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SUMÁRIO INTRODUÇÃO ............................................................................................................ 2 UNIDADE 1 – FIGURA HUMANA: CONSTRUINDO ARTE E IDEIAS ....................... 6 1.1 A história e os desenhos: fontes de registro da humanidade ............................ 6 1.2 Antiguidade: a arte e a estética centradas no corpo humano ............................ 8 UNIDADE 2 – O DESENHO: INSTRUMENTO DE REPRESENTAÇÃO, COMPREENSÃO, ESBOÇO E ESTUDO DAS FORMAS LINEARES E PICTÓRICAS DAS IMAGENS COMO SIGNO ......................................................... 13 UNIDADE 3 – O DESENHO COMO PARTE DE UM SISTEMA DE SIGNIFICAÇÃO .................................................................................................................................. 17 3.1 Evolução dos estudos sobre os desenhos infantis .......................................... 18 3.2 Justificativas para o trabalho com o desenho na educação básica ................. 19 3.3 O sistema de representação ............................................................................ 21 3.4 Teorias sobre o desenvolvimento gráfico-plástico da criança .......................... 23 UNIDADE 4 – BREVE PANORAMA DO DESENHO NA ARTE OCIDENTAL ......... 35 4.1 O que é desenho ............................................................................................. 35 4.2 Tipos de desenho ............................................................................................ 37 REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 45 2 Todos os direitos reservados ao Grupo Prominas de acordo com a convenção internacional de direitos autorais. Nenhuma parte deste material pode ser reproduzida ou utilizada seja por meios eletrônicos ou mecânicos, inclusive fotocópias ou gravações, ou, por sistemas de armazenagem e recuperação de dados – sem o consentimento por escrito do Grupo Prominas. INTRODUÇÃO A dimensão social das manifestações artísticas revela modos de perceber, sentir e articular significados e valores que orientam os diferentes tipos de relações entre os indivíduos na sociedade. A arte estimula o aluno a perceber, compreender e relacionar tais significados sociais. Essa forma de compreensão da arte inclui modos de interação como a empatia e se concretiza em múltiplas sínteses. Figura 1: Primeiros desenhos. A arte ensina que nossas experiências geram um movimento de transformação permanente, que é preciso reordenar referências a cada momento, ser flexível. Isso significa que as ações de criar e conhecer são indissociáveis e a flexibilidade é condição fundamental para aprender (BRASIL, 1997, p.19-20). Embora seja uma constatação primária e subjetiva, fato é que todos nós gostamos de observar um trabalho bem feito. O artista é um desenhista, pois o desenho pode ser definido como a arte de representar objetos por meio de linhas e sombras. Essa é a nossa primeira manifestação nas artes visuais. Na história da humanidade, antes mesmo de representar a realidade pela escrita, os homens desenhavam. As primeiras expressões artísticas são desenhos: os desenhos das cavernas. Podemos dizer que o desenho vem antes de todas as coisas que o homem produz: roupas, sapatos, casas, edifícios, pontes, automóveis, utensílios, ferramentas, entre outros. 3 Todos os direitos reservados ao Grupo Prominas de acordo com a convenção internacional de direitos autorais. Nenhuma parte deste material pode ser reproduzida ou utilizada seja por meios eletrônicos ou mecânicos, inclusive fotocópias ou gravações, ou, por sistemas de armazenagem e recuperação de dados – sem o consentimento por escrito do Grupo Prominas. O desenho é a matriz de outras formas de expressão visual que têm como base o esboço: a pintura, a gravura, e, às vezes, até mesmo o cinema, pois muitos diretores famosos gostam de desenhar personagens ou cenas que imaginam antes de filmá-las. Nem sempre o desenho é figurativo, ou