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Tricuríase Entre os nematódeos à ordem Trichurida, três gêneros apresentam grande importância médica e veterinária: Trichuris, Trichinella e Capillaria. Estes nematódeos, como outras ordens da classe Adenophorea, não apresentam órgãos sensoriais denominados fasmídes, além da ausência de canais laterais do sistema excretor. Na superfície ventral da região esofagiana de Trichurida pode-se observar uma série de glândulas unicelulares com pequenos poros denominada camada bacilar, que, provavelmente, estão relacionadas com a regulação osmótica destes vermes. Nos representantes da ordem Trichurida, a abertura bucal, localizada na extremidade anterior do parasito, é desprovida de lábios e a cápsula bucal é muito reduzida ou ausente. O esôfago constitui um tubo delgado, com musculatura pouco desenvolvida, e na porção posterior é marginado por uma coluna de células glandulares. TRICHURIS TRICHIURA A infecção de T. trichiura tem distribuição cosmopolita – grandes cidades –, sendo estimado cerca de 1 bilhão de pessoas infectadas no mundo, das quais, aproximadamente 350 milhões apresentam idade inferior a 15 anos e, geralmente, estão expostas a quadros mais graves desta helmintose. Apesar de amplamente distribuída, a tricuríase é mais prevalente em regiões de clima quente e úmido e condições sanitárias precárias, que favorecem a contaminação ambiental e a sobrevivência dos ovos do parasito. Os vermes adultos apresentam uma forma típica semelhante a um chicote, esta aparência é consequência do afilamento da região esofagiana, que compreende cerca de 2/3 do comprimento total do corpo, e o alargamento posterior, na região do intestino e órgãos genitais. Apesar de humanos serem o principal hospedeiro de T. trichiura e o único relevante para a transmissão desta infecção de porcos e macacos com esta espécie de Trichuris. Por outro lado, também existem alguns relatos de diarreia em crianças da Índia causada pela infecção por T. vulpis, espécie de tricurídeo que utiliza canídeos como hospedeiro. MORFOLOGIA ADULTOS: T. trichiura medem de 3 a 5 cm de comprimento, sendo os machos menores que as fêmeas. A boca, localizada na extremidade anterior, é uma abertura simples e sem lábios, seguida por um esôfago bastante longo e delgado, que ocupa aproximadamente 2/3 do comprimento total do verme. Na porção final, o esôfago apresenta-se como um tubo de parede delgada, circundado por uma camada unicelular de grandes esticócitos. A parte posterior do corpo de T. trichiura, cerca de 1/3 do comprimento total, compreende a porção alargada, onde se localiza o sistema reprodutor simples e o intestino que termina no ânus, localizado próximo à extremidade da cauda. Os vermes adultos são dioicos e com dimorfismo sexual. O macho é menor, possui testículo único seguido por canal deferente, canal ejaculador que termina com um espículo. A extremidade posterior é fortemente curvada ventralmente, apresentando o espículo protegido por uma bainha, recoberta por pequenos espinhos. Na fêmea pode-se observar ovário e útero únicos, que se abrem na vulva, localizada na extremidade da junção entre esôfago e intestino. OVOS: medem de 50-55 µm de comprimento por 22 µm de largura, apresentam um formato elíptico característico com poros salientes e transparentes em ambas as extremidades, preenchidos por material lipídico. A casca do ovo de Trichuris é formada por três camadas distintas: uma camada lipídica externa, uma camada quitinosa intermediária e uma camada vitelínica interna, que favorece a resistência destes ovos a fatores ambientais. HABITAT Os adultos de T. trichiura são parasitos de intestino grosso de humanos, e em infecções leves ou moderadas, estes vermes habitam principalmente o ceco e cólon ascendente do hospedeiro. Nas infecções intensas ocupam também cólon distal, reto e porção distal do íleo. T. trichiura é considerado por muitos autores um parasito tissular, pois toda a região esofagiana do parasito penetra na camada epitelial da mucosa intestinal do hospedeiro, onde se alimenta principalmente de restos dos enterócitos lisados pela ação de enzimas proteolíticas secretadas pelas glândulas esofagianas do parasito esticócitos. A porção posterior de T. trichiura permanece exposta no lúmen intestinal, facilitando a reprodução e a eliminação dos ovos. CICLO BIOLÓGICO É do tipo monoxênico; fêmeas e machos que habitam o intestino grosso se produzem sexuadamente e os ovos são eliminados para o meio externo com as fezes. A fêmea fecundada elimina de 3.000 a 20.000 ovos por dia e o embrião contido no ovo recém- eliminado se desenvolve no ambiente para se tornar infectante. Temperaturas muito elevadas (acima de 52ºC) ou muito baixas (- 9ºC) não permitem o desenvolvimento dos ovos de T. trichiura, apesar de não necessariamente matar o embrião. Da mesma maneira que Ascaris lumbricoides, os ovos de T. trichiura são muito sensíveis à dessecação, não sobrevivendo por mais de 15 dias quando a umidade relativa é menor que 77%. O período de desenvolvimento do ovo depende das condições ambientais, e em condições favoráveis, os ovos de T. trichiura contendo as larvas infectantes podem permanecer viáveis por logo período de tempo. Os ovos infectantes podem contaminar alimentos sólidos e líquidos, podendo, assim, serem ingeridos pelo homem. As larvas de T. trichiura eclodem através de um dos poros presentes nas extremidades do ovo, no intestino delgado do hospedeiro. Estudos indicam que o processo de eclosão é