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Entenda os textos da Bíblia - Denis Duarte

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2
3
Apresentação
A Bíblia é a Palavra de Deus dirigida aos homens, escrita por pessoas inspiradas
(hagiógrafos) pelo próprio Espírito Santo; é a Revelação divina, ensinando-nos o que
devemos saber e fazer nesta vida. Mas a Bíblia não é um livro de ciências, e sim de fé.
Utilizando os mais diversos gêneros literários, ela narra acontecimentos da vida de um
povo guiado por Deus, desde quatro mil anos atrás, atravessando os mais variados
contextos sociais, políticos, econômicos etc. Por isso, a Palavra de Deus não pode
sempre ser tomada ao “pé da letra”, literalmente, embora muitas vezes o deva ser.
Porque “a letra mata, o Espírito é que dá a vida” (2Cor 3,6c), como diz São Paulo.
Para aquele que possui a fé sem a qual “é impossível agradar a Deus” (Hb 11,6), a
Palavra de Deus é alimento sólido para a vida espiritual, indispensável para aquele que
deseja, pela fé, fazer a vontade do Senhor e ter luz na própria vida. Mas nem sempre a
Bíblia é fácil de ser interpretada, pelas razões já expostas. É por isso que Jesus confiou a
interpretação dela à Igreja Católica, que a faz por meio do Sagrado Magistério, dirigido
pela cátedra de Pedro (o Papa), e da Sagrada Tradição Apostólica, que constitui o acervo
sagrado de todo o passado da Igreja e de tudo quanto o Espírito Santo lhe revelou no
passado e continua fazendo no presente. (cf. Jo 14,15.25; 16,12-13). Santo Agostinho
disse: “Eu não creria no Evangelho, se a isto não me levasse a autoridade da Igreja
Católica” (Catecismo, n. 119).
A alma da Igreja é o Espírito Santo dado em Pentecostes; por isso, a Igreja não erra
na interpretação da Bíblia, e isso é dogma de fé. Jesus mesmo lhe garantiu isto: “Quando
ele vier, o Espírito da Verdade, vos guiará em toda a verdade” (Jo 16,13).
A Igreja não despreza a ciência; muito pelo contrário, a valoriza tremendamente e a
utiliza para iluminar a fé e entender a Revelação bíblica. O Vaticano possui a “Pontifícia
Academia de Ciências”; em Jerusalém está a Escola Bíblica que se dedica a estudar
exegese, hermenêutica, línguas antigas, geologia, história antiga, paleontologia,
arqueologia, e tantas outras ciências, a fim de que cada palavra, cada versículo e cada
texto da Bíblia sejam interpretados corretamente. Tudo isso mostra que a Igreja é guiada
pelo Espírito Santo, mas não dispensa a luz da ciência natural. É a fé caminhando junto
com a ciência.
São Pedro nos alerta para o perigo de interpretar de maneira errada a Sagrada
4
Escritura. Falando das cartas de São Paulo, ele diz:
Ele trata disso também em todas as suas cartas, se bem que nelas se encontrem algumas coisas
difíceis, que homens sem instrução e vacilantes deformam, para sua própria perdição. Aliás, é o que
fazem também com as demais Escrituras (٢Pd ٣,١٦).
Portanto, se a Bíblia nos leva à salvação, pode também levar à perdição, se for
interpretada sem ouvir a voz do Magistério da Igreja.
Neste livro, Entenda os Textos da Bíblia, o amigo e colega Denis Duarte, professor
no Instituto de Teologia Bento XVI da Canção Nova e da Diocese de Lorena e estudioso
especializado na Bíblia, nos apresenta os meios necessários e seguros para uma boa
leitura, entendimento e aplicação dos textos bíblicos, seguindo os critérios que a Igreja
nos ensina há muito tempo.
O livro nos ajuda, antes de tudo a conhecer, a Bíblia em seu conjunto e sentido;
ensina os tipos de leitura que podem ser usados para bom entendimento e assimilação da
Palavra divina; apresenta um roteiro para o estudo da Bíblia e apresenta dez
“ferramentas” práticas para isso. Por fim, ajuda o leitor a aplicar a Bíblia na vida.
Com satisfação apresento mais este livro do Denis a nossos leitores, rogando ao
Divino Espírito Santo, inspirador da Sagrada Escritura, que conceda a mesma luz a todos
que a lerem. Agradecemos ao Denis mais este bom serviço prestado ao povo de Deus.
PROF. FELIPE AQUINO
Professor do Instituto de Teologia Bento XVI
5
Ao meu irmão Délio Duarte,
pela sua amizade e exemplo de dedicação.
6
Introdução
Ao entrar numa oficina mecânica, é possível encontrar várias ferramentas, cada uma
para desempenhar determinada função. Um mecânico realiza muitos serviços, mas para
cada trabalho utiliza uma ferramenta própria.
Algo parecido propõe este livro, que quer oferecer ferramentas para quem se dispõe
a conhecer melhor os textos bíblicos, além de apresentar um instrumental para que cada
um possa fazer com mais condições a leitura e, dessa maneira, entender melhor o que lê.
Não se quer aqui dar a interpretação de textos da Bíblia, pelo contrário, o anseio é
apresentar ferramentas que permitam que cada pessoa, ao utilizar o material exposto,
possa entender melhor o texto bíblico. Cabe aqui um velho ditado popular: “Não será
dado o peixe, mas se ensinará a pescar”.
É necessário esclarecer que a proposta deste livro não é a de um estudo acadêmico-
científico da Bíblia, ainda que sejam usadas algumas ferramentas baseadas em técnicas
de exegese e hermenêuticas bíblicas. Esta obra se propõe a auxiliar de modo prático
aqueles que querem conhecer melhor as Sagradas Escrituras e, sobretudo, a incentivar a
sua leitura, estudo e aplicação.
São palavras da Igreja a respeito do estudo da Palavra de Deus:
É tão grande o poder e a eficácia encerrados na Palavra de Deus, que ela constitui sustentáculo e vigor
para a Igreja, e para seus filhos, firmeza da fé, alimento da alma, pura e perene fonte da vida
espiritual. É preciso que o acesso à Sagrada Escritura seja amplamente aberto aos fiéis. Que o estudo
das Sagradas Páginas seja, portanto, como que a alma da Sagrada Teologia. Da mesma palavra da
Sagrada Escritura também se nutre salutarmente e santamente floresce o ministério da palavra, a
saber, a pregação pastoral, a catequese e toda a instrução cristã, na qual deve ocupar lugar de destaque
a homilia litúrgica. A Igreja exorta com veemência e de modo peculiar todos os fiéis cristãos [...] a
que, pela frequente leitura das divinas Escrituras, aprendam “a eminente ciência de Jesus Cristo” (Fl
3,8). Com efeito, ignorar as escrituras é ignorar a Cristo (Catecismo da Igreja Católica, 131-133).
Este livro deve ser usado, como mencionado anteriormente, como uma caixa de
ferramentas. A ela você poderá recorrer sempre que estiver lendo um texto bíblico e nela
encontrará a ferramenta adequada para trabalhar na leitura e estudo desse texto. Por isso
é importante que ao estudar a Bíblia, tenha este livro por perto, pois, como numa oficina,
você terá em mãos uma caixa cheia de equipamentos, cada um adequado para um tipo de
7
trabalho, ou seja, para um texto bíblico.
O que é oferecido aqui é destinado a todos aqueles que fazem, ou desejam fazer, o
estudo da Palavra de Deus. De modo especial, para aqueles que exercem o ministério da
pregação, formação comunitária ou catequese, e que por isso precisam não somente
entender o texto e aplicá-lo, mas também transmiti-lo aos demais.
Este livro está dividido em três partes. Na primeira, são apresentados alguns
conceitos básicos e também algumas sugestões de roteiros de estudos. A segunda parte é
dedicada às técnicas de estudo dos textos bíblicos e é composta por dez ferramentas
simples e objetivas para o entendimento da Bíblia. A terceira parte diz respeito a alguns
passos relacionados à aplicação do texto lido, de acordo com o Magistério e Tradição da
Igreja.
Como este livro possui um caráter pastoral, não foram colocadas notas de rodapé
com as obras utilizadas como referência, mas ao final do capítulo 3 é apresentada uma
bibliografia básica com o material utilizado para compor esta obra, bem como sugestões
para quem quer se aprofundar nos assuntos aqui tratados.
Que a Palavra de Deus seja lâmpada para nossos pés e luz para nosso caminho (cf.
Sl 119,105).
Bom trabalho!
8
Conhecendo a Bíblia
1. Estudar e entender a Bíblia
No Salmo 118, versículo 17, lê-se: “Concedei a vosso servo esta graça: que eu viva
guardando vossas palavras” (Sl 118,17). Esse é o objetivo deste livro: auxiliá-lo na
leitura da Bíblia, incentivá-lo a fazer um estudo da Palavra;e a quem já faz esse estudo,
oferecer ferramentas que permitam um aprofundamento cada vez maior nesse trabalho.
Para isso, é necessário tratar de algumas questões ligadas à exegese e hermenêutica
bíblicas. Mas não se assuste. Essas palavras (exegese e hermenêutica) estão mais
presentes na sua leitura da Bíblia do que você imagina.
Comecemos pela definição desses termos; trata-se de algo muito próximo àqueles
que se propõe a estudar com mais afinco a Palavra de Deus.
Exegese significa explicação ou explanação. É a arte de expor, de trazer para fora o
sentido de um determinado texto. É um conjunto de técnicas e ferramentas utilizadas
para entender e descobrir o significado de um texto.
Já hermenêutica diz respeito à interpretação do texto em si. É a apropriação que se
faz do entendimento do conteúdo para aplicá-lo no dia a dia.
Mas existe no meio do caminho entre a exegese e a hermenêutica um filtro: a
Doutrina da Igreja, o Catecismo da Igreja Católica. Esse procedimento de filtrar o estudo
bíblico serve basicamente para duas coisas: não permitir os exageros e também ampliar o
entendimento quando ele é muito limitado.
É necessário esclarecer a importância de fazermos esse caminho: estudo (exegese),
doutrina (catecismo) e aplicação do texto (hermenêutica).
