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Leishmaniose visceral

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Émile Fernandes
Medicina 
7
Leishmaniose visceral
Calazar ou leishmaniose visceral é uma protooze causada pelo Leishmania donovani com larga distribuição nas regiões tropicais e subtropicais no globo. Do ponto de vista clinico é uma doença grave e crônica consequente a disseminação do parasito em órgãos ricos em celulas do sistema fagocítico mononuclear como fígado e baço.
Epidemiologia: 
· Em 2020, até julho, foram registrados 56 novos casos, dispersos em 42 municípios. Incidência de 04 casos por 100 mil habitantes e redução de 54,5% com relação a 2019. 
· A Bahia possui 183 municípios com transmissão de LV, sendo 162 de baixa transmissão (38,9%), 22 municípios com médio risco de transmissão (5,3%) e 2 com alto risco de transmissão (0,5%), os quais são classificados como prioritários pela OPAS.
· Segundo o Ministério da Saúde, em 19 anos de notificação (1984-2002), os casos de LVA somaram 48.455 casos (anexo 1), sendo que aproximadamente 66% deles ocorreram nos estados da Bahia, Ceará, Maranhão e Piauí. Nos últimos dez anos, a média anual de casos no País foi de 3.156 casos, e a incidência de dois casos/100.000 hab.
· A doença é mais freqüente em crianças menores de 10 anos (54,4%), sendo 41% dos casos registrados em menores de 5 anos. O sexo masculino é proporcionalmente o mais afetado (60%).
Etiologia: O agente etiológico é um protozoário da família Trypanosomatidae a Leishmania é um parasito intracelular obrigatório que se multiplica nas celulas do sistema fagocitico mononuclear
Apresenta-se sob duas formas, a promastigota, possui vida extracelular, é alongado e móvel observada no tubo digestivo dos flebótomos (mosquito/vetor) ou em meios de cultura apropriados. Essa forma é fusiforme, mede cerca de 15 micrômetros e possui núcleo, citoplasma, cinetoplasto e um flagelo livre. A multiplicação ocorre por processo de divisão binária. Pode ainda ser classificada em dois estágios de desenvolvimento: fase logarítmica de crescimento e fase estacionária. Nesta última, o parasito encontra-se desenvolvido, ocupa o segmento anterior do tubo digestivo do inseto, onde pode ser inoculado no hospedeiro definitivo e causar a doença. A fase estacionária ou metaciclica é a forma infectante do parasito. Na superfície externa da promastigno existe uma gicoproteina de 63 KDa (gp63) e uma lipofosfoglicana (LGP), essas moléculas são utilizadas pelo parasito para aderir às celulas do hospedeiro definitivo logo após serem inoculadas, facilitando a entrada nas células e permite que não sejam destruídas. A promastigota que não se ligar às celulas do hospedeiro será destruída pela ação lítica do complemento, anticorpos inespecíficos e neutrófilos. Uma vez aderida à superfície do macrófago, a promastigota é fagocitada e transformada na forma amastigota.
A segunda forma a amastigota é arredondada ou oval, medindo 4 a 6 micrômetros de comprimento por 2 micromêtros de comprimentos, contem núcleo, cinetoplasto e um vacúolo, essa forma é encontrada dentro das celulas do hospedeiro definitivo. Se multiplica por divisão binária e tem vida intracelular. Tem muito pouco LPG e grande quantidade de gp63, nos macrófagos essa forma se multiplica até destruí-los. Com a morte do macrófago, o parasito fica livre no meio extracelular, podendo novamente ser fagocitado por outros macrófagos ou ser ingerido por mosquitos (hospedeiro intermediário) após sugarem o sangue desses mamíferos infectados, refazendo-se o ciclo. No tubo digestivo desses mosquitos, no epitélio intestinal, ocorre uma serie de transformações e as formas flageladas (promastigotas) migram até a probóscida, que é o nome do aparelho sugador dos mosquitos. No repasto das femeas, a probóscida é inserida na pele dos mamíferos para realizar a aspiração de sangue, antes disso o mosquito regurgita saliva que ajuda na dilatação dos vasos sanguíneos da pele facilitando a aspiração de sangue. É nessa regurgitação de saliva que são inoculados milhares de parasitos.
