíram de forma pertinaz, para 
tornar o ambiente da sala de aula o mais aprazente possível, em uma comunhão de 
desígnios. 
 
 
 
 
 
Aos meus amigos Alcides Branco e Tony Rafael Oliveira Branco, representantes da 
empresa Tony Tur turismo, pela disponibilidade do transporte diário, feito com apreço, 
esmero e hospitalidade, sem o qual impossível perseverar. Indubitavelmente, uma das mais 
importantes armas na conflagração renhida quotidiana. 
Muito obrigado a todos e todas, sem os quais e as quais, a quimera não teria se 
tornado realidade, embatumado de orgulho e admiração própria. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
RESUMO 
 
O trabalho revisita o populismo penal sob a perspectiva processual penal e sua relação com 
direitos fundamentais, um dos mandamentos primordiais da Constituição da República 
Federativa do Brasil de 1988. Avaliar o fenômeno sob o prisma político e sociológico e 
quais consequências jurídicas daí advirá se demonstra imperativo. A origem do populismo 
penal está associado às pressões sociais realizadas pela população, acossada via de regra, por 
falta de políticas públicas no sentido de garantias mínimas que condicionem dignidade às 
pessoas. O espetáculo midiático, relacionado à violência, tem levado legisladores, 
magistrados, autoridades policiais, entre outros responsáveis pelo tema a buscar a via 
simplista do endurecimento penal, com segregação em massa como forma de resolução dos 
problemas sociais causados pelo aumento da criminalidade, sem, contudo o enfrentamento 
do problema em sua gênese. Assim, o que se constata são políticos, juízes, promotores e 
outras autoridades agindo neste sentido, apascentando massas de alienados e mal 
informados, que acreditam piamente, e inocentemente, que o recrudescimento da legislação 
penal é a solução para suas aflições diárias no sentido da estabilização da paz e da dignidade 
social. O endurecimento penal neste sentido tem sido cada vez mais freqüente, com o 
crescente apoio da grande maioria da população, que assiste, e aplaude uma produção 
legislativa em matéria processual penal e penal que se alicerça no rigorosismo legislativo, 
tendo como norte a segregação como meio e fim das políticas públicas de combate às 
dissensões sociais violentas. Assim, o presente trabalho por meio da utilização do método 
dedutivo, traz à tona tema de relevância importante no meio social e consequentementejurídico, evocando inicialmente aspectos históricos da ocorrência do populismo penal, 
apresentando dados legislativos, com índices da produção legal no tocante ao tema, as 
consequências no devido processo legal e consequentemente as mitigações das garantias daí 
decorrentes, apresentando ao cabo, um mapeamento dos números de crimes considerados 
mais violentos, especialmente aqueles contra a vida e de clausuras, tomados como 
indicadores de violência e de políticas punitivistas de segurança pública, contrapondo-os 
para analisar a hipótese de ineficiência. 
 
PALAVRAS-CHAVE: Populismo Penal, Garantismo, Processo Penal, Direito Penal, Direito 
Constitucional. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
ABSTRACT 
 
The work revisits penal populism from a criminal procedural perspective and its relation to 
fundamental rights, one of the primary mandates of the Constitution of the Federative 
Republic of Brazil from 1988. Assessing the phenomenon from a political and sociological 
point of view and what legal consequences will result from this is imperative. The origin of 
criminal populism is associated with the social pressures carried out by the population, 
which is usually harassed, due to the lack of public policies in the sense of minimum 
guarantees that condition dignity to people. The media spectacle, related to violence, has led 
legislators, magistrates, police authorities, among others responsible for the theme to seek 
the simplistic way of criminal hardening, with mass segregation as a way to solve the social 
problems caused by the increase in crime, without, however, facing the problem in its 
genesis. Thus, what can be seen are politicians, judges, prosecutors and other authorities 
acting in this direction, feeding masses of alienated and ill-informed, who firmly and 
innocently believe that the increase in penal legislation is the solution to their daily 
afflictions in the sense of stabilization of peace and social dignity. The criminal hardening in 
this sense has been more and more frequent, with the growing support of the great majority 
of the population, who assist, and applauds a legislative production in criminal and penal 
procedural matters that is based on legislative rigorism, with segregation as the means of 
guidance. and an end to public policies to combat violent social dissensions. Thus, the 
present work brings up an issue of important relevance in the social and consequently legal 
environment, initially evoking historical aspects of the occurrence of criminal populism, 
presenting legislative data, with indices of legal production in relation to the theme, the 
consequences in due legal process and consequently the mitigations of the ensuing 
guarantees, presenting, at the end, a mapping of the numbers of crimes considered more 
violent, especially those against life and clauses, taken as indicators of violence and punitive 
public security policies, contrasting them to analyze the inefficiency hypothesis. 
 
KEYWORD: Penal Populism, Guarantee, Criminal Procedure, Criminal Law, Constitutional 
Law. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
SUMÁRIO 
 
Introdução ............................................................................................................................... 9 
 
1 - O Populismo Penal 
1.1 - A ascensão punitivismo penal.....................................................................................11 
 1.2 - O populismo penal no Brasil.......................................................................................14 
1.2.1 - Ordenações Filipinas............................................................................................17 
1.2.2 - Sistema Penal no Brasil - Império e arcabouço social e penal.............................19 
1.2.3 - O Código Criminal do Império............................................................................21 
1.2.4 - Período da Regência e Segundo Império - A Lei nº 261 de 1841........................25 
1.2.5 - A Lei nº 2033 de 20 de setembro de 1871 - Tentativa de abrandamento penal...27 
1.2.6 - O Processo Penal na primeira fase republicana...................................................28 
1.2.7 - O Código Penal de 1890......................................................................................29 
1.2.8 - O Código Penal de 1940 - Síntese histórica.........................................................33 
1.2.8.1 - Finalidade das penas.....................................................................................41 
 
2 – Sanções penais do Código Penal atual..........................................................................43 
2.1 - A reforma do Código Penal de 1984.........................................................................47 
2.1.1 - Princípio da Dignidade da Pessoa Humana..........................................................49 
2.1.2 - Princípio da Legalidade........................................................................................49 
2.1.3 - Princípio da Intervenção Mínima.........................................................................49 
2.1.4 - Princípio da Lesividade........................................................................................50 
2.1.5 - Princípio da Pessoalidade e da Culpabilidade......................................................50 
2.1.6 - Princípio da Humanidade.....................................................................................51 
2.1.7 - Princípio da Proporcionalidade............................................................................51 
2.1.8 - Princípio da Individualização da Pena.................................................................53 
 
3 - A Legislação Processual Penal da ditadura aos dias atuais.......................................54 
 
4 – Rigor penal legislativo no Brasil e as justificativas do Congresso 
Nacional.................................................................................................................................56 
4.1 - Análise quantitativa...................................................................................................57 
4.1.1 - Análise quantitativa e seus respectivos governos................................................58 
4.1.2 - Recorrência de temas...........................................................................................59 
 
5 – Inópias do populismo penal...........................................................................................65 
5.1 - Ineficiências do Populismo Penal em números.........................................................68 
5.2 - Resultado do Populismo Penal - Evolução da população carcerária.........................73 
 
6 – Considerações finais......................................................................................................74 
 
7 – Referências bibliográficas.............................................................................................78 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
9 
 
INTRODUÇÃO 
 
O presente trabalho monográfico apresenta como título O Populismo Penal e suas 
implicações no Sistema Jurídico Pátrio, avaliando as consequências do populismo penal no 
devido processo legal, buscando delimitar o estudo sobre populismo penal e suas ilações 
jurídicas, balizando as análises sobre o Direito penal máximo nas nuances de contraposição 
com Garantismo. Desta maneira, existe uma íntima relação com o Direito Processual Penal, 
Direito Penal e Direito Constitucional. 
Neste diapasão, impreterível se mostra insistir que o Brasil é um dos maiores 
produtores de violência no mundo e que a realidade tem levado a uma produção legislativa, 
em matéria processual penal e penal cada vez mais populista, com evidencialismos 
rigorosos, buscando satisfazer uma população ávida peloenclausuramento e punições 
severas, com vistas à punição e vingança contra aqueles que tenham praticado crimes 
tipificados como inaceitáveis ou que algum ato seja visto de forma reprovativa pela 
população, que influenciada, na maioria das vezes, pela mídia, cobram posicionamentos de 
seus representantes. Nesta direção, existe a condução no sentido de crer que não existem 
meios outros de agir sobre o transgressor a não ser com um maior e mais amplo rigor 
punitivo, que seria a única e viável alternativa capaz de atender os anseios e frear a violência 
e a insegurança. 
Não é exagero afirmar que a alimentação diária do sentimento de vingança e a ideia 
de encarceramento e até mesmo a pena de morte, são os combustíveis para a sensação de 
paralisar condutas criminosas. Assim, se busca dar ênfase ao delito praticado, e se o ato não 
se configura delito, possa ser ao menos reprovativo, com o azo de alcançar um consenso ou 
apoio popular para a produção e expansão de normas baseadas no poder punitivo, com égide 
em mais presídios, mais poder policial (nada obstante abusos que daí advirão), mais 
vigilância à população, enfim, maior controle social. 
Inicialmente, no primeiro capítulo, será traçado um escorço histórico do populismo 
penal e sua relação com o sistema jurídico penal brasileiro desde as primeiras normas, a 
saber, As ordenações Filipinas, perpassando pelo Código Criminal do Império assim como 
as tratativas de endurecimento e medidas liberalizantes das respectivas legislações penais até 
chegar ao atual Código Penal em vigor. No mesmo passo, realizou-se um paralelo das 
normas penais e sua combinação com o populismo penal e a ascensão do punitivismo penal 
no Brasil. 
 
