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UNIDADE 1 Fundamentos do processo de aprendizagem Objetivos de aprendizagem • Conhecer as contribuições de diversos filósofos, educadores e psicólogos para a compreensão do processo de aprendizagem. • Entender as bases biológicas da aprendizagem, assentadas sobre os neurônios e suas conexões, e conhecer a neurociência e a neuropsicologia. • Estudar as diferentes correntes de compreensão do processo de aprendizagem, enfatizando a bagagem inata, o ambiente e os estímulos ou as interações sociais. Temas 1 - Fundamentos epistemológicos da aprendizagem Para começar nosso estudo, vamos fazer um mergulho na história e conhecer os pensadores, os educadores e os psicólogos que teorizaram sobre a aprendizagem. 2 - Conceitos e princípios da aprendizagem Neste tema, veremos como os neurônios e suas conexões, investigados pelas neurociências e pela neuropsicologia, representam as bases biológicas do processo de aprendizagem. 3 - Concepções de aprendizagem No último tema da unidade, abordaremos as características das concepções apriorista, empirista e interacionista da aprendizagem, bem como suas consequências para a educação. Introdução Iniciaremos nosso estudo abordando os fundamentos epistemológicos da psicologia da aprendizagem. Em uma breve viagem por mais de 2 mil anos de história ocidental, você vai conhecer ideias, conceitos e teorias que guiaram ao longo do tempo a compreensão do processo de aprendizagem. A viagem se estenderá da filosofia pré-socrática ao construtivismo, passando pelos trabalhos pioneiros de Wilhelm Wundt, William James, John Dewey e Ivan Pavlov. Com mais detalhes, veremos os corpos teóricos construídos pelo suíço Jean Piaget e pelo bielorrusso Lev Vygotski. Em seguida, conheceremos as bases biológicas da psicologia da aprendizagem: os neurônios, suas conexões e a arquitetura do sistema nervoso. Verificaremos como a precursora teoria neuronal de Santiago Ramón y Cajal fundou a neurociência moderna, uma disciplina plural, marcada pelo debate entre os localizacionistas, para quem as funções mentais podem ser associadas com regiões específicas do cérebro, e distribucionistas, para quem as funções mentais emergem da integração de diversas áreas e sistemas. Abordaremos também a importância da plasticidade neural para a formação de nossas memórias, tanto implícitas quanto explícitas, e para o processo de aprendizagem. Nesse tópico, abordando ainda, como mente e cérebro se relacionam, estudando também o nascimento e o desenvolvimento da neuropsicologia. Por último, analisaremos as diferentes concepções de aprendizagem - apriorista, empirista e interacionista - e suas implicações para a prática educacional. Veremos que o verbo aprender, de acordo com as diferentes perspectivas sobre o desenvolvimento humano, pode significar a autorreflexão, a recepção passiva de conteúdos e estímulos ou a interação com colegas e adultos. Ao final, verificaremos que o interacionismo busca resolver a tensão entre a visão na qual o conhecimento se produz internamente e outra em que ele vem de fora, apostando na interação social e cultural para a construção desse conceito. Fundamentos epistemológicos da aprendizagem Iniciamos o estudo da psicologia da aprendizagem fazendo uma breve incursão no terreno da epistemologia, disciplina que trata do próprio conhecimento, construído por meio do pensamento, da imaginação, das sensações, das percepções, da inteligência e da consciência (BROWAEYS, 2004). A epistemologia é a busca de respostas para uma série de perguntas: “O que é o conhecimento?”; “O que é possível conhecer?”; “Que tipo de conhecimento é válido?”; “O que é verdade?”; “Como podemos conhecer algo?”; “Como transformamos dados, percepções e informações em conhecimento?”. Embora, à primeira vista, essas questões não pareçam ter importância prática, as respostas que diferentes filósofos deram e dão a elas servem como fundamentos não somente para as teorias, como também para a prática educacional. Essas visões se concretizam, por exemplo, em diferentes concepções do currículo escolar, com cargas horárias, conteúdos e ênfases distintos - sobre a memorização dos conteúdos, o desenvolvimento de competências ou a aquisição de habilidades. Os fundamentos epistemológicos também se refletem na criação e na escolha de métodos para ensinar uma determinada disciplina e nos modos de avaliar a construção do conhecimento pelos aprendizes. Filósofos, educadores e teóricos da aprendizagem sempre se preocuparam com questões epistemológicas. Buscando contribuir tanto para os avanços teóricos quanto para a prática educacional, esses pensadores trabalham conceitos como conhecimento, aprendizagem, compreensão, crença, pensamento, teoria e racionalidade, entre outros. Procuram compreender que tipos de conhecimento são mais relevantes, o que vale a pena conhecer e qual é a melhor maneira de acomodar as informações nas atividades curriculares (KNOBEL; LANKSHEAR; PETERS, 2000). Eles também investigam as relações entre ensino e aprendiza- gem, crença e opinião, informação e conhecimento para entender, entre outros fenômenos, como estudantes podem ganhar autonomia como “conhecedores”. De acordo com Knobel, Lankshear e Peters (2000), procuram compreender o que faz alguém se tornar um expert ou uma autoridade em uma determinada área do conhecimento ou como avaliar e comparar diferentes crenças, teorias, paradigmas ou pontos de vista sobre um determinado assunto. Dois mil anos de reflexão Já faz mais de 2 mil anos que buscamos compreender o processo de aprendizagem (HAMMOND et al., 2001). As primeiras reflexões sobre a relação da natureza humana e o processo educacional foram feitas no período grego clássico. Demócrito, filósofo pré- socrático que viveu no século V a.C., escreveu sobre os efeitos do ambiente doméstico em aprendizes. Para esse filósofo,a melhor maneira de treinar crianças para a administração de uma propriedade era compartilhá-la com elas. Posteriormente, Sócrates (469-399 a.C.), Platão (428/427- -348/347 a.C.) e Aristóteles (384- 322 a.C.) trataram de assuntos dos quais hoje se ocupam psicólogos da aprendizagem, como o papel do professor, os métodos de ensino, a natureza do processo de aprendizagem e o papel do afeto nesse processo. Sócrates criou o método dialético, usando o diálogo para “parir” as ideias de seus interlocutores a respeito de temas como a virtude e o amor. Fazia uma sucessão de perguntas a seus pupilos, mostrando-lhes a insuficiência de suas respostas, que geralmente se alimentavam de preconceitos ou de opiniões. Seus ouvintes descobriam que não sabiam o que acreditavam saber, mas eram guiados pelas perguntas de Sócrates rumo à verdade (MIRANDA, 2015). Para ele, o único saber válido era o autoconhecimento, por isso dizia que nada sabia. Em seguida, como segunda etapa do método socrático, o filósofo desenvolveu a maiêutica (em grego, “parto”, “dar à luz”), comparando-se à sua mãe, cuja profissão era a de parteira; pois, enquanto ela realizava o parto de corpos, ele possibilitava o “parto” de novas ideias. Para Platão, um racionalista, podemos encontrar a verdade e o conhecimento por meio do raciocínio e da reflexão. Tudo o que sabemos já estaria dentro de nós. Platão dizia que o homem vivia dois tipos de realidade: a inteligível, que se refere à vida concreta, imutável, e a sensível, ligada ao universo das percepções, dos sen- tidos, uma realidade que se transforma e se coloca sobre a esfera do inteligível. Com isso, concebeu a Teoria das Ideias, também conhecida por Teoria das Formas. Já para Aristóteles, o conhecimento é algo que adquirimos pelas experiências que vivemos nos ambientes que nos cercam. Ele era um empirista e acreditava que a aprendizagem se dava por associação de ideias - por exemplo, pela lei da similaridade, associamos coisas parecidas;pela lei do contraste, associamos coisas que são o contrário de outras, como preto e branco. Essa divisão separa duas grandes escolas de pensamento relativo à natureza do conhecimento: a inata (nature) versus a adquirida (nurture) (HAMMOND et al., 2001; POWER; HONEY; SYMBALUK, 2005). Aristóteles criou o método peripatético de ensino, no qual o mestre ensina enquanto caminha (peripatético). Ele dava suas aulas ao ar livre, passeando com os alunos pelos jardins da cidade de Atenas. Caso encontrassem uma planta no caminho, por exemplo, Aristóteles aproveitava para ensinar sobre a estrutura desse ser vivo - divisão em raiz, tronco e folhas. O filósofo fundou a Escola Peripatética, e seus discípulos deram continuidade à orientação empírica do mestre, abordando assuntos de interesse do próprio Aristóteles, como botânica, lógica, música, astronomia, história política, retórica e artes. Esses discípulos faziam parte de um Liceu que coletava manuscritos e pesquisas realizadas em um grande número de temas, constituindo-se posteriormente na primeira grande biblioteca da Antiguidade. Os romanos, por sua vez, não viam a educação como uma maneira de alcançar a verdade nem compreender a vida. O importante era formar cidadãos que fossem capazes de dar contribuições práticas para a sociedade, por meio de construção de aquedutos ou estradas. Assim, a educação romana era uma forma de treinamen- to para o exercício de uma vocação, e não para capacitar a mente a descobrir a verdade. Mesmo assim, além das atividades práticas guiadas por alguém mais experiente, também havia um estímulo à reflexão para exercitar a mente (HAMMOND et al., 2001). Com o fim do Império Romano, no século V d.C., a Igreja Católica ganhou poder crescente sobre o cotidiano das pessoas. Na Idade Média, o conhecimento era transmitido às populações pelos padres. Os monastérios e as igrejas, além do sistema escolar, eram lugares onde se