Ciclo biológico: 
1-Durante o repasto sanguíneo o vetor (mosquito palha) injeta promastigotas metacíclicas na pele do hospedeiro vertebrado; 
2- Se dirigem para os órgãos linfóides secundários, principalmente no fígado, baço, medula óssea e linfonodos, infectando células do sistema fagocítico mononuclear, como monócitos, histiócitos e macrófagos, onde se transformam em amastigotas. 
3- As amastigotas se multiplicam por fissão binária até romperem a célula hospedeira, disseminam-se pelas vias hematogênica e linfática, iniciando uma reação inflamatória e proporcionando a atração de outros macrófagos. 
4- Um flebotomíneo não infectado adquire o parasito ao se alimentar do sangue de um mamífero infectado, através da ingestão de amastigotas livres ou intramacrofágicos no tecido subcutâneo. 
5- As formas intracelulares (amastigotas) são liberadas no trato digestivo do inseto, que se diferenciam para formas promastigotas procíclicas, multiplicando-se por divisão binária. 
6- Estas formas procíclicas diferenciam-se para formas infectivas metacíclicas e migram, então, para a probóscide do inseto, de onde poderão infectar um novo hospedeiro mamífero. 
 O período de incubação é bastante variável tanto para o homem como para o cão: 
 No homem: 10 dias a 24 meses, com média entre 2 a 6 meses. 
 No cão: bastante variável, de 3 meses a vários anos com média de 3 a 7 meses. 
Imunopatogenia e imunidade: Os acontecimentos a partir do momento da picada do vetor até o aparecimento dos sintomas da LV depende de fatores genéticos e imunológicos, e o grau de expressão clínica da infecção é determinado pelo resultado da interação do parasita com o hospedeiro. De forma geral, o desenvolvimento da doença é dependente da resposta imune do hospedeiro. Ocorrem múltiplas interações entre o hospedeiro e o parasito, as quais envolvem todos os componentes de doença. No entanto, o parasita tem estratégias, que são os mecanismos de evasão às varias etapas da infecção.
Dessa forma, tem-se a resposta inflamatória inespecífica na ocasião em que o parasita entra em contato com o hospedeiro. A forma promastigota, na presença de soro humano, pode ser lisada pela ativação do complemento e pela participação de anticorpos inespecíficos. A lise de promastigotas pelo complemento depende da fase de crescimento: a camada espessa de LPG das promastigotas favorece a fagocitose.
A fixação de C3 e a subsequente ligação das moléculas ligantes da superfície das promastigotas (gp63 e LGP) com os receptores CR1/CR3, nos macrófagos, parecem ser essenciais para o inicio da infecção intracelular. Em seguida, ocorre a fagocitose, com a transformação das promastigotas em amastigotas dentro dos fagolisissomas. O LPG é também capaz de inibir enzimas e a gp63 tem importante papel protegendo as proteínas do parasita da degradação no fagolisossoma.
As amastigotas ativam a via alternativa do complemento, apesar de serem mais resistentes à lise. Os leucócitos, em particular, polimorfonucleares neutrófilos, fagocitam promastigotas e amastigotas previamente opsonizadas pelo complemento e as destroem. Isso não acontece com os leucócitos mononucleares que, apesar da sua atividade fagocítica, têm pouca atividade leishmanicida. As amastigotas são fagocitadas, sobrevivem e se multiplicam dentro dos macrófagos, que são células derivadas de monócitos do sangue circulante.
Além desses fatos, as amastigotas, ao contrário das promastigotas, mostram uma alta atividade enzimática que degrada metabólitos oxidativos tóxicos do macrófago e também são altamente adaptadas ao PH ácido do fagolisossoma. Assim, as amastigotas sobrevivem e se multiplicam no interior dos vacúolos fagocíticos.