Ler superficialmente um trecho bíblico, sem um mínimo de contextualização e
consulta à Igreja, o fará correr o risco de aplicar o texto de maneira equivocada e causar
danos a si e àqueles a quem transmite o seu estudo. Daí a importância desses três
momentos: estudo mais cuidadoso (exegese), filtro da doutrina (catecismo) e aplicação
no dia a dia (hermenêutica).
2. Tipos de leitura bíblica
9
Existem vários métodos de leitura ou abordagens bíblicas que, de uma forma ou
outra, influenciam os roteiros ou técnicas que usamos no cotidiano dos estudos da Bíblia.
Então, é preciso conhecer melhor alguns deles para que você pense sobre como tem feito
o seu estudo e aplicação dos textos da Sagrada Escritura.
Método estruturalista
Esse método distingue-se por defender que na estrutura e na organização do texto
está todo o entendimento dele. Para esse método, a estrutura do texto apresenta todo o
seu significado.
A leitura estruturalista possui algumas características positivas, às quais se deve
prestar atenção. Primeiramente, ela incentiva uma leitura repetida e mais atenta ao texto,
o que é essencial para quem se dispõe a entender as Sagradas Escrituras. Dessa forma,
essa maneira de estudo ensina a atentar aos detalhes, a pormenores muitas vezes
considerados insignificantes na composição e organização do texto (é o que se chama de
“ver o que está nas entrelinhas”), abrindo a capacidade de percepção do leitor.
O risco dessa leitura está em prender-se somente ao texto e, consequentemente,
esquecer-se das outras coisas que envolvem o processo de escrita, como o contexto,
autoria, público alvo etc. Além do mais, corre-se também o risco de se ignorar o filtro da
Doutrina, ou seja, o Magistério e a Tradição, na etapa final, que é a de aplicação do texto
no cotidiano. A estrutura e organização do texto realmente revelam o próprio texto, mas
essa leitura não pode ser isolada do contexto e de tudo mais que envolve a produção
escrita, bem como o entendimento do texto bíblico precisa ser feito em comunhão com o
Magistério e a Tradição da Igreja.
Método histórico-crítico
Essa leitura é feita com a historicidade do texto, com seu contexto. Entende os livros
bíblicos como escritos há milênios e busca compreender sua evolução. É também crítica,
porque analisa o texto de modo a levantar perguntas e, dessa forma, buscar o maior
número de informações, para a partir daí encontrar as respostas.
A vantagem dessa leitura é que se leva em conta que os textos são a revelação de
Deus, mas em situações históricas específicas, considerando a distância temporal,
cultural, linguística e circunstancial existente, antes de entender o texto.
Mas essa leitura também precisa de cuidados, entre eles o de não fazê-la atentando-
se meramente ao aspecto histórico, esquecendo-se de que a Bíblia é um livro de fé, das
revelações de Deus à humanidade, e enxergando os textos bíblicos simplesmente como
história antiga. Outro risco que se corre é o de estudar demais tudo o que cerca o texto e
esquecer o texto em si, ou seja, consultar muitas informações sobre o contexto e deixar
10
em segundo plano a leitura bíblica, que deve vir primeiro.
Uma leitura crítica possibilita um entendimento mais real do texto sem querer, por
exemplo, harmonizar os que são conflitantes, mas antes entendê-los verdadeiramente,
enxergar os autores sagrados como pessoas do seu período histórico, que utilizaram as
ferramentas linguísticas e literárias de que dispunham para construir os escritos.
Abordagem fundamentalista
Essa leitura é caracterizada por entender cada detalhe da Bíblia no seu sentido literal.
Dessa forma, a leitura torna absoluto tudo o que está escrito, defendendo a todo o
instante que a Bíblia não apresenta contradições nos textos e não levando em
consideração o trabalho humano de composição textual.
Por mais que esse tipo de leitura e entendimento da Bíblia encare com muita
seriedade a revelação Divina contida nos textos, ela se torna extremamente perigosa,
pois não leva em conta a Sagrada Tradição e o Magistério da Igreja, necessários para o
entendimento e aplicação da Palavra. Também não leva em conta a condição humana e
tudo o que cerca o trabalho do homem no processo de construção dos textos e, por fim,
pode cair no erro da bibliolatria, ou seja, uma idolatria a tudo o que está no texto,
colocando a Bíblia e a interpretação literal dela acima de tudo e de todos.
Por esses tipos básicos de métodos e abordagens talvez seja possível refletir como
tem sido a sua leitura ou estudo dos textos bíblicos, qual a ênfase você tem dado para sua
análise e entendimento daquilo que lê. E, fazendo essa avaliação, é possível pensar em
como essa leitura deve ser feita a partir de agora.
Podemos notar que todas essas leituras possuem características positivas e também
riscos. É necessário assimilar o que cada delas oferece de melhor.
1. Ler atenta e repetidamente o texto e buscar seu sentido não somente no que está a
nossa vista, mas também no que está nas entrelinhas;
2. Buscar o máximo de informações possíveis acerca do texto, para que a leitura seja
contextualizada e realmente de acordo com o que o autor sagrado quer transmitir;
3. Acreditar na revelação de Deus nos textos e na reserva de sentido, ou seja, na
constante novidade que o mesmo texto sempre vai apresentar toda vez que se recorre a
ele, porque é Palavra inspirada.
Eis um resumo do que de melhor cada uma das abordagens e métodos apresentados
pode oferecer a você.
3. Roteiros para estudo bíblico
11
Quando alguém se propõe a fazer uma viagem, o ideal é que ele se programe para
essa empreitada: defina qual meio de condução vai utilizar (avião, carro, ônibus…), onde
vai se hospedar, em que lugar fará as refeições, entre outras coisas. Se for de carro, por
exemplo, é essencial que o viajante veja por qual caminho seguirá para chegar ao destino
final. Se ele quiser chegar mais rápido, deverá optar por determinada estrada; se quiser
pagar menos pedágios, deverá seguir por outro caminho; se quiser se hospedar em bons
hotéis, poderá escolher outra rota.
Com certeza, cada um dos caminhos tem sua beleza própria e também sua
dificuldade. É preciso que o viajante escolha o roteiro que é mais adequado para a sua
realidade, qual caminho se encaixa melhor no objetivo da viagem e, do mesmo modo,
qual não trará maiores dificuldades.
Quando você se propõe ao estudo da Bíblia, algo parecido acontece. Estudar e se
aprofundar nos textos bíblicos é também viajar por lugares muitas vezes desconhecidos.
Por isso, é preciso que haja um
planejamento, assim como numa viagem de automóvel. Faz-se necessário escolher um
roteiro de estudo – um método que melhor se encaixe à sua realidade, um roteiro que lhe
seja mais útil e oportuno.
São vários os roteirosde estudos bíblicos que podemos encontrar hoje no mercado.
Sem desmerecer os demais, são indicados aqui quatro deles, pois são os conhecidos pelo
autor de forma mais aprofundada. Destaco novamente que estes são apenas alguns dos
tantos e bons roteiros à disposição. O que precisa ficar claro é a necessidade de seguir
um percurso que lhe dê segurança e o impulsione a não desistir no meio da viagem.
Lectio Divina
O primeiro é um dos métodos mais antigos da Igreja. Leitura da Bíblia a partir de
quatro passos: ler, meditar, orar e contemplar. O objetivo da Lectio Divina é – por meio
de um método orante – proporcionar um contato direto com as Sagradas Escrituras.
A Bíblia no meu dia a dia
O segundo roteiro faz parte da proposta do monsenhor Jonas Abib. O estudo possui
alguns passos e também tem uma ligação direta com a Lectio Divina. Num diário
espiritual você deve, ao fazer o estudo de um capítulo bíblico, anotar as promessas de
Deus, Suas ordens, os princípios eternos, Sua mensagem e como aplicar o entendimento
do texto no cotidiano.
Coleção Luz para os Meus Passos
Baseada na Lectio Divina. Trata-se de uma proposta que segue uma apostila com
12
uma lição que deve ser feita a cada dia.
Curso Bíblico da Escola Mater Ecclesiae
O quarto roteiro vem da escola fundada por Dom Estêvão Tavares Bettencourt, OSB,
cujo objetivo é a formação. É um tipo de curso de teologia para leigos por
correspondência.
Além desses métodos, algumas pessoas fazem estudos dos Livros Sagrados
orientados por roteiros disponíveis em páginas da Internet. É preciso muito cuidado! Há
muita coisa errada e perigosa em várias dessas propostas. Se ainda assim você faz ou
deseja fazer um estudo orientado pela rede mundial de computadores, tome as devidas
precauções: veja quem é a pessoa que ministra o curso, se está vinculado à Igreja
Católica, qual a procedência do site, converse com outras pessoas que também seguem
esse curso e peça orientação ao seu diretor espiritual, pároco ou coordenador de sua
comunidade.
Muitas pessoas não conseguem se adaptar a nenhum dos roteiros que conhecem, e
por isso resolvem ler a Bíblia começando no seu primeiro livro, o Gênesis, seguindo até
o Apocalipse, lendo um ou alguns capítulos diariamente. Esse é um dos caminhos mais
difíceis, mas não se pode negar que também funciona, pois algumas pessoas optam e se
adequam a essa proposta.
O importante é que você faça uso de um bom roteiro que o impeça de se perder nessa
viagem e o mantenha motivado a seguir adiante. Escolha um percurso de estudos que vá
de acordo com as suas necessidades e capacidades, tomando o devido cuidado de
averiguar a procedência do roteiro que assume para si.
13
Entendendo a Bíblia
1. Primeira ferramenta: definir o trecho a ser estudado
Ao você estudar uma passagem da Bíblia, é preciso selecionar bem a perícope. Mas
o que é isso?
Perícope é um trecho que tem início, meio e fim bem definidos e possui uma unidade
completa de sentido. Uma perícope pode ser uma passagem, um capítulo inteiro ou um
único versículo. Tudo vai depender do texto definido como perícope possuir um sentido
completo.
Essa delimitação do trecho a ser estudado é importante porque dessa maneira você
não corre o risco de misturar textos diferentes, com histórias ou conteúdos diversos na
mesma leitura. Quando se faz essa mistura, não é possível captar a mensagem do texto,
pois mesclam os significados de passagens diferentes.
Para que você defina bem o trecho que se propõe a estudar, é interessante que
conheça o livro de maneira geral, o trecho maior em que está inserido, e ir diminuindo
essa leitura até fechar na passagem que separou como perícope.
E como saber onde começa e termina o texto que me propus a ler?