seja, imita a natureza, a realidade. Ele pode ser uma abstração, mas é sempre bom que o desenhista domine a técnica figurativa como base para sua criatividade artística. Dando uma focada no universo da educação, todos nós, quando crianças, desenhamos muito. Entretanto, a autocrítica, a timidez, os comentários alheios, às vezes, se não na maioria delas, nos levam a abandonar o desenho e acreditar que não temos o “dom”. Quem insiste e continua a tentar sempre, apesar de qualquer decepção ou crítica desfavorável, pode dominar a técnica e chegar a desenhar bem, pois isso depende de treino e prática constantes. Uma prática que exige observação, análise, síntese, orientação espacial, pensamento lógico e criativo (BALESTRERI, 2005). E o desenho? Quais suas possibilidades para enriquecer o ser humano? Participando do campo das Artes Visuais, o desenho também possui suas particularidades, sendo utilizado em várias combinações, encontrando na criatividade do educando um meio de expressar-se e comunicar-se consigo mesmo e com as outras pessoas. Ele pode ser apresentado em sua forma geométrica, livre, natural, entre outras. Desde a mais tenra idade, os rabiscos ajudam os pequenos impulsionado seu desenvolvimento cognitivo e expressivo. Nas aulas de Arte, os alunos do Ensino Médio, ao darem continuidade ao seu aprendizado de fazer produtos em linguagens artísticas, podem aperfeiçoar seus modos de elaborar ideias e emoções, de maneira sensível, imaginativa, estética, tomando-as presentes em seus trabalhos de música, artes visuais, dança, teatro, artes audiovisuais. A partir das culturas vividas com essas linguagens no seu meio sociocultural e integrando outros estudos, pesquisas, confrontando opiniões, refletindo sobre seus trabalhos artísticos, os alunos vão adquirindo competências que se estendem para outras produções ao longo de sua vida com a arte (BRASIL, 2000, p. 51). 4 Todos os direitos reservados ao Grupo Prominas de acordo com a convenção internacional de direitos autorais. Nenhuma parte deste material pode ser reproduzida ou utilizada seja por meios eletrônicos ou mecânicos, inclusive fotocópias ou gravações, ou, por sistemas de armazenagem e recuperação de dados – sem o consentimento por escrito do Grupo Prominas. Figura 2: Estudo para a escultura da Pequena Dançarina de 14 anos, de Edgar Degas. Fontes (2011) defende que as Artes Visuais e o desenho atuam ao representar visualmente uma forma, cor ou representação, estando presentes no teatro, na música, na dança, no cinema, na fotografia e nas demais expressões. Nos tempos atuais, além de atuar no segmento artístico, também exercem papel fundamental na representação visual comercial, de empresas e instituições públicas. Toda arte apreciada pelo olhar é conceituada como arte visual, que abrange a pintura, o desenho, a gravura, a fotografia, o cinema, a escultura, a arquitetura, web design, a moda, a decoração e o paisagismo. Lida com o caráter teórico e prático do estético, seja o estético do belo, do funcional ou do fazer pensar. Feitas essas considerações básicas, podemos partir para um pouco de teoria! Veremos ao longo do módulo a construção da figura humana pela imagem e pelo desenho que foi, como muita certeza, a primeira manifestação de arte do ser humano pré-histórico. 5 Todos os direitos reservados ao Grupo Prominas de acordo com a convenção internacional de direitos autorais. Nenhuma parte deste material pode ser reproduzida ou utilizada seja por meios eletrônicos ou mecânicos, inclusive fotocópias ou gravações, ou, por sistemas de armazenagem e recuperação de dados – sem o consentimento por escrito do Grupo Prominas. Evidentemente que fazendo parte de um sistema de significação teceremos reflexões sobre as teorias e trabalhos de Wallon, Piaget e Vygotsky. Ao final falaremos do desenho enquantotécnica e suas variantes. Desejamos boa leitura, mas antes duas observações se fazem necessárias: Em primeiro lugar, sabemos que a escrita acadêmica tem como premissa