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ISSN 2176-1396 O ESTÁGIO EM AMBIENTES NÃO ESCOLARES NA FORMAÇÃO INICIAL DE PROFESSORES: RELATO DE EXPERIÊNCIA Juliana P. de Araújo1 - UFG\RC Eixo – Formação de professores Agência Financiadora: não contou com financiamento Resumo O estágio supervisionado é atividade fundamental e obrigatória nos cursos de licenciatura. Predominantemente, ele é realizado em escolas da Educação Básica, desde a educação infantil até o ensino médio e em suma tem como objetivo a realização de um exercício de aproximação em relação ao espaço escolar e em relação a própria profissão docente. Em razão da dificuldade em estabelecer um modelo de formação inicial que atenda às múltiplas demandas da carreira na dimensão “escolar” é compreensível que uma minoria de cursos de licenciatura atente para as demandas projetadas pelos processos educativos que ocorrem fora das salas de aulas formais como aquelas desenvolvidas nas empresas, nas organizações não governamentais (ONGs), nos hospitais etc. São espaços que, de certo modo, acionam a busca por um perfil profissional mais flexível. Na Universidade do Estado do Pará o curso de pedagogia tem buscado responder ou pelo menos sensibilizar para estas demandas que são lidas como demandas que devem compor a base formativa dos pedagogos e para isso investe na realização de estágios em ambientes não escolares subsidiados pela disciplina “educação em ambientes não escolares”. Neste artigo objetivamos socializar um pouco de uma experiência conformada nesta perspectiva já que como formadores de professores desejamos contribuir com a discussão maior sobre a própria formação do pedagogo. Neste sentido apresentamos um pouco da discussão sobre o estágio e a educação em ambientes não escolares, o percurso da disciplina que enfoca no curso de pedagogia esta relação e alguns apontamentos que nos amparam em defesa de sua continuidade. Palavras-chave: Estágio. Ambientes não escolares. Pedagogia. Introdução Para darmos início a este relato, que enfoca uma experiência de estágio em ambientes não escolares, também conhecida como educação “não formal”, como denomina Gohn (2011) sentimos a necessidade de apresentar elementos que concorram para a desconstrução da visão 1Doutora em Educação: Universidade Federal de São Carlos- UFSCar. Professora Adjunta da Universidade Federal de Goiás- Regional Catalão (UFG\RC). E-mail: juliana.araujo@ufg.br 24672 paradigmática que evoca a escola como único local para a educação. Assim como Gohn (2011), entendemos que a educação não se resume à escolar, realizada na escola propriamente dita. Na defesa dessa afirmação, destaca que: Há aprendizagens e produção de saberes em outros espaços, aqui denominados de educação não formal. Portanto, trabalha-se com uma concepção ampla de educação. Um dos exemplos de outros espaços educativos é a participação social em movimentos e ações coletivas, o que era aprendizagens e saberes. (GOHN, 2011, p.333) Mesmo sendo crescentemente utilizada por Organizações Não Governamentais (ONGs), movimentos sociais, sindicatos, associações comunitárias, ou por toda organização que tenha em vista a formação do indivíduo, a educação não formal é um campo de estudo pouco valorizado e ainda desconhecido. Para Gohn (2006): A educação não-formal designa um processo com várias dimensões tais como: a aprendizagem política dos direitos dos indivíduos enquanto cidadãos; a capacitação dos indivíduos para o trabalho, por meio da aprendizagem de habilidades e/ou desenvolvimento de potencialidades; a aprendizagem e exercício de práticas que capacitam os indivíduos a se organizarem com objetivos comunitários, voltadas para a solução de problemas coletivos cotidianos; a aprendizagem de conteúdos que possibilitem aos indivíduos fazerem uma leitura do mundo do ponto de vista de compreensão do que se passa ao seu redor; a educação desenvolvida na mídia e pela mídia, em especial a eletrônica etc. Em suma, consideramos a educação não-formal como um dos núcleos básicos de uma Pedagogia Social. (GOHN, 2006, p. 2) A questão que se apresenta é que, em razão de uma formação