recebia educação. Nos séculos XI e XII surgiram as primeiras universidades, a partir de escolas cristãs ou monásticas, na França, na Inglaterra e na Itália para o estudo de artes, direito, medicina e teologia. A aprendizagem consistia em memorizar e recitar de cor. No Renascimento, entre os séculos XV e XVII, a concepção grega de educação foi resgatada, estimulando o aprendizado por meio da exploração do legado cultural deixado pela Antiguidade. O conhecimento deveria ser alcançado pela razão, com o questionamento de dogmas estabelecidos, a análise dos fenômenos e dos objetos e a experimentação. Mas somente os membros do clero, da pobreza e da burguesia tinham acesso a essa educação humanística, na qual o verbalismo perde espaço (PALMA FILHO, 2010). Empiristas versus racionalistas No século XVII, a divisão entre empiristas e racionalistas voltaria a se manifestar. O racionalista francês René Descartes (1596-1650) argumentou em seu Discurso do método que as ideias consideradas claras e distintas por nossa mente podiam ser tomadas como verdades porque vinham de Deus. A partir delas, era possível deduzir até mesmo a realidade de nossa existência, o que produziu o princípio cogito, ergo sum (“penso, logo existo”). Para Descartes, alguns de nossos comportamentos não passam de reflexos automáticos disparados por estímulos externos. Esta é a parte governada pelo corpo, que funciona como uma máquina. Mas outra parte de nossos comportamentos é governada pela mente, voluntária, regida por nosso livre-arbítrio. Em contrapartida, John Locke (1632-1704), empirista inglês, defendeu que a mente humana era uma tábula rasa. Os materiais para a razão trabalhar e o conhecimento em construção viriam das experiências em torno das quais deveria se estruturar o processo de ensino (POWER; HONEY; SYMBALUK, 2005; EDGAR, 2012). No século XVIII, Jean-Jacques Rousseau (1712-1778) dizia que a educação deveria ser adequada às crianças, e não o contrário. Em sua concepção, elas deveriam se desenvolver naturalmente, construindo ideias complexas a partir de ideias simples à medida que iam passando por diversas experiências. Essa perspectiva se parece com a de autores como John Dewey e Jean Piaget, cujas visões de educação ou desenvolvimento são centradas nas crianças (HAMMOND et al., 2001). Para o filósofo Immanuel Kant (1724-1804), as experiências servem para nos tornar conscientes de faculdades que já estão presentes em nós e representam as condições de possibilidade do conhecimento, ou seja, o que torna possível conhecer, transformar sensações em conhecimento. O entendimento se caracteriza pela imposição pela razão de conceitos a priori aos objetos (SILVEIRA, 2002). Kant foi um dos primeiros a reconhecer que a mente é parte ativa do processo de pensamento, sendo capaz de contribuir para seu desenvolvimento. Essa teoria da aprendizagem é considerada importante para o posterior desenvolvimento da noção de cognição - entre outros, por Piaget (HAMMOND et al., 2001). Para Kant, a educação deveria apresentar uma preocupação com a conduta do homem. Portanto, a educação pública tinha uma importância superior à educação doméstica, porque apresentaria elementos formadores do cidadão (SOUZA JÚNIOR, 2005). Os empiristas ingleses acreditavam que a mente consciente resulta de uma combinação de um conjunto finito de elementos básicos, a partir dos quais se compõem as sensações complexas e os padrões de pensamento. Mas eles não testaram suas ideias, a não ser Wilhelm Wundt (1832-1920), que buscou estudar cientificamente a consciência humana usando a introspecção, por meio da qual um homem ou uma mulher buscam descrever de forma precisa o que pensa, sente e percebe com os sentidos. O discípulo norte-americano de Wundt, Edward Titchener (1867-1927), foi um grande divulgador do que ficou conhecido como estruturalismo, ou seja, a observação sistemática do comportamento humano, que ajudou a psicologia a se estabelecer como uma disciplina científica. Diferentemente da psicanálise freudiana, que busca suas respostas nas manifestações do inconsciente, a ênfase dos estruturalistas recai sobre as experiências conscientes como matéria por excelência do trabalho em psicologia. Essa noção será mais tarde retomada pelo behaviorismo (POWER; HONEY; SYMBALUK, 2005). Outro pioneiro dessa área foi o norte-americano William James (1842-1910), que fundou a escola conhecida como funcionalismo. Para os funcionalistas, os psicólogos não deveriam estudar a estrutura da mente, mas sim a importância adaptativa da mente. Como a aprendizagem é um processo adaptativo, ela se tornou um dos tópicos a que esses pioneiros se dedicaram. Além de usar o método da introspecção, analisando com ele as experiências conscientes, tal como os estruturalistas, os funcionalistas também acreditavam que era possível aprender sobre a mente humana estudando os animais, com os quais compartilhamos uma história evolutiva. Dois dos principais psicólogos behavioristas, Edward B. Thorndike (1874-1949) e John B. Watson (1878- 1958), foram discípulos de funcionalistas (POWER; HONEY; SYMBALUK, 2005). Entre as principais vertentes teóricas da aprendizagem estão o behaviorismo, o cognitivismo e o construtivismo, que você vai conhecer a seguir. O behaviorismo e sua influência O fisiologista russo Ivan Pavlov (1849-1936) descobriu o que ficou conhecido por condicionamento clássico. Ele tinha recebido nada menos que um Prêmio Nobel pelos estudos sobre o papel do suco gástrico na digestão de cães. Dando continuidade a seus experimentos, Pavlov observou que os cães, inicialmente, só sali- vavam quando a comida era colocada dentro de suas bocas. Um estímulo não condicionado (o alimento) levava a uma resposta não condicionada (salivação). Mas, com o tempo, os animais passavam a salivar antes de experimentar a comida: a salivação era deflagrada pela visão do alimento ou até pelo som que anunciava achegada da comida - os passos de quem os alimentava (CRANDELL; CRANDELL; ZANDEN, 2011; MCLEOD, 2013). Pavlov então decidiu estudar essa associação entre estímulo e resposta como uma maneira de compreender mecanismos que os organismos usam para se adaptar aos ambientes em que vivem. Ele fez experimentos nos quais fazia um sino tocar logo antes de alimentar um cão no laboratório. Depois de repetir o gesto algumas vezes, observou que o cão passava a salivar ao ouvir o sino tocar, mesmo que não fosse alimentado. Assim, conseguiu associar a uma resposta involuntária e inata (não aprendida) o reflexo de salivação, a um estímulo diferente da presença do alimento na boca, o toque do sino. Com o condicionamento se cria uma conexão que não existia antes (CRANDELL; CRANDELL; ZANDEN, 2011). Coube a John Watson e Edward Thorndike transpor as conexões entre estímulo e resposta para o contexto da aprendizagem (EDGAR, 2012). Para Watson, a psicologia só deveria se preocupar com os comportamentos observáveis, que podem ser objetivamente descritos em termos de estímulos, de um lado, e respostas, de outro. Os pensamentos seriam apenas “respostas implícitas”. Por isso, convidou os psicólogos a abandonar termos como “estados mentais”, “consciência” e “imagens” e a introspecção como método. Watson não via diferença entre a psicologia humana e a compreensão do comportamento animal. Segundo ele, o behaviorismo tem como objetivo não somente prever como também controlar os comportamentos (POWER; HONEY; SYMBALUK, 2005). “Num sistema de psicologia inteiramente desenvolvido, dada a resposta é possível predizer o estímulo; dado o estímulo é possível predizer a resposta” (WATSON, 1913). Thorndike foi outro pioneiro na aplicação da nascente ciência da psicologia ao processo de aprendizagem, contribuindo para que mudasse a visão vigente da forma como esse processo ocorre (EDGAR, 2012). Para ele, a aprendizagem ocorre aos poucos, de modo incremental, por tentativa e erro. O processo de aprendizagem se baseia em associações entre impressões que os sentidos os trazem e impulsos para agir. Por isso, ele defendeu um aprendizado ativo por parte dos alunos em ambientes estruturados para proporcionar determinados estímulos (HAMMOND, 2001). Na concepção de Thorndike, a aprendizagem está sujeita a três leis. Uma é a lei do efeito, segundo a qual associações positivas (agradáveis) entre estímulo e resposta reforçam conexões, ao passo que associações negativas (ou desagradáveis) as enfraque- cem. Já a lei do exercício dita que a repetição torna mais provável que os alunos deem respostas corretas. Por fim, segundo a lei da prontidão, ações forçadas geram aborrecimento. Mas, se um organismo está pronto e preparado para o estabelecimento de conexões entre estímulos e respostas, o resultado será agradável e uma aprendizagem efetiva se produzirá (EDGAR, 2012). Centrada em conexões entre estímulos e respostas, a concepção de educação de Thorndike ficou conhecida como conectivismo. Thorndike também desenvolveu métodos para ensino da leitura e da aritmética que foram amplamente adotados e criou escalas para medir diversas habilidades - além de leitura e aritmética, escrita, desenho e redação (STATE UNIVERSITY, 2015). Partindo da teoria de aprendizagem por meio de estímulo e resposta de Thorndike, Burrhus Skinner (1904-1990) criou um programa de aprendizagem baseado em pesquisas que ele mesmo fez em animais (ratos e pombos). Nesse programa, respostas corretas recebiam reforço positivo. Aprender seria o mesmo que produzir comportamentos desejáveis. Ao longo de toda a primeira metade do século XX, as teorias de aprendizagem que se baseavam no behaviorismo dominaram a área da psicologia dedicada a esse processo. Sua influência se mostrou presente na elaboração dos currículos, nas abordagens escolhidas por programas de instrução e nos livros-textos, entre