ser científica, ou seja, baseada em normas e padrões da academia. Pedimos licença para fugir um pouco às regras com o objetivo de nos aproximarmos de vocês e para que os temas abordados cheguem de maneira clara e objetiva, mas não menos científicos. Em segundo lugar, deixamos claro que este módulo é uma compilação das ideias de vários autores, incluindo aqueles que consideramos clássicos, não se tratando, portanto, de uma redação original. Ao final do módulo, além da lista de referências básicas, encontram-se muitas outras que foram ora utilizadas, ora somente consultadas e que podem servir para sanar lacunas que por ventura surgirem ao longo dos estudos. 6 Todos os direitos reservados ao Grupo Prominas de acordo com a convenção internacional de direitos autorais. Nenhuma parte deste material pode ser reproduzida ou utilizada seja por meios eletrônicos ou mecânicos, inclusive fotocópias ou gravações, ou, por sistemas de armazenagem e recuperação de dados – sem o consentimento por escrito do Grupo Prominas. UNIDADE 1 – FIGURA HUMANA: CONSTRUINDO ARTE E IDEIAS 1.1 A história e os desenhos: fontes de registro da humanidade Iniciamos nosso percurso neste módulo por um caminho que consideramos uma via de mão dupla, falando de história e desenho, instrumentos que auxiliam as demais disciplinas. Ambas vão além dessa instrumentalidade multidisciplinar, elas fazem parte do rol de “ciências” das mais antigas e sabemos que o desenho pode ser considerado uma das primeiras manifestações do ser humano. Segundo Trinchão e Oliveira (1998), o ato de desenhar não é só uma forma de expressão, como também traz em si, a ideia de perpetuar como uma forma de registrar. Por outro lado, quando pensamos o caráter da História, seja ela qual for, percebemos que ela não é um continuum de acontecimentos homogêneos e vazios. A História, tal como o Desenho, é registro. E, enquanto registro, carregam consigo uma espessa camada de acontecimentos que esperam do futuro uma releitura crítica. Portanto, carregam uma lógica em comum – a de transmissão. É a partir deste entendimento que se concebe o Desenho contando a História das civilizações e a História sendo contada pelo Desenho das civilizações. Ambos são canais de transmissão relacionados, partindo desta união, uma série de procedimentos que incidem na forma multidisciplinar com a qual o Desenho e História, quando unidos, são reinterpretados, como por exemplo, os ideais de imitação, restauração e rememoração. A princípio, aceita-se o desenho como uma linguagem de comunicação, ou seja, uso de signos que servem à expressão e a comunicação individual ou entre indivíduos, podendo ser percebida pelos diversos órgão dos sentidos, seja por meio da palavra articulada e escrita ou pela representação gráfica. Por este prisma, o Desenho é “intento, intenção, desejo, plano, projeto e propósito” (GOMES, 1996, p. 37). Assim, o ato de desenhar é aqui compreendido como a arte de liberar e compartilhar emoções para/e com o mundo. Portanto, o Desenho é, sobretudo, canal de comunicação. Já História pode ser compreendida como vestígios de um passado que não está intacto, é constitutivo e espera ser avaliado criticamente, para revelar uma História que não aquela revestida de verdades absolutas. Esta avaliação, baseada 7 Todos os direitos reservados ao Grupo Prominas de acordo com a convenção internacional de direitos autorais. Nenhuma parte deste material pode ser reproduzida ou utilizada seja por meios eletrônicos ou mecânicos, inclusive fotocópias ou gravações, ou, por sistemas de armazenagem e recuperação de dados – sem o consentimento por escrito do Grupo Prominas. na crítica, converte-se na prática da preservação, numa experiência de salvação, possibilidade, intimamente, ligada à concepção que Walter Benjamin (1987) tem de liberdade, ou seja, liberar, no presente, as qualidades não reveladas de um passado expressivo que aguarda ansioso o momento de sua libertação. A referida libertação não é possível