de base positivista, afincada e fortalecida por uma pedagogia social, a tarefa de dar objetivos claros à educação não formal mostra-se complexa. Os objetivos dessa educação são construídos de forma interativa e cotidiana, e têm como meta a transmissão de informação, assim como a formação política e sociocultural. O que deriva da educação não formal é uma série de processos, dentre os quais estão a consciência e organização para agir no coletivo; concepção e reconstrução de percepção de si e de mundo; e formação para as adversidades, muito mais que para o mercado de trabalho. (GOHN, 2006). Gadotti (2005) também discute a questão da educação não formal e instiga a considerar o impacto da categoria espaço nessa atividade, considerando-a tão importante quanto a categoria tempo. Para ele, O tempo da aprendizagem na educação não formal é flexível, respeitando as diferenças e as capacidades de cada um, de cada uma. Uma das características da educação não formal é a sua flexibilidade, tanto em relação ao tempo, quanto em relação à criação e recriação dos seus múltiplos espaços. (GADOTTI, 2005, p. 2) 24673 Ressaltamos que a existência de uma maniqueização ou polarização da educação, assentada no eixo do formal e do não formal, implica na construção de locais mais ou menos educativos e não educativos, escolares e não escolares, que pouco se alinham ao presente, tão múltiplo e global em tempos, sujeitos e práticas. Essas construções, no senso comum e no cotidiano produzem uma educação crivada por distinções, que, no seio da sociedade, propiciam a supervalorização da educação formal, que compreende “o sistema educacional altamente institucionalizado, cronologicamente graduado e hierarquicamente estruturado que vai dos primeiros anos da escola primária até os últimos da universidade” (TRILLA; GHANEM; ARANTES, 2008) e uma desvalorização da educação não formal. Ressaltemos que a educação não formal envolve: Toda atividade organizada, sistemática, educativa, realizada fora do marco do sistema oficial, para facilitar determinados tipos de aprendizagem a subgrupos específicos da população, tanto adultos como infantis”; e a educação informal, “um processo, que dura a vida inteira, em que as pessoas adquirem e acumulam conhecimentos habilidades, atitudes e modos de discernimentos por meio das experiências diárias e de sua relação com o meio.” (COOMBS, 1975 apud TRILLA; GHANEM; ARANTES, 2008, p. 33) Ao longo deste texto, são empregados os termos “educação não escolar” ou “educação em ambientes não escolares” para fazer referência ao conjunto das práticas educativas que ocorrem no campo social, fora da escola. Desse modo, é feita uma distinção entre educação escolar, formal, e educação não escolar, não formal. Destacamos que as duas disciplinas da Universidade do Estado do Pará (UEPA), oferecidas no último ano do curso de Licenciatura em Pedagogia, voltadas ao tema, são: “Educação em ambientes não escolares” e “Estágio Supervisionado em Ambientes Não Escolares”. A criação dessas disciplinas resulta de um processo tenso de aproximação/concordância e distanciamento/negação em relação às estruturas e caminhos da educação formal. Além disso, reflete uma demanda apresentada pelos movimentos sociais que, no decorrer das últimas décadas do século XX, fazem uma releitura das dinâmicas sociais de transformação. Os movimentos sociais, inegavelmente, acompanham o ritmo do mundo cotidiano, que é mais ligeiro que o da escola, mais urgente. A relação entre movimento social e educação consolida-se a partir das ações práticas de movimentos e grupos sociais. Realiza-se, pois, na interação dos movimentos em contato com instituições educacionais (GOHN,2011) Essa relação pode ocorrer de duas formas: “na interação dos movimentos em contato com instituições educacionais, e no interior do próprio movimento social, dado o caráter educativo 24674 de suas ações” (GOHN, 2011, p. 334). Quanto ao modo como essa relação chega ou se apresenta no meio acadêmico, tanto brasileiro quanto estrangeiro, Gohn (2011) afirma que: No meio acadêmico, especialmente nos fóruns de pesquisa e na produção