 
 
10 
 
O capítulo segundo e seus tópicos apresentarão as sanções penais do Código Penal 
atual, perpassando pela reforma sofrida em 1984, apresentando ainda tabelas comparativas 
entre os diplomas legais em matéria penal, quando se referem às penas impostas aos 
respectivos crimes. Considerando a mitigação dos princípios constitucionais garantidores da 
limitação do jus puniedi do Estado frente ao cidadão, com destaque para a dignidade da 
pessoa humana. 
No capitulo 3, a abordagem será referente à legislação processual penal 
compreendida no período inicial ao final da ditadura militar no Brasil, quando do golpe de 
1964 aos dias atuais. 
O capítulo 4 referenciará as justificativas do Congresso Nacional em seu processo 
legiferante, na produção legislativa penal e processual penal, tratando dos projetos de leis 
propostos e aprovados, com tabelas estatísticas devidamente embasadas comparando as 
diversas épocas do Direito penal brasileiro, perpassando pela recorrência de temas. 
O quinto capítulo, intitulado As Inópias do Populismo Penal, apresentará de forma 
ampla, com tabelas e gráficos comparativos, as ineficiências do populismo penal na 
repressão e prevenção ao crime. 
O capítulo 6 trará as considerações finais, apresentando de forma sintética as 
consequências jurídicas e sociais do populismo penal, ou seja, quais consequências o 
sistema jurídico pátrio assim como a sociedade avaliada em sua realidade social vem 
sofrendo com o fenômeno. 
Por fim, pretende se apresentar as referências bibliográficas utilizadas para a 
produção do presente trabalho científico. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
11 
 
 
1 O POPULISMO PENAL 
1 .1 Ascensão do punitivismo penal 
Inicialmente, pertinente estabelecer um escorço histórico sobre o populismo penal, 
com o azo de precisar critérios situativos. Neste sentido, ao final da Segunda grande Guerra, 
a maioria dos países passou a praticar um modelo de capitalismo calcado no 
assistencialismo, baseado no Estado de Bem-Estar Social. No período pós-guerra, foi 
possível constatar uma queda vigorosa nas taxas de desemprego, maior persistência no 
equilíbrio econômico, segurança para investimentos e elevação salarial, gerando um estado 
geral de confiança da sociedade nas instituições estatais. Essa confiança se refletia 
diretamente na delegação de competência para elaboração de políticas públicas, à época 
baseadas na opinião de especialistas e em pesquisas profissionais, sendo o público estiva 
circunstancial tão somente se o Estado exorbitase seus poderes. Durante esse período, o 
direito penal estava em processo de reformulação para redução de seu papel de derradeiro 
ratio. As penas tinham como principal objetivo o correcionalismo, através da reabilitação e 
reinserção social do ofensor, cingida em estrutura penal-previdenciária que pleiteava pelo 
uso de encarceramento apenas como último artifício. O Estado penal-previdenciário foi 
resultado direto de uma gnosiologia criminológica que visualizava o problema criminal 
como resultado de exiguidade individual – privação de estudo, de oportunidade, de família, 
de condições psicológicas, enfim, de entrosamento social – que só poderia ser superada por 
meio de medidas sociológicas de integração. Por esse ponto de vista, a estrutura cultural de 
mérito na busca pela ascensão social e econômica estaria em descompasso com a estrutura 
social definidora dos meios legítimos de obtenção desses objetivos, gerando uma sociedade 
desorganizada que irremissivelmente teria indivíduos que apresentaria condutas desviantes. 
Na esteira de Merton, a anomia é o produto da antinomia entre a estrutura cultural e a social 
(...) nasce, desse conflito socialmente determinado, uma relação de tensão que acabaria por 
gerar condutas desviantes, ensejando o rompimento das normas ou seu completo desprezo 
(MERTON, 1970). Assim, a privação de determinados grupos sociais, afastando-os de metas 
culturais restritas a poucos privilegiados, geraria frustração, força motriz da criminalidade. 
Sendo a força anômica uma matriz do criminalismo, o Estado e a sociedade passam a se 
perceberem como propulsores da criminogenia, assim sendo, parcialmente culpados pelas 
condutas desviantes. 
Dessa forma: 
 
 
 
12 
 
 
Sob esses novos axiomas condutores da política criminal, o enquadramento penal-
previdenciário definiu uma racionalidade penal de bem-estar social, balizada na 
condição deficitária do delinquente e necessidade de assistência estatal para sua 
reabilitação e reintegração social. Esses objetivos só poderiam ser satisfeitos por 
profissionais especialistas, que passam a substituir as autoridades legais dantes 
responsáveis pelos programas de justiça criminal que interpretavam a pena como 
fim em si mesma. Essa atribuição de competência a profissionais revestiu as 
políticas criminais com caráter técnico, tipicamente apolítico, o que afastava o 
interesse de cobertura midiática e debate do grande público. (ALMEIDA, 2018, p. 
16). 
 
Nos auspícios desses modernos postulados condutivos da política criminal, a 
enquadração penal-previdenciário definiu um senso penal de bem-estar social, orientada na 
condição deficitária do criminoso e necessidade de auxílio estatal para sua reabilitação e 
reinserção à sociedade. Esses fins só seriam satisfeitos por especialistas, que doravante, 
substituem as autoridades legalmente instituídas anteriormente responsáveis pelos 
prospectos de justiça criminal que enxergavam a pena como um objetivo em si mesma. Essa 
delegação de atribuição a abalizados, paramentou as políticas criminológicas com jaez 
técnico – científico, especificamente afastado do caráter político, o que distanciava o 
interesse de cobertura mediática e debatimento do grupo alvo. À coletividade apraz 
perceber, não havia de todo, suplantado a asseveração alicerçada no punitivismo, no entanto, 
não se via como promotor importante nas políticas criminais, muito menos, procurava se 
opor energicamente à hodierna visão penal previdenciária. Desta maneira, o 
descontentamento com a assistência do estado aos necessitados, passa a ser aos poucos 
motivo proeminente para buscar meios eficazes de uma suposta segurança em face dos 
problemasoriundos da delinquência. 
Nesse diapasão: 
As instituições previdenciárias são responsáveis por uma “mudança de 
dependência”, onde os indivíduos necessitados deixam de depender, e.g., da 
família, e passam a depender de serviços sociais estatais. Essa mudança causa 
incômodo à classe média, que, enquanto pagadora de impostos, começa a criar 
antipatia pelo Estado de bem-estar por considerar que seu dinheiro está 
beneficiando apenas a terceiros. Além disso, em vista do desenvolvimento 
capitalista e sua criação constante de novos produtos, os serviços estatais passam a 
ser considerados aquém da expectativa, demasiadamente burocráticos e 
inflexíveis, incapazes de acompanhar e pagar os modernos desenvolvimentos 
mercantis. Em paralelo ao descontentamento popular, as taxas de criminalidade se 
mantinham em ascendência, gerando uma sensação de caos e impunidade. 
(ALMEIDA, 2018, p. 16). 
 