se as obras do passado forem desassociadas do contexto histórico em que se inserem. Assim, entende-se que qualquer intervenção sobre o objeto de importância histórica - o Desenho, por exemplo – merece uma interpretação crítica dos interesses que se colocam diante dos conflitos entre classes que fornecem a lógica da História das áreas de conhecimento que trazem o Desenho como instrumento. Por outro lado, deve-se notar que no interior desta “lógica” esteve sempre presente o confronto entre a mudança e a permanência no devir histórico dos interesses entre classes antagônicas. Percebe-se com isso que o Desenho, enquanto entidade histórica, e a própria história é interpretação, também, se coloca como um texto a ser apreendido, decodificado. Enfim, o Desenho não está dissociado da História da humanidade, pois, mais antigo ainda que a história falada e escrita é a História, através dos registros gráficos, mágicos e ritualistas do cotidiano do homem das cavernas. A sua “imitação da ação”, ao representar o cotidiano, expressava uma manifestação do desígnio, de comunicação com os espíritos da natureza. A intencionalidade, o desejo mágico de apreensão e enfraquecimento da caça via expressão gráfica, talvez não trouxesse nenhuma intenção, no entanto, a expressão gráfica deste homem eslava associada à sua própria existência, consequentemente, estava revelando ao futuro os primórdios da vida humana e nisso está embutida a ideia de preservação (TRINCHÃO; OLIVEIRA, 1998). A intenção do registro gráfico para a posteridade, entendido como o conjunto de signos que expressam uma ideia, transformaram os egípcios nos precursores do desenho aplicado, deixaram suas marcas nos trabalhos de finalidade funerária e na arquitetura. Como os egípcios, os mesopotâmios já usavam o desenho como linguagem entre os projetistas e os construtores das urnas mortuárias, aquedutos, edifícios e fortalezas e como representação de passagens da vida do morto, tornando-o imortal pela recordação. 8 Todos os direitos reservados ao Grupo Prominas de acordo com a convenção internacional de direitos autorais. Nenhuma parte deste material pode ser reproduzida ou utilizada seja por meios eletrônicos ou mecânicos, inclusive fotocópias ou gravações, ou, por sistemas de armazenagem e recuperação de dados – sem o consentimento por escrito do Grupo Prominas. Na Antiguidade, quando as especulações acerca da natureza da História, no sentido de processo, começam a ser feitas, o movimento histórico começa a ser construído à imagem da vida biológica. Na historiografia antiga, significa que o sentido da grandeza dos mortais como algo diferente da grandeza da natureza e dos deuses tinha acabado. Todos faziam parte, agora, da narrativa histórica independente do instrumento, a fala, a escrita ou a expressão gráfica. Não mais existia a busca da imortalidade do ser. Os Gregos alcançaram o esplendor com seu desenho livre e descontraído, no qual o homem era a medida de todas as coisas, o homem é natureza, logo perdura por si só. Os seus feitos, de finalidades religiosa e política, ficaram registrados tanto no espaço construído na planificação e construção de anfiteatros, edifícios, ruas, pantheons, quanto na comunicação estabelecida entre si e os outros povos via expressão gráfica. Mas, foi o povo Romano quem aplicou a linguagem desenho, de forma aperfeiçoada, tanto na arquitetura e urbanismo, engenharia, construção naval quanto nas artes plásticas como nos registros dos feitos de guerra. Neste sentido, a grandeza estava no louvor, do qual advinha a glória e a fama, para as coisas que mereciam ser imortais. Na Idade Média, por muito tempo, o conhecimento ficou sob o poder da igreja.A Filosofia e a Astronomia dividiam sua importância com os registros da linguagem Geométrica e a Arte. Através da História dos registros da arte gráfica deixada pelos povos medievais, percebe-se que o Desenho passou a ter uma força de linguagem a ponto de representar o poder da igreja tanto sobre o segmento social mais desfavorecido quanto nas questões políticas, no momento em que estava direcionado para a arte sacra. E eis que podemos falar do corpo, da figura humana como vínculo construtor de imagens e ideias! 