teórico- metodológica existente, o estudo dessa relação é relativamente recente. A junção dos dois termos tem se constituído em “novidade” em algumas áreas, como na própria Educação – causando reações de júbilo pelo reconhecimento em alguns, ou espanto e estranhamento – nas visões ainda conservadoras de outros. No exterior, a articulação dos movimentos com a educação é antiga e constitutiva de alguns grupos de pesquisa, como na International Sociological Association (ISA), Latin American Studies Association (LASA), Associación Latinoamericana de Sociologia (ALAS) etc. (GOHN, 2011, p. 334) Vivemos o júbilo, o estranhamento da relação academia (formação de professores) x educação não formal x movimentos sociais (ONGs). A formação de professores, impactada pelas tessituras múltiplas da realidade objetiva transita de modo frágil nas entretelas da sociedade e fora dos muros da escola manifesta apatia e desorientação que reflete um paradigma de formação ao qual a universidade se submete que é marcada por um processo de escolarização, de certificação, e, por isso, cada vez mais pela especialização. Em poucos momentos essa formação avança rumo à realidade externa aos muros da escola. Como anteriormente exposto, tomamos como foco deste texto a análise as ações desenvolvidas durante o estágio supervisionado da UEPA, que ocorre concomitantemente com a disciplina “Educação em Ambientes Não Escolares”. Avançaremos a seguir com a apresentação do desenvolvimento de nossa ação. Desenvolvimento Em Belém do Pará, os alunos do curso de licenciatura em Pedagogia aproximam-se das demandas provenientes tanto da educação em ambientes não escolares, quanto dos movimentos sociais. Isso ocorre especialmente através de duas disciplinas, “Educação em Ambientes Não Escolares” e “Estágio Supervisionado em Ambientes Não Escolares”, conquistas do diálogo entre o movimento popular urbano de bairros e a universidade. A experiência aproxima os futuros professores daqueles que eclodem na cena pública como "agentes de novos conflitos e renovação das lutas sociais coletivas". (GOHN, 2011, p. 337). É um desafio já que a formação inicial do pedagogo se define a partir da Resolução CNE/CP nº 1, de 15 de maio de 2006 que centraliza a profissão no eixo da docência e, portanto, assume como prioridade a educação formal pertencente ao lócus da escola. Esta instituição ainda que venha sofrendo para se adaptar 24675 ao intenso processo de mudança iniciado ainda nas décadas finais do século XX permanece como bastião da humanidade e do desenvolvimento humano. Em nosso relato nos voltaremos a pensar a partir de nossa experiência no estágio que ocorreu em uma Organização Não governamental (ONG). O termo ONG começou a ser utilizado na década de 1940, pela Organização das Nações Unidas (ONU), para designar entidades executoras de projetos humanitários ou de interesse público. No Brasil, a expressão referia-se principalmente às organizações de cooperação internacional, formadas por igrejas, católicas e protestantes; organizações de solidariedade; ou governos de vários países. Em um primeiro momento, essas organizações priorizavam a ajuda às organizações e movimentos sociais nos países do Sul, com o intuito de consolidar a Democracia. (ASSUMPÇÃO, 1993; VIEIRA, 2001). O fortalecimento das ONGs efetivou-se, conforme explica Gohn (2011), quando elas passaram a ser relevantes no cenário do associativismo nacional, já que, articuladas com empresas, bancos, redes do comércio e da indústria, ou por artistas famosos, começaram a realizar os projetos junto à população, em parcerias firmadas com o Estado. Essas características podem ser utilizadas para compreensão do Espaço Cultural “Nossa Biblioteca” (ECNB), que se localiza no Guamá, bairro da periferia de Belém, no estado do Pará, que possui quase 100 mil habitantes. É aberta ao público geral, geralmente moradores do bairro. Nela, o vocabulário empregado pelos profissionais, fixos e voluntários, que atuam na ECNB, reforça termos como "protagonismo", "compromisso social" ou "responsabilidade social". No discurso sobre o espaço, perpetua-se a história de luta pelas conquistas