Nessa direção, a busca pelo Estado mínimo passa a ser a viga mestra das novas 
proposições com vistas a superar o status quo até então existente, levando se em 
 
 
 
13 
 
consideração que os investidores avaliam a segurança do local de investimento para 
direcionar seus recursos, havendo uma alteração de arquétipo sobre o papel do Estado, que a 
partir de então, passa a ser o intendente por propor e efetivamente criar as condições 
socioeconômicas para o neoliberalismo globalizado. Nessa conjuntura, há uma mudança nas 
funções e responsabilidades do Estado, que passa de incumbido do bem-estar social para 
primordialmente policialesco, consoante avaliado por Bauman: 
No mundo das finanças globais, os governos detêm pouco mais que o papel de 
distritos policiais superdimensionados; a quantidade e qualidade dos policiais em serviço, 
varrendo os mendigos, perturbadores e ladrões das ruas, e a firmeza dos muros das prisões 
assomam entre os principais fatores de “confiança dos investidores” e, portanto, entre os 
principais dados considerados quando são tomadas decisões de investir ou de retirar um 
investimento. (BAUMAN, 1999). 
Atuando como ator preliminarmente policial, o Estado mínimo se afasta de regular 
a economia. Dado que o neoliberalismo alçou-se esteiado na crise financeira, seu triunfo 
inconstante apenas aumenta a miséria antes estabelecida, por não ter poder de consumo, o 
pobre é repelido do sistema econômico, em contraponto totalmente oposto àquele do período 
de Bem-Estar Social. A inutilidade do pobre para o neoliberalismo, tipicamente, irá reforçar 
o perfil do criminalizado, sendo basilar para a crescente criminalização da pobreza e para o 
uso do enclausuramento como mecanismo de domínio dos excluídos. Assim, o caminho para 
o controle, de forma mais ágil e eficiente, é o populismo penal, que se baseia em propor leis 
que buscam garantir aos cidadãos "de bem", a pseudo sensação de segurança, ante à 
realidade escancarada. A Constituição federal traz em seu bojo princípios explícitos e 
implícitos. Esses princípios são pilares garantidores dos cidadãos, como regras de 
interpretação e integração e também como um mandamento que não poderá ser desonrado 
pelo legislador. 
Dessa maneira, o populismo penal está inserto em um conjuntura expansionista de 
uma espécie de espetacularização da violência e como forma de julgar e combater essa 
violência, a produção de legislação baseada em uma espécie de justiçamento. Acossada pelo 
medo, a população clama pelo recrudescimento das penas e a ampliação do espectro 
punitivista estatal, calcado no falso argumento de que tais medidas irão diminuir a violência 
e consequentemente as práticas criminosas. 
 
 
 
 
 
14 
 
 
 
 
1.2 O Populismo Penal no Brasil 
De acordo com Gomes e Gazoto (2016), de 1940 até o final do primeiro semestre 
de 2009, aproximadamente 122 leis que alteram o sistema penal, quanto aos crimes comuns 
foram apresentadas. Delas, 80,3% foram no sentido de tornar mais gravosas as reprimendas 
penais, 12,3%, mais benéficas e 7,4% possuem conteúdos mistos ou indiferentes. Realizada 
uma análise acurada dessas leis, constata-se que as penas agravaram, em geral, havendo 
casos que foram quintuplicadas, sextuplicadas e até octuplicadas. Prossegue, os eminentes 
juristas: 
Por tudo isso, chega-se a uma primeira conclusão geral: contrariando a expectativa 
de que, após a Constituição Federal de 1988, com a redemocratização do estado, houvesse 
uma reavaliação geral do direito penal imposto pela ditadura militar, retomando-se o 
processo de abrandamento e humanização das penas, estas estão cada vez mais e mais 
rigorosas. (GOMES; GAZOTO, 2016, p.247) 
Na contramão da história, encontra-se a produção legislativa brasileira em matéria 
penal, levando magistrados à parcialidade, deixando a independência de lado, com 
ações e julgamentos que se mostram muito mais formas justiceiras de vingança 
que a aplicabilidade da legislação correlata esteada no bom senso de justiça. [...]" 
 
 O delinqüente deve ser investigado, processado, condenado e punido, porém tudo 
deve ser feito com respeito às mais amplas garantias inerentes à sua condição humana e de 
cidadão. A teoria garantista sustenta-se em dez axiomas (GRECO, 2007, v. 1, pp. 12-13), 
quais sejam:Nullapoenasine crimine (não há pena sem crime); Nullumcrimensine lege (não 
há crime sem lei); Nullalex (poenalis) sinenecessitate (não há lei penal sem necessidade); 
Nulla necessitas sine injuria (não há necessidade sem ofensa); Nulla injuria sineactione(não 
há ofensa sem ação); Nullaactiosine culpa (não há ação sem culpa); Nulla culpa sine judicio 
(não há culpa sem processo); Nullum judicium sineaccusatione(não há processo sem 
acusação);Nullaaccusatiosineprobation (não há acusação sem provas); 
Nullaprobatiosinedefensione"(não há prova sem defesa). 
Entretanto, estudos realizados em diversas épocas e lugares demonstram, que a 
pena não possui os efeitos dissuasivos que se lhe atribui, ou ao menos, que o índice de 
prevenção de crimes não é proporcional ao rigor da pena. No início do século XX, a título 
de exemplo, estudos realizados por Rusche e Kirchheimer fizeram amplos estudos sobre os 
 
 
 
15 
 
efeitos do rigor penal nas cifras criminais da Inglaterra e País de Gales, entre 1911 e 1928. 
As conclusões indicam que os resultados mostraram uma grande tendência de queda em 
crimes específicos, apesar da liberalidade da política penal contemporânea. Transcription: 
 
Observamos a partir de um quadro que se apresenta, um declínio nas condenações 
por furto e apropriação indébita e um crescimento de detenções feitas sem 
condenação. Nessas categorias de crime há um declínio geral no recurso de 
encarceramento e uma tendência a oscilar entre sentenças de dois meses. O uso de 
fianças saltou acentuadamente. Em resumo, uma política penal mais liberal - à 
parte do crescimento médio das sentenças para pena de prisão - acompanha uma 
queda apreciável na taxa de criminalidade. A tendência no caso da apropriação 
indébita é diferente. Há uma acentuada variação entre as sentenças de curta e 
média duração, sem um aumento no número de fianças ou decréscimo nas 
condenações. Uma política penal mais severa não produz qualquer efeito na taxa 
de criminalidade, que permanece estacionária. (RUSCHE; KIRCHHEIMER, 
2004, p. 267). 
 
Ou seja, é de se observar que desde prístinos tempos, o endurecimento penal não 
tem surtido o efeito preventivo como querem alguns, servido apenas como maquilagem para 
uma realidade controversa. Qual seja, de busca de segurança e tranquilidade. 
Na mesma medida, neste entendimento, quando o legislador constituinte utilizou o 
termo “acusados em geral” acabou por proteger e abarcar todos aqueles que forem 
imputados de cometer algum fato delituoso, de forma ampla e protecionista, pois se assim 
não quisesse, teria utilizado apenas o termo “acusados”, o que permitiria uma leitura mais 
formalista. (LOPES JUNIOR, 2014, p. 755). Por conseguinte, há de se buscarde forma 
eficiente a aplicabilidade de reprimendas, não no sentido de vingança, mas na busca de 
aplicabilidade da justiça, que na visão do mestre Aury Lopes Júnior (1997, p. 47), consiste 
no garantismo penal, que se esteia em princípios básicos como: jurisdicionalidade: não só 
como necessidade do processo penal, mas também em sentido amplo, como garantia 
orgânica da figura e do estatuto do juiz. Também representa a exclusividade do poder 
jurisdicional, direito ao juiz natural, independência da magistratura e exclusiva submissão à 
lei. Inderrogabilidade do juízo: no sentido de infungibilidade e indeclinabilidade da 
jurisdição. Separação das atividades de julgar e acusar: configura o Ministério Público como 
agente exclusivo da acusação, garantindo a imparcialidade do juiz e submetendo sua atuação 
a prévia invocação por meio da ação penal. Deve ser lido de forma mais abrangente, 
evitando que o juiz tenha iniciativa probatória e acabe substituindo as partes na liberação de 
suas cargas probatórias. Presunção de inocência: a garantia de que será mantido o estado de 
inocência até o trânsito em julgado da sentença condenatória implica diversas consequências 
 
 
 
16 
 
no tratamento da parte passiva, inclusive na carga da prova (ônus da acusação) e na 
obrigatoriedade de que a constatação do delito e a aplicação da pena serão por meio de um 
processo com todas as garantias e através de uma sentença. Contradição: é um método de 
confrontação da prova e comprovação da verdade, fundando-se não mais sobre um juízo 
potestativo, mas sobre o conflito, disciplinado e ritualizado, entre partes contrapostas: a 
acusação (expressão do interesse punitivo do Estado) e a defesa (expressão do interesse do 
acusado em ficar livre de acusações infundadas e imune à penas arbitrárias e 
desproporcionadas). Fundamentação das decisões judiciais: para o controle do contraditório 
e da racionalidade da decisão, isto é, sobre a existência de provas suficientes para derrubar a 
presunção de inocência. Tanto das sentenças como também das decisões interlocutórias. Só 
a fundamentação permite avaliar se a racionalidade da decisão predominou sobre o poder. 
Nas palavras de Ferrajoli: 
 
Esse esquema, como se sabe, apresenta numerosas aporias lógicas e teóricas, que 
fazem dele um modelo ideal e em grande parte ideológico, e que em várias 
ocasiões tem provocado sua desqualificação científica e política por parte da 
cultura jurídica, com resultados indefectivelmente antigarantistas. Ademais, antes 
de empreender sua crítica e revisão teórica, é útil delinear, ainda que apenas 
esquematicamente, seus elementos constitutivos. Estes elementos são dois: um 
relativo à definição legislativa, e o outro à comprovação jurisdicional do desvio 
punível. E correspondem a singulares conjuntos de garantias - as garantias penais e 
as garantias processuais - do sistema punitivo que fundamentam.(FERAJOLI, 
2002, p.30) 
 