1.2 Antiguidade: a arte e a estética centradas no corpo humano De uma maneira um tanto poética, o desenho começou pelo corpo, segundo a tradição, e com uma história de amor, referida por Plínio e retomada por Alberti: A história passa-se em Corinto e conta que uma jovem, filha do ceramista Butades de Sicyone, apaixonada por um rapaz que teria de abandonar a 9 Todos os direitos reservados ao Grupo Prominas de acordo com a convenção internacional de direitos autorais. Nenhuma parte deste material pode ser reproduzida ou utilizada seja por meios eletrônicos ou mecânicos, inclusive fotocópias ou gravações, ou, por sistemas de armazenagem e recuperação de dados – sem o consentimento por escrito do Grupo Prominas. cidade, desenha numa parede o contorno da sombra do seu amado, que a luz de uma lanterna projetava, guardando assim a memória da imagem dele (RODRIGUES, 2000, p. 21). O mesmo Plínio conta que as origens da pintura são obscuras, afirmando os egípcios que a inventaram seis mil anos antes de passar à Grécia, enquanto os gregos dizem que se descobriu em Sicion ou em Corinto, mas todos reconhecem que consistia em circunscrever com linhas o contorno da sombra de um homem. Assim, desde o início, a Arte centrou-se no corpo. Já no Egito, o desenho preparatório era traçado com pincel e tinta vermelha ou negra na parede a pintar, ou então, em papiros, suportes móveis, destinados a serem transferidos para o muro pelo sistema da quadratura (TAVARES, 2012). Na pintura egípcia, as proporções do corpo e as posições eram determinadas por uma grelha estrutural e as ações eram dadas através de posições e gestos estereotipados. Os egípcios representavam através de convenções diferentes das nossas e idealizavam a figura humana, sobretudo as personagens reais e divinas, com exceção do período em que o Egito foi governado por Amenófis IV (Akhenaton). Tais convenções eram certamente transmitidas nas oficinas onde pintores e escultores faziam o seu aprendizado. De fato, a questão das proporções parece ter preocupado o homem desde muito cedo, assim como a representação de um corpo ideal, que vemos na arte egípcia como nas top-models de hoje. Certo é que a Antiguidade legou-nos uma prática de representação do corpo humano, pintado ou esculpido, normalmente idealizado, embora no período helenístico as representações se alarguem às diversas idades da vida, da infância à velhice, e mesmo à deformidade física. Pela importância que deram ao retrato, os romanos continuaram a representação naturalista, embora a concepção idealizada permanecesse na representação dos deuses. Com a Idade Média há uma rarefacção do desenho que leva os investigadores a conclusões opostas: para uns, a prática do desenho foi quase abandonada, resumindo-se a desenhos preparatórios diretos, destinados a desaparecer uma vez completadas as obras. Estes desenhos eram realizados com traços a carvão ou pincel no pavimento ou no muro, para mosaicos e frescos, ou com esboços à pena no pergaminho para as miniaturas. 10 Todos os direitos reservados ao Grupo Prominas de acordo com a convenção internacional de direitos autorais. Nenhuma parte deste material pode ser reproduzida ou utilizada seja por meios eletrônicos ou mecânicos, inclusive fotocópias ou gravações, ou, por sistemas de armazenagem e recuperação de dados – sem o consentimento por escrito do Grupo Prominas. Outros estudiosos afirmam que existiu desenho autônomo não necessariamente destinado a suporte de uma pintura, mas os que chegaram até nosso tempo são muito raros, devido ao custo dos pergaminhos e ao uso de técnicas precárias para a aprendizagem e exercício do desenho, como as tabuinhas enceradas, depois reutilizadas, mas, sobretudo, pela pouca consideração em que eram tidos os produtos de