do lugar, ocorridas a reboque dos movimentos sociais, por meio das quais o Guamá e o próprio ECNB fortaleceram- se enquanto comunidade, constituindo uma identidade muito própria e bem delineada dentro da cidade de Belém. As ONGs têm sido a ferramenta utilizada para articulação do bairro com a universidade, com o poder público e com o meio empresarial local, no propósito de sanar algumas de suas muitas precariedades. É pela pressão, resistência e cultura que a população busca condições de vida mais condizentes com seus direitos. Procuram, também, a ampliação de espaços de lazer (pois possui uma única praça), de saúde (há um pronto socorro apenas), e escolas, além de incrementar o sistema de segurança, que é ineficaz. O elevado número de habitantes do bairro engloba grande diversidade de pessoas, com múltiplas origens e trajetórias. O bairro é alvo de preconceitos e depreciações em razão de sua fama de violência e criminalidade. Diante disso, suas lideranças e moradores possuem uma grande preocupação com a formação sociocultural dos habitantes da localidade, sobretudo os mais jovens e isso potencializa sua união na manutenção das atividades da ECNB voltadas à formação de 24676 mediadores de leitura e, logo, à consolidação de crianças leitoras. A ECNB orienta-se pela missão de evitar que o Guamá se perpetue como um dos bairros mais violentos da cidade de Belém. Uma das educadoras da Ong salienta que os objetivos da mesma são o incentivo a leitura e a conscientização das crianças, jovens e adultos. Segundo ela a leitura é instrumento para a cidadania pois contribui para a transformação social ao promover atividades culturais e educacionais para jovens e crianças carentes do bairro e articular parceria com escolas municipais e estaduais do entorno para o trabalho de incentivo a leitura e outras atividades culturais. O funcionamento da ECNB ocorre durante a semana, nos períodos da manhã e tarde, propiciando o acesso dos moradores ao acervo, que é composto por mais de 4 mil livros, que são emprestados pelo prazo de uma semana. No local, além do empréstimo de livros, os moradores participam de várias atividades, como o círculo de leitura, com teatro, dança e música; aulas de natação; aulas de artes marciais; e outras. O lugar possui legitimidade, sendo compreendido como difusor de conhecimento e cultura. Ao longo de um semestre, um grupo de dez alunas do curso de Pedagogia da UEPA participou ativamente das atividades da ECNB, através do Estágio Supervisionado, atuando fundamentalmente nos círculos de leitura e na organização de uma brinquedoteca. A primeira questão que surgiu para o grupo de estagiárias foi: se entendemos que a aprendizagem da docência em ambientes escolares se inicia nas vivências próprias como alunos, a partir de estratégias de prática enquanto “imitação de modelos” (PIMENTA; LIMA, 2005), como é vista, na formação inicial, a aprendizagem da docência ou da função de educador social em ambientes não escolares? Seria caso de se partir para uma mera reprodução do que se ensina na pedagogia pensada para a escola? Afinal, por onde ir, já que os estágios pouco enveredam nessa dimensão? De início, buscamos assumir o estágio como uma oportunidade para conhecer e compreender as bases teórico-metodológicasque envolvem o processo educativo. Bases que reclamavam textos sobre educação popular. O exercício era se apropriar de elementos da academia e da formação de professores e, ao mesmo tempo, reconstruí-los em mosaicos urgentes, que se preenchem do cotidiano, do humano, do diverso, do urgente. Havia a expectativa não ingênua, mas um tanto deslocada, de que as instituições - como ONGs, fundações, empresas, e outras - por atuarem no redemoinho do cotidiano e para o cotidiano imediato, para o trabalho, enfim, para a vida, propiciariam descobertas, materializações concretas da Pedagogia já consolidadas além dos muros escolares. A Pedagogia e seus aportes teóricos e metodológicos, como as metodologias de ensino, o currículo, e outros, não 24677 instrumentaliza, tampouco prepara para a atuação fora da escola. Na entretela entre ideal e real, expectativa e