outros elementos. Mas suas limitações ficaram claras com o tempo. Eram úteis para o desenvolvimento de habilidades que podiam ser adquiridas por prática e reforço, mas não serviam para equipar os alunos com ferramentas para lidar com tarefas e problemas complexos. As maneiras como as pessoas percebem o processo e conferem sentido às experiências que vivem, desprezadas pelos behavioristas, voltaram a ter importância. Como disse Albert Bandura em Aprendizagem social, a visão de que o comportamento é determinado pelo ambiente reduz as pessoas a seres que meramente reagem aos caprichos de recompensas e punições externas. Parte dos determinantes do comportamento tem origem no funcionamento cognitivo das pessoas, algo que não pode ser ignorado (BANDURA, 1971). Outros pioneiros William James William James (1842-1910) lançou em 1890 o primeiro livro- -texto da área de psicologia, Princípios de psicologia. Alguns anos mais tarde, de 1899 a 1903, James deu uma série de palestras para professores nas quais discutia como aplicar a psicologia à educação de crianças. Para ele, experimentos de psicologia feitos em laboratório geralmente não informam efetivamente sobre o que fazer na prática no ensino das crianças. Desse modo, para melhorar a educação era preciso observar o ensino e a aprendizagem ocorrendo nas salas de aula. James recomendava que as lições deveriam começar em um nível de entendimento superior ao das crianças, o que seria bom para “puxar” suas mentes (SANTROCK et al., 2010). John Dewey Outro pioneiro importante na história da psicologia da aprendizagem foi John Dewey (1859- 1952), filósofo norteamericano que defendia a democracia e a liberdade de pensamento como instrumentos para a maturação emocional e intelectual das crianças. Também se empenhou em aplicar os conhecimentos de psicologia a prática. Dewey montou o primeiro laboratório importante voltado a esse tema nos Estados Unidos, em 1894, na Universidade de Chicago. Dewey via as crianças como aprendizes ativos, e não passivos. Por isso, melhor do que aprender sentados em suas carteiras era aprender fazendo, o que não impedia os alunos de aprender a pensar. Para ele, a construção do conhecimento se dá de forma individual, ocorrendo à medida que passamos por experiências, interagindo com os ambientes à nossa volta. Sendo assim, os professores deveriam ajustar o currículo o máximo possível ao conhecimento e aos interesses dos estudantes. E o currículo deveria ser elaborado levando em consideração as atividades e as responsabilidades que esperam os alunos depois do período escolar (LUTZ; HUITT, 2004). Dewey também defendeu que a educação devia se preocupar com a criança como um todo, com sua capacidade de se adaptar aos ambientes. Na prática, isso significa não restringir o ensino na escola aos temas acadêmicos. Mais do que conteúdos, as crianças para Dewey deveriam aprender a refletir e a resolver problemas. Além disso, todas as crianças deveriam receber uma boa educa- ção, o que não era uma realidade no tempo de Dewey, quando as melhores escolas eram frequentadas, sobretudo, por meninos de famílias ricas. Esse psicólogo defendeu a necessidade de uma edu- cação de qualidade para todas as crianças - meninos e meninas de todos os grupos étnicos e classes socioeconômicas (SANTROCK et al., 2010). O que hoje pode parecer bom senso no início do século XX soava como ideias muito progressistas. Dewey teria preparado o terreno para a aceitação do trabalho de pesquisadores que vieram depois dele (LUTZ; HUITT, 2004). O cognitivismo Até a Segunda Guerra Mundial, a educação escolar ocidental era pautada na memorização, e não na compreensão dos conteúdos ensinados. A maioria dos estudantes só aprendia a ler, escrever e fazer operações matemáticas simples. Caso fossem confrontados com experiências novas, não tinham como saber qual seria a resposta correta. Mas o mundo do pós-guerra era bem mais complexo que o anterior.O lançamento ao espaço do primeiro satélite artificial, o Sputnik, pela União Soviética durante a Guerra Fria serviu, sobretudo, como um grande divisor de águas. Abordagens cogitivistas da aprendizagem se desenvolveram nos trabalhos de Albert Bandura, Robert Gagné e Lev Vygotski, entre outros (POWER; HONEY; SYMBALUK, 2005; EDGAR, 2012). A partir dali, seria preciso ensinar mais do que ler, escrever e fazer contas simples. Uma pessoa educada deveria ser capaz de resolver problemas por si mesma, aplicando o conhecimento construído na elaboração de hipóteses e fazendo generalizações (EDGAR, 2012). A partir da década de 1950, o cognitivismo ganhou importância na psicologia. Faz um contraponto ao behaviorismo, que não consideraria a cognição para o entendimento da mente. O nome “cognitivismo” deriva do latim cognoscere (“conhecer”), e essa abordagem teórica surgiu a partir de antigas tradições de investigação do pensamento. O pensamento é reconhecido pelos behavioristas como um comportamento em si, o que é refutado pelos cognitivistas. Para estes, o modo como as pessoas pensam impacta diretamente em seu comportamento. Por isso, a corrente cognitivista prega que o pensamento deve ter um estudo próprio, fundamental à psicologia. Robert Gagné, psicólogo e pedagogo norte-americano, desenvolveu uma teoria na qual distingue cinco tipos de aprendizagem: informação verbal, estratégias cognitivas, habilidades motoras, habilidades intelectuais e atitudes. Nos objetivos dos exercícios as habilidades a serem desenvolvidas são explicitadas por escrito e o tipo de aprendizagem dever ser identificado. Analisando as tarefas, o professor identifica habilidades que servem como pré- - requisitos. Para cada objetivo a ser alcançado, há o “evento instrucional” adequado (EDGAR, 2012). O psicólogo canadense Albert Bandura, por sua vez, concebeu uma teoria da aprendizagem na qual as pessoas não são nem dirigidas por forças internas nem manipuladas por influências externas. Na aprendizagem social, “o funcionamento psicológico é mais bem compreendido em termos de interações contínuas e recíprocas entre o comportamento e as condições que o controlam” (BANDURA, 1971, p. 2). Bandura fez experimentos com pacientes com fobia de cobra que contribuíram para promover a importância da observação para o desenvolvimento cognitivo humano (EDGAR, 2012). Observamos o comportamento das outras pessoas e suas consequên- cias (BANDURA, 1971): caso alguém adote um comportamento ou tome uma ação específica e seja recompensado por isso, é mais provável que no futuro aja da mesma maneira. Ao contrário, caso uma atividade provoque consequências adversas, como uma punição, é menos provável que um dia essa pessoa imite a ação ou o comportamento (BANDURA, 1971; HANNUM, 2015). A aprendizagem por observação torna as pessoas capazes de adquirir grandes unidades de comportamento, seguindo o exemplo de outros no lugar de ter de construir esses padrões aos poucos por meio de tentativa e erro. Não somente comportamentos, mas também respostas emocionais podem se desenvolver por observação quando testemunhamos as reações de outros a experiências prazerosas ou dolorosas (BANDURA, 1971). No final do século XX emergiu uma nova forma de cognitivismo, baseada na compreensão dos efeitos de fatores pessoais, sociais e culturais sobre a aprendizagem. É o construtivismo, inspirado em autores como Jean Piaget e John Dewey. O construtivismo Nessa concepção, para haver aprendizagem os estudantes têm de mergulhar em atividades que possibilitem a elaboração de um sentido pessoal para o que se aprende. Os ambientes de aprendizagem devem ser desenhados para proporcionar a construção do conhecimento (EDGAR, 2012). Para os construtivistas, aprender não é sinônimo de memorizar. É muito mais que isso. Quando compreendemos, de fato, um assunto, podemos aplicar o conhecimento adquirido a outras situações, podemos resolver problemas teóricos ou práticos, tornamo-nos capazes de discuti-lo com outras pessoas. Também nos tornamos capazes de fazer descobertas por conta própria. Por isso, ensinar deve ser mais do que despejar informações nas cabeças dos alunos (SLAVIN, 2003). Não cabe aos professores transmitir conhecimento: este só pode se construir com a participação ativa dos estudantes. Assim, na perspectiva construtivista, o professor atua como um facilitador do processo de aprendizagem, ajudando os alunos na tarefa de atribuir sentido às informações. O processo de aprendizagem é individual, desenvolvendo-se à medida que os estudantes descobrem e transformam informações de modo que se apropriam delas (SLAVIN, 2003). Em relação a outras abordagens, as construtivistas tornam mais difícil a avaliação dos alunos justamente por respeitar a individualidade do processo de aprendizagem. E não podemos consi- derar o construtivismo perfeito. A aprendizagem colaborativa, por exemplo, pode não se prestar à aprendizagem de alguns temas ou disciplinas. Outro problema é que estudantes de outras culturas podem encontrar dificuldade em aprender (EDGAR, 2012). Por isso, não se esqueça: você deve se apropriar criticamente das teorias e práticas criadas e defendidas pelos diversos autores. Vamos em seguida estudar com mais detalhes os trabalhos de Jean Piaget e Lev Vygotski, que não tinham como objetivo orientar professores quanto às melhores maneiras para educar crianças, e sim compreender o desenvolvimento humano, embora tenham contribuíram muito nesse sentido (SANTROCK et al., 2010). Para ambos a aprendizagem tem caráter social e só ocorrem mudanças cognitivas quando conceitos previamente estabelecidos por alguém são abalados por novas informações (SLAVIN, 2003). Jean Piaget O pensador suíço Jean Piaget (1896-1980), um dos mais importantes do século XX, defendeu a importância de uma abordagem interdisciplinar para a