Ademais, a democracia, que se assenta em dispositivo político, com vistas à cultura 
de realce da pessoa frente aos abusos do Estado, iniciou a busca pela socialização do direito 
repressivo penal e processual, como decorrência do robustecimento do ser humano como 
sujeito passivo no processo, concedendo lhe a prerrogativa de inocente até que fique 
provado ao contrário, tudo visando à dignidade da pessoa humana. A partir dessa premissa, a 
reprimenda aplicada no processo criminal não deve ser levado em conta como trivial 
ferramenta punitivista, mas de outro norte, de modo que se estabeleça como apresto 
assegurador de garantias, mínimas que sejam, dos seres a ele submisso. 
Desta forma, Na concepção de Sarlet (2002, p. 62), a dignidade humana constitui-se 
em "qualidade intrínseca e distintiva de cada ser humano que o faz merecedor do mesmo 
respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando, neste sentido, um 
complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra todo e 
qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições 
existenciais mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação 
 
 
 
17 
 
ativa e co-responsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com os 
demais seres humanos". 
No Brasil, o reflexo direto do populismo penal vem sendo medido por pesquisas de 
opinião pública sobre o nível de apoio a medidas mais punitivistas, apontando que a adesão 
ao discurso de políticas duras está no nível mais alto desde o começo da série histórica. D 
acordo com pesquisa realizada pelo Instituto Datafolha, em novembro de 2017, 57% da 
população seria a favor da pena de morte – um crescimento de 10% na última década, e 84% 
dos entrevistados se declararam favoráveis à redução da maioridade penal. Já em pesquisa 
no começo de 2018, 77% se disseram a favor da prisão perpétua para crimes hediondos 
(Índice de Conservadorismo Brasileiro, realizado pelo Ibope Inteligência, fevereiro/2018, 
JOB0104). 
Em todo o período histórico do direito penal brasileiro, o país experimentou etapas 
evolutivas, que podem ser avaliadas por algumas características particulares, sendo o poder 
público do momento, o definidor da matiz da estrutura social daquele específico momento. 
Nada obstante as especificidades nacionais particularizantes, não se pode afirmar que 
fugimos à regra de países ocidentais, no tocante a marcos históricos, sejaprincipalmente por 
força da colonização, seja pela facilidade que as ideias políticas que emanam dos países 
centrais possuem de influência em solo pátrio. Há uma quase adoração pelo modo de vida e 
de pensar, sobretudo de países ocidentais. 
Neste tom, importante sinopsar a história do direito penal brasileiro, com especial 
ênfase no período compreendido a partir da Independência, tencionando identificar as 
estruturas sustentantes sociologicamente referenciais, como atinentes teóricos, para melhor 
compreensão do que se pretende demonstrar, ao logo do trabalho.É importante perceber que 
as penas aplicáveis hodiernamente, são comparativamente mais gravosas que as de outrora. 
Desta forma, imperativo se demonstra traçar os períodos da história brasileira e as 
legislações aplicáveis nas diferentes épocas em matéria penal, para uma análise um pouco 
mais acurada sobre o tema. 
 
1.2.1 Ordenações Filipinas 
A primeva legislação vigorante em terra brasilis, foi evidentemente a portuguesa. 
Desde o descobrimento, no ano de 1500 até a Independência em 1822, a sujeição, do ponto 
de vista formal, eram às leis lusitanas, ou seja, às Ordenações do Reino, que mesmo 
 
 
 
18 
 
ineptamente sistematizadas, abrangiam normas de toda ordem: civil, penal de Administração 
Pública, tributos, entre outras. Tudo, em um volume único, divididos por temas. 
Nesta direção, salutar esclarecer que as relações públicas e privadas portuguesas 
foram regidas, de forma sucessiva, pelas Ordenações Manuelinas, isto no século XV, 
Ordenações Afonsinas, século XVI e Filipinas. As duas primeiras, praticamente não trazem 
nenhum sentido à realidade brasileira, por não serem aplicáveis à história nacional, uma vez 
que até a efetiva instalação do Tribunal da Relação da Bahia, em 1609, o poder e 
consequentemente a aplicação da lei eram atributos de capitães de navios, líderes militares e 
locais, quando de suas atividades exploratórias e posteriormente, pelos donatários das 
capitanias hereditárias, que detinham o poder de nomeações de juízes, ouvidores e 
autoridades, que inclusive, poderiam deter competências criminais para aplicação de penas 
capitais. Desta forma, a capitania hereditária era um pequeno reino, onde o detentor do 
poder, ou seja, seu possuidor detinha todos os privilégios legais e criava a legislação que 
mais apropriada lhe parecesse, quer dizer, sem nenhum controle político ou legal, o que leva 
a crer que não se mostra apropriada para parâmetros comparativos, por não haverdados ou 
índices específicos que serviriam de base para o presente trabalho. Naquele período, como 
historicamente se sabe, o Brasil era refúgio de toda a sorte de pessoas, desde aventureiros, 
ávidos por títulos, até fugitivos, que se instalavam onde havia guarida “legal”, protetiva ou 
de melhores meios de sobrevivência, o que de per si, traz em seu bojo características muito 
peculiares, a depender do local onde as pessoas se estabeleciam. Era uma época de 
legislação aplicada localmente, diferenciando, por força de mandamento central, de região 
para região. 
 
“Até a instalação do Tribunal da Relação da Bahia, em 1609, o poder foi exercido, 
quase que absolutamente, pelos capitães de navios, líderes de expedições militares 
e exploratórias e, finalmente, pelos donatários das capitanias hereditárias, que 
nomeavam juízes e ouvidores com competências pra causas criminais que 
pudessem resultar em pena de morte. Seus privilégios e isenções judiciais eram 
parecidos àqueles concedidos aos “magnatas” em Portugal, pois seus territórios 
não estavam sujeitos às visitas do Corregedor da Coroa e, mesmo após a chegada 
de Pero Borges, o primeiro Ouvidor-Geral, seus poderes não lhes foram 
subtraídos. Mencione-se que, até 1609,não havia pelourinho que representasse o 
poder constituído na cidade de Salvador; relata-se que, à época, na cidade de São 
Paulo, dos 190 moradores, 65 eram fugitivos da justiça, que lá encontravam asilo 
legal. Assim, o Brasil era o refúgio “legal” de foragidos da justiça. Só tinham 
direito ao “couto” pessoas acusadas de heresia, traição e falsificação. (GOMES e 
GAZOTO, 2016, p. 78). 
 
 
 
 
19 
 
Destarte, não há de se falar de legislação de maneira organizacional, dado o 
emaranhado de “legislações” locais, que nem sempre refletiam a suposta legalidade 
centralizada, não havendo controles específicos ou registros dessas codificações. 
Assim, neste norte, as Ordenações Filipinas foram as que mais tempo 
permaneceram em vigor no país, por cerca de 300 (trezentos) anos, atingindo até mesmo 
épocas posteriores à independência, enquanto não eram aprovados os primeiros códigos da 
nova era que se iniciava então, por força da segmentação colonial advinda com o anúncio 
separatista. 
O evidente aspecto histórico das Ordenações, precipuamente as chamadas Filipinas, 
servem apenas como marco, sem nenhum aspecto paradigmático para o estudo que se 
desenvolve, até porque envolto pelo espírito situacional da época, que se atinha às questões 
sociais particulares, precipuamente baseadas em critérios cristãos, como e.g. lastros 
punitivos a feiticeiros, hereges, benzedores, cristãos que se relacionavam com pessoas 
consideradas infiéis, alcaiotes e proxenetas entre outros. Havia preocupação também com 
homens que se ataviavam com roupas femininas além de mouros e judeus que não se 
importavam em sinalizar tais condições. As penas eram as mais variadas, nestes casos. 
Apenas como ilustração, pode se afirmar que iam de confisco de bens à pena de morte. 
Interessante magistério sobre o tema nos apresenta Zahidé Machado Neto. Observe-
se: 
O Livro V, chamado pelos historiadores e comentadores de “catálogo das 
monstruosidades”, “código bárbaro”, incumbindo-se do direito penal e respectivo 
processo, é um bom reflexo do absolutismo colonialista, da justiça beata e 
ritualística, da indiferenciação de princípios religiosos, morais e propriamente 
jurídicos. As esferas normativas se entrelaçam como se pretendessem alcançar, 
num nível de abarcamento total, todos os aspectos da conduta humana, cujo 
controle se faz ali de modo desproporcionado e preciosamente minudente. Crime e 
pecado se confundem, e as penas, se não têm o caráter privativo da vindita, muito 
dele se aproximam, a sua transmissibilidade sendo tomada em muitos casos como 
autêntica garantia da “composição”, admitindo-se e usando-se, largamente, a 
analogia. (MACHADO NETO, Zahidé, 1977, p. 33). 
 
Portanto, se apresenta como lições historiadoras, a fim de situacionar-se, as 
apresentações do nascedouro das legislações pátrias para uma melhor análise do que está por 
advir. 
 