concretude, as ações do estágio no Guamá foram essenciais para insurgir no grupo de alunos a necessidade de uma reflexão crítica que pautasse a busca por um perfil mais possível de pedagogo. Percebemos durante o tempo em que estivemos por lá que mesmo a organização das tarefas tidas como as mais simples, como a estruturação de círculos de leitura, dos horários da brinquedoteca, ou o repertório para a Educação Popular, mostraram requerer uma base formativa que não propunha a escolarização dos grupos sociais frequentadores do espaço. O desenho curricular, os tempos-aula, as hierarquias compõem uma armadura difícil de ser abandonada por isso as expectativas positivas em relação à presença do pedagogo no lugar foram se delineando a partir do perfil histórico do professor. Coletivamente com as profissionais da ONG, foram vivenciadas grandes dificuldades em definir funções, tais como acompanhamento das atividades (roteiros, bases, conceitos, objetivos) e visualização de uma formação básica para mediadores de leitura, na maioria voluntários. Isso comprovou que não estão claros os papéis do pedagogo nos espaços educativos não escolares, o que dificulta para a universidade pensar essa formação. Isso ficou claro em diversos momentos, em que percebíamos uma expectativa irreal em relação às estagiárias. A aposta era que elas iriam estruturar, no papel e fora dele, todo o funcionamento do espaço, desde a proposta, passando pelas metodologias, até os objetivos de todas as atividades. Muito dessa pressão se explicou pelo fato da ONG estar constantemente pressionada pelo universo de editais e concorrências, muitos promovidos por grandes fundações para patrocinar e prover de verbas as iniciativas. Alí, ganhar um edital é tarefa com sentido de sobrevivência, sendo o maior desafio defender e fundamentar em texto metas e objetivos da ECNB. Esse tipo de escrita mostrou-se algo desconhecido para as alunas, distante das ações cotidianas de professores da educação básica e de sua formação. Ao longo de todo o percurso, mesmo com o auxílio da disciplina temática, sentimos a fragilidade de leituras e saberes na dimensão da Educação Popular. Constatamos, então, a necessidade que a universidade e o curso de Pedagogia têm de avançar no diálogo com outras instituições, que não unicamente a escola, para desconstrução dessa visão que perpetua de que o pedagogo é professor da e na escola. Para Freire (1983), o conflito derivado da ampliação da concepção de educação e educadores é benéfico, visto que promove uma “mudança de percepção, que se dá na problematização de uma realidade concreta, no entrechoque de suas 24678 contradições, implica um novo enfrentamento do homem com sua realidade” (FREIRE, 1983, p. 60). Das atividades realizadas e que foram bem avaliadas pelo grupo e pelas pedagogas da ECNB, destacamos a mediação de leitura e a contação de histórias para as crianças. Essas atividades tinham como responsável a mediadora do espaço e como auxiliar uma estagiária. A mediação é uma leitura, feita por um adulto, de um livro curto, com boas ilustrações, na qual há interações para construção de sentido e significado. Já a contação é um ato mais objetivo, que transmite a história do livro, preferencialmente, com objetos e outros recursos. Trata-se de um processo similar ao do brinquedo simbólico, em que a criança utiliza-se da imaginação para representar uma ideia. A execução dessas atividades sempre foi tranquila, e não expressava as tensões vividas durante o planejamento das mesmas, período sempre marcado por dificuldades de articulação e consenso entre alunos, professores e profissionais do espaço. Entendemos essa territorialização como uma expressão do alheamento da universidade, histórico por sinal; como uma defesa das pedagogas da ONG na posse de um saber cotidiano proveniente da experiência como "educadoras sociais"; e receio de mostrar meandros da construção desse repertório. Esse afastamento também reforça a hipótese de que não estava clara a base de conhecimentos necessários ao pedagogo ou quem desempenhasse esse papel. No caso, o pedagogo era “rei em terra de ninguém”. A