Na modulação da resposta imune, o macrófago parasitado apresenta antígeno aos linfócitos CD4+ e, por meio de seus receptores e da secreção de interleucina-1 (IL-1), esses linfócitos são ativados. Caso ocorra expansão preferencial de linfócitos T CD4+ do subtipo TH1, haverá produção de interleucinas do padrão TH1 (interferon gama, IL-12, fator de necrose tumoral alfa e IL-2) levando à ativação dos macrófagos e à destruiçãodos parasitas e resolução do processo. Por outro lado, se a resposta for do tipo Th2 (IL-4 e IL-10), o parasito escapa do ponto de inoculação e se dissemina carregado por macrófagos para todos os órgãos do sistema fagocítico mononuclear.
Na LV ocorre, portanto, produção inadequada de IL-2 e interferon gama, o que explica a capacidade do macrófago infectado de destruir os parasitas. A indução preferencial de células Th1 ou Th2 é que mediaria o controle imunológico da infecção ou a progressão para leishmaniose doença, por meio das diferentes citocinas produzidas por essas células.
Utilizando-se a técnica de PCR para identificação de RNA mensageiro para IL-10, Il-4, INF-gama e IL-2 na medula óssea e nos linfonodos de pacientes com LV, constataram-se níveis normais de RNA mensageiro para IL-10 (que normalizam após o tratamento da LV). Anticorpos monoclonais anti-IL-10 restauram a resposta linfoproliferativa de linfócitos de pacientes com LV. A IL-12 parece ter também importância nessa resposta imunológica. Os linfócitos do sangue periférico de pacientes com LV são incapazes de produzir interleucinas de padrão Th1 e produzem elevadas citocinas de padrão Th2. No fígado, órgão no qual Leishmania se multiplica ativamente durante a fase inicial da doença, as células de Kupfer encontram-se abarrotadas de formas amastigotas em um meio pobre de IL-12 e IFN-gama. É interessante notar que, com a resolução da doença, existe aumento progressivo das quantidades teciduais das citocinas de padrão Th1, o que comprova a relação estreita entre a doença e o padrão imune. A diminuição destas citocinas de padrão inflamatório (IL-12 e IFN-gama) promove uma diminuição da produção de óxido nítrico (NO) pelos macrófagos, um dos mecanismos fundamentais na destruição intracelular da Leishmania.
Durante a fase ativa da LV, ocorrem no hospedeiro doentes graves alterações da imunidade celular e humoral que tendem a reversão completa após o tratamento (cura clinica). A depressão da imunidade celular específica mediada por células e antígenos de Leishmania, durante a fase ativa da LV, é demonstrada pela resposta negativa de testes cutâneos de hipersensibilidade tardia.
São verificadas também alterações da imunidade inespecífica mediada por celulas frente a antígenos não relacionados. Assim, durante o período de doença (com posterior recuperação após a cura clinica), as reações cutâneas de hipersensibilidade tardia costumam ser negativas utilizando-se antígenos inespecíficos.
Observa-se diminuição da população de linfócitos T no sangue periférico, que ocorre durante a fase ativa de doença. Existem relatos de significativa diminuição de linfócitos CD4+ na ocasião do diagnóstico da LV, enquanto os CD8+ estão significamente aumentados, e essas alterações retornam aos valores normais 3 meses após o tratamento.
Verificam-se, além disso, alterações histopatológicas com depleção de linfócitos nas áreas T dependentes do baço e de gânglios linfáticos. O comprometimento da resposta imune celular inespecífica pode ser ainda evidenciado por testes in vitro utilizando-se mitógenos, verificando-se uma respostas linfoproliferativa diminuída na fase ativa da doença. Na LV, ocorre ativação policlonal de globulinas e pela presença de imunocomplexos circulantes. Por outro lado, existem, embora pouco estudadas, evidencias de que a produção de anticorpos encontraa-se diminuída frente a antígenos novos, a despeito da hipergamaglobulinemia.
Os receptores do tipo toll-like tem sido recentemente descritos como associados com a infecção pela leishmania, principalmente os receptores do tipo TLR2, TLR4 e TLR9. É possível que esses receptores reconheçam os antógenos que são expressos pelas formas promastigotas e sejam os iniciadores da resposta imune com produção de citocinas mediante a ativação do NFIB.