1.2.2 Sistema penal do Brasil – Império e seu arcabouço social e penal 
 
 
 
20 
 
Conveniência é o que estimulou a independência brasileira em relação à coroa 
portuguesa. De uma lado, o príncipe regente se atem fiel às perspectivas políticas de 
Portugal, que poderia ainda definir novos rumos. De outro norte, a visão aparece no 
horizonte de forma nimbosa, porque inevitável se demonstrava a separação, umbilical até 
então no que se refere à política e legislação. Sem a participação da família real, a 
independência brasileira equivaleria dizer que todos os laços estariam rompidos e o poder 
seria uma disputa com a participação das massas populares, o que contrariava em muito o 
desejo dos grandes fazendeiros, que eram força política considerável em uma colônia 
ativamente agrícola, esteiada em força escravocrata. O assenhoramento do poder central 
deveria estar alicerçado no representante da Casa de Bragança, porque de outra maneira, a 
alternativa seria recorrer à mobilização popular, o que não era recomendável, sob os olhos 
dos poderosos de então. 
Nelson Werneck Sodré, tratando do conceito de povo no Brasil, da época, 
apresenta umintelecto globalizante da composição estrutural da sociedade brasileira à época 
da Independência: 
 
Uma estimativa de 1823 admite a existência de quatro milhões de habitantes no 
Brasil. Desses quatro milhões, um milhão e duzentos mil são escravos. Do ponto 
de vista social, a população se reparte em: a) senhores de terras e de escravos, - 
que constituem a classe dominante, - e são em vastas áreas, senhores de terras e de 
servos, quando nelas existem relações feudais; b) pessoas livres, não vivendo da 
exploração do trabalho alheio, agrupadas numa camada intermediária, entre os 
senhores, de um lado, e os escravos e os servo, de outro, camada que recebera 
grande impulso com a atividade mineradora, compreendendo pequenos 
proprietários rurais, comerciantes, intelectuais, funcionários, clérigos, militares; c) 
trabalhadores submetidos ao regime da servidão; d) escravos. Como os servos e 
escravos, tanto quanto os pequenos grupos de trabalhadores livres que se 
dispersam particularmente em áreas urbanas, não têm consciência política, 
embrutecidos que se acham pelo regime colonial, só participam da luta pela 
autonomia a classe dominante de senhores e a camada intermediária. Esta, 
incontestavelmente, participa desde muito cedo da referida luta e está presente em 
todos os movimentos precursores dela, movimentos que, como a Inconfidência 
Mineira, reúnem militares, padres e letrados. Pelas condições que caracterizam a 
vida colonial, entretanto, a luta pela autonomia só poderia ter possibilidades de 
vitória quando englobasse a classe dominante. E esta padece de vacilações 
constantes; só esposará o ideal da Independência em sua fase final, empolgando-o, 
para moldar o Estado segundo os seus interesses. (SODRÉ, 1962, p. 19). 
 
Assim, no interior desse sistema, se desenha a legislação brasileira de então. A elite 
(política, não a pensante), organizou um sistema político anafadamente centralizador. O 
imperador detinha todo o poder de execução, que governava com “mãos de ferro”. Nesse 
quesito, chama atenção a forma dos representantes do Poder Legislativo. Os deputados eram 
eleitos de forma indireta, com base em voto censitário. 
 
 
 
21 
 
O artigo 92 da Constituição Imperial, a propósito regia: 
 
Art. 92. São excluidos de votar nas AssembléasParochiaes. 
 I. Os menores de vinte e cinco annos, nos quaes se não comprehendem os 
casados, e Officiaes Militares, que forem maiores de vinte e um annos, os 
Bachares Formados, e Clerigos de Ordens Sacras. 
 II. Os filhos familias, que estiverem na companhia de seus pais, salvo se servirem 
Officiospublicos. 
III. Os criados de servir, em cujaclasse não entram os Guardalivros, e primeiros 
caixeiros das casas de commercio, os Criados da Casa Imperial, que não forem de 
galão branco, e os administradores das fazendas ruraes, e fabricas. 
 IV. Os Religiosos, e quaesquer, que vivam em Communidade claustral. 
 V. Os que não tiverem de renda liquida annual cem mil réis por bens de raiz, 
industria, commercio, ou Empregos.(BRASIL. [Constituição (1824)]. Constituição 
do Império do Brasil: outorgada em 22 de abril de 1824. Artigo 92. Disponível em 
: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/.htm. Acesso em 24 de março 
de 2020). 
 
É perceptível que a concentração de renda era requisito formal para aquisição do 
direito ao voto, que elegeria os representantes, deputados, ao passo que senadores, eram por 
suas vezes, vitalícios escolhidos por meio de listas tríplices, elaboradas pelas províncias, 
equivalentes aos estados federados atualmente, conforme asseverava os artigos 40 e 43 da 
Constituição Imperial de 1824. Observe-se: 
 
Art. 40. 0 Senado é composto de Membros vitalicios, e será organizado por eleição 
Provincial. 
[...] 
Art. 43. As eleições serão feitas pela mesma maneira, que as dos Deputados, mas 
em listas triplices, sobre as quaes o Imperador escolherá o terço na totalidade da 
lista. 
 
Os juízes eram nomeados diretamente pelo mandatário, a saber, o imperador, ao 
passo que os párocos eram considerados funcionários públicos, já que o Estado Imperial era 
o responsável pela arrecadação do dízimo da Igreja e sua aplicação prática. Assim, os padres 
eram pagos pelo Império. 
De toda a história política exposta, o objetivo é acostar-se no Código Criminal do 
Império, primeiro arcabouço jurídico penal genuinamente brasileiro. 
 
1.2.3 O Código Criminal do Império 
O primeiro projeto de um código penal tipicamente brasileiro, foi apresentado à 
Câmara no dia 03 de junho de 1826, pelo Deputado José Clemente Pereira, magistrado do 
Poder Judiciário dório de Janeiro. Tratava-se de apenas um esboço, uma vez que havia 
apenas quarenta e cinco artigos, cuidando basicamente de reprimendas aplicáveis em cada 
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/.htm
 
 
 
22 
 
caso, abstratamente idealizados. A esse projeto, alguns outros surgiram, já que a cada um, 
surgiam novas ideias e discussões sobre a insuficiência do anterior. Neste caminhar, 
finalmente em 16 de dezembro de 1830, com a sanção imperial, o primeiro Código Criminal 
brasileiro é posto em prática.O sistema penal no primeiro império, vale salientar, era uma 
imposição da Constituição de 1824, que ainda previa a instituição do Código de Processo 
Criminal, que efetivamente passou a vigorar em 1832, que comparativamente à legislações 
anteriores, não deixou de conter avanços garantistas, de um direito penal e processual mais 
racional. Com efeito, no artigo 179 da Constituição Imperial expressamente previa alguns 
princípios, que poderiam ser vistos como garantias constitucionais, como irretroatividade, 
inviolabilidade domiciliar, excepcionalidade da prisão sem culpa formada, admissão de 
fiança em crimes de menor potencial ofensivo, prisão provisória fundamentada, vedação dos 
juízos de exceção. Já com relação às penas, o mesmo artigo 179 já referido, aboliu penas 
consideradas cruéis, como açoites, torturas e a marca com ferro quente, estipulou ainda o 
princípio da personalidade ou intranscendência da pena, em uma antevisão do que seria o 
atual artigo 5º da Constituição vigente.
1
 
Nada obstante passos perceptíveis em direção ao respeito aos direitos humanos, o 
Código Criminal de 1830, ainda manteve penas de morte (artigo 38), galés (artigo 44), 
banimento (artigo 50), degredo (artigo 51) e ainda pena de desterro (artigo 52). Chama a 
atenção que na prática, prevalecia a aplicação de prisão simples (artigo 45) ou trabalhos 
forçados (artigo 46), por serem mais apropriados à mentalidade da época. Quanto à pena de 
morte, a comissão parlamentar responsável pelo debate à época, justificou sua manutenção, 
pela “baixa escolaridade” do povo, que acabaria sendo de relevância ao imaginário popular. 
Observe-se: 
 
A Comissão desejou suprimir a pena de morte, cuja utilidade raríssimas vezes 
compensa o horror causado na sua aplicação, principalmente nomeio de um povo 
de costumes dóceis, qual o brasileiro; porém o estado atual da nossa população, em 
que a educação primária não pode ser geral, deixa ver hipóteses em que seria 
indispensável: tendo a consolar-se desta triste necessidade com a providência da 
lei, que proíbe a execução de tal pena sem o consentimento do Poder Moderador, 
que seguramente o recusará quando convier a substituição. (GOMES e GAZOTO, 
2016, p. 94). 
 
 
Assim, além da possibilidade do perdão do imperador, consoante transcrição acima, 
necessário estabelecer também que a pena capital, conforme a regra do artigo 322 do Código 
 
1
A Constituição do Império do Brasil, ao contrário da atual Carta Política, como se sabe, foi outorgada em 22 
de abril de 1824, em comunhão com o autoritarismo imperial vigente à época. 
 