escolha das leituras, dos livros a serem lidos nos círculos de leitura ou na mediação, foi atividade desenvolvida para aproximar o grupo das alunas e professora da UEPA do grupo das profissionais da ECNB. e estabelece a ONG. Considerações A experiência mostrou sobretudo, a ausência, a incapacidade ou distanciamento da formação inicial, que se pauta pela educação formal (escola), em responder aos problemas sociais que se impõem no atual contexto. A “formação de leitores” apresenta-se como desafio social que, naquela comunidade, em muito se diferencia dos processos de alfabetização aos quais se apegam. Portanto, a alfabetização ainda se mostra como uma competência atrelada ao mundo do trabalho, e não à cultura/identidade social. Nesse ponto, afirma-se a urgência da melhoria das disciplinas de alfabetização e/ou letramento na formação inicial do pedagogo. Estagiar em um local cuja função e perfil profissional do pedagogo eram desconhecidos, obrigou as estagiárias a ponderarem sobre como as dimensões da obrigação moral, do compromisso com a comunidade, e da competência profissional, que impactam na formação 24679 inicial, apresentam-se quando vividas em uma situação de estágio fora da escola. Entendemos que essas dimensões impactam profundamente, como um choque de realidade ainda mais agudo do que o que caracteriza a inserção profissional nas escolas, e como a descoberta de possibilidades que a academia não consegue apresentar. Consideramos que esses impactos geraram aprendizagens difusas, experienciais e pessoais. Entretanto, nos distanciarmos da formalidade escolar, é algo complexo, pois obriga a considerar o contexto em que se realiza para atender as necessidades apresentadas pelo público atendido, que passam ao largo do currículo oficial. O tempo e a rigidez burocrática do estágio supervisionado constituem outra barreira, já que os tempos nem sempre se ajustam em horas-aula. A partir da experiência exposta, foi possível percebermos que, apesar de terem indiscutível importância na promoção do saber, da ética e da cultura em uma localidade, os espaços educativos não escolares têm seus próprios dilemas e problemas, a serem ponderados e resolvidos, assim como os da escola e da universidade. A aproximação entre esses agentes é complexa, mas possível e absolutamente necessária para a educação em sua acepção maior. O estágio supervisionado em ambientes não escolares concorreu em alto grau para com o pressuposto da indissociabilidade entre teoria e prática, cuja transcendência é dada pela pesquisa. A experiência originou diversas produções, já apresentadas na Jornada de Estágio, que ocorre na universidade, assim como o texto que ora se apresenta, contribuindo para ampliação do debate/socialização junto aos pares. No mais, espera-se que outros trabalhos possam adensar este debate, dele surgindo novos embatese, logo, avanço, retrocesso, e, principalmente, aprendizagens. REFERÊNCIAS FREIRE, Paulo. Educação e Mudança. v. 8. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1983. GADOTTI, Moacir. A questão da educação formal/não-formal. Suisse: Institut Internacional des Droits de l´ Enfants, 2005, p. 1-11. GOHN, Maria da Glória. Movimentos Sociais na Contemporaneidade. Revista Brasileira de Educação, Rio de Janeiro, v. 16, n. 47, p. 333-361, 2011. GOHN, Maria da Glória. Educação não-formal na pedagogia social.. In: I CONGRESSO INTERNACIONAL DE PEDAGOGIA SOCIAL, 1., 2006. Anais Eletrônicos... Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo. 24680 ASSUMPÇÃO, Leilah Landim. A Invenção das ONGs: do serviço invisível a profissão sem nome. Rio de Janeiro: Museu Nacional; Universidade Federal do Rio de Janeiro, 1993. PIMENTA, Selma Garrido.; LIMA, Maria Socorro Lucena. O estágio na formação de professores: unidade teórica e prática. 4.ed. São Paulo: Cortez, 2005. TRILLA, Jaume; GHANEM, Elie; ARANTES, Valéria Amorim. Educação formal e não formal: pontos e contrapontos. 1.ed. São Paulo: Summus, 2008. VIEIRA, Liszt. Os Argonautas da cidadania. A sociedade civil na globalização. 1.ed. Rio de Janeiro: Record, 2001.
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