investigação epistemológica. Com isso, fundou a teoria da epistemologia genética para explicar a gênese psicológica do pensamento humano. Foi o primeiro a defender que o processo de aprendizagem se dá de acordo com o estágio de desenvolvimento cognitivo, definido por um conjunto de desenvolvimentos: biológico, físico e mental. Cada aluno, segundo suas possibilidades, cria seu próprio conhecimento a partir das informações e situações a que seus professores o expõem e das experiências que vive (HAMMOND et al., 2001). Pouco se sabia sobre a forma como os pensamentos são gerados quando Piaget começou a trabalhar nos anos 1920. Os psicólogos da época geralmente pressupunham que as crianças pensavam de modo parecido com os adultos. Mas, com base em sua experiência como psicólogo infantil, Piaget argumentou que eram diferentes os pensamentos de adultos e crianças. À medida que vão crescendo, também vai mudando sua forma de pensar. De 1920 a 1950 Piaget fez diversos experimentos com crianças, inclusive com os próprios filhos, para entender como a inteligência humana evolui (PILETTI; ROSSATO; ROSSATO, 2014). Ele observou que, interagindo continuamente com o mundo, as crianças o transformam e ao mesmo tempo se transformam, sendo moldadas pelas consequências dessas interações (CRANDELL; CRANDELL; ZANDEN, 2011). Três fatores são relevantes para o desenvolvimento mental: o grau de maturação orgânica, as experiências ativas dos sujeitos com os objetos e as transmissões sociais, que se dão por meio da linguagem e da educação (PILETTI; ROSSATO; ROSSATO, 2014). Brincando com outras crianças e interagindo com os pais, parentes e outros adultos, vão se formando seus “esquemas” (modelos, conceitos, estruturas cognitivas), com os quais as novas experiências que elas vivem vão interagir. Como consequência, as crianças vão alterando seus esquemas para adequá-los às suas experiências. Geralmente, elas estendem até onde podem os esquemas de que dispõem para acomodar novas informaçõesou observações (CRANDELL; CRANDELL; ZANDEN, 2011). Então, trata-se de uma via de mão dupla. Não é somente a experiência que modifica os esquemas; os esquemas também modificam as experiências. A interação contínua do indivíduo com seu ambiente leva a novas percepções do mundo e a novas formas de organizar o conhecimento, isto é, resulta em adaptação. Quando nascemos respondemos aos estímulos por simples reflexos, mas com o tempo, o desenvolvimento e as experiências ampliamos nosso repertório de respostas/comportamentos possíveis para lidar com os ambientes que nos cercam (CRANDELL; CRANDELL; ZANDEN, 2011). Para Piaget, a adaptação envolve assimilação, apreensão e interpretação de informações novas por meio dos esquemas e acomodação, reinvenção e aprimoramento dos esquemas que o contato com a realidade e as experiências exige. Quando as crianças estão em equilíbrio, assimilam novas experiências de acordo com os conceitos e modelos criados no processo de acomodação. Mas em algum momento o equilíbrio pode se romper para que novos esquemas se produzam. E assim acontece o desenvolvimento cognitivo: uma sucessão de estados de equilíbrio e desequilíbrio. Cada estágio do desenvolvimento corresponde a um conjunto particular de esquemas. O crescimento/desenvolvimento biológico se combina com as interações com o ambiente, o que resulta em uma sucessão de estágios relacionados à idade da criança, que passa de um a outro, sem a possibilidade de pular nenhum. Para Piaget, o ensino e as experiências podem acelerar ou retardar o desenvolvimento, mas a ordem com que os estágios se sucedem não muda. São quatro os estágios de desenvolvimento da cognição e da inteligência. Veja o Quadro 1.1, a seguir. Nos Estados Unidos, até a década de 1960, Piaget era um desconhecido da maioria dos cientistas. Mas desde então os psicólogos de todo o mundo têm estudado os fatores cognitivos em operação no processo de desenvolvimento. A contribuição de Piaget para a compreensão do desenvolvimento é considerada muito grande, porque ele conseguiu mostrar de várias maneiras que crianças não são adultos em miniatura. Ele também ajudou a entender como adultos desenvolvem conceitos abstratos como tempo, espaço e causalidade: relações de causa e efeito (CRANDELL; CRANDELL; ZANDEN, 2011). Por isso, influenciou os estudos posteriores de outros pesquisadores sobre o tema. No entanto, existem evidências de que ele subestimou a capacidade de crianças para realizar diversas tarefas. Além disso, o desenvolvimento cognitivo de crianças pertencentes a outras culturas pode não se encaixar exatamente nos estágios piagetianos. Saiba mais Pesquisadores brasileiros e estrangeiros se encontraram em setembro de 2009 no I Colóquio Internacional de Epistemologia e Psicologia Genéticas: atualidade da obra de Jean Piaget, organizado pelo Grupo de Estudos de Psicologia e Epistemologia Genética e Educação (Gepege) na Faculdade de Filosofia e Ciências da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (Unesp) de Marília, em São Paulo. As conferências e palestras apresentadas no evento foram reunidas em uma publicação, disponível no link: <www.marilia.unesp. br/Home/Publicacoes/jean_piaget.pdf>. Lev Vygotski Embora formado em Direito, Lev Vygotski (1896-1934) dedicou-se às críticas literárias e às análises do significado histórico e psicológico das obras de arte, concentradas posteriormente a obra Psicologia da arte, que inclui sua tese de doutorado defendida em 1925. Vygotski fez uma leitura crítica sobre a produção teórica da época, incluindo as ideias do epistemólogo Jean Piaget, e concebeu o homem como um ser que se constitui dialeticamente em suas relações com os outros, mediadas pela cultura, que é construída historicamente. Um ser ao mesmo tempo biológico, social e histórico, produto da ontogênese (sucessão de estágios do desenvolvimento biológico), da evolução darwiniana e da evolução histórico-cultural (PILETTI; ROSSATO; ROSSATO, 2014). A criança aprende desde que nasce e a aprendizagem promo- ve o desenvolvimento. Nessa concepção, a aprendizagem se dá em contextos culturais, envolvendo interações sociais. Nas inte- rações com o mundo e com os outros é que se forjam as funções psíquicas superiores: linguagem, memória, criatividade, imagina- ção. Por isso, o desenvolvimento cultural não é linear, não é uma consequência direta do desenvolvimento biológico (PILETTI; ROSSATO; ROSSATO, 2014). A cultura e a linguagem têm lugar privilegiado nessa concepção, segundo a qual colegas, professores e outros adultos são fundamentais para que as crianças desenvolvam habilidades e criem novas ideias (HAMMOND et al., 2001). Vygotski investigou diversos temas em seus estudos: a relação entre pensamento e linguagem, o desenvolvimento das crianças e o papel da educação formal nesse processo (PILETTI; ROSSATO; ROSSATO, 2014). Ele colocava ênfase na natureza social do processo de aprendizagem. Para ele, as crianças aprendem interagindo com adultos e com os colegas mais habilidosos. Vygotski observou em seus estudos que, para se tornarem boas solucionadoras de problemas, as crianças têm de ser expostas a problemas difíceis. Quando trabalham em projetos cooperativos, elas podem aprender com seus colegas maneiras de resolver problemas (SLAVIN, 2003). Outro conceito importante que Vygotski desenvolveu foi o de melhor aprendizado de crianças que estão no que chamou de zona de desenvolvimento proximal. Isso ocorre quando desempenham tarefas que só conseguem cumprir com a ajuda dos colegas ou de adultos. Na zona de desenvolvimento proximal, são executadas tarefas como os projetos cooperativos, nos quais trabalham crianças com diferentes níveis cognitivos. O conceito de aprendizagem cognitiva é derivado da ênfase que Vygotski põe nos elementos anteriores: a natureza social do processo e a zona de desenvolvimento proximal. Refere-se ao processo por meio do qual uma pessoa aprende interagindo com colegas mais avançados ou com adultos, como acontece no exercício de alguns empregos. Os teóricos do construtivismo, como Vygotski, sugerem que os professores adotem esse modelo nas salas de aula. Os alunos devem participar de tarefas complexas e os professores devem ajudá-los a cumpri-las. Além disso, os alunos devem formar grupos heterogêneos nos quais os mais adiantados ajudam os outros a resolução de problemas complexos ou na execução de tarefas complexas (SLAVIN, 2003). Vygotski também enfatizou a aprendizagem mediada, segundo a qual os alunos devem, por um lado, receber tarefas complexas e realísticas e, por outro, ter todo o suporte necessário para que consigam cumpri-las. Para ele, isso é mais efetivo que ensinar alguns pedaços de conhecimento que podem ou não um dia ser mobilizados na solução de uma tarefa complexa. Na prática, esse princípio se traduz no uso em sala de aula de exercícios na forma de projetos e simulações, por exemplo. Com base no trabalho de Vygotski, são preparados materiais que promovam uma aprendizagem cooperativa, baseada em projetos e descobertas feitas pelos próprios estudantes. Conceitos e princípios da aprendizagem Uma das funções mentais mais importantes em humanos e animais e possível de ser aplicada a sistemas artificiais, a aprendizagem define comportamentos, valores, conhecimentos e competência pelas experiências vividas, pela observação e pelo raciocínio. O processo de aprendizagem pode ser analisado a partir de perspectivas diversas, desembocando em diferentes teorias a respeito. Em humanos, esse processo está relacionado ao desenvolvimento pessoal e à educação, facilitado quando há motivação do indivíduo. O estudo da aprendizagem envolve conhecimentos de diversas áreas, como neuropsicologia, psicologia, pedagogia e educação. Conforme o ser vivo se relaciona com o meio ambiente, é