 
 
23 
 
de Processo Criminal do Império, teria sua aplicação apenas se a decisão condenatória fosse 
tomada pela unanimidade do júri popular, sendo portanto, conforme é possível perceber, 
mantida no Código Criminal imperial nos casos de homicídio qualificado (artigo 192), 
latrocínio (artigo 271) e para líderes de insurreição de vinte ou mais escravos (artigo 113), 
sendo estendida posteriormente, por intermédio da Lei 4, de 10 de junho de 1835, para punir 
escravos que matassem, ferissem ou cometessem qualquer outra ofensa física contra seus 
senhores, a ascendentes ou descendentes que em sua companhia morassem, assim como 
administradores, feitores e suas respectivas famílias. 
Importante magistério sobre o Código Processual Criminal do Império nos fornece 
GOMES e GAZOTO, que permite uma visualização da realidade vivida à época, no tocante 
aos procedimentos processuais criminais. 
 
Relativamente ao sistema processual, na Constituição do Império, estabeleceu-se 
uma justiça popular, composta de juízes e jurados, com competência cível e 
criminal (artigo 151), esta bastante ampla: compreendia não somente os crimes 
dolosos contra a vida – como ocorre atualmente – mas todos os crimes, em geral, 
com exclusão de algumas poucas contravenções. Os jurados se pronunciavam 
sobre fatos e provas, e os juízes aplicariam a lei, conforme decisão dos jurados 
(art.152). Os jurados eram tirados de uma relação feita em comum pelo juiz de 
paz, capelão e presidente da Câmara de Vereadores. Assim, muito embora os 
juízes de direito, que eram nomeados pelo imperador, presidissem às sessões de 
julgamento e prolatassem as sentenças, os verdadeiros julgadores eram pessoas do 
povo. 
O Código de Processo Criminal do Império estabeleceu a existência do júri de 
acusação e júri de julgamento: no dia do júri de acusação, em sessão presidida pelo 
juiz de direito da comarca, o juiz de paz apresentava todos os processos que ele 
próprio e os demais juízes de paz dos diversos distritos haviam prolatado sentença 
de pronúncia ou de impronúncia; sobre tais decisões, deliberava: 1) o conselho de 
acusação, formado por sessenta juízes de fato, sorteados do rol do distrito, 
confirmando-as ou não; 2) nos casos de confirmação de pronúncia, passava-se ao 
julgamento do crime, que era feito por um conselho de sentença, composto por 
doze jurados, tirados à sorte, do mesmo rol, sendo que a acusação e defesa podiam 
recusar doze sorteados. Os juízes de paz, que eram eleitos pelo povo, para um 
mandato de um ano, receberam importantes funções, de polícia administrativa e 
polícia judiciária (lavravam o auto de corpo de delito); realizavam a formação da 
culpa, relativamente aos crimes que eram de competência do júri popular; e ainda 
lhes competia julgamento das contravençõesàs posturas municipais e os crimes 
cuja pena restritiva de liberdade máxima seria de seis meses. (GOMES e 
GAZOTO, 2019, pp. 95,96). 
 
Nesse tom, verifica-se que o processo criminal do Brasil Império, estava em 
consonância, evidentemente, com a Constituição Imperial de 1824. É perceptível, a sintonia 
com o artigo 151 da Constituição, que estabeleciaindependência do Poder Judiciário em 
relação aos outros poderes, e determinava que esse poder referente fosse composto por 
juízes e jurados. Estes últimos estariam incumbidos da apreciação dos fatos enquanto que 
 
 
 
24 
 
aos juízes, a aplicação da legislação, conforme se abstrai do artigo 152 daquela norma 
constitucional. Primariamente, a organização do Poder Judiciário era dividida em instâncias, 
estando o Supremo Tribunal de Justiça no topo e os Juízes de Paz, Juízes Municipais e os 
Juízes de Direito na base, ou seja, primeira instância. A segunda instância, conforme previa 
o artigo 158 da Constituição, competia às relações, que deviam ser instaladas nas Províncias 
de acordo com a necessidade e comodidade popular.Interessante notar, conforme fica 
evidente, que já nessa época a justiça criminal se identificava muito com a justiça repressiva, 
abarcando todas as funções de coerção: desde o promotor, até a força policial e os juízes. 
Necessário destacar que o procedimento processual da época, era em muito 
diferente do atual, por óbvio. Primeiramente, não existia inquérito policial, o que de certa 
forma, assemelha de alguma forma, com proposições atuais, de que o caderno investigativo 
é plenamente dispensável, sendo esta questão em si, outra discussão, que não é pertinente 
com o tema especificamente tratado neste ponto, seguidamente, a lavratura do auto de corpo 
de delito ou uma delação, denominada de “denúncia”ou “queixa”, ensejava de imediato o 
início do procedimento, que seguia por impulso oficial. Na sequência, a instrução processual 
se desenvolvia perante um juiz singular, sendo o requisito para a denúncia ou não do 
acusado, sendo esta confirmada pelo júri de acusação, o réu seria submetido a julgamento 
pelo júri específico, chamados de “grande júri” e “pequeno júri”. Somente a partir desse 
momento é que se tinha ou não processo criminal, pois nos procedimentos anteriores, não 
havia que se falar em contraditório e ampla defesa a rigor. De toda a sorte, incutindo um 
sistema processual penal visionário para a época, podendo até de certa forma, ser 
considerado democrático de um ponto de vista mais perspectivo, a legislação processual do 
Império constituiu-se em avanço, de certo prisma, importanteà guisa de proteção a direito 
humanitário e liberal. Assim, são normas que se mostraram avançadas para uma época em 
que o suposto cometimento de atitudes ilegais, poderia ser visto como sinônimo de aplicação 
de medidas duras, cruéis por assim dizer. Com relação aos compilados legais, Faoro mostra 
interessante docência, aclarando, notadamente que: 
 
Duas medidas consagraram a autonomia local com medidas arrancadas à reação e 
partejadas com dor: o Código de Processo Penal (29 de novembro de 1832) e o 
Ato Adicional (12 de agosto de 1834). O Código de Processo Penal, a mais 
avançada obra liberal e a mais duramente criticada em dez anos seguintes, deu 
fisionomia nova aos municípios, habilitando-os a exercer por si mesmos, 
atribuições judiciárias e políticas num renascimento de sistema morto desde o fim 
do século XVII (FAORO, 2001, p. 364). 
 
 
 
 
25 
 
Sessenta anos transcorreram-se entre o Código Criminal e a norma seguinte em 
matéria penal, a saber, o Código Penal dos “Estados Unidos do Brazil” que data 1890. Nesse 
entremeio de período, o Estado brasileiro passou por algumas transformações políticas, 
sociais e consequentemente legislativas, que são interessantes de fazer nota, mesmo que de 
forma sintética, para não desposarmos da concatenação histórica dos acontecimentos. 
 
 
 
1.2.4 Período da Regência e Segundo Império – A Lei nº 261 de 1841 
Neste instante, sem a pretensão de esgueirar-se por outras matérias, insjuntivo se 
apresenta a realidade histórica do momento referencial. Nesta proposição, na madrugada do 
dia 07 de abril de 1831, Dom Pedro I proporcionaria parte do seu plano para não perder o 
direito ao trono português. Com o intento de manter sob sua tutela, os dois tronos, o 
brasileiro e o de Portugal, que poderia herdar de seu genitor, D. João VI, abdicou ao 
primeiro em favor de seu filho D. Pedro II, então com cinco anos de idade, que ficou sob a 
tutela de José Bonifácio, isto sob forte pressão que sofria da oposição, fortalecida que saiu 
nas últimas eleições. Com a menoridade do monarca, assumiu o poder uma regência, 
chamada de trina, de maneira provisória, até que o sucessor atingisse a maioridade, que 
passou em seguida a ser permanente e em 1834, passou a ser uma, com a escolha do regente 
mediante voto popular. Nesse meio tempo, foram experimentados vários avanços, que 
poderiam ser considerados liberais, inclusive maior descentralização de poder do Governo. 
No tocante ao que é mais relevante no presente, relacionado à justiça, estabeleceu-se juízes 
municipais, que, além de julgar demandas cíveis, detinha sob sua tutela o poder de comandar 
o aparato policial, respondendo pela ordem pública. Os juízes em comento eram eleitos 
pelos próprios habitantes do local. O fato em si, foi o grande responsável pela vitória dos 
liberais nas eleições daquela época, o que levou o padre Diogo Feijó a ser regente único. 
Revoluções eclodiram, em diversas regiões do país, sobretudo patrocinadas pelos 
conservadores, sobretudo nas províncias, atuais Estados do Pará, Maranhão, Pernambuco, 
Bahia e Rio Grande do Sul. A situação levou o regente a pedir mais poderes legais para 
enfrentar os revoltosos de forma legal. Entre discussões sobre a temática, liberais temerosos 
por um retrocesso na legislação e no processo legiferante, de um lado patrocinavam atitudes 
conservadoras, para uma posterior busca liberal. Enfim, o resultado foi a coroação 
antecipada do herdeiro do trono, Dom Pedro II, então com quinze anos incompletos, levando 
 