Num primeiro momento é preciso perceber o contexto maior do qual faz parte seu
texto. Primeiro você precisa entender como se organiza o capítulo no qual está o trecho
que vai estudar: como ele se define, como se estrutura, qual o seu conteúdo. Depois,
passe ao contexto menor, que o ajudará a cercar a sua perícope.
No exemplo abaixo, você verá como se chega a uma perícope, ou seja, como se
seleciona um trecho bíblico para o estudo. A perícope escolhida foi Mt 13,44-46: as
parábolas do tesouro e da pérola. Veja como foi feita a delimitação desse trecho.
Contexto maior
O capítulo 13 de Mateus é muito bem moldado e todo ele se trata de parábolas.
Como podemos afirmar isso? No seu primeiro versículo, lê-se:
Naquele dia, saindo Jesus de casa, sentou-se à beira do mar. Em torno dele reuniu-se grande multidão.
Por isso, entrou num barco e sentou-se, enquanto a multidão estava em pé na praia. E disse-lhes
muitas coisas em parábolas (Mt 13,1).
14
Basta olhar o que cerca o capítulo, que se difere do anterior em virtude dos textos do
capítulo 12 tratarem de curas realizadas por Jesus e de discussões com escribas e
fariseus. Isso caracteriza uma mudança de conteúdo quando se olha para o capítulo 13,
que, como visto logo na sua introdução, é dedicado ao discurso em parábolas.
Ainda num contexto maior, devemos definir onde acaba o discurso em parábolas. A
conclusão desse discurso se dá no versículo 53, que diz: “Quando Jesus acabou de contar
essas parábolas, partiu dali” (Mt 13,53). Diante disso, você pode se perguntar: “Mas o
capítulo 13 não termina com o versículo 58? Por que a delimitação foi até o versículo
53?”
Aqui vale um alerta fundamental para essa etapa. Cuidado com a marcação de
versículos e capítulos da Bíblia. Eles o ajudam a delimitar o texto, mas não são
confiáveis, pois não foram criados primeiramente para isso. A intenção dos capítulos e
versículos é facilitar a busca do texto, para que você encontre com rapidez e facilidade o
trecho que procura. A Bíblia é uma biblioteca e, como tal, tem seu sistema de busca.
Como as bibliotecas, que possuem todos os seus livros numerados e ordenados nas
prateleiras para facilitar a procura de um item, a Bíblia também tem determinados
marcadores que a organizam.
Como visto, o versículo 53 encerra o discurso em parábolas, e no 54 tem-se início
uma nova cena, na qual Jesus ensina na Sinagoga, ou seja, não está mais no barco, o
público é outro e, ao que indica, também operava milagres:
E, dirigindo-se para sua pátria, pôs a ensinar as pessoas que estavam na sinagoga, de tal sorte que elas
se maravilhavam e diziam: De onde lhe vêm essa sabedoria e esses milagres? (Mt ١٣,٥٤).
Assim acontece do versículo 54 ao 58. O início do capítulo 14 também mostra que
essa mudança continua: no versículo 1, inicia-se a narrativa da execução de João Batista,
ordenada por Herodes.
Sendo assim, o contexto maior em que está inserida a perícope escolhida Mt 13,44-
46: as parábolas do tesouro e da pérola é um capítulo sobre parábolas, que começa em
Mt 13,1 e vai até Mt 13,53, pois os demais versículos do capítulo 13 se referem a outro
texto.
Por meio do contexto maior que envolve o capítulo, é possível perceber que ele é
essencialmente constituído de parábolas. Isso é indicado no primeiro versículo: “E disse-
lhes muitas coisas em parábolas” (Mt 13,1). E no versículo 53: “Quando Jesus acabou de
contar essas parábolas, partiu dali” (Mt 13,53). Pela análise do contexto maior, é
possível concluir que o que está no meio, entre o versículo 1 e o 53, são parábolas
contadas por Jesus.
A perícope escolhida para estudo está inserida nesse meio. Ela é uma entre as
15
parábolas do capítulo. Como extraí-la desse capítulo para estudá-la sem retirá-la do
contexto? Simples! Depois de analisar o contexto maior, é necessário dar o próximo
passo: verificar qual é o contexto menor.
Contexto menor
As parábolas do tesouro e da pérola (Mt 13,44-46) fazem parte de um bloco que,
juntamente com a parábola da rede, é caracterizado pela fórmula que inicia cada um
desses três textos: O Reino dos Céus é semelhante...
Essa fórmula indica três parábolas consecutivas, todas bem divididas. Formam um
bloco não somente pela fórmula introdutória, mas também pelo advérbio ainda, presente
nas duas parábolas que seguem a fórmula da primeira: Oreino dos Céus é ainda
semelhante..., dando sequência e fazendo uma ligação direta com o que foi exposto na
primeira parábola.
Caso você pretenda estudar essas três parábolas, a delimitação está pronta. Mas se
for continuar diminuindo a perícope, você pode se perguntar: “O que me faz colocar
juntas, em uma perícope, as parábolas do tesouro e da pérola e deixar de fora a parábola
da rede, uma vez que, como visto, elas formam um bloco dentro do capítulo 13?”
A primeira justificativa é o assunto tratado nas duas primeiras, que as diferem da
terceira parábola. Enquanto as parábolas do tesouro e da pérola comparam o Reino dos
Céus a um homem que encontrou um tesouro no campo e a um negociante que
encontrou uma pérola de grande valor, ou seja, fazem uma ligação com questões
financeiras, a parábola da rede compara o Reino dos Céus a uma rede que apanha peixes
no mar. Mas a ênfase desta terceira parábola não está nessa comparação direta do Reino
dos Céus com a imagem utilizada, mas sim na questão da separação que é feita dos
peixes bons e ruins e na comparação feita entre essa separação e o fim do mundo:
“Assim será no fim do mundo” (Mt 13,49a).
Delimitamos, assim, nossa perícope:
13,1 Contexto maior – introdução ao discurso em parábolas.
13,44-50 Contexto menor – parábolas com fórmula introdutória: O reino dos céus é semelhante a...
13,44-46 Perícope – parábolas do tesouro e da pérola.
13,44-50 Contexto menor – parábolas com fórmula introdutória: O reino dos céus é semelhante a...
13,53 Contexto maior – conclusão do discurso em parábolas.
Por meio da mudança de plano e conteúdo, do contexto maior e menor, foi possível
definir o trecho a ser analisado: duas parábolas que formam uma unidade em virtude do
conteúdo e da forma que apresentam. Ambas têm como assunto principal a comparação
16
entre o Reino dos Céus e alguma imagem concreta, e se iniciam pela fórmula: O Reino
dos Céus é semelhante.
Isso demonstra afinidade tanto na estrutura quanto no conteúdo dessas parábolas. As
próprias histórias contadas pelas parábolas as identificam. Primeiro, um tesouro que está
escondido é descoberto, ao que se segue o ato de vender tudo para comprar o terreno no
qual está aquele tesouro. Na segunda parábola, a pérola também é encontrada, e da
mesma maneira tudo é vendido para adquiri-la.
E como visto, a parábola da rede, embora tenha uma estrutura semelhante, possui
conteúdo diferente das anteriores, pois apresenta a imagem da rede, da pesca e do mar e
diz respeito não ao ato de adquirir o Reino dos Céus, mas ao julgamento final.
Os motivos acima brevemente apresentados para as delimitações de perícopes são
exemplos de argumentações para definir os trechos que serão estudados. E essa
delimitação nos ajudará a não misturar conteúdos diferentes, fazendo-nos,
consequentemente, entender de maneira correta a mensagem de cada texto.
Caso queira delimitar ainda mais e ficar apenas com um versículo, também é
possível, pois você sabe exatamente onde está esse versículo, a qual contexto ele
pertence. Aqui está o grande objetivo da delimitação de um texto bíblico: saber em qual
contexto ele está inserido. Assim você não corre o perigo de ler passagens ou versículos
isolados e de fazer uma leitura fundamentalista.
Alguns fatores que podem ajudá-lo a fazer essa delimitação da perícope são:
– Alteração de tempos verbais (ex.: o texto está no presente e muda para o passado);
– Mudança geográfica (ex.: na perícope que selecionamos, Jesus está num barco,
depois vai para Sinagoga);
– Mudança de formas literárias (ex.: deixa de ser parábola e passa para uma narrativa
de milagres);
– Mudança cronológica (ex.: história acontece à noite e muda para outra hora do
dia);
– Mudança de personagens (ex.: aparecem personagens que dão outra direção à
história);
– Mudança de conteúdo (ex.: muda o assunto tratado no texto).
2. Segunda ferramenta: identificar a forma do texto
Feita a seleção do texto que você vai estudar, por meio da análise do contexto maior
e/ou menor, já é possível ter uma ótima indicação do endereço do seu texto. E esse
endereço nada mais é do que a forma literária, importante ferramenta para se fazer um
17
estudo mais preciso.
Ao ler uma carta, sabe-se que ela tem uma organização própria que deve ser
respeitada. Ao ler uma poesia, sabe-se que em seu conteúdo as palavras podem ser
usadas fora do seu significado imediato, dando lugar a metáforas. As formas literárias
em que o texto se apresenta indicam de que maneira se deve lê-lo. E, por isso, é preciso
sempre se perguntar qual a forma do texto que se dispõe a ler.
Mas o que são formas literárias?
São um conjunto de características de um determinado texto, relacionadas tanto ao
seu conteúdo quanto à sua estrutura. Isso que o faz, segundo suas características
principais, ser classificado dentro de uma ou outra forma literária.
Como exemplo, vamos ver a forma literária parábola.
A parábola é um tipo de comparação, pois utiliza imagens da realidade para
expressar uma outra mais profunda. Ao usar esse recurso, Jesus quer explicar algo, quer
ir além daquilo que as imagens por Ele apresentadas evocam. Portanto, usa essas
imagens (semeador, campo, semente, espinhos, pedras...) para, a partir delas, transmitir
Seu ensinamento sobre o anúncio da Palavra, sobre o Reino dos Céus, para questionar a
realidade.
Essas comparações eram sempre feitas com realidades concretas do cotidiano dos
Seus ouvintes. Por exemplo: uma família que morava no campo, pobre e sem instrução,
poderia entender perfeitamente: “O Semeador saiu pelo campo a semear” (Mt 13,3), “O
Reino de Deus é como um grão de mostarda” (Mt 13,31), “O Reino de Deus é como um
fermento” (Mt 13,33).