possível medir a aprendizagemem curvas que revelam a repetição de determinadas predisposições fisiológicas, de “tentativa e erro” e de períodos de descanso, necessários para a aceleração do processo, quando possível. Os estudos na área também mostram como a aprendizagem está relacionada aos reflexos condicionados nos seres vivos. Vários modelos foram desenvolvidos pelas teorias de aprendizagem na psicologia e na educação, com destaque para os de Jean Piaget e de Lev Vygotski (como pudemos ver anteriormente), cujos estudos são fundamentais para a educação contemporânea. Bases biológicas da psicologia Nosso estudo começou com o conhecimento dos fundamentos epistemológicos e das principais linhas teóricas que constituem o campo da psicologia da aprendizagem. Mas essa disciplina também tem bases biológicas, assentando-se sobre a teoria neuronal, proposta no final do século XIX, e os conhecimentos até aqui acu- mulados pela neurociência moderna. Décadas depois da formulação e da consolidação da teoria celular, que apostou nas células como unidades anatômicas e funcionais dos seres vivos, o sistema nervoso também “ganhou” uma unidade anatômica e funcional: o neurônio. Os neurônios emergiram como unidades anatômico-funcionais dos trabalhos de Santiago Ramón y Cajal (1852-1934), que partiu, por sua vez, dos trabalhos feitos pelo italiano Camilo Golgi. Influenciado pelo desenvolvimento da fotografia, Golgi, anos antes, tinha inventado uma nova forma de corar células, a reação negra, impregnando os tecidos com prata. Assim, ele conseguiu visualizar a estrutura microscópica do cérebro e suas células divididas em corpo celular e prolongamentos - que hoje conhecemos como axônios e dendritos. Na visão de Golgi, esses prolongamentos tinham continuidade física uns nos outros. Os neurônios seriam as unidades fundamentais do sistema nervoso, mas não independentes: o cérebro seria formado por uma rede contínua de células (GOODWIN, 2005; SEGURA, 2005; MESSIAS JÚNIOR; SILVA, 2013). Nas palavras de Cajal, o neurônio é um “aristocrata das estruturas do corpo com seus braços gigantes estendidos como os tentáculos de um polvo para as áreas fronteiriças do mundo exterior” (CAJAL apud SEGURA, 2005). Hoje sabemos que é por meio dos dendritos que os estímulos de outros neurônios chegam ao corpo celular dos neurônios. Eles costumam ser ramificados e arborizados, o que possibilita que cheguem a uma célula ao mesmo tempo impulsos que partem de muitos outros neurônios. O axônio, por sua vez, é único; não há mais de um por neurônio. Em sua extremidade ficam os bulbos ou botões terminais, que se aproximam de outras células e com elas fazem sinapses. Sabemos também que o sistema nervoso central ão é composto somente por neurônios. Existem nele também os diversos tipos celulares que chamamos de células da neuroglia ou glia. Encontramos dez células da glia para cada neurônio (CARNEIRO; JUNQUEIRA, 2004). Relação entre mente e cérebro Em sua totalidade, o sistema nervoso é fundamental para a manutenção do equilíbrio do organismo, por coordenar e regular as atividades corporais, tarefa que compartilha com o sistema endócrino e seus hormônios - no lugar dos neurotransmissores. Também é responsável pelo desenvolvimento e pela manutenção do que chamamos de mente, mesmo que não sejamos capazes ainda de descrever como a consciência e a inteligência emergem. Isso significa que não podemos dizer como esse órgão nos torna humanos (NICOLELIS apud PILETTI; ROSSATO; ROSSATO, 2014). A mente é um produto do cérebro. Na visão dos neurocientistas, não é preciso mais. Como afirmou o neurocientista brasileiro Miguel Nicolelis, descargas elétricas seguidas da liberação de vesículas são os únicos geradores de sensações, pensamentos, sentimentos, criações etc. Partindo desse ponto comum, porém, a maioria adere à visão conhecida como localizacionismo. Nessa perspectiva, regiões cerebrais específicas se associam com cada função cerebral e parte importante da tarefa dos neurocientistas é mapear as regiões responsáveis pelas diferentes funções - como as motoras, as auditivas, as gustativas e as olfativas (PILETTI; ROSSATO; ROSSATO, 2014). Inicialmente, essas regiões foram mapeadas por meio da dissecação de cadáveres ou da análise dos efeitos provocados por perdas acidentais ou patológicas de partes do cérebro. Outras foram localizadas por meio de investigações feitas em animais. Mas dos anos 1970 em diante se desenvolveram diversas técnicas de imageamento que têm proporcionado o estudo de cérebros normais em pleno funcionamento. E essas técnicas têm, em geral, fornecido evidências favoráveis às teses localizacionistas. A corrente minoritária dos holistas ou distribucionistas defende que as conexões se fazem entre grandes populações de neurônios distribuídos por múltiplas regiões cerebrais, capazes de participar da gênese de várias funções ao mesmo tempo (PILETTI; ROSSATO; ROSSATO, 2014). Na verdade, a história das neurociências é marcada pelo embate entre holistas e localizacionistas, que se acirrou no século XX. O resultado é a produção de uma grande quantidade de informações e de conclu- sões variáveis - alguns estudos reforçam a noção holista, outros a localizacionista. Parte do público recebe essas informações com ceticismo - seriam divulgadas para favorecer a indústria, para vender um produto ou negar/mascarar os malefícios que uma substância pode causar? Mas para muitas pessoas as descobertas e os avanços tecnológicos proporcionados pela neurociência são motivo de otimismo. Afinal, podem levar ao controle ou à cura de distúrbios, transtornos e limitações cognitivas que afetam o desenvolvimento ou diminuem significativamente a qualidade de vida de seus portadores. A psicofarmacologia, por exemplo, potencializou a psiquiatria biológica e levou à compreensão de doenças mentais como desequilíbrios químicos provocados ou influenciados por “defeitos” genéticos (PILETTI; ROSSATO; ROSSATO, 2014). Com isso, portadores de diversos males passaram a ter a chance de viver uma vida mais plena. Em contrapartida, à medida que começaram a surgir remédios para doenças cognitivas, tornou-se real a possibilidade de usar esses medicamentos de forma recreacional, para diversão ou “cosmética”. Essas intervenções não têm como objetivo restabelecer ou ajudar a manter a saúde e atingem crianças, jovens e adultos que estão envelhecendo. Por isso, muitos especialistas levantam preocupações, discutindo as implicações éticas do fenômeno e incorporando a seu vocabulário o termo “neuroética” (CHATTERJEE, 2004; FARAH, 2002; FARAH et al., 2004). Um dos problemas para a elucidação da relação mente versus cérebro é que, enquanto pesquisadores são capazes de observar o corpo e o cérebro em funcionamento, eles não têm como observar a mente dos outros. A mente só pode ser observada por seu próprio dono. Outro problema é que, nesse caso, a pesquisa é feita com o próprio objeto estudado: a mente consciente. Isso torna a relação entre observador e observado conflituosa. Há ainda mais um desafio pelo fato de que cada cérebro é único. Mesmo assim, são muitos os cientistas que seguem acreditando que a explicação virá e não vai demorar a surgir, possivelmente com o auxílio dos físicos. Antes, porém, os neurocientistas ainda têm muito trabalho a fazer, como compreender com mais detalhes o funcionamento dos neurônios e dos circuitos em nível molecular. Também é preciso avançar no conhecimento do comportamento dos neurônios nas regiões cerebrais. Já existem, por exemplo, indicações de que estados biológicos muito complexos sejam gerados por interações de regiões que não ficam próximas fisicamente (DAMASIO, 2004). Plasticidade neural Outro conceito importante para a psicologia da aprendizagem é o de plasticidade. Ao longo da vida acontecem mudanças adaptativas na estrutura e na função do sistema nervosoem resposta a interações com o ambiente externo e o ambiente interno. Foi no final do século XIX que Santiago Ramón y Cajal a definiu como: [...] a propriedade em virtude da qual acontecem mudanças funcionais sustentadas em sistemas particulares de neurônios em seguida à administração de estímulos ambientais apropriados ou da combinação de diferentes estímulos (CAJAL apud BENFENATI, 2007). A plasticidade neural representa a base sobre a qual se constroem a aprendizagem e a memória, é o que possibilita que as experiências contribuam para moldar estrutural e funcionalmente o sistema nervoso. O primeiro a descrever esse aspecto fundamental do desenvolvimento neural pode ter sido o grego Epicuro, no século III a.C. Segundo os escritos desse filósofo, podemos identificar formas e pensar sobre elas porque algo dos objetos externos penetra em nós (BENFENATI, 2007). Mas foi somente em 1930, aproximadamente, que Albrecht Bethe (1872-1954) introduziu na literatura especializada o termo neuroplasticidade para se referir à proprie- dade que Cajal descreveu. As experiências e os comportamentos estão incluídos na lista de promotores de adaptações cerebrais. Lesões também podem fazer o cérebro se reorganizar (PILETTI; ROSSATO; ROSSATO, 2014). Charles Sherrington (1857-1952), o criador do termo sinapse, recebeu em 1932 um Prêmio Nobel por ter descoberto que os arcos reflexos espinhais dependem da cooperação de diversas estruturas do sistema nervoso central e periférico. O trabalho de Sherrington estimulou os neurocientistas distribucionistas a continuar defendendo que o cérebro, mais do que uma máquina, representa um ecossistema (PILETTI; ROSSATO; ROSSATO, 2014). Sabemos agora que uma grande quantidade de neurônios é gerada, mas somente alguns são selecionados de acordo com o tamanho e a atividade dos territórios inervados. Essas células sobrevivem, ao passo que as outras entram em apoptose (suicídio celular programado). Então nesses neurônios selecionados crescem prolongamentos que vão ficar em contato com os neurônios reconhecidos como alvos por meio de sinais expostos as membranas, que são geneticamente determinados. No início, portanto, a formação das redes de neurônios é dirigida por fatores genéticos que se expressam diferentemente em populações distintas de células. Depois desse período inicial, os circuitos que se formam entre os neurônios vão se modificar, sendo moldados pelas experiências. Por exemplo, veremos conexões sinápticas que são pouco usadas se enfraquecerem ou até desaparecerem, enquanto sinapses muito usadas não somente se fortalecem como também podem se tornar mais numerosas. Essa força da sinapse pode se manter por pouco ou muito tempo, dependendo de diversos fatores, como a atividade prévia da rede de neurônios, mudanças nas proteínas pré e pós-sinápticas e a regulação da expressão de genes. Entre esses genes estão os que codificam as receitas para fabricar proteínas relacionadas com a transmissão sináptica (BENFENATI, 2007). Com isso, a eficiência da transmissão sináptica varia, podendo durar uma fração de segundos ou minutos no caso da plasticidade de curto prazo ou horas, dias e meses no caso da plasticidade de longo prazo. Essas mudanças são relevantes para a compreensão da aprendizagem, porque afetam o processamento das informações que chegam e contribuem para moldar a forma como as informações fluem pela rede. Assim, a estrutura física da memória talvez repouse na plasticidade das sinapses, que depende da intensidade de sua atividade. Hoje sabemos também que existem dois tipos de memória: uma para habilidades, conhecida como memória não declarativa ou implícita (por ser inconscientemente recordada), outra para o conhecimento, que também chamamos de declarativa ou explícita. Usando a memória implícita, agimos de modo automático (BENFENATI, 2007). Nela colecionamos as habilidades percepto-motoras ou cognitivas que adquirimos por meio da exposição repetida a um estímulo ou uma atividade. Essas habilidades não se manifestam de modo consciente ou intencional (BOLOGNANI et al., 2000). Já a memória explícita ou declarativa se refere a nossas lembranças conscientes de fatos relacionados com pessoas, coisas, lugares e noções. Pode ser autobiográfica (episódica), proporcionando-nos a lembrança de eventos e experiências que nos fazem ser quem somos, ou semântica, com a qual lembramos fatos e noções tanto gerais quanto autobiográficas. Pesquisas em neuropsicologia mostraram que os múltiplos sistemas de memória envolvem regiões distintas do cérebro. Para dispor da memória explícita, precisamos de um hipocampo intacto. Os sistemas de memória implícita, por sua vez, integram-se em diversos níveis no sistema nervoso central: vias reflexas, corpo estriado, cerebelo, amígdala, neocórtex. Outra diferença entre os tipos de memória está no fato de que a implícita demora a se construir. Temos de fazer muitas tentativas até conseguir. É o que acontece quando aprendemos, por exemplo, a andar de bicicleta, patins, skate. Se queremos, em contrapartida, lembrar um número de telefone ou o endereço de um amigo, recorremos à memória explícita e a resposta é mais imediata, o esforço, menor. Mas, quando não é usada, a memória explícita pode desaparecer rapidamente, ao passo que a implícita, mais robusta, pode durar por toda nossa vida. Dificilmente esquecemos como se anda de bicicleta depois de aprender, mesmo que não pratiquemos (BENFENATI, 2007). Concepções de aprendizagem Concepção apriorista A priori, em latim, quer dizer “a princípio”. Aprioristas são aqueles que pensam que as condições de possibilidade do conhecimento vêm de uma bagagem hereditária, pré determinada a priori. Toda a atividade de conhecimento seria exclusiva do sujeito, não contaria com a participação do meio. A teoria inatista, ou apriorista, defende que as possibilidades para a obtenção do conhecimento são inatas a todos os humanos, isto é, hereditárias e predeterminadas - o indivíduo pouco se transforma pelo meio ambiente. De acordo com Davis e Oliveira (1994): As qualidades e capacidades básicas de cada ser humano - sua personalidade, seus valores, hábitos e crenças, sua forma de pensar, suas reações emocionais e mesmo sua conduta social - já se encontrariam basicamente prontas (p. 27). Para Becker (2012), o desenvolvimento do conhecimento depende apenas do indivíduo, por isso a educação deve ter como objetivo principal o aprimoramento do conhecimento. Desse modo, podemos verificar que a concepção apriorista, ou inatista, fundamenta ideologias que marginalizam os indivíduos. “A postura apriorista se opõe à empirista na medida em que relativiza a experiência, absolutizando o sujeito” (BECKER, 2012). O conhecimento já estaria no aluno, cabendo ao professor somente despertá-lo. A lógica e o raciocínio, por exemplo, são inatos e o ensino tem de expandir essa bagagem. Durante muito tempo, essa concepção inatista foi dominante. Nela o desenvolvimento humano é determinado pelo crescimento físico e pelo grau de maturação do organismo. Uma criança aprende se tiver condições e aptidões para tal e não aprende se não contar com esses “pré- requisitos”. Por isso, nessa perspectiva têm grande relevância as características herdadas biologicamente dos pais. Conforme diz o ditado, “filho de peixe, peixinho é” (PILETTI; ROSSATO; ROSSATO, 2014). Conforme vimos no início desta unidade, a origem dessa concepção na história ocidental pode ser atribuída ao filósofo grego Platão, para quem o conhecimento não se alcançava por meio dos sentidos: ele fica na esfera do inteligível, que alcançamos com a autorreflexão. Nessa corrente também ficam filósofos e cientistas que procuraram abordar o homem como mero produto de sua própria biologia, com pouca ou nenhuma influência do ambiente. Como a escola é parte do ambiente, ela teria pouca influênciasobre o desenvolvimento humano. Foi a exploração das possibilidades da inteligência inata que levou os psicólogos franceses Alfred Binet (1857-1911) e Théodore Simon (1872-1961) a desenvolverem seus testes para avaliar a capacidade mental de crianças. Binet e Simon queriam mostrar que as diferentes raças tinham capacidades intelectuais distintas, sendo que os negros eram inferiores aos brancos. Em seguida, vieram testes que comprovavam que a inteligência era herdada dos pais. Nesses testes, os meninos de classe alta se saíam melhor que as outras crianças; no entanto, as crianças inferiores não podiam se desenvolver para além do que sua “natureza” proporcionava (PILETTI; ROSSATO; ROSSATO, 2014). O desenvolvimento das características humanas seriam geneticamente programado. Como defendeu o psicólogo norte-americano Arnold Gesell (1880-1961) nos anos 1920, a maturação biológica das capacidades e habilidades intelectuais seguiria uma sequência geneticamente pré definida. Sob essa perspectiva, o meio só pode facilitar ou dificultar o processo de amadurecimento. O desenvolvimento motor, para Gesell, ilustra bem o caráter natural e progressivo da maturação. Parte dos psicólogos investigou a relação dos genes com o comportamento humano. A genética do comportamento procura distinguir o que resulta da ação dos genes do que pode ser atribuído à influência do ambiente. Por exemplo, estudando gêmeos criados em diferentes contextos e/ou comparando os resultados obtidos com os gêmeos e não gêmeos. Havia diferenças quanto ao desempenho intelectual? Um dos pioneiros desse tipo de estudo foi Binet (ALMEIDA; ALMEIDA, 2010). Outros estudos se dedicaram a compreender o desenvolvimento de crianças adotadas: elas se pareciam com seus pais biológicos ou com os pais adotivos? (PILETTI; ROSSATO; ROSSATO, 2014). Essa abordagem teórica nos leva a esperar que determinadas capacidades se manifestem nas crianças de acordo com sua faixa etária. Na prática educacional, ela se traduz na necessidade de considerar que existem idades definidas para ensinar determinados conhecimentos ou realizar certas tarefas. Concepção empirista Para a concepção empirista, as experiências são únicas e res- ponsáveis pela formação de ideias. Empiristas são aqueles para os quais o conhecimento é adquirido por meio dos órgãos dos sentidos (BECKER, 2012). O desenvolvimento é determinado pelas condições que nos cercam, pelos ambientes à nossa volta, pelas experiências que vivemos em meios físico e social, que incluem nossa família e a escola que frequentamos (PILETTI; ROSSATO; ROSSATO, 2014). Conforme já vimos no início desta unidade, o filósofo inglês John Locke é um dos principais expoentes da corrente empirista. Em 1690, ele argumentou que os bebês nascem todos iguais, desenvolvendo suas características próprias de acordo com as experiências e os ambientes a que eram expostos. A mente, ao nascer, seria como uma lousa vazia na qual o conhecimento trazido pelos sentidos vai sendo escrito, decalcado. O conhecimento aqui não vem do sujeito, e sim do objeto, do mundo, do meio físico ou social pelas experiências. E a atividade é propriedade do objeto, não do sujeito, que é passivo. Assim, ensinar é transmitir conhecimento. Nessa perspectiva, a memória é concebida de forma estática, como um arquivo no qual se acumulam informações vindas do ambiente, captadas pelos sentidos. Acumular conhecimentos seria como encher um armazém de mantimentos (BECKER, 2012). Encontramos também essa visão entre os behavioristas, como John Watson, que considerava o papel do ambiente fundamental para moldar o comportamento humano. A partir dos estudos que fez com crianças, defendeu que elas podem ser moldadas a gosto. Para Watson, podemos condicionar um bebê, por exemplo, a temer qualquer estímulo ou treinar uma criança para ser qualquer coisa: ladrão, artista, médico, professor. Já vimos que os estudos dos behavioristas consistiam na associação entre estímulos e seus efeitos (respostas), não se importando com o que acontecia na “caixa preta” do cérebro (PILETTI; ROSSATO; ROSSATO, 2014). Uma das dificuldades desses estudos era controlar e isolar as características ambientais que deveriam ser testadas. Mesmo assim, conforme já vimos, até os anos 1950 essa foi a corrente dominante na psicologia. Além de Watson, seus maiores expoentes foram Thorndike, Pavlov e Skinner. Dessa concepção nasce a teoria da aprendizagem social, que explica o comportamento e a personalidade humana por meio do condicionamento clássico, do condicionamento operante e da imitação. Muitas vezes, seus adeptos foram convocados para refletir sobre comportamentos inadequados: como seria possível desprendê-los e adequar o comportamento? Mas não é somente o ambiente que nos cerca que contribui para que se forme nosso jeito de ser. O desenvolvimento sofre a influência dos meios sociais e dos contextos culturais em que vivemos. Sem a compreensão dessas influências, fica incompleto qualquer conhecimento do desenvolvimento humano. E o behaviorismo não se propunha a estudá-las, como também ignorava os processos cognitivos. Vimos também que essas insuficiências associadas à corrente comportamentalista contribuíram para a emergência de outra corrente: o cognitivismo (PILETTI; ROSSATO; ROSSATO, 2014). Oposto ao racionalismo, o empirismo prega que a mente humana é uma “tábula rasa” em que são gravadas as impressões externas, desprezando a existência de ideias natas ou de conhecimento universal. Essa concepção crítica a metafísica e os conceitos como os de causa e substância. O empirismo apresenta três linhas distintas: a integral, a moderada e a científica. Atualmente, o empirismo lógico é conhecido como neopositivismo. Concepção interacionista A conduta interacionista defende que o processo de conhecimento é dinâmico e busca a interação entre sujeito e objeto, a fim de estabelecer relações recíprocas entre eles. Essas relações provocam mudanças tanto no sujeito quanto no objeto a ser conhecido. Para os interacionistas não existe conhecimento anterior à ação do sujeito sobre os objetos, as coisas, o mundo. Piaget e Vygotski adotaram a concepção interacionista em seus estudos; a partir de princípios interacionistas, Vygotski teria compreendido o desenvolvimento das funções cognitivas, especialmente as humanas. Baseado em conceitos de Marx e Engels, Vygotski procurou entender a mediação na relação homem e ambiente pelo uso de signos e instrumentos. Criados pela sociedade, os sistemas de ins- trumentos e de signos, como a linguagem, a escrita e os números, transformam o modo como as relações sociais se desenvolvem e o desenvolvimento cultural do humano. Decerto, Vygotski foi pioneiro ao sugerir, em uma perspectiva histórica e cultural do desenvolvimento humano, que a mediação das relações com os objetos é fundamental para a compreensão das concepções, importante para a elaboração das estruturas cognitivas do sujeito. De acordo com o teórico, o sujeito não tem acesso direto aos objetos; o indivíduo só pode se relacionar com eles por meio dos sistemas simbólicos de que dispõe. Ele concluiu que a cultura é que fornece esses sistemas aos sujeito, importantes para a representação da realidade, o que constrói o aspecto da origem social das operações com os sistemas simbólicos. Outro aspecto relacionado ao conceito de mediação é o próprio processo de representação mental. Sozinhas, as ideias não ocorrem no sujeito. É necessária a inter-relação entre indivíduos e o meio em que vivem para o desenvolvimento de atividades, a fim de despontar as ideias. Para Vygotski, cada pessoa, como ser social, constrói sua própria individualidade conforme mantém relações com outros membros da sociedade. Isso significa que a interação social, mediada pela cultura, é condição imprescindível para a construçãodo indivíduo. Nessa concepção, segundo Piaget (apud BECKER, 2012, p. 386): As relações entre o sujeito e seu meio consistem numa interação radical, de modo tal que a consciência não começa pelo conhecimento dos objetos nem pelo da atividade do sujeito, mas por um estado indiferenciado; e é desse estado que derivam dois movimentos complementares, um de incorporação das coisas do sujeito, o outro de acomodação às próprias coisas. Piaget defende a teoria de que os seres humanos sofrem trans- formações ordenadas e previsíveis, baseando-se no interacio- ismo, na ideia de construtivismo sequencial e nos fatores que interferem no desenvolvimento do indivíduo. De acordo com essa teoria, a criança é dinâmica, interagindo a todo momento com a realidade, os objetos e as pessoas, o que constitui as estruturas mentais do organismo. Pela organização interna e adaptação ao ambiente, realizadas simultaneamente, o organismo interage com o meio durante toda a vida. O conhecimento é, portanto, algo que se constrói por intermédio das interações ou trocas dos organismos com seus meios. Agindo sobre os objetos, os sujeitos os transformam ao assimilá-los. Do mesmo modo os objetos também fazem os sujeitos se transformarem para acomodá-los, mudando seus esquemas de ação/operação sobre o mundo. Assim, a acomodação é uma ação transformadora do sujeito sobre si mesmo e a aprendizagem é o resultado desses dois processos: assimilação e acomodação (BECKER, 2012). Panorama A educação escolar no processo de humanização do homem Sabemos que o homem, na medida em que interage com o outro, supera sua condição biológica, processo que é mediatizado pela cultura humana composta de objetos, instrumentos, ciência, valores, hábitos, lógica e linguagens. Nesse prisma, a educação é essencial, com destaque para a educação realizada por meio do ensino e da educação escolar, pois de acordo com Leontiev (1978) esta se caracteriza por um processo de humanização, que permite aos homens o desenvolvimento de suas aptidões, numa apropriação das obras da cultura historicamente constituídas pela humanidade, através das interações sociais estabelecidas. Por isso, ao longo da história, como nos indica Mello (2007), o ser humano formou o conjunto de gestos adequados ao uso de objetos e de instrumentos, bem como as funções intelectuais envolvidas nesse processo. Assim, ao criar a cultura humana, criamos o conjunto das características e das qualidades humanas expressas pelas habilidades, capacidades e aptidões que foram se formando ao longo da história por meio da própria atividade humana. Tais qualidades, por sua vez, não são adquiridas sob a forma de herança genética e, sim, por meio da cultura material e intelectual repassada de geração a geração, que nos indica o que devemos aprender ou rechaçar. Para tanto, é necessário que as novas gerações aprendam a utilizar os objetos da cultura deixados pela geração precedente, de acordo com a função social para a qual foram criados, levando adiante o processo de desenvolvimento da humanidade. Desse modo, ao apropriar-se dos instrumentos culturais, como o computador ou a linguagem escrita, por exemplo, faz-se necessária a mediação, motivo pelo qual uma criança, ainda que nasça com o aporte biológico necessário ao seu desenvolvimento, necessita relacionar-se com os outros para humanizar-se. Assim, Vygotski (2001) compreende que o nosso desenvolvimento está vinculado à natureza e à qualidade das mediações que realizamos ou das quais participamos, bem como ao quanto aprendemos a fazer uso de instrumentos da cultura, como referência do nível de desenvolvimento da nossa mente. Reforça-se, desse modo, a importância e a necessidade de que as mediações proporcionadas às crianças, desde muito cedo, sejam ricas em oportunidades de aprendizagem e possam mediar a apropriação das significações socialmente produzidas, pois ao dar sentido aos objetos, normas, valores, papéis sociais, experiências, por exemplo, individualiza-se e constrói um modo próprio de ser o mundo, pleno de significações (Carvalho, 2007). No processo de desenvolvimento cultural as aquisições históricas da humanidade não estão incorporadas nas disposições naturais do homem, e sim, no mundo que o rodeia, nas grandes obras da cultura humana. Por isso, para Vygotski (2001), o ensino e a educação têm um papel fundamental, por constituírem formas universais de desenvolvimento psíquico do homem que variam de acordo com os determinantes históricos. Elkonin (1987) realça a relevância de um bom ensino para o desenvolvimento intelectual da criança em idade escolar, desde que o ensino tenha significado e exerça influência sobre o desenvolvimento. “A importância primordial da atividade de estudo está determinada, ademais, porque através dela se mediatiza todo o sistema de relações da criança com os adultos que a circu- lam, incluindo a comunicação pessoal na família” (1987, p. 119). Quando se trata de um ensino orientado, formal, consideramos que as relações de aprendizagem estão imbricadas com uma série de fatores, entre eles, a necessidade de conhecer as condições ade- quadas para o processo de aprendizagem, o que envolve igualmente uma formação adequada dos professores, visando propiciar situações de aprendizagem e de desenvolvimento em que o aluno participe ativamente. Quanto a isso, Saviani (2005) aponta que cada homem contribui para a produção do saber, mas deve ter a possibilidade de acesso, objetivação e apropriação da cultura para que se desenvolva, e um importante meio de acesso e de socialização da cultura, do saber elaborado (com os devidos instrumentos) é a educação escolar.Daí a importância de que todos tenham acesso a uma escola de qualidade. Nessa perspectiva, o professor constitui-se em um mediador entre os conteúdos já elaborados pelos homens e os alunos, de