 
 
26 
 
ao processo cognominado de “regresso”, com a reforma do Código de Processo Criminal, 
aprovada em 03 de dezembro de 1841, pela Lei 261/2841, culminando com a centralização 
do comando policial e da justiça, esbulhando o juiz de paz, até aquele momento eleito pelo 
voto popular, de suas funções, transferindo para os juízes municipais e o chefe de polícia, 
agora nomeados pelo pode central. No mesmo ato, houve alterações significativas no 
instituto do júri, que até então, eram vistos como forma de participação popular mais 
interessante na condução de processos criminais. No que diz respeito ao júri, a lei 
retrocitada, extinguiu o júri preliminar, ou seja, o de acusação, substituiu a exigência de 
unanimidade dos votos na aplicação da pena de morte, passando agora a ser por dois terços 
dos sufrágios de seus componentes, ao passo que diminuiu o número de jurados, que 
inicialmente seria sessenta, passando para quarenta e oito, podendo a sessão ser realizada 
por trinta e seis,o que equivale dizer que a aplicação da pena de libitina poderia ser aplicada 
por vinte e quatro votos, a lista dos formantes do Conselho de Sentença passou a ser 
responsabilidade dos delegados de polícia, o que supostamente, poderia direcionar os 
julgamentos ao seu bel prazer, podendo escolher exatamente aqueles que coadunavam com 
ideias de penas capitais para determinado julgamento, sendo que ao mesmo tempo, a 
formação da culpa e a sentença de prolação também passou a ser responsabilidade das 
autoridades policiais. Para mais, o organismo do júri, perdeu algumas competências: 
julgamentos de crimes de contrabando passaram a ser de alçadas policiais, quanto ao seu 
julgamento. Já os crimes praticados por empregados públicos, que não privilegiados, 
passaram a serem julgados pelosjuízes de direito. Wolkmer (1998, p. 88)quando se refere à 
Lei 261/1841 que tratou como já explanado, da reforma do Código Processual da época, 
afirma que “ficava nítida a substituição das diretrizes judiciais descentralizadora para uma 
centralização rígida, poderosa e policialesca”. Houve um reforço no aparato burocrático da 
dominação patrimonialista, ao longo da condução monárquica, em que a atividade da justiça 
era sustido pelo cabal policialismo judiciário. 
Assim descreveu José Frederico Marques as variações apresentadas pela Lei 261 de 
1841: 
 
Criou se o cargo de Chefe de Polícia, no município e na Corte e em cada 
Província, criando-se, outrossim, os cargos de delegados e subdelegados distritais. 
O primeiro era ocupado por um desembargador ou um juiz de direito, os dois 
últimos por quaisquer juízes e cidadãos. As atribuições até então conferidas aos 
juízes de paz passaram a ser exercidas pelas aludidas autoridades, nos seus 
respectivos distritos. Assim, os chefes de polícia, como os delegados e 
subdelegados, além das funções policiais, tinham função judiciária. Os juízes 
 
 
 
27 
 
municipais eram nomeados pelo Imperador, por quatro anos, entre os bacharéis em 
direito com um ano de prática no foro, pelo menos, podendo ser removidos. No 
entanto, o governo da Corte, e os presidentes, nas Províncias, podiam nomear, por 
quatro anos, „seis cidadãos notáveis do lugar, pela sua fortuna, inteligência e boa 
conduta, para substituírem os juízes municipais‟, segundo a ordem em que 
estivessem seus nomes. (MARQUES, 1963, vol. I, p. 19). 
 
Neste tom, avultoso notar que os passos dados na direção do liberalismo, são 
retrogradados em épocas de crises, concordante se verifica nas argumentações acima. O 
rigor penal funciona, usualmente como vetor de suposta segurança jurídica em matéria penal 
e tranqüilidade, ao passo que ante às repercussões negativas, novas tentativas são 
verificadas. O rigorosismo penal atua como um viés cognitivo, junto ao imaginário 
popularesco, causando sensação de certeza de bem estar social. Não foi diferente no caso em 
comento, já que o formalismo exacerbado da Lei 261/1841, passou a repercutir mal, 
sobretudo no meio oligárquico, que viu seus poderes esvaziados frente à nova legislação 
extremamente realista e centralizadora. Neste passo, necessário se mostrou tomar medidas 
consideradas liberalizantes, ao menos de forma fictícia, buscando atuar entre outras massas, 
além daquelas já costumeiramente atingidas pelas medidas. Nessa lógica, surge a Lei 2033 
de 20 de setembro de 1871, que se juntaria à outras visualmente de cunhos liberalizantes. 
 
1.2.5 A Lei nº 2033 de 20 de setembro de 1871 – Tentativa de abrandamento penal 
Conforme já referido alhures, a Lei em contexto apresentou à população uma 
fachada prodigalizante, especialmente àquela camada que havia perdido parte de seus 
poderes, singularmente os grandes fazendeiros e poderosos. 
No entanto, parte dela poderia ser vista como positiva. A nova legislação 
restabeleceu a competência do júri que a lei anterior havia derrogado e extinguiu as 
atribuições judiciárias entregues à polícia pela Lei 261/1841. Pecava no entanto a nova 
norma, em alguns critérios, não sendo tão democrática quanto o Código de Processo 
Criminal de 1832, já que a competência dos juízes de paz, que eram eleitos pelo povo não 
foi restituída, ficando às questões restritas no âmbito municipal, a instrução processual de 
crimes com pena privativa de liberdade de até seis meses, continuou a ser feita pelas 
autoridades policiais, levando à instituição do inquérito policial, figura arcaica que insiste 
em permanecer no sistema processual penal brasileiro até nos dias atuais. 
Demonstra a novel, à época, o caráter ainda exacerbadamente centralizador do 
poder, já que além dos juízes municipais e os juízes de direito eram de livre nomeação do 
imperador, além, é claro, dos chefes de polícia. Até então, se falou em crimes e penas, 
 
 
 
28 
 
justificável até pelo período vivido, não havendo mudanças de significado relativo. Quase a 
totalidade das leis promulgadas naquele período foi no sentido de tentar estabilizar a 
escravidão. 
 
1.2.6 O Processo Penal na primeira fase republicana 
Proclamada a República em 15 de novembro de 1889, instala-se o Governo 
Provisório e com ele a República federativa, por intermédio do Decreto nº 01/1889. Neste 
caminhar, necessário se demonstrou atos legais que instaurasse em definitivo o novo sistema 
político nacional. Neste horizonte, surge a necessidade de uma nova Constituição, sendo 
aprovada e publicada no Diário do Congresso Nacional, agora renovado, no dia 24 de 
fevereiro de 1891 a primeira Constituição republicana, refletindo sobretudo, ideais 
positivistas e liberais. 
Com a federalização da República dos Estados Unidos do Brasil, emergiu a 
necessidade de instituição de um órgão judicial que estabelecesse ligação intima com a nova 
ordem política instaurada, sendo desvinculada dos governos e judiciários estaduais, sendo 
especialmente especializada em direito federal, pois nascia a ideia de cada ente instituir sua 
própria justiça, que cuidasse de sua específica legislação processual, conforme autorizava o 
artigo 34 da Constituição de 1891. Poucos Estados editaram códigos processuais próprios, 
como Bahia, São Paulo e Minas Gerais, sendo que a maioria declinou de tal competência, 
adotando de forma voluntária a legislação federal quanto ao tema. 
Até então, o que se visualiza é a independência dos Estados para legislar sobre 
matérias processuais. Quanto à Justiça Federal, ela nasceu através do Decreto nº 848 de 11 
de outubro de 1890, tendo como suporte legitimador o Decreto nº 510 de 22 de junho de 
1890, que durante certo período, funcionou como Constituição Provisória, sendo 
confirmado, nesse mesmo propósito, pela Constituição Federal de 1891, sendo, portanto 
uma norma recepcionada pela nova ordem constitucional, até pela necessidade premente que 
se apresentava. 
Quanto à questão penal, não apresentou o período da República Velha novidades 
expressivas, mantendo se em vigência Código de Processo Criminal de 1832, inclusive, 
descrevendocompendioso a Constituição Federal de 1891 em seu artigo 72, [...] parágrafo 
31: “É mantida a instituição do Júri”. No diapasão de independência dos Estados quanto à 
matéria processual, o que se verificou foi discussões sobre sua eficácia e sobretudo justiça. 
Alguns defendiam que o instituto não poderia ficar imóvel no tempo e outros a defesa de seu 
 
 
 
29 
 
status quo.No meio de tudo isso, alguns Estados, com especial importância para o Rio 
Grande do Sul, com fortes inspirações castelhanas, dada à proximidade dos países daquela 
região, instituíram mudanças no júri, tendo o estado sulista mencionado, alterado o número 
de componentes do Conselho de Sentença, reduzindo-o a cinco, já que a tradição castelhana 
traz em seu bojo, aversão à jurisdição popular sob o argumento da falta de técnica. Assim 
traduz Rui Barbosa (1950) o evento. Observa-se: 
 
Todos os estados brasileiros têm respeitado a garantia federal. O Rio Grande do 
Sul foi o único onde, sob as influências especiais que moldaram sua organização 
presente, entrou a se desenvolver, desde os trabalhos constituintes, o espírito de 
antagonismo do júri. Meras funções de tribunal correcional, presidido por um juiz 
amovível, eram as que ali atribuíam o projeto de constituição política. Apenas se 
lhes deixava “o julgamento de crimes afiançáveis e em geral de todos aqueles em 
que os réus se podiam livra soltos”. Era a inversão da ideia mais radical 
conhecidas no assunto. A política dominante naquele estado, portanto, não 
reconhece no júri esse caráter de constitucionalidade federal, que é a base de sua 
estabilidade entre nós contra as pretensões das tiranias locais. Mas nas próprias 
razões do governador se descobre a intenção de submeter o júri a umatransformação fundamental. Enquanto a leipositivista, com a confiança dos 
mezinheiros sociais nas panacéias revolucionárias, preconiza o voto a descoberto e 
na abolição do direito de recusa à fórmula salvadora, o espírito conservador das 
grandes instituições vê, pelo contrário, na recusa peremptória e no voto secreto 
dois elementos imprescindíveis à existência do júri”. (BARBOSA, 1950, p. 64). 
 