tal prática na concepção essencialmente artesanal da arte dessa época (ARNOLDI; VALENTI, 1996 apud CALADO, 2012). Não podemos também esquecer que na Idade Média os objetivos da representação deixam de estar ligados à mimesis e, por consequência, perde importância a expressão dos volumes, da tridimensionalidade, e da articulação das figuras no espaço, conquistas da arte clássica que se deviam à prática e experiência do desenho. A imagem, na Idade Média, é esquemática, simplificada e bidimensional. Assim, o desenho deixa de ter função estrutural e de suporte da representação e reduz-se a uma indicação sumária das formas, ao contorno e delimitação dos campos cromáticos. No entanto, a Idade Média teve a sua própria teoria das proporções, baseada no princípio da esquematização planimétrica. A teoria bizantina das proporções, de base clássica, elaborou um esquema tomando a articulação orgânica do corpo humano como ponto de partida, mas aplicou de forma rudimentar o sistema do módulo. As dimensões do corpo humano, na medida em que se projetavam num plano, exprimiram-se em “comprimentos de cabeça”, ou mais exatamente de “rosto”. O tamanho do corpo somava, em geral, nove destas unidades. Por exemplo, o Manual do pintor do Monte Athos atribui uma unidade ao rosto, três ao torso, duas tanto à parte superior como à parte inferior da perna, um terço da unidade, ou seja, o nariz, à parte superior da cabeça e ao pescoço (ARNOLDI; VALENTI, 1996 apud CALADO, 2012). Com o Renascimento, regressou a teoria clássica das proporções e escultores e pintores mediam as estátuas antigas como os arquitetos mediam os monumentos. No século XV, em vez de procurarem uma noção abstrata de beleza, inspiravam-se na natureza, no mundo dos sentidos. Por outro lado, o artista deixa de ser um simples artesão e passa a ser um pensador, capaz de uma visão pessoal. 11 Todos os direitos reservados ao Grupo Prominas de acordo com a convenção internacional de direitos autorais. Nenhuma parte deste material pode ser reproduzida ou utilizada seja por meios eletrônicos ou mecânicos, inclusive fotocópias ou gravações, ou, por sistemas de armazenagem e recuperação de dados – sem o consentimento por escrito do Grupo Prominas. Tenta conciliar o orgânico e o geométrico. É o caso de Piero della Francesca (1420- 92) que aliou os conhecimentos de Matemática à prática da pintura, tendo marcado 130 pontos numa face humana e tendo depois medido as distâncias entre eles, para criar uma imagem cuidada da mesma. Também Fra Luca Paccioli, um monge franciscano, publicou em Veneza, em 1509, o De Divina Proportione, ilustrado com desenhos de Leonardo Da Vinci, onde estudou os tratados que se debruçavam sobre a proporção ideal. Pretendia reconciliar os corpos vivos com os corpos geométricos, o que é simbolizado no seu retrato, pintado por Jacopo de'Barbari, no qual é retratado entre um jovem e um poliedro suspenso de estrutura cristalina (COMAR, 1999 apud CALADO, 2012). Embora o sistema de transmissão de conhecimentos ainda tivesse por base a oficina, esta se torna um verdadeiro laboratório onde se desenvolvem as investigações nas áreas mais diversas, como acontece na oficina de Verrocchio, onde Da Vinci e vários outros artistas se formaram. Muito importante é o fato de os artistas terem aliado a discussão teórica sobre as proporções, de acordo com a tradição antiga, nomeadamente do texto de Vitrúvio, com o estudo da anatomia em cadáveres. A partir de agora não bastava conhecer o corpo por fora, a sua aparência, através do desenho demodelo vivo, era necessário saber como ele era formado por dentro e como se articulava. Neste processo, Arte e Ciência estão muito próximas, e em certa medida alguns artistas ultrapassaram os cientistas, ainda inibidos por preconceitos religiosos. A medicina clássica, na tradição de Galeno de Pérgamo, estudou anatomia até ao final da Idade Média por analogia: a estrutura do esqueleto era a do macaco (CALADO, 2012). 