estimulado pela exposição sequencial dos ovos aos componentes do suco gástrico e suco pancreático. Estudos histológicos revelam que as larvas de Trichuris sp. Podem penetrar na mucosa em várias regiões do intestino, mas esta penetração ocorre principalmente no intestino grosso, e não foram encontradas evidências de que as larvas que penetram no duodeno completam seu desenvolvimento, ou mesmo que ocorra uma posterior migração das larvas do duodeno para o intestino grosso. Na região do ceco, as larvas migram por dentro das células epiteliais, em direção do lúmen intestinal, formando túneis sinuosos na superfície epitelial da mucosa. Durante este período as larvas se desenvolvem em vermes adultos, passando pelos quatro estágios larvais típicos do desenvolvimento dos nematódeos; ocorre a diferenciação dos esticócitos na região esofagiana, e do órgão genital na porção posterior para a junção do esôfago com o intestino. O crescimento e desenvolvimento dos vermes levam ao rompimento das células epiteliais e à exposição da porção posterior do corpo de T. trichiura à luz intestinal do hospedeiro. Apenas uma pequena parte (5-22%) dos ovos infectantes de T. trichiura ingeridos completa o desenvolvimento até vermes adultos. Estima-se que o período pré- patente da tricuríase no homem, tempo entre a infecção até a eliminação dos ovos pelas fezes do hospedeiro, é de aproximadamente 60-90 dias. TRANSMISSÃO Os ovos de T. trichiura eliminados com as fezes o hospedeiro infectado contaminam o ambiente, sem saneamento básico. Como os ovos são extremamente resistentes às condições ambientais, podem ser disseminados pelo vento ou pela água e contaminar os alimentos sólidos ou líquidos, sendo, então, ingeridos pelo hospedeiro. Os ovos de T. trichiura também podem ser disseminados por mosca doméstica, que transportam os ovos na superfície externa do corpo, do local onde as fezes foram depositadas até o alimento. Em algumas áreas de alta prevalência de tricuríase tem sido demonstrada que a prática de geofagia (comer substâncias terrestres) é muito frequente, principalmente entre crianças e mulheres grávidas, sendo esta uma importante fonte de infecção, especialmente em algumas regiões da África, Índia e América Latina. PATOGENIA A gravidade da tricuríase depende da carga parasitária, mas também tem importante influência de fatores,como idade do hospedeiro, estado nutricional e a distribuição dos vermes adultos no intestino. A maioria dos pacientes com infecções leves é assintomática ou apresenta sintomatologia intestinal discreta, enquanto os pacientes com infecção moderada apresentam graus variados de sintomas, como dores de cabeça, dor epigástrica e no baixo abdômen, diarreia, náusea e vômitos. A síndrome disentérica crônica é relatada em crianças com infecções intensas, e nestes casos pode-se observar uma diarreia intermitente com presença abundante de muco e, algumas vezes, sangue, dor abdominal com tenesmo (espasmo doloroso do esfíncter anal ou vesical com desejo urgente de defecar ou urinar, e com eliminação de quantidade mínima de fezes ou urina), anemia, desnutrição grave caracterizada por peso e altura abaixo do nível aceitável para a idade e, algumas vezes, prolapso retal. Como não existe migração sistêmica das larvas de T. trichiura, as lesões provocadas pelo verme estão confinadas ao intestino. Infecções com pequena quantidade de vermes adultos, que compreendem a grande maioria dos casos, os vermes encontram-se restritos à região do ceco e cólon ascendente, consequentemente a inflamação se apresenta discreta e localizada, não interferindo significativamente nos processos fisiológicos do hospedeiro e não produzindo sintomatologia expressiva. Em infecções intensas e crônicas, o parasito se distribui por todo o intestino grosso, atingindo também a porção distal do íleo e reto. Desta maneira, os sintomas relatados estão associados a distúrbios locais: dor abdominal, disenteria, sangramento e prolapso retal, bem como alterações sistêmicas: perda do apetite, vômito, eosinofilia, anemia, desnutrição, retardamento no desenvolvimento físico e comprometimento cognitivo. As alterações locais estão, provavelmente, associadas ao aumento da extensão e da intensidade da reação inflamatória intestinal, com relatos de ulcerações e sangramento na mucosa. O processo inflamatório pode ser particularmente intenso quanto os vermes atingem o reto, sendo observados edema e intenso sangramento da mucosa retal, que provavelmente é responsável por iniciar o reflexo de defecação, mesmo na ausência de fezes no reto. DIAGNÓSTICO CLÍNICO: não é específico, portanto deve ser confirmado com o diagnóstico laboratorial. LABORATORIAL: realizado pela demonstração dos ovos do parasito nas fezes. Para estudos epidemiológicos em áreas endêmicas, o método mais utilizado é o método de Kato-Katz, que permite uma avaliação qualitativa e quantitativa da infecção. Além da possibilidade de visualizar vermes adultos em exames de colonoscopia ou anoscopia. TRATAMENTO Benzoilmidazóis, como albendazol e mebendazol, são drogas mais eficientes no tratamento da tricuríase humana. Mais recentemente foi testada a eficácia de dietilcarbamazina, albendazole ou de ivermectina, isoladamente ou em combinações, para o controle de Ascaris e Trichuris em crianças. Os estudos demonstraram que a associação de albendazol com ivermectina foi mais eficaz na cura dos pacientes infectados por T. trichiura que cada droga isoladamente.
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