Essas imagens eram fixadas a tal ponto que, quando a pessoa tivesse contato com a
semente, com um semeador, um grão de mostarda ou visse sua árvore, lembraria das
palavras de Jesus e, principalmente, faria essa ligação entre o cotidiano e as verdades
reveladas pelo Mestre, compreendendo, assim, Seu ensinamento. Desta forma, a
parábola tinha ligação muito concreta com a vida diária dos ouvintes de Jesus.
Então, ao se deparar com uma parábola, você estará no ambiente do ensinamento.
Algo do cotidiano é usado como ponto de partida para que uma verdade sobrenatural
seja apresentada. Sendo assim, quanto mais aprender sobre o que é utilizado como ponto
de comparação (sementes, grão de mostarda, fermento...), melhor entenderá o
ensinamento de Jesus (anúncio da Palavra, o Reino dos Céus...).
Pela forma do texto é possível estudá-lo melhor, e dessa maneira, entendê-lo
corretamente. Por isso, é preciso identificar a forma do texto e também localizar onde ele
se situa. A parábola, por exemplo, é o ambiente de ensino. A intenção de Jesus era
ensinar, e não contar alguma história, realizar algum milagre ou dar alguma ordem.
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Identificando o ambiente e a forma do texto, você descobrirá qual a sua real
intenção. Descobrirá se esse texto tem o propósito de ensinar, relatar algum fato,
converter, discutir, cantar... E dessa forma o lerá e o entenderá mais corretamente.
3. Terceira ferramenta: ler e reler o texto
Agora que já separou o trecho que escolheu para estudar e identificou seu endereço,
é preciso ter um contato profundo com ele. Esse é o seu momento com o texto
propriamente dito.
O melhor caminho que você tem para entender o texto é o da leitura. Aqui a
conversa é sobre a Bíblia como literatura. A princípio isso parece óbvio, já que ela é um
livro (ou melhor, um conjunto de livros), e os livros existem para serem lidos. Só por
isso está mais do que claro que é necessário entender a Bíblia como literatura. Mas
quando se trata das Sagradas Escrituras, nem sempre é simples assim. Para os cristãos, a
Bíblia é mais do que um simples livro; é revelação, é Palavra de Deus, e por isso essa
Palavra é profundamente venerada.
O que acontece muitas vezes é que várias pessoas entendem de modo equivocado o
fato de que a Bíblia é Palavra de Deus e deve ser venerada como tal. Desse modo,
acabam, em virtude de um respeitoàs vezes fora da normalidade, com medo de lê-la ou
lendo-a de modo exageradamente espiritual, criando-se, inclusive, uma série de lendas
sobre a leitura de seus textos. Daí a importância de mostrar a Bíblia também como
trabalho literário.
Ver a Sagrada Escritura como literatura significa entendê-la como um produto da
mente humana. A Bíblia foi escrita por pessoas reais, que viveram em determinadas
épocas e usaram suas línguas maternas e as ferramentas literárias que conheciam, mas
isso não causa confronto com o fato de que ela é de inspiração divina. Para entendermos
isso com mais clareza, basta separar as palavras Bíblia e Sagrada.
Bíblia significa um conjunto de livros, e como já dito, livro existe para ser lido, ou
seja, para ser submetido a um ato humano. Sagrada é relativo às coisas divinas, algo
santo, separado, ou seja, um ato divino. Perceba aí o que Deus propõe: a união do divino
com o humano.
Na composição da Bíblia Sagrada se tem, no ato da redação dos livros, a mão
humana, mas também, e principalmente, a inspiração divina, o que a torna algo sagrado.
Ao lermos os textos bíblicos, encontramos igualmente essa junção do ato humano e da
ação divina, pois faz o que lhe cabe no ato humano da leitura dos textos, enquanto Deus
exerce a parte Dele ao lhe enviar o Espírito Santo que o ilumina e o encaminha nessa
leitura.
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A Igreja ensina que a graça de Deus é oferecida a todo ser humano, mas que para
produzir seu efeito é necessário que haja a cooperação humana. É o que a Igreja chama
de livre adesão do homem à graça de Deus. Assim também o é com a Bíblia. Para que a
Palavra de Deus em toda sua sacralidade, para que o ato divino aconteça em você, é
preciso realizar o ato humano da leitura dos textos, assim como foi necessária a
participação humana dos autores bíblicos na composição desses mesmos textos.
Esta ferramenta, portanto, consiste em realizar a leitura do texto. E essa leitura não
pode ser num só momento. Faz-se necessário ler e reler o texto o máximo de vezes
possível. Ler o texto uma só vez não lhe permite entender realmente o que ele apresenta.
Aquilo que você enxerga na primeira leitura ainda está ligado a um entendimento
muito pessoal e, por isso, subjetivo. Você acabará por colocar nessa primeira leitura suas
experiências anteriores com o texto, o estado de espírito no qual se encontra enquanto lê,
o conhecimento prévio que tem ou não dos elementos que constituem o texto etc. Daí a
importância de reler o texto, pois à medida que repete a leitura, você se distancia dessa
assimilação subjetiva e passa ao estágio seguinte, que é o de questionar o texto.
Dessa forma, a leitura cuidadosa e repetida é um passo fundamental para se fazer um
bom estudo. Mas muitas pessoas, antes mesmo de ler o texto, já procuram o que outros
escreveram sobre a passagem que estão lendo. Buscam a chamada literatura secundária.
E após terem lido o que alguns comentaristas bíblicos escreveram, não conseguem, ao
ler o texto, entendê-lo sem se influenciar pelas ideias lidas anteriormente.
Durante o estudo chegará a hora de, caso você tenha acesso, consultar a literatura
secundária, mas nesse momento não é aconselhável esse contato. O principal agora é o
seu contato com o texto, as suas impressões, a sua leitura apurada, inclusive para que,
numa segunda etapa, conhecendo o texto por você mesmo, você possa conversar com
outros autores, e não somente repetir as ideias deles.
Nessa etapa é importante compreender todas as palavras do texto. Não é agora que
você irá fazer sua interpretação, mas sim compreender as palavras e expressões da língua
portuguesa. Ao reler o texto, confira se conhece o significado de todas as palavras e
expressões que aparecem, e se tiver dúvidas sobre algum termo, consulte um dicionário,
a fim de que não haja lacunas no processo de leitura.
Claro que à medida que for relendo o texto, já surgirão as primeiras impressões sobre
ele. É importante também que você tome nota delas.
4. Quarta ferramenta: fazer perguntas ao texto
Numa conversa com um amigo, se você não entende o que ele diz, basta perguntar-
lhe para ouvir mais uma vez o que foi dito, e fazer isso quantas vezes forem necessárias,
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até que você realmente compreenda o que foi falado.
Mas no que diz respeito ao texto bíblico, não há como se encontrar com algum dos
autores sagrados para lhe perguntar o que ele quis dizer em determinada passagem. Por
isso, é importante reler várias vezes na tentativa de assimilar o seu sentido.
Mas tendo consciência das limitações encontradas diante de determinados textos, é
preciso levantar as questões relativas a eles, de modo a caminhar com cautela e evitar
erros de entendimento. É preciso fazer perguntas ao texto. Por isso, num primeiro
momento, é aconselhável ler e reler e já levantar as primeiras interrogações a respeito do
que está sendo lido.
Existem dois tipos básicos de perguntas que podem ser feitas ao texto: perguntas
gerais e perguntas específicas.
As perguntas gerais devem ser feitas a todos os textos. São questões como: quem é o
autor sagrado?; quando o texto foi redigido?; quem foi o seu primeiro público alvo? etc.
As perguntas específicas são diretamente relacionadas ao texto lido: por que o uso
de determinados termos?; o que significa essa ou aquela expressão?; por que tais
personagens aparecem?
Lembre-se: esse é o lugar das perguntas e não das respostas. Geralmente, surge a
ânsia de ler e logo entender o texto, dando imediatamente respostas, sem ao menos fazer
as perguntas, ou tendo feito-as de maneira apressada e incorreta. Durante o estudo, não
se deve procurar respostas para todas as perguntas logo de imediato.
Fazer as perguntas certas ao texto amplia de modo considerável as descobertas em
relação a ele quando, posteriormente, as respostas forem encontradas. Por isso as
perguntas ficam em aberto, e somente na etapa final do estudo há condições de
respondê-las corretamente.
Qualquer pessoa, quando lê, tem capacidade de tirar conclusões do texto, ter
sentimentos em relação a ele, fazer observações. Mas à medida que consegue novas
informações, sejam elas gerais ou específicas, a sua capacidade de entender o texto
aumenta muito.
Por isso, a partir do próximo passo, você vai entrar nessas questões que podem
ajudá-lo a responder essas perguntas. Trabalhará ferramentas e conceitos por meio dos
quais será possível colher um maior número de informações do texto, clareando ainda
mais suas leituras.
Cabe aqui uma observação importante: talvez você já tenha lido diversas vezes um
determinado texto bíblico e, por isso, ao estudá-lo novamente, correrá o risco de achar
que não precisa lê-lo com cuidado, que não necessita fazer-lhe perguntas ou, pior ainda,
que já sabe o que aquele texto quer dizer.
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O texto bíblico possui a reserva de sentido, e por isso sempre que o ler, algo novo lhe
surgirá diante dos olhos. Uma leitura mais atenta e o ato de sempre interrogar o texto lhe
permite trazer à tona muitas observações inéditas, e isso evita o perigo de fixar para esse
texto uma única e definitiva leitura.
Faça perguntas ao texto. Todas as que puder, gerais e específicas, mas não as faça já
buscando as respostas, pois estas seriam apressadas e talvez incorretas. As respostas
virão na medida em que você absorve mais conhecimento do texto e sobre ele. Anote as
perguntas. Mantê-las anotadas e recorrer a elas enquanto se faz o estudo é um ótimo
recurso para manter a atenção ao texto e para descobrir coisas novas.
5. Quinta ferramenta: conhecer o contexto
Nessa ferramenta, a proposta é entender melhor uma regra de ouro da literatura: ler o
texto dentro do seu contexto. Isso significa ver o texto também como produto de pessoas
e de épocas diferentes.