Patologênese: As reações teciduais consequentes à infecção por leishmânias viscerotropicas são a expressão patologiva da relação parasita-hospedeiro, que reflete várias escalas do espectro no qual os sistemas mecro e macrofágico são capazes de destruir os parasitas até onde as lesões crônicas se estabelecem. De modo geral, as descrições histopatológicas relativas a leishmaniose visceral referem-se ao comprometimento do sistema fagocitico mononuclear, sua hipertrofia, hiperplasia e parasitismo, especialmente em fígado e baço. Verificam-se, além disso, alterações histopatológica com depleção de linfócitos nas áreas T dependentes do baço e de gânglios linfáticos.
O fígado pode apresentar padrões morfolóficos variados de reatividade que refletem tanto o tipo peculiar de resposta do hospedeiro à infecção como à duração da doença
Padrão típico: Acentuada hipertrofia e hiperplasia das celulas de Kupffer, com parasitismo e infiltrado linfo-histioplasmocitário portal e intratubular, presentes na fase de doença plenamente manifesta.
Padrão nodular ou involutivo: agregados de linfócitos, macrófagos e plasmócitos nos lóbulos hepáticos e nos espaços portais com raras amastigotas, é o quadro visto nos casos oligossintomáticos e nos indivíduos já tratados, e representa a resposta tecidual para controlar a infecção.
Padrão fibrogênico: Ampliação do espaço de Disse com a proliferação sinusoidal de fibras reticulínicas e feixes colágenos, observado na doença de longa duração ou após o tratamento.
Padrão cirrótico: A fibrose hepática intralobular difusa (cirrose de Rogers), raramente é registrada no Brasil.
Nos pulmões, pode encontrar pneumonia intersticial e focos de fibrose septal. A demonstração de leishmânia nos pulmões é relatada com pequena frequência.
Nos rins, pode ocorrer comprometimento glomerular discreto, com hiperplasia e hipertrofia do sistema retículo endotelial (células mesangiais), configurando-se uma glomerulite, com depósitos de igG, igM, fibrinogênio e complemento.
Também se descreve na LV humana comprometimento da mucosa jejunal, com presença de formas amastigotas em macrófagos em associação com infiltrado inflamatório mononuclear e discreta proliferação fibrosa do interstício, encontrando-se ocasionalmente micro-ulcerações da mucosa. Descreveu-se, em alguns casos, linfangectasia em nível de coletores, que poderia estar relacionada com processos disabsortivos, os quais constituíram o substrato fisiopatogênico da acentuada desnutrição verificada em muitos doentes com LV.
Considerando-se as alterações descritas, pode-se concluir que as lesões histopatológicas do calazar são fundamentalmente intersticiais, parecendo refletir nos diversos órgãos o desenvolvimento de um mesmo processo. Este, porém, pode apresentar-se predominantemente sob a forma de infiltrado inflamatório, com resposta fibrogênica. Essas diferentes alterações intersticiais corresponderiam, provavelmente, a vários tipos de resposta do hospedeiro ao parasita e seus produtos.
Quadro clínico:
O período de incubação é variável, geralmente dura meses (2-5 meses), mas existem relatos extremos de dias até vários anos. No Brasil, a LV caracteriza-se por três formas clínicas distintas:
Forma assintomática: Corresponde à infecção inaparente e é detectada em indivíduos em manifestação clínica em inquéritos epidemiológicos ou em áreas de transmissão, pela positividade da intradermorreação (leishmaniose) ou pela presença de anticorpos específicos no soro. Os títulos de anticorpos são baixos e podem permanecer positivos por tempo indeterminado. Indivíduos que tiveram LV, foram tratados e se curaram apresentam também positividade do teste intradérmico e anticorpos específicos em títulos baixos.