tal modo que propicia a formação e transformação das funções psicológicas superiores (atenção voluntária, imaginação, pensamento, linguagem etc.), por meio da apropriação dos conhecimentos e provocando neles a necessidade de apropriação permanente de novos conhecimentos. Assim, o homem em processo de humanização e culturalização pode encontrar, nas relações com o outro, na educação escolar, as mediações e instrumentalizações necessárias e fundamentais para o desenvolvimento das funções psicológicas superiores que, estruturadas em sistemas funcionais, organizam dinamicamente a vida mental de um indivíduo nas suas relações com seu meio, ajudando em seu desenvolvimento e na apropriação das características produzidas historicamente pelas gerações humanas. Fonte: Piletti e Rossato (2012, p. 83-85). Recapitulando Começamos esta unidade estudando as diversas maneiras em que o processo de aprendizagem foi pensado ao longo da história do Ocidente. Vimos que os filósofos da Grécia Antiga foram os primeiros a teorizar sobre o conhecimento, o que é possível conhecer, como se conhece. Estudamos os trabalhos dos pioneiros do campo da psicologia da aprendizagem, entre os quais William James e John Dewey, e vimos como o behaviorismo predominou durante grande parte de sua existência, além de como essa corrente foi sucedida pelo cognitivismo e pelo construtivismo. Abordamos também no primeiro tema os principais pontos das obras de Piaget e Vygotski. Depois dos fundamentos epistemológicos, estudamos os fundamentos biológicos da compreensão da aprendizagem pelos psicólogos. div-box Vimos que essa compreensão se assenta na teoria neuronal, que estendeu a teoria celular à constituição do sistema nervoso. Verificamos sua unidade anatômica e funcional, o neurônio, e as células da glia. Vimos ainda como nasceram as neurociências modernas e como seu avanço ao longo do século XX se deveu em parte à oposição entre localizacionistas e distribucionistas. Estudamos tambéma importância da plasticidade neural para a memória e a aprendizagem e o que sabemos até hoje sobre a relação entre o cérebro e a mente. Encerrando esta unidade, abordamos as concepções de aprendizagem. Vimos que os aprioristas apostam na primazia de nossas características inatas, genéticas, enquanto os empiristas veem o ambiente que nos cerca como determinante para a elaboração do conhecimento. Por último, estudamos a concepção interacionista da aprendizagem, que procurar superar a oposição entre aprioristas e empiristas defendendo que o conhecimento não se encontra fora nem dentro de nós. É algo que se constrói continuamente nas interações do sujeito com o ambiente e outros sujeitos. UNIDADE 2 Contribuições significativas para a construção do pensamento e da linguagem Objetivos de aprendizagem • Conhecer as diferentes tendências que se manifestaram na pedagogia ao longo do tempo, da tradicional à libertadora. • Entender o que é e como surgiu o behaviorismo, estudando suas vertentes e seus principais precursores e expoentes. • Estudar mais detalhadamente a concepção piagetiana dos estágios do desenvolvimento humano. • Compreender a concepção de educação libertadora de Paulo Freire. Temas 1 - Tendências pedagógicas Neste tema, faremos um novo mergulho na história, agora com foco as tendências pedagógicas adotadas pelas escolas. 2 - Behaviorismo e suas implicações educacionais No segundo tópico da unidade, iremos ver as características gerais do behaviorismo, as diferenças entre diversas versões dessa vertente da psicologia e sua influência. 3 - Epistemologia genética de Jean Piaget Nesta seção estudaremos os quatro estágios do desenvolvimento cognitivo humano, que progridem no sentido de maior capacidade de abstração e operação. 4 - A pedagogia crítica de Paulo Freire No último tema, abordaremos o método libertador de alfabetização de adultos e educação popular criado por Freire para conscientizar a opressão social. Introdução Começamos nosso estudo nesta unidade conhecendo as diversas tendências pedagógicas que se sucederam ao longo da história da educação. Primeiro, veremos o que caracteriza a pedagogia tradicional, realizada por meio de aulas expositivas nas quais a desigualdade entre professores e alunos é clara. Por isso, cabe aos professores transmitir conhecimentos e principalmente participar da construção do conhecimento do aluno, permitindo o pensar de forma inteligente aos estudantes e visando formar pessoas com um bom nível de cultura geral. Em seguida, veremos como funciona a escola renovada, na qual a aprendizagem é proporcionada por experiências diretas com o ambiente e os objetos. Essa concepção de ensino é centrada no aluno, que se educa por meio da interação de suas estruturas cognitivas com o mundo. Mas na escola renovada, aprenderemos que as experiências têm de ser, além de interessantes para os alunos, elaboradas com foco na satisfação das exigências sociais. Depois estudaremos como funcionam as escolas que seguem a tendência renovada não diretiva, orientadas no sentido da autorrealização dos alunos, de modo que os conteúdos e as aulas importam menos que o autodesenvolvimento psicológico. Analisaremos ainda a concepção tecnicista, na qual o que importa é a transmissão de verdades científicas para os alunos por meio de tecnologias eficientes. Em seguida, conheceremos outra forma de encarar a educação: as pedagogias libertadoras, como a de Paulo Freire, educador que abordaremos em mais detalhes na última parte desta unidade. Estudaremos ainda outras formas progressistas de educação: as pedagogias libertárias e as crítico-sociais. Outro tópico que estudaremos nesta unidade é o behaviorismo. Veremos quais foram seus principais precursores, o que caracteriza essa escola de modo geral e as particularidades das diversas vertentes behavioristas. Como você vai ver, diferenças separam os behaviorismos de Watson, Tolman, Hull e Skinner. Entre essas diferenças estão as metodologias que usaram. Abordaremos, por exemplo, o método do reflexo condicionado de Watson e os experimentos de condicionamento de ratos em caixas-gaiola de Skinner. Dando sequência aos estudos da unidade, veremos a concepção de desenvolvimento humano de Jean Piaget. Conheceremos o que, para o biólogo suíço, caracteriza cada um dos quatro estágios do desenvolvimento e como isso foi importante para colocar em evidência as peculiaridades cognitivas das crianças. Por fim, encerrando esta unidade, analisaremos o método de Paulo Freire para a alfabetização de adultos e a educação popular, de orientação explicitamente política. Tendências pedagógicas A forma como os professores realizam seu trabalho, selecionam e organizam os conteúdos das matérias e escolhem métodos de ensino e técnicas de avaliação reflete pressupostos teóricos e metodológicos, mesmo que esses pressupostos, muitas vezes, fiquem apenas implícitos em suas opções e ações. Grande parte dos professores põe em prática noções pedagógicas adquiridas ao longo da vida, desde suas experiências como estudantes na escola. É menor a porcentagem de professores que compreende que sua prática tem um sentido mais amplo e busca tornar explícitas as convicções que implicitamente orientam seu trabalho docente. Em muitos cursos de licenciatura, que supostamente preparam para a prática docente, as correntes pedagógicas ficam de fora do currículo. Em outros cursos, os futuros professores estudam teorias da aprendizagem e do ensino desconectadas das situações e das condições concretas que os aguardam nas salas de aula. Assim, muitos docentes se formam sem ter clareza sobre as referências teóricas e metodológicas que guiam sua atuação profissional (LIBÂNEO, 1990). Por isso, estudaremos agora as tendências pedagógicas que se manifestam na prática dos professores. Examinaremos os pressupostos, tanto metodológicos quanto teóricos, de cada uma dessas tendências. Mas tenha em mente que será muito difícil encontrar tendências puras, conforme serão aqui definidas. Por não serem mutuamente excludentes, elas podem se manifestar ao mesmo tempo. A primeira divisão que podemos fazer entre as tendências se- para as pedagogias de tipo liberal das pedagogias ditas progressistas. Entre as liberais estão a tradicional, a renovada progressivista, a renovada não diretiva e a tecnicista. Os tipos progressistas, por sua vez, são a libertadora, a libertária e a crítico-social dos conteúdos. Tendência liberal De acordo com essa concepção, a escola deve preparar os indivíduos para o desempenho de papéis sociais de acordo com suas aptidões. O desenvolvimento da cultura individual deve se dar de modo que as pessoas aprendam a se adaptar aos valores e às normas vigentes nas sociedades em que vivem. A educação liberal começou com a pedagogia tradicional e evoluiu para a pedagogia renovada, que também chamamos de escola nova ou ativa. Mas não pense que uma tenha substituído a outra: as duas se manifestam na prática escolar (LIBANEO, 1990). Tendência tradicional Essa tendência aposta no ensino de caráter humanístico, que visa formar indivíduos com uma boa cultura geral. Por meio de seu próprio esforço, o aluno é educado para se realizar como pessoa. Assim, os conteúdos que aprende não estão diretamente relacionados com seu cotidiano nem com a realidade social. Por isso, essa tendência também é considerada intelectualista ou enciclopédica. O que importa é receber as informações que o professor transmite, conformar-se às regras e tornar-se o que se considera uma pessoa intelectualmente cultivada (LIBANEO, 1990). À escola cabe preparar não apenas intelectualmente como também moralmente os alunos para desempenhar os papéis que os esperam na sociedade, de onde pertencem os problemas sociais. O mesmo caminho
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