Muitas vezes as pessoas se sentem desencorajadas diante de determinados textos da
Bíblia, por não conseguirem entender suas passagens. Quem nunca leu um texto da
Bíblia e não entendeu quase nada do que ali estava escrito? Quem nunca se deparou com
conceitos muito complicados e muito distantes daquilo que se entende ese vive hoje?
Isso acontece porque cada um dos livros da Bíblia faz parte de um contexto mais
amplo e porque foram escritos numa época muito distante da de hoje. Assim, a leitura se
torna um pouco mais complexa e, não raras vezes, incompreensível, em virtude de uma
distância temporal, linguística e cultural existente entre a redação do texto bíblico e a
leitura e compreensão feitas hoje.
E aqui vale repetir a necessidade de uma leitura mais cuidadosa, e não tão rápida e
superficial, para que não ocorra um entendimento equivocado e arriscado dos textos da
Bíblia. Isso porque, naturalmente, o leitor entenderá o texto a partir de conceitos e ideias
que tem do mundo moderno em que vive, esquecendo-se de que ela é formada por textos
antigos construídos num mundo diferente do atual.
Dessa maneira, é preciso buscar o máximo de informações sobre o texto que você irá
estudar, sobre tudo que o cerca. De modo especial, a época em que foi escrito e qual
contexto histórico o influencia. Quanto mais informações tiver a respeito do texto, mais
poderá se guiar pela regra literária citada no começo desta ferramenta: ler o texto dentro
do contexto.
Mas como saber mais sobre a época em que os textos bíblicos foram redigidos?
Para isso, basta consultar as diversas traduções da Bíblias que você possui. Elas
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podem lhe fornecer muitas dessas informações. Basta conferir as introduções
apresentadas antes de cada livro bíblico. Assim acontece, por exemplo, nas traduções da
Bíblia como a TEB, a Bíblia Jerusalém e do Peregrino. Ou ainda na tradução da Bíblia
Ave-Maria, que traz logo na sua abertura um comentário sobre cada um dos livros
bíblicos.
Essas introduções são muito importantes, pois dão informações preciosas a respeito
do livro que lerá. Informações essas muito úteis e práticas a respeito do período de
composição do texto, do contexto histórico no qual se deu essa redação, do grupo a que
esse texto foi primeiramente dirigido etc.
Claro que, caso tenha acesso a fontes confiáveis que podem, da mesma maneira, e
talvez de forma mais completa, fornecer-lhe essas informações, você pode e deve usá-
las. Como dito anteriormente, quanto mais informações você tiver, maior será sua
segurança de que lerá o texto dentro do contexto, evitando erros e equívocos. Mas
lembre-se de que é importante conhecer bem essa literatura secundária utilizada, para
não consultar uma bibliografia que pode levá-lo ao erro.
Um alerta: muito cuidado ao buscar essas informações na Internet. Nada contra
pesquisas on-line, muito pelo contrário; essa ferramenta, se bem usada, facilita a vida
cotidiana. Mas, infelizmente, em se tratando de estudos bíblicos, a maior parte do que é
apresentado possui muitos erros ou está ligada a uma doutrina diferente da Doutrina
Católica, o que é incoerente com a proposta deste livro.
Outro recurso que as Bíblias apresentam, que muito auxilia na compreensão dos
textos e que também fornece informações importantes a cerca do que se lê, são as notas
de rodapé. Essas notas são tão valiosas porque são explicativas. Por meio delas são
esclarecidas questões ligadas à língua, à geografia, à cultura, entre tantas outras
informações que facilitam o entendimento do texto. Muitos ignoram essas notinhas,
justamente por serem pequeninas, às vezes até difícil de enxergar. Mas elas estão ali para
servir de auxílio, para que o texto se torne mais acessível a você, que está distante
temporal, cultural e linguisticamente.
6. Sexta ferramenta: conhecer o autor sagrado
É muito comum se ouvir expressões como: a Bíblia diz isso ou a Bíblia diz aquilo.
Essas expressões são um tanto equivocadas. A Bíblia não é somente um livro, mas uma
biblioteca inteira com mais de setenta livros diferentes, e escritores distintos redigiram
todos esses textos. Portanto, seria mais conveniente dizer o nome do livro, pois assim já
é usado o conhecimento sobre o autor ou autores do livro em questão no momento do
entendimento do texto.
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Em relação a alguns livros, é, inclusive, complicado dizer que fulano ou beltrano
escreveu esse ou aquele livro da Bíblia. A autoria dos livros da Bíblia é mais complexa.
Parte dos textos do Antigo Testamento, por exemplo, é fruto da colaboração de vários
autores. Mais interessante ainda é que houve casos em que os autores de um mesmo livro
do Antigo Testamento viveram em regiões e tempos diferentes. Por tudo isso, é melhor
que se diga o nome do livro e se tente descobrir a autoria sagrada, na intenção de melhor
compreender o que foi escrito.
É fundamental compreender que as histórias bíblicas chegam até nós por meio de
textos que trazem consigo marcas dos autores, e eles foram pessoas que viveram há
muito tempo e que possuíam uma mentalidade e uma bagagem cultural muito diferente
da que temos hoje. Essa distância temporal entre o autor sagrado e os leitores de hoje
mostra que ele é fruto da época em que viveu, e que por isso utilizou, no momento da
escrita, os recursos linguísticos e culturais do seu tempo.
Algumas pessoas acreditam que a revelação de Deus aos homens por meio da Bíblia
aconteceu do seguinte modo: o Senhor apareceu para determinadas pessoas e ditou
palavra por palavra o que está escrito nas páginas da Sagrada Escritura. Se tivesse
acontecido assim, a Bíblia seria, toda ela, composta de verdades absolutas, ditas
diretamente pelo próprio Deus. Mas é preciso explicar que não é bem assim, pois Ele
quis, e ainda quer, contar com a participação humana na construção do Seu Reino.
Deus, então, não ditou diretamente nenhum dos livros bíblicos, mas inspirou os
autores sagrados a escreverem-nos com o conhecimento humano que possuíam. (Em
caso de dúvidas a respeito do que foi apresentado neste trecho do livro, talvez seja
interessante reler a terceira ferramenta sobre ato humano e ato divino.)
Mas como conhecer melhor os autores sagrados? Aqui vale a dica da ferramenta
anterior, que dizia respeito à necessidade de se conhecer o contexto no qual determinado
texto foi produzido. Para saber mais sobre a autoria de determinado livro, você pode
consultar a introdução do livro em si ou a introdução da Bíblia, sem se esquecer das
notas de rodapé e do possível uso de uma boa literatura secundária.
Conhecer os autores sagrados tem a mesma finalidade de se conhecer o contexto, ou
seja, ter mais uma informação relevante que possibilita levantar mais questões relativas
ao texto, responder muitas dessas questões e, ao mesmo tempo, compreender melhor o
que está sendo estudado.
7. Sétima ferramenta: usar as traduções da Bíblia
Ao consultar, nas traduções da Bíblia que você possui, informações como autoria
sagrada e contextos dos livros, além de vários outros elementos que as traduções
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oferecem, faz-se necessário um comentário e uma direção a respeito da tradução da qual
você faz uso.
É dito tradução porque os textos bíblicos foram escritos em hebraico, no Antigo
Testamento, e em grego, no Novo Testamento, e por isso as Bíblias são traduções dos
textos dessas línguas para a língua portuguesa.
Por isso que, quando você compara o mesmo texto em diferentes traduções bíblicas,
percebe que ele está escrito de maneira diferente. Ou seja, o conteúdo é o mesmo, mas as
palavras e expressões usadas muitas vezes não são iguais. Isso acontece por conta do
processo de tradução e demonstra que o uso das palavras e expressões depende da opção
feita por cada tradutor na intenção de melhor transmitir o conteúdo do hebraico ou grego
para a língua portuguesa.
O ideal, então, é que cada um faça a sua própria tradução. E, fazendo as suas
próprias opções de vocabulário, deverá explicar o porquê de cada uma delas. Dessa
maneira, ficará mais seguro quanto ao conteúdo do texto na hora em que for estudá-lo.
Mas são raras as pessoas que sabem línguas antigas.
O que fazer, então? Utilizar para o estudo bíblico aquela tradução que melhor se
adeque à sua realidade. Da mesma forma que a escolha do roteiro para o estudo bíblico
deve ser feita de acordo com as suas necessidades e capacidades de entendimento do
texto, a escolha da traduçãoque será usada deve seguir o mesmo critério: use uma Bíblia
que facilite sua leitura e seu entendimento do texto.
São várias as traduções de Bíblia disponíveis hoje em dia. Muitas pessoas possuem
várias delas, como a Bíblia Jerusalém, TEB, Peregrino, Ave-Maria e CNBB. Mas
existem, além dessas, outras muito boas também. Nesse momento você pode estar se
perguntando: “Será que a tradução que eu uso é boa?” A aquisição dessa reposta se dá
em dois momentos.
Para responder se a Bíblia que você usa é boa basta saber se ela está de acordo com a
sua realidade de leitor, ou seja, se ela facilita seu entendimento do texto, se você
compreende bem as palavras que lê. Mas se para você ela possui um vocabulário
complexo, uma sequência de frases complicadas, então ela não está adequada para você.
Enfim, a primeira resposta para sua pergunta vai de acordo com a combinação entre a
sua capacidade de leitura e o nível de complexidade da tradução da Bíblia que usa. Claro
que para descobrir qual tradução melhor se adequa à sua realidade é preciso passar o
olho por algumas delas, e assim escolher a melhor para o seu uso diário.
Feita a escolha de qual tradução será usada, é necessário conferir se ela possui o
imprimatur. Essa é a segunda parte da pergunta que lhe responderá se a sua Bíblia é boa.
O imprimatur, em geral, vem em uma das primeiras páginas da Bíblia e trata-se de uma
autorização de um Bispo ou da CNBB que permite que aquela impressão/tradução seja
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veiculada e afirma que ela está de acordo com o que corresponde a uma tradução bíblica
da Igreja Católica Apostólica Romana.
Essa verificação é importante porque muitos católicos acabam fazendo uso de
Bíblias protestantes sem saber. E qual é o problema de usar uma Bíblia protestante se
tudo é Bíblia? Basicamente, isso é problemático por dois motivos. Primeiro porque para
o protestantismo os livros Tobias, Judite, Sabedoria, Baruc, Eclesiástico (ou Sirácida), 1
e 2 Macabeus, além de trechos dos livros de Ester e de Daniel não fazem parte da Bíblia.