Forma oligossintomática: A sintomatologia dessa forma de possibilidade evolutiva pode passar despercebida ou ser confundida com outras doenças infecciosas. O paciente, em geral, criança, apresenta discreto comprometimento do estado geral. A suspeita baseia-se na história de febre, discreta anemia, diarreia, emagrecimento e adinamia. Em geral, não se relata febre. A hepatomegalia normalmente está presente e não ultrapassa 5 cm, e a esplenomegalia, ao contrário da forma de apresentação clássica da LV, é discreta e pode táausente. As alterações laboratoriais são pouco evidentes: hemograma normal ou com anemia, velocidade de hemossedimentação elevada e eletroforese de proteína normal. A intradermorreação é geralmente negativa. Os anticorpos anti-leishmânia estão sempre presentes. Na área endêmica, esses quadros de infecção oligossintomática ou subclínica foram observados no acompanhamento prospectivo de criança, após a soroconversão. Esses quadros são autolimitados e, em geral, não se indica tratamento. Os sintomas podem persistir por cerca de 3 a 6 meses.
Forma clássica: É uma doença plenamente manifesta. Nessa forma, a sintomatologia tem instalação insidiosa e a doença, em geral, tem curso crônico. O período inicial também é denominado período agudo e caracteriza-se por febre diária com duração de 15 a 21 dias e estado geral preservado, frequentemente evidenciam-se hepatoesplenomegalia e anemia discretas. A sorologia revela presença de anticorpos maior que 1:256 e aintradermorreação é negativa. A velocidade de hemossedimentação eleva-se (50mm) e ocorre anemia discreta (Hb maior que 9g/dL), além de leucócitos normais com linfomonocitose. A pesquisa de amastigotas em aspirado esplênico ou na medula óssea pode ser positiva.
O período de estado é caracterizado pela febre, geralmente alta e diária, tipicamente apresentando dois picos diários, podendo sofrer períodos de remissão espontânea. A febre pode ser acompanhada de calafrios e ser seguida de sudorese. Progressivamente, o paciente apresenta anorexia, enfraquecimento e emagrecimento, surgindo sinais clínicos de desnutrição grave, como cabelos secos e quebradiços, cílios longos e pele seca. Ao mesmo tempo, surge a palidez cutânea, que vai se acentuando, o paciente nota o aumento progressivo do volume abdominal, referindo desconforto no hipocôndrio esquerdo. Ocorre aumento gradativo do tamanho do fpigado e sobretudo do baço. Manifestações hemorrágicas e gastrintestinais, respectivamente epistaxes, gengivorragias e quadro diarreicos, são comumente relatadas durante a evolução. Outro sintoma que pode ser relatado com certa frequência é a tosse seca, que estaria relacionada à pneumonite intersticial da LV. 
A duração da sintomatologia na ocasião em que o diagnóstico é realizado é de vários meses, em geral mais de 3 meses de evolução. A icterícia é pouco frequente, é mais comum nos casos graves e de evolução longa. São observadas pancitoprnia e hipergamaglobulinemia. A intradermorreação é negativa e os títulos de anticorpo, elevados maior que 1:4000.
No período final, a forma de apresentação clássica pode evoluir de forma mais grave, chegando a grande esplenomegalia até a cicatriz umbilical e até a fossa ilíaca direita, caquexia pronunciada e anemia intensa. Podem ocorrer as complicações determinantes de óbitos como hemorragias, ascite e icterícia ou infecções bacterianas.
Diagnostico laboratorial: o diagnóstico específico direto geralmente é feito pelo encontro de formas amastigotas de leishmânias em enfregaços corados pela coloração de Leishman ou Giemsa obtidos por punção da medula óssea (mielograma) com sensibilidade variando entre 80 e 85% ou punção esplênica com sensibilidade de cerca de 95%. Esse material deve ser cultivado em meio especial a partir do qual se visualizam formas promastigotas nas culturas positivas. O mesmo material obtido por punção também pode ser inoculado em hamster, por via intraperitoneal. Na pesquisa de anticorpos específicos, utilizam-se antígenos de promastigotas, e as técnicas mais utilizadas são a imunofluorescência indireta e a reação imunoenzimática (ELISA e DOT-ELISA). Os anticorpos são detectados em títulos elevados durante a fase de doença e decrescem após o tratamento. 