Dentro do emaranhado de leis processualistas, surge o Código Penal de 1890, já, 
conforme definido anteriormente sob tutela republicana. 
 
1.2.7 O Código Penal de 1890 
Com o fim de uma era e especialmente da escravidão, que ocorrera ainda no 
período imperial, mostra se premente a elaboração de um novo código, agora adaptado à 
nova realidade sociológica e política. Mesmo antes da Proclamação da República, já haviam 
projetos, entre eles o de Joaquim Nabuco, propondo tal adequação. A solução encontrada, 
com a Proclamação Republicana foi a construção de um novo código. Com especial rapidez, 
o projeto foi apresentado ao Ministro da Justiça, que por meio do Decreto nº 847 de 11 de 
outubro de 1890, aprovou o Código Penal dos Estados Unidos do Brasil. Nada obstante as 
críticas, a nova codificação apresentou avanços peculiares. Zaffaroni e Pierangelli (1997, p. 
190), disseram que o novel código “possuía um texto liberal, clássico, que simplificou o 
sistema de penas anterior, a ponto que, para seu tempo, significou um sensível avanço sobre 
o texto do código imperial”. 
 
 
 
30 
 
Este código estipulou praticamente com exclusividade penas de prisão celular, em 
seu artigo 45. Compreende-se por “prisão celular” é o mesmo que privação de liberdade, em 
regime fechado, cumprida em penitenciária, acrescida de multa. Reclusão, em seu artigo 47, 
tal qual se verifica hodiernamente, com trabalho obrigatório (artigo 48) e disciplinar (artigo 
49), que conforme analisado, se distinguia quanto ao local de cumprimento das penas. 
Importante novidade foi acolhida pelo Código Penal de 1890, que foi os prazos 
prescricionais e da condenação, conforme preceituava os artigos 78 a 85. Examine-se: 
 
Art. 78. A prescripção da acção, salvos os casos especificados nos arts. 275, 277 e 
281, é subordinada aos mesmos prazos que a da condemnação. 
Art. 79. A prescripção da acção resulta exclusivamente do lapso de tempo 
decorrido do dia em que o crime foi commettido. Interrompe-se pela pronuncia. 
Art. 80. A prescripção da condemnação começa a correr do dia em que passar em 
julgado a sentença, ou daquelle em que for interrompido, por qualquer modo, a 
execução já começada. Interrompe-se pela prisão do condemnado. 
Paragraphounico. Si o condemnado em cumprimento de pena evadir-se, a 
prescripção começará a correr novamente do dia da evasão. 
Art. 81. A prescripção da acção e da condemnação interrompe-se pela 
reincidencia. 
Art. 82. A prescripção, embora não allegada, deve ser pronunciada ex-officio. 
Art. 83. A acção criminal e a condemnação, nos crimes a que a lei infligir 
exclusivamente pena pecuniaria, prescreverão em um anno a contar da data do 
crime ou da condemnação. 
Art. 84. A condemnação a mais de uma pena prescreve no prazo estabelecido para 
a mais grave. 
Paragraphounico. A mesma regra se observará com relação áprescripção da acção. 
Art. 85. Prescrevem: 
Em um anno, a condemnação que impuzer pena restrictiva da liberdade por tempo 
não excedente de seis mezes; 
Em quatro annos, a condemnação que impuzer pena de igual natureza por tempo 
de dousannos; 
Em oito annos, a condemnação que impuzer pena de igual natureza por tempo de 
quatro annos; 
Em doze anos, a condemnação que impuzer pena de igual natureza por tempo de 
oito annos; 
Em dezeseisannos, a condemnação que impuzer pena de igual natureza por tempo 
de doze annos; 
Em vinte annos, a condemnação que impuzer pena de igual natureza por tempo 
excedente de doze annos. (BRASIL, Código Penal de 1890. Disponível em: 
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1851-1899/d847.htm. Acesso em 26 
de março de 2020). 
 
Quanto à gravidade das penas, importante reparar que em relação aos códigos 
anteriores, o Código Penal da primeira República se mostrou liberal e mais brando, senão 
verifica-se: 
Repare-se que, na passagem do Código Criminal do Império (1830), para o Código 
Penal Republicano (1890), dos dez crimes relacionados, considerando-se a pena 
máxima aplicável e, ainda, que a pena de galés é mais gravosa do que a de prisão, 
verifica-se que, em sete casos, a pena foi diminuída; e, em três casos, a pena foi 
mantida. Isso, aliado ao fato de que foram extintas as penas de banimento, galés e de 
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1851-1899/d847.htm
 
 
 
31 
 
morte (esta salvo a exceção referida), mais a estipulação de prazos prescricionais, 
leva à conclusão de que a legislação republicana importou em um abrandamento 
de penas. 
Quanto às novidades processuais penais, vimos que não houve alteração substancial, 
salvo a redução progressiva da competência do júri, por influência positivista. 
(GOMES e GAZOTO, 2016, p. 130). 
 
Importante trazer à baila algumas considerações históricas – sociológicas, de modo 
especial nesta argüição, que de um determinado ponto de vista, não foge ao tema proposto, 
mormente porque o Código Penal de 1890 se traduz em uma antevisão de transição entre a 
Monarquia e a República. Sendo a primeira codificação penal do período pós-monarquia, 
apresenta importantes nuances sobre a realidade política vivida naquele período, 
consequentemente sociológica e jurídica, se mostrando como uma das bases para a 
construção de ideias vindouras. Neste norte, para a necessária compreensão daquilo que se 
posiciona como processos-crime, definidos no Código Penal de 1890, é importante 
evidenciar que se recorreu aos conceitos patenteados de Pierre Bourdieu, que busca a 
abordagem no campo jurídico recorreu-se aos conceitos de Pierre Bourdieu, que aborda o 
campo jurisdicional, abordando sua estrutura simbologista, o lado interno do fato, realizando 
uma crítica aos marxistas que se manteve alheios à análise das convicções estruturantes, sem 
o aprofundamento necessário naquilo que realmente norteia internamente. Necessariamente 
nesta direção, Bourdieu estabelece a lógica do campo jurídico, quando afirmando que: 
 
As práticas e os discursos jurídicos são, com efeito, produto dofuncionamento de 
um campo cuja lógica específica estáduplamente determinada: por um lado, pelas 
relações de forçaespecíficas que lhe conferem a sua estrutura e que orientam 
aslutas de concorrência ou, mais precisamente, os conflitos decompetência que 
nele têm lugar e, por um outro lado, pela lógicainterna das obras jurídicas que 
delimitam em cada momento oespaço dos possíveis e, deste modo, o universo das 
soluçõespropriamente jurídicas. ( BOURDIEU, 2003, p. 211). 
 
 
É possível visualizar por meio da citação, que Bourdieu, destaca o quanto a área do 
Direito é objeto de monopólio, pelos agentes que a operam elaborando seus produtos, 
delimitando seus espaços e suas configurações através das leis. O ato em si, de recorrer às 
instâncias legais para a resolução de demandas é significativo no sentido da aceitação de 
uma das únicas formas de resolução, sem recorrer à violência, evidentemente, qual seja, 
transversalmente pela expressão legal, nada obstante, baseada em suas discussões. É o 
caráter negatório da violência física, tão presente em tempos primários da humanidade. 
Desta maneira, fica se submisso ao sistema ideológico que norteia o campo 
jurídico, esteiado em sua organização, bem explicitado por Bourdieu 
 
 
 
32 
 
 
O campo judicial é o espaço social organizado no qual e pelo qualse opera a 
transmutação de um conflito direto entre partesdiretamente interessadas no debate 
juridicamente regulado entreprofissionais que atuam por procuração e que têm de 
comum oconhecer e o reconhecer da regra do jogo jurídico,

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