Por isso, as Bíblias protestantes estão incompletas em comparação com as católicas. O
segundo motivo é que, sendo de orientação protestante, essas Bíblias trarão as
informações extras, como introduções aos livros bíblicos e notas de rodapé, entre outros
possíveis comentários, orientados pela sua própria doutrina, que é diferente da Doutrina
Católica.
Aconselhar o católico a fazer uso de uma Bíblia católica não se trata de preconceito
quanto ao protestantismo. Trata-se mais de uma coerência com a fé professada. Um
católico, ao usar uma Bíblia protestante, pode misturar conteúdos e interpretações,
causando confusões para si mesmo e para os outros, pois a maneira de entender as
Sagradas Escrituras e de construir a doutrina é diferente entre católicos e protestantes.
Por isso também o conselho é válido para o protestante – que faça uso de uma Bíblia que
vá de acordo com a sua profissão de fé, para que evite as mesmas confusões.
Se você possuir mais de uma tradução da Bíblia católica, pode escolher a que mais
lhe convém para seu uso diário. Ao mesmo tempo, pode utilizar outras traduções para
lhe auxiliarem no estudo. Por exemplo, na consulta às informações das notas de rodapé,
das introduções dos livros etc. Será uma quantidade maior de informação que você
poderá consultar, pois cada Bíblia tem comentários próprios.
Pode, ainda, utilizar essas diferentes traduções num procedimento de comparação.
Isso ajuda na proposta de se aprofundar nos textos bíblicos e, para fazê-lo, basta colocar
lado a lado as diferentes traduções do texto que você está estudando. Assim, de certo
modo, você poderá trabalhar na sua própria tradução, fazendo opções por expressões,
palavras e frases que acredita estarem mais de acordo com o texto que estuda.
Veja, como exemplo, o versículo Mt 5,13:
Bíblia
Jerusalém
Bíblia
Ave-Maria Bíblia TEB
Bíblia
Peregrino
Vós sois o sal da terra.
Ora, se o sal se tornar
insosso, com que o
salgaremos?
Para nada mais serve,
senão para ser lançado fora
e pisado pelos homens.
Vós sois o sal da terra.
Se o sal perde o sabor, com
que lhe será restituído o
sabor?
Para nada mais serve senão
para ser lançado fora e
calcado pelos homens.
Vós sois o sal da terra.
Se o sal perde seu sabor,
como tornará a ser sal?
Não serve mais para nada;
é jogado fora e é calcado
aos pés dos homens.
Vós sois o sal da terra:
se o sal perde o gosto,
com que o salgarão?
Serve somente para ser
jogado fora e para que as
pessoas o pisem.
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Essa comparação de traduções é muito útil, já que, além de lhe dar essa possibilidade
de escolher os termos e expressões, abre-lhe outros horizontes no entendimento do texto,
em virtude, justamente, dessa riqueza de sinônimos presentes nas diferentes traduções,
fruto das opções feitas por cada tradutor.
8. Oitava ferramenta: conhecer algumas figuras de linguagem
Nessa etapa do estudo bíblico é importante entender um pouco mais sobre as
estruturas literárias da Bíblia. Aqui o assunto será a presença de figuras de linguagem
nos textos bíblicos como parte das ferramentas utilizadas por seus redatores.
Mas o que são as figuras de linguagem?
São recursos literários que o escritor pode aplicar no texto para conseguir um
determinado efeito na interpretação que será feita pelo leitor. Na língua portuguesa
moderna, mais de vinte figuras de linguagem são comumente usadas. Serão abordadas
quatro delas com exemplos bíblicos: hipérbole, metáfora, simbolismo e personificação.
Leia: 1Reis 1,40
Hipérbole: nada mais é do que o exagero, usado para, no caso desta passagem
sobre Salomão, dar ênfase ao fato narrado. O autor tenta por meio do exagero não
enganar os leitores, mas mostrar a importância do que ele quer contar.
No dia a dia é comum se usar o exagero. Na maioria das vezes, é até
inconsciente. Quem nunca disse a expressão Estou morrendo de fome?
Leia: Salmo 1
Metáfora: é utilizar uma palavra que é encontrada normalmente num
determinado contexto, retirá-la dali e aplicá-la num outro contexto.
No Salmo 1, o autor usa a metáfora para traçar pontos comuns entre a árvore e
o homem reto e, por outro lado, entre a palha e o homem iníquo. Os salmistas,
inclusive, usam, e muito, a metáfora quando vão descrever a Deus. É interessante
porque o uso dessas expressões para qualificar o Senhor são coisas do cotidiano.
Todo mundo sabia o que era uma rocha, um escudo, uma luz, e faziam a
transferência das características desses objetos para a descrição de Deus.
Leia: Ap 1,12-20
Simbolismo: a principal diferença entre o simbolismo e a metáfora é que o
simbolismo, na Bíblia, na maioria das vezes, é usado com o recurso das imagens.
O simbolismo, usualmente, necessita da interpretação, do significado dessas
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imagens. E aí entra a figura do intérprete. É você, no processo de leitura, que
interpreta e dá significado a essa simbologia à medida que toma conhecimento do
texto. No exemplo indicado no livro do Apocalipse, o simbolismo está presente nas
imagens sobre o Filho do Homem, que apresentam a figura de Cristo.
Leia: Gn 3,1
Personificação: ocorre quando são dadas a seres inanimados ou a animais
irracionais características humanas. Como em Gn 3,1, em que uma serpente fala.
Essa – a fala – é uma característica humana, por isso a personificação.
E mais comum do que dar a bichos características humanas, é considerar um
grupo de pessoas, ou uma tribo ou uma nação inteira, como uma única pessoa. Veja
também Oseias 11,1. Israel, uma nação, é tomada por uma pessoa, mais
especificamente um menino.
São várias as figuras de linguagem. Aqui foram apresentadas apenas algumas
das mais comuns e mais gerais relacionadas ao texto bíblico. Seria bom que você
se inteirasse, caso seja possível, de outras figuras de linguagem que poderão ajudá-
lo a melhor entender os textos da Bíblia.
9. Nona ferramenta: conferir as tradições e dependências
literárias
Às vezes, encontramos na Bíblia palavras ou expressões que parecem estar
soltas, sem sentido naquele texto, o que dificulta o entendimento de tal passagem.
Nessahora é preciso ficar atento ao campo semântico a que essas palavras e
expressões podem pertencer.
Mas o que é campo semântico? É um grupo de palavras que se relacionam
entre si, ligadas pelo sentido que representam. Por exemplo, quando se diz palavras
como multa, semáforo, pedestres, sabemos que elas fazem parte do campo
semântico do trânsito, pois aí se relacionam e adquirem sentido.
O uso dos campos semânticos possibilita vislumbrar a ligação entre linguagem
e pensamento. O ato de realçar um campo semântico pode ajudar a enxergar
melhor as propostas, os valores e as perspectivas de um determinado autor sagrado
e de que maneira ele pretende divulgar e transmitir seu pensamento.
Quando se identifica um determinado campo semântico, algumas palavras que
não fazem sentido quando estão juntas num mesmo texto passam a se relacionar
tranquilamente. Essa relação entre essas palavras e a consequente compreensão
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delas são encontradas por meio do uso de uma chave bíblica.
A chave bíblica apresenta determinada palavra e em quais lugares ela aparece
na Bíblia. Muitas vezes só se entende o sentido de determinadas palavras num texto
quando se recorre a outras passagens nas quais ela aparece. É a dependência
literária entre os livros bíblicos, que faz com que o autor de um texto utilize um
conhecimento prévio já citado em outro livro. Por isso, a compreensão total de uma
passagem depende de outra.
Veja um exemplo:
A besta que vi era semelhante a leopardo, com pés como de urso e boca como de leão. E deu-
lhe o dragão o seu poder, o seu trono e grande autoridade (Ap ١٣,٢).
Para termos um melhor entendimento de quem é a besta e quais os males que
ela causa, podemos buscar em outros textos as imagens às quais a passagem se
refere para descrever a besta. Encontramos dentre outras referências:
“Como leão que ruge e urso que ataca (salta), assim é o perverso que domina
sobre um povo pobre” (Pr 28,15).
Perceba como fica mais aberta a compreensão do texto quando se busca outras
referências. Nesse caso, fica mais fácil entender o que faz a besta, pois a
comparação com o leão e com o urso faz ver, por meio de Provérbios, quem ela
ataca e quão perversa é.
A ligação entre os textos acontece porque muitas expressões, em uma dada
cultura, possuem um sentido específico que, em geral, não são compreendidas por
pessoas de outro meio cultural. Em Minas Gerais, se você disser a palavra “trem”,
um morador local não vai entender a que você se refere exatamente, pois essa
palavra é utilizada para falar de várias coisas, e não só do meio de transporte com
locomotiva e vagões. Se um estrangeiro chega a Minas e não conhece a cultura
local, dificilmente vai entender o uso amplo que essa palavra tem nessa região do
Brasil. Da mesma maneira acontece com os textos bíblicos, que também possuem
essas chamadas tradições linguísticas.
Mas como identificar e entender essas tradições e dependências literárias no
texto bíblico?
Primeiro é necessário fazer um levantamento das palavras ou imagens que se
sobressaem no texto estudado. Em Ap 13,2 foram destacadas as imagens que se
referem à besta: leopardo, uso, leão, dragão. E por meio de outra passagem foi
possível entender um pouco melhor algumas dessas imagens.
O segundo momento diz respeito a como encontrar essas passagens que se
relacionam com o texto que está sendo lido. Esta consulta é feita por meio de uma
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chave bíblica, que você pode adquirir, ou de maneira mais prática, conferindo se no
final de sua Bíblia existe um dicionário bíblico, que muitas vezes traz a palavra a
ser explicada com algumas passagens nas quais pode ser encontrada (em algumas
traduções, essas passagens relacionadas vêm nas notas de rodapé ou na lateral, ao
lado do próprio texto que está sendo lido). Ou então, para quem possui a Bíblia em
CD-ROM, basta consultar a palavra desejada no sistema de busca do CD para,
automaticamente, encontrar todas as passagens nas quais ela aparece.