O diagnóstico sorológico é empregado em inquéritos epidemiológicos e pode ser útil no diagnóstico de casos em que não se encontram parasitas nos esfregaços corados ou nas culturas. Mais recentemente, uma nova preparação antigênica, o antígeno recombinante rK39, utilizado para o teste de ELISA, mostrou 95% a 100% de positividade na detecção de casos de LV clássica. Recentemente, as técnicas de biologia molecular têm sido uma alternativa mais promissora, sendo a PCR uma técnica que pode ser usada como método de triagem inicial para casos suspeitos de leishmaniose.
Já nos pacientes co-infectados, a sorologia e a reação de Montenegro têm baixa sensibilidade. Muitos dos pacientes HIV positivos têm testes sorológicos para Leishmania negativos, sendo, portanto, a demonstração do parasita em tecidos pré-requisito para o diagnóstico e para a instituição do tratamento.
Os exames laboratoriais inespecíficos fundamentais que auxiliam no diagnóstico são o hemograma e a eletroforese de proteínas. O hemograma revela anemia, leucopenia com neutropenia e, freqüentemente, plaquetopenia. A patogênese da pancitopenia é multifatorial, sendo, principalmente, conseqüente ao hiperesplenismo, existindo também alterações medulares pela presença dos parasitas e componentes imunológicos (imunocomplexos circulantes adsorvidos aos elementos sangüíneos e auto-anticorpos).
Na eletroforese de proteínas, observam-se diminuição da albumina e marcante elevação dos níveis de gamaglobulina em pico policlonal. A hipoalbuminemia tem múltiplas causas, desde nutricionais, funcionais hepáticas e até por perda entérica devido à enterite leishmaniótica. A hipergamaglobulinemia é decorrente de ativação policlonal de linfócitos B.
Diagnostico diferencial: devem ser consideradas soenças de curso crônico e que apresentem durante a evolução febre e hepatoesplenomegalia, como a histoplasmose, a tuberculose miliar, a toxoplasmose, a endocardite bacteriana e a malária crônica. Deve-se incluir as doenças não transmissíveis como os linfomas e as leucemias, especialmente a mielóide crônica e as colagenoses.
No decurso da forma hepatoesplênica da fase crônica da esquistossomose ou quando se associam outras infecções, como a malária ou o próprio calazar. A enterobacteriose septicêmica prolongada é uma bacteriemia crônica por enterobacterias, principalmente salmonela, que acomete indivíduos com esquistossomose mansonica especialmente na forma hepatoesplênica, e é uma das principais hipóteses no diagnostico diferencial de LV.
Tratamento:
Internação: A internação está indicada, de forma geral, a todos os pacientes com a forma grave de LV. Assim, com alterações laboratoriais que podem ser consideradas como fatores de mau prognostico em decorrência de risco de infecção ou sangramento, como leucopenia menor que 1000/ml ou netropenia grave (menor que 500/mm) e plaquetopenia abaixo de 50000/ml. Outros achados que também indicam gravidade são: hemoglobina sérica < 7 g/dL, creatinina> 2Xo valor de referência, alteração no coagulograma (atividade de protrombina < 70%), alteração hepática (bilirrubina total acima dos valores de referência, AST/ALT > 5X o limite superior da normalidade, albumina < 2,5 mg/mL), além de exame radiológico de tórax sugestivo de pneumonia.
Drogas:
Antimonial pentavalente: A possibilidade de tratamento com os compostos antimoniais, inicialmente empregados na leishmaniose tegumentar, reverteu o prognóstico da doença que frequentemente era fatal. Atualmente, existem duas apresentações do antimonial pentavalente, o estibogluconato de sódio, usado em países de língua inglesa, e o antimoniato de N-metilglucamina (Glucantime®), empregado habitualmente na França e no Brasil.
A ação dos antimoniais contra Leishmania não é bem conhecida, mas acredita-se que atuem no mecanismo bioenergético das formas amastigotas por meio de glicólise e beta-oxidação, que ocorrem nas organelas denominadas glicossomas. Outro mecanismo aventado é o de ligação com sítios sulfidrílicos, deflagrando a morte desses protozoários.