10. Décima ferramenta: dicionário e outras informações
que a Bíblia possui
Como visto na ferramenta anterior, existem palavras e expressões que dizem
respeito a tradições e que pertencem a determinados grupos de épocas e lugares
diferentes, e que por isso há certa dificuldade em entendê-las.
Foi visto também que para uma melhor compreensão dessas palavras,
expressões ou imagens você pode recorrer à chave bíblica, ou seja, a outras
passagens na Bíblia que fazem uso das mesmas palavras, expressões ou imagens,
na intenção de clarear o entendimento sobre elas.
Mas depois dessa busca de uma possível dependência literária ou de tradições
bíblicas, você deve também consultar um dicionário ou um glossário bíblico, que
se encontram na maioria das nossas traduções. É comum encontrá-los ao final da
Bíblia. Pensados e escritos para facilitar a leitura dos textos, servem de orientação
geral e referem-se aos principais temas e palavras, relacionando-os a passagens
importantes tanto do Antigo quanto do Novo Testamento. É um suporte necessário
e importante para quem se dispõe a ler e entender a Bíblia Sagrada.
A consulta a esse material pode ser feita da mesma maneira descrita na
ferramenta anterior, ou seja, após se fazer um levantamento de palavras, expressões
e imagens do texto estudado, recorre-se ao dicionário ou vocabulário da Bíblia na
tentativa de clarear o significado do texto.
Vejamos um exemplo. A palavra anticristo é descrita da seguinte maneira no
vocabulário de notas temáticas da Bíblia Peregrino:
Anticristo – É o poder hostil ou personagem rival do Messias = Cristo, com antecedentes no
Gog de Ez 38-39, no personagem de Dn 8,23-25 e outros. Figura com esse título em I Jo 2,18;
4,3 e II Jo 7: pertence à etapa final, oprime, extravia e persegue, é uno. Ao contrário, Mc 13,22,
Mt 24,24 falam de vários falsos Messias. Sem o nome, II Ts 2,3-12 fala de um rival e o
descreve. À mesma categoria pertencem as duas feras do mar e da terra em Ap 13.
30
Por este exemplo é possível perceber como a explicação deste vocabulário abre
o significado e facilita o entendimento do termo. Além disso, neste caso, há a
referência a vários textos nos quais esta palavra aparece, o que serve também como
uma espécie de chave bíblica, por meio da qual podemos buscar a compreensão do
termo em outras passagens, seja do Antigo ou do Novo Testamento.
Quase todas as ferramentas usadas até agora foram baseadas em material ou
conhecimento que já se tem em mãos, ou seja, a própria tradução bíblica. A ideia é
justamente aproveitar mais e melhor as ferramentas que existem nas traduções da
Bíblia. E não tenha dúvida, ela é nossa principal caixa de ferramentas.
Por isso, ao final desta lista de ferramentas fica a dica para que você vasculhe
sua Bíblia e perceba a quantidade de informações úteis e importantes que ela traz
para facilitar a leitura e entendimento dos textos. Nas próximas páginas, você
encontrará um demonstrativo da quantidade e qualidade das informações que
podemos encontrar em algumas traduções. Se você usa alguma delas, esse
demonstrativo vai auxiliá-lo a conhecê-la melhor. E caso utilize outra tradução, o
que apresentaremos servirá para investigar, na sua própria Bíblia, quais
informações extras ela oferece.
Vale a pena chamar atenção para o fato de que essas informações variam de
Bíblia para Bíblia, ainda que sejam de uma mesma tradução. Isso acontece porque
pode haver variações nas diferentes edições de uma determinada tradução ou
também, o que é mais comum, porque essas informações são mais sucintas nas
Bíblias menores.
As informações que serão apresentadas são de Bíblias com tamanhos variados:
a Ave-Maria é a pequena; a TEB, a Jerusalém e a CNBB são a média, e a Peregrino
é a grande. Isso para percebermos que, independente do tamanho e, porventura, da
quantidade de informações, todas elas oferecem esse rico instrumental.
Bíblia do Peregrino – Apresenta logo na abertura a Constituição Dogmática
Dei Verbum sobre a Revelação Divina. Essa tradução é muito rica em três aspectos:
notas de rodapé, comentários introdutórios a cada umdos livros bíblicos e um
vocabulário de notas temáticas que usamos como exemplo no passo anterior. Traz
também mapas de Jerusalém, tanto no período do Antigo quanto do Novo
Testamento, lista de abreviaturas usadas, bem como uma explicação sobre essa
tradução. E outro item que vale a pena ressaltar é uma ótima tabela de cronologia
histórica que coloca lado a lado os períodos da história do povo de Deus e a
história mundial.
Bíblia Jerusalém – Além das também muito boas notas de rodapé e introduções
31
a cada um dos livros bíblicos, essa tradução apresenta uma breve explicação sobre
o cânon da Bíblia hebraica e da Bíblia grega LXX. Além disso, podemos encontrar
outras informações valiosas, como explicação e quadro demonstrativo sobre o
calendário antigo, lista de medidas e moedas e um quadro mostrando o período das
dinastias asmoneia e herodiana. Nessa tradução, encontramos os seguintes mapas:
Antigo Oriente; Egito, Península Sinaítica e Palestina na época do Êxodo; além de
um mapa das viagens de São Paulo.
Nela também há observações quanto ao trabalho de tradução feito, abreviaturas
e siglas usadas, tabela de cronologia histórica entre o povo de Deus e a história
mundial e lista alfabética das notas mais importantes.
TEB – Destacamos nesta tradução a quantidade de mapas oferececidos: Médio
Oriente Antigo; Egito e Sinai; Terra de Canaã e as Doze Tribos; o Reino de Davi e
Salomão; os Reinos de Israel e de Judá; os Impérios Assírio, Babilônico e Persa;
Reinos Helenísticos; Palestina Física; Palestina do Tempo de Jesus; Jerusalém do
Novo Testamento; Arredores do Lago de Tiberíades; Arredores de Jerusalém.
Também possui uma apresentação com explicação sobre a tradução, calendário
litúrgico, boas notas de rodapé e introduções a cada livro bíblico, além do glossário
– pequeno dicionário bíblico – e uma ótima relação e explicação de muitos nomes
próprios da Bíblia.
Bíblia Ave-Maria – Logo no início desta tradução, temos a introdução a todos
os livros bíblicos, bem como uma introdução geral à Bíblia. Também no início ela
apresenta o calendário hebraico, a genealogia bíblica e uma explicação a respeito
dessa tradução.
A Ave-Maria traz ainda um calendário litúrgico, um índice doutrinal que
também pode ser usado como uma pequena chave bíblica, além de uma relação de
medidas e moedas. Nela não faltam as notas de rodapé e nem os mapas, que são:
Oriente Antigo; Palestina Antiga; Palestina no Tempo de Jesus; Viagens de São
Paulo; Jerusalém no Novo Testamento; mapa com distâncias da Palestina.
CNBB – Essa tradução da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil possui
uma ótima introdução geral à Bíblia, além da Dei Verbum. Possui uma rica
introdução a cada livro bíblico e boas notas de rodapé. Além disso, a tradução da
CNBB tem glossário, leituras do ano litúrgico, mapas, planta do Templo de
Jerusalém, cronologias e diferentes tipos de índices.
32
Aplicando a Bíblia
1. O que fazer com o conteúdo levantado
Após um estudo mais aprimorado do texto, do levantamento de uma série de
questões, e também de respostas, chegou o momento de analisar todo esse conteúdo,
responder mais algumas perguntas e organizar tudo isso para, de modo muito prático,
aplicar a Palavra de Deus na sua vida.
Interpretar o conteúdo é assimilar o que, até aqui, foi estudado. Nesse conteúdo estão
as respostas das perguntas levantadas durante o estudo. Isso não quer dizer que você terá
todas as respostas, pois a dúvida, em algum aspecto ou outro, pode sim continuar. E que
bom que isso acontece, pois a dúvida o manterá em movimento, o motivará a buscar
mais respostas, o impulsionará a fazer novas descobertas na Palavra de Deus.
Entender o conteúdo estudado pode também ajudá-lo a compreender uma série de
outras passagens do mesmo livro do qual faz parte o trecho que separou para ler. Isso
acontece porque os livros possuem uma unidade interna. Uma passagem representa uma
abertura para se entender o que o autor sagrado quer contar por meio de todo o seu livro.
Por isso é importante também, nesse momento de estudo do conteúdo da passagem
escolhida, tentar percebê-la como parte de um livro, enxergando, assim, o que o autor
desse livro quer nos mostrar em sua teologia.
Ao ler um texto, automaticamente inicia-se o processo de compreensão do que foi
lido, ou seja, o ato de compreender é acionado imediatamente com a leitura. Isso
acontece porque você é o que a teoria do texto chama de leitor competente, ou seja, você
possui a capacidade de assimilar uma primeira compreensão do texto. Os fatores que
ativam essa competência são: intensidade da leitura, conhecimento da língua,
conhecimento prévio do texto, experiência de vida, estado de espírito num momento da
leitura, entre outros fatores.
Essa primeira leitura, e consequentemente a primeira compreensão do texto, porém,
não garantem o entendimento correto do texto lido. E não é raro, no caso da Bíblia, que
se faça uma interpretação equivocada e cheia de erros. Por mais que haja essa
competência de leitura, outros fatores também podem dificultar o entendimento dos
textos, principalmente em se tratando de textos bíblicos, que possuem conceitos, cultura,
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línguas originais e vários outros fatores muito distantes do mundo atual.
Essa distância temporal e cultural entre o mundo da Bíblia e o de hoje faz o leitor
correr o risco de interpretar as palavras do texto bíblico com o sentido que é familiar
hoje. Daí a necessidade da consciência de que há essa distância entre o leitor de hoje e os
textos bíblicos. Dessa maneira, antes de interpretá-los e aplicá-los na vida, é preciso
estudar calmamente seu conteúdo.
Por isso a importância de uma leitura mais apurada da Palavra de Deus, de um
estudo mais cuidadoso das Sagradas Escrituras, pois dessa forma se evita tanto o
problema de equívocos por causa das distâncias dos textos quanto os riscos de
interpretações subjetivas e voltadas para posições pessoais. Esse alerta é importante
porque jamais se pode entender os textos bíblicos desvinculados do Magistério e da
Tradição da Igreja. O entendimento do conteúdo estudado, e depois a sua aplicação, não
podem ser feitos a seu bel prazer. Se assim o fizer, todos os passos dados até agora de
nada valeram.