Atualmente, a apresentação do Glucantime® é em frascos de 5 mL, contendo 81 mg de Sbv (antimônio pentavalente) por mL. A dose para tratamento deve ser calculada com base no conteúdo de Sbv em cada ampola, nunca ultrapassando a dose de três ampolas/dia, ou seja, 15 mL/dia. A dose recomendada para o tratamento da LVé de 20 mg/kg/dia de Sbv por 20 a 40 dias, sendo o tempo médio de tratamento de 28 dias.
As contra-indicações ao uso dos antimoniais são: gestantes, portadores de cardiopatias, nefropatias e hepatopatias. Quanto às nefropatias, deve ser ressaltado que os antimoniais pentavalentes não são dialisáveis, ocorrendo acúmulo em indivíduos com clearance de creatinina rebaixado e, portanto, podendo levar a arritmias graves; é uma substância que tem sido utilizada na terapêutica da LV na dose de 20 mg/kg/dia de Sbv por 30 dias. Os efeitos adversos mais comuns apresentados pelo antimoniato de N-metilglucamina não são infreqüentes, especialmente em pacientes idosos ou com comorbidades, e o seu uso pode ocasionar: artralgia, mialgia, náusea, vômito, cefaléia, anorexia, aumento de transaminases, fosfatase alcalina, lípase e amilase, leucopenia, alargamento do intervalo QT e supra ou infra-desnivelamento do segmento ST.
Outros efeitos colaterais menos freqüentes são: aumento de uréia e creatinina, arritmia cardíaca, morte súbita e herpes-zoster.
Antes da utilização do antimonial, devem ser realizados eletrocardiograma, dosagem sérica de uréia e creatinina, enzimas hepáticas e leucograma. Durante o tratamento, o eletrocardiograma deve ser realizado duas vezes por semana, e os demais exames, ao menos uma vez por semana.
Anfotericina: Droga com maior potencial leishmanicida. Esta age sobre o ergosterol, esteroide da membrana de leishmania, causando aumento de permeabilidade da membrana celular, promovendo influxo de íons e levando a morte do parasito. Além da sua potência, é a droga com menor descrição de resistência até então. Apresenta diversas formas de apresentação, sendo basicamente separadas em formulação convencional (desoxicolato) e formulações lipídicas, todas elas para aplicação intravenosa lenta.
A formulação desoxicolato apresenta-se em frascos liofilizados com 50 mg de anfotericina, e a dose preconizada é de 0,5 a 0,7 mg/kg/dia ou 1 mg/kg em dias alternados até uma dose total entre 2 a 3 g, não ultrapassando a dose diária de 50 mg. Infelizmente esse esquema apresenta alta toxicidade, sobretudo renal e com distúrbios hidroeletrolíticos; necessita, na maioria das vezes, um período de internação não desprezível e outros efeitos adversos, como cardiotoxicidade. Os efeitos adversos mais comuns são aqueles que ocorrem durante a infusão da droga: febre, anorexia, náuseas, vômitos e flebite. Esses sintomas devem ser corretamente manejados, uma vez que eles não contra-indicam o uso da anfotericina. Hipopotassemia e insuficiência renal são outras complicações muito freqüentes com o uso da anfotericina. Hidratação adequada e aplicação intermitente são formas práticas de tentar diminuir esses efeitos adversos. Não existe um valor de creatinina estabelecido para interromper o tratamento, porém níveis acima de 2,0 mg/dL podem ser considerados de risco para a manutenção do tratamento. A hipopotassemia pode ser manejada com reposição oral quando o potássio sérico encontra-se acima de 2,5 mEq/L. Anemia, leucopenia e alterações cardíacas são outras complicações encontradas não infreqüentemente.
O monitoramento do tratamento deve consistir em dosagem, duas vezes por semana, dos níveis séricos de sódio, potássio, magnésio, ureia e creatinina, além da realização de hemograma e eletrocardiograma.
As formulações lipídicas são medicações mais recentes que visa a diminuição dos efeitos colaterais da anfotericina original. Apresenta-se em frascos-ampola com 50 mg de anfotericina e a dose preconizada varia conforme os estudos e a região estudada. No Brasil, a dose empregada para o tratamento da LV é de 4 a
5 mg/kg/dia durante 5 dias após estudo multicêntrico com participação de pacientes com LV por L. chagasi no Brasil.
Outras drogas:
Uma droga que vem se tornando bastante atrativa é a miltefosina que é um quimioterápico de apresentação oral e que aparentemente apresenta poucos efeitos adversos.
As diamidinas aromáticas, como a pentamidina, também são eficazes nesse tratamento. A dose preconizada é de 4 mg/kg, três vezes por semana, por 5 a 25 semanas dependendo da persistência do parasita no aspirado esplênico. A pentamidina interfere na síntese do DNA, provavelmente alterando a morfologia do cinetoplasto e fragmentando a membrana mitocondrial, levando o agente à morte. Os eventos adversos mais descritos são: náuseas, vômitos, cefaléia, hipoglicemia, hipotensão durante a infusão, aumento de uréia e creatinina, síncope, diabetes, leucopenia, pancreatite e alterações inespecíficas do segmento ST e da onda T. É contra-indicada para gestantes, portadores de diabetes, insuficiência renal, insuficiência hepática, doenças cardíacas e em crianças com peso inferior a 8 kg. Durante o uso da pentamidina, pode ocorrer hipoglicemia seguida de hiperglicemia em decorrência da destruição de células beta-pancreáticas. Esse é o motivo pelo qual contra indicamos o seu uso em pacientes diabéticos não insulino-dependentes.
Refretariedade ou retratamento: Nas formas refratárias ao tratamento antimonial, têm sido avaliados muitos esquemas alternativos, sendo um dos mais referidos a utilização do alopurinol em doses entre 15 e 20 mg/kg, divididos duas a três vezes ao dia por em média 14 dias, associado ao antimonial.
Nos casos de insucesso com o uso de anfotericina B, principalmente se for de formulação lipídica, a recomendação é repetir o tratamento. Em casos de falha ao retratamento, considerar, além de outro diagnóstico (ver diagnóstico diferencial), associação de doenças ou a possibilidade de resistência, devendo-se optar, em suspeita desta, por outro tratamento, como Glucantime® ou pentamidina.
Formas graves: Deve ser internado e em hospital de referência para detecção precoce dos sinais de gravidade e controle laboratorial rigoroso para evitar ou detectar precocemente complicações infecciosas e hemorrágicas, assim como identificar possíveis toxicidades decorrentes do tratamento específico. Nesse grupo de pacientes a droga de escolha é a anfotericina B e, se disponível, dar preferência à formulação lipídica.
Critérios de cura: observa-se o desaparecimento da febre nos primeiros dias após a introdução da terapêutica especifica. Progressivamente o paciente melhora o estado geral, ocorre aumento do apetite e ganho de peso. A recuperação das alterações hematológicas pode ser acompanhada observando-se inicialmente tendência à normalização do número de plaquetas e leucócitos. Progressivamente ocorre melhora da anemia. 
O paciente apresenta, durante o tratamento, involução progressiva da hepatoesplenomegalia. Nota-se muitas vezes, regressão mais lenta do fígado do que do baço e, na maioria das vezes, ocorre regressão total das visceromegalias após o tratamento especifico, exceto quando há doenças associadas, não obtiver resposta à terapêutica ou se houver comprometimento do fígado pela fibrose leishmaniótica. A regressão total do fígado e do baço pode levar semanas ou meses após o término da terapia especifica.
A albuminemia eleva-se com a melhora clínica do doente mesmo durante o tratamento, e a hipergamaglobulinemia persiste por várias semanas ou até meses após a cura clínica.
Se houver suspeita de falha terapêutica é recomendado a realização do mielograma para pesquisa de formas amastigotas
Complicações: As observadas com mais frequência são as hemorragias e, sobretudo, as infecções bacterianas, sendo as pneumonias e as septicemias as potencialmente mais graves e podem levar ao óbito.
Profilaxia: Na profilaxia primária recomenda-se o tratamento dos doentes, o reconhecimento dos reservatórios, o combate aos insetos e a proteção dos indivíduos sadios

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