Sendo assim, é importante que você vá para o próximo passo: filtrar tudo o que
aprendeu sobre o texto no momento de estudo. Todas as perguntas que levantou, as que
respondeu ou não. Chegou a hora de purificar tudo isso com o filtro da Doutrina da
Igreja Católica. Dessa forma estão assegurados um melhor e correto entendimento e
aplicação da Palavra de Deus na sua vida e na das outras pessoas.
2. Como filtrar esse conteúdo
Após organizar e entender o conteúdo levantado durante o estudo, é chegado o
momento fundamental do processo: passar todo esse conteúdo pelo filtro da Doutrina da
Igreja.
Mas para que serve um filtro?
Para obter essa resposta, pense no filtro usado em casa para purificar a água que você
bebe. No interior de muitos estados brasileiros é muito comum usar os filtros de barro,
não só para purificar a água, mas também para mantê-la fresca.
Igualmente acontece nesse processo de filtrar, através da Doutrina, a leitura dos
textos bíblicos antes de aplicá-la na vida. A ideia é justamente purificar o entendimento
do texto. Dessa forma, você cerca os equívocos que porventura poderia cometer. E mais
que isso, com o auxílio da Doutrina, você amplia consideravelmente o entendimento do
texto.
É preciso, então, nesta etapa, purificar o conteúdo que foi levantado no estudo, para
não se contaminar com a água suja dos equívocos e dos possíveis erros. A função do
34
filtro não é impedir que a água passe, mas evitar que as sujeiras a contaminem.
O filtro também garante, por meio das atualizações que a teologia apresenta, que a
água pura, que é a Palavra de Deus, chegue fresca, nova, atual e pronta para ser
deliciosamente saboreada.
Esse filtro está concentrado no Catecismo da Igreja Católica. Nele se lê, na
Constituição Dogmática Fidei Depositum – para a publicação do Catecismo da Igreja
Católicaredigido depois do Concílio Vaticano II:
Um catecismo deve apresentar, com fidelidade e de modo orgânico, o ensino da Sagrada Escritura, da
Tradição viva da Igreja e do Magistério autêntico, bem como a herança espiritual dos Padres, dos
santos e santas da Igreja, para permitir conhecer melhor o mistério cristão e reavivar a fé do povo de
Deus. Deve ter em conta as explicações da doutrina que, no decurso dos tempos, o Espírito Santo
sugeriu à Igreja. É também necessário que ajude a iluminar, com a luz da fé, as novas situações e os
problemas que no passado ainda não tinham surgido.
O Catecismo incluirá, portanto, coisas novas e velhas (cf. Mt ١٣,٥٢), porque a fé é sempre a mesma e
simultaneamente é fonte de luzes sempre novas (CIC, p. ١٠).
Sendo assim, no Catecismo se tem, de modo sistemático, a base de toda a nossa fé.
Por isso é possível guiar-se seguramente por ele. O Catecismo possui a facilidade de um
excelente índice analítico, por meio do qual é possível ir diretamente ao assunto que lhe
interessa.
Por exemplo, se o texto estudado versa sobre o Espírito Santo, no momento de filtrar
o conteúdo, basta ir ao Catecismo e procurar por Espírito Santo no índice analítico. Lá
você encontrará as indicações das páginas e dos parágrafos do Catecismo nos quais
existem as explicações e ensinamentos da Igreja a respeito da terceira pessoa da
Santíssima Trindade.
A base está no Catecismo, mas você pode ainda buscar outras fontes, por meio das
quais também é possível ter acesso ao ensinamento da Igreja. Trata-se dos documentos
do Vaticano e dos documentos da CNBB, que podem ser adquiridos em livrarias
católicas e versam sobre os mais variados assuntos. É possível também, graças à
facilidade da Internet, encontrá-los gratuitamente no site do Vaticano e no site da CNBB.
3. Aplicar o conteúdo
Depois de uma boa caminhada com e através do texto bíblico, é chegado o momento
final do trabalho. Agora é a hora de aplicar o texto na própria vida. Você estudou a
Palavra de Deus com atenção, e agora é o momento de praticá-la e/ou transmiti-la. Aqui
está o sentido de tudo o que foi feito até agora. Foi para esse momento que cada passo
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foi dado.
No início do livro foi mostrada a importância das três etapas pelas quais devem
passar a leitura e a aplicação do texto bíblico: exegese (estudo do texto) – filtro da
doutrina (catecismo) – hermenêutica (aplicação).
Mas neste momento de aplicar o texto é preciso se atentar à provável quantidade de
material que se tem nas mãos. Se todos os passos foram seguidos corretamente, é bem
provável que você tenha produzido, caso você pregue, por exemplo, um conteúdo
suficiente para diversas e consistentes pregações ou palestras.
Por isso é preciso discernimento na hora de aplicar o que foi levantado durante o
estudo da Bíblia. Não é preciso tentar assimilar tudo de uma só vez ou, no caso de uma
pregação, querer expor todo o conteúdo do estudo numa só pregação. É preciso separar
aquilo que foi usado apenas como caminho para se chegar ao resultado final. Além disso,
é necessário saber separar cada descoberta, para que sejam usadas no lugar e na hora
certa, na sua vida e na vida das outras pessoas.
Mas é importante dizer: não tenha medo de aplicar a Palavra de Deus à sua vida! Ela
de fato é lâmpada para os pés e luz para nosso caminho. E também não espere conhecer
tudo da Bíblia. A Palavra de Deus é viva e você nunca a conhecerá totalmente, pois Deus
(e Sua palavra) é infinito.
Uma questão que você pode estar levantando ao final deste livro é: “Como vou
aplicar tudo isso se tenho pouco tempo para fazer estudo bíblico?”
É compreensível, já que muitos possuem uma série de atividades importantes durante
o dia, como trabalho, cuidados com a casa, estudos, cuidados com os filhos... E muitas
vezes sobra pouco tempo para aplicar todas essas dicas num estudo bíblico frequente.
O importante é que, no tempo de que dispõe, você comece. Use o método e o roteiro
que escolheu para estudar a Bíblia e utilize as dicas dadas aqui, como dito no início,
como uma caixa de ferramentas, como um apoio ao método e roteiro que escolheu.
Comece! Mesmo que seja com um versículo por dia, ou com uma passagem por
semana. Com fidelidade, isso se tornará um hábito, e com o tempo crescerá a quantidade
de textos estudados, sem perder a qualidade.
Não espere. Leia. Entenda. Aplique. E você colherá os frutos dez, trinta, cem vezes
mais na sua vida, e poderá ainda semear essa boa semente no coração das outras pessoas.
Deste modo, pois, com a leitura e estudo dos livros sagrados, “a palavra de Deus se difunda e
resplandeça” (٢ Tes ٣,١), e o tesouro da revelação confiado à Igreja encha cada vez mais os corações
dos homens. Assim como a vida da Igreja cresce com a assídua frequência do mistério eucarístico,
assim também é lícito esperar um novo impulso de vida espiritual, se fizermos crescer a veneração
pela palavra de Deus, que “permanece para sempre” (Is ٤٠,٨; cf. lPd ١,٢٣-٢٥) (Papa Paulo VI, Dei
36
Verbum).
37
Indicação de referências
ABIB, Monsenhor Jonas. A Bíblia no meu dia a dia. 8. ed. São Paulo: Loyola, ١٩٩٦.
ALVES, Josefa; NOGUEIRA, Emmir. Luz para os meus Passos. 7. ed. Fortaleza: Shalom,
2008.
BERGER, Klaus. As Formas Literárias do Novo Testamento. São Paulo: Loyola, 1984
(Coleção Bíblica Loyola nº ٢٣).
BETTENCOURT, Estevão Tavares. Curso Bíblico. Apostila. Rio de Janeiro: Escola
Mater Ecclesiae.
Bíblia Jerusalém. 3. ed. São Paulo: Paulus, 2004.
Bíblia do Peregrino. São Paulo: Paulus, 1997.
Bíblia Sagrada (Ave-Maria). 4. ed. São Paulo: Ave-Maria, 1995.
BROWN, Raymond E. Introdução ao Novo Testamento. São Paulo: Paulinas, 2004.
CATECISMO da Igreja Católica – Edição Típica Vaticana. São Paulo: Canção
Nova/Loyola, 2000.
CORREIA JR, João Luiz. Chave para Análise de Textos Bíblicos. Com exercícios de
análise. São Paulo: Paulinas, ٢٠٠٦.
EGGER, Wilhelm. Metodologia do Novo Testamento. Introdução aos métodos
linguísticos e histórico-críticos. São Paulo: Loyola, ١٩٩٤ (Coleção Bíblica Loyola nº
١٢).
GABEL, John B; WHEELER, Charles B. A Bíblia como Literatura. Uma introdução. São
Paulo: Loyola, ١٩٩٣ (Coleção Bíblica Loyola).
LIMA, Anderson de Oliveira. Metodologia Exegética por Paulo Roberto Garcia.
Anotações sobre o conteúdo das aulas de Metodologia Exegética durante o curso de
Especialização em Bíblia. Tradição Profética. Lato Senso. UMESP, Setembro de 2006.
PAULO VI. Constituição Dogmática Dei Verbum sobre a Revelação Divina, 1965.
PONTIFÍCIA COMISSÃO BÍBLICA. A interpretação da Bíblia na Igreja. 7. ed. São Paulo:
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Tradução Ecumênica da Bíblia. São Paulo: Loyola, 2002.
WEGNER, Uve. Exegese do Novo Testamento. Manual de Metodologia. 4. ed. São
Leopoldo/São Paulo: Sinodal/Paulus, 1998.
ZEVINI, Giorgio. Bíblia, carta de amor. São Paulo: Salesiana, 2006.
38
Sites
CNBB: www.cnbb.org.br
Mosteiro de São Bento (Lectio Divina): www.osb.org.br
Vaticano: www.vatican.va
Bíblia Católica on-line: www.bibliacatolica.com.br
39
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aproveitar da melhor maneira possível a ação da divina providência em nossa
vida, sempre lembrando que tudo o que procuramos está em Deus. É através
dele, e somente dele, que todas as coisas nos serão acrescentadas. 
"Seja rico, seja pobre, os riscos de uma vida infeliz por estar longe de Cristo são
uma realidade."
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