12 Todos os direitos reservados ao Grupo Prominas de acordo com a convenção internacional de direitos autorais. Nenhuma parte deste material pode ser reproduzida ou utilizada seja por meios eletrônicos ou mecânicos, inclusive fotocópias ou gravações, ou, por sistemas de armazenagem e recuperação de dados – sem o consentimento por escrito do Grupo Prominas. Figura 3: O Homem Vitruviano – Da Vinci. Leonardo da Vinci foi quem levou mais longe estes estudos. Fez variadas dissecações, desenhou-as e anotou-as e não fora o fato de a sua obra ter permanecido manuscrita, teria tido muito maior impacto. Curiosamente, Leonardo parece ter ignorado as possibilidades da imprensa e da gravura e, por isso, a glória da difusão dos desenhos do corpo humano cabe a Andreas Vesalius, o médico flamengo que, em meados do século XVI, publicou a primeira obra de anatomia totalmente baseada na observação e dissecção - De Humani corporis fabrica. Enfim, na esteira dos acontecimentos, vimos evoluções, reformas e contrarreformas até nossos dias atuais e do desenho podemos concluir que é considerado ainda um símbolo da simetria básica do corpo humano, e por extensão, para o universo como um todo. 13 Todos os direitos reservados ao Grupo Prominas de acordo com a convenção internacional de direitos autorais. Nenhuma parte deste material pode ser reproduzida ou utilizada seja por meios eletrônicos ou mecânicos, inclusive fotocópias ou gravações, ou, por sistemas de armazenagem e recuperação de dados – sem o consentimento por escrito do Grupo Prominas. UNIDADE 2 – O DESENHO: INSTRUMENTO DE REPRESENTAÇÃO, COMPREENSÃO, ESBOÇO E ESTUDO DAS FORMAS LINEARES E PICTÓRICAS DAS IMAGENS COMO SIGNO O desenho, entendido como prática gráfica e plástica, recorre a meios e instrumentos que ajudam a uma diferenciação e ordenação num quadro referencial e conceitual. Existe num espaço que se situa entre a ideia e a imagem, reconfigura e coloca em evidência, ordena ou elimina, que é fundamentalmente um processo de busca, de compreensão, de construção e de síntese (OLIVEIRA, 2010). Sendo o desenho, elemento ou instrumento de representação, compreensão, esboço, estudo de formas lineares e pictóricas das imagens como um signo, vamos a alguns entendimentos básicos explicados didaticamente por Marques (2006). A percepção ou o que no caso poderia corresponder a uma aquisição perceptiva pode ser efetivamente compreendida como um processo de descodificação da realidade, que comporta ao mesmo tempo a atribuição de um sentido ou de um significado. Por outro lado, temos as representações concretas que podem ser entendidas como representações codificadas. Correspondem a um processo (individual) de escolhas, construções e sinais gráficos que não correspondem (exatamente) ao que chamamos de realidade. Trata-se da formalização de uma mensagem visual cuja descodificação está prevista dentro dos seus limites. Certas produções mentais só se estruturam de maneira visual. Identificamos naturalmente determinadas situações em que só a demonstração por imagens permite resolver um problema ou atingir um resultado que de outro modo é impossível ou é seguramente menos eficaz. O desenho é assim um instrumento de contínua verificação das relações entre o sinal gráfico e significado, fazendo tocar com a mão o desnível que pode existir entre visão e realidade. A prática do desenho também está intimamente ligada ao desenvolvimento do conceito de ideia, como condição funcional para o exercício da imagem. Esta consideração significa muitas vezes uma valorização dos fantasmas interiores do 14 Todos os direitos reservados ao Grupo Prominas de acordo com a convenção internacional de direitos autorais. Nenhuma parte deste material pode ser reproduzida ou utilizada seja por meios eletrônicos ou mecânicos, inclusive fotocópias ou gravações, ou, por sistemas de armazenagem e recuperação de dados – sem o consentimento por escrito do Grupo Prominas. sujeito em detrimento dos modelos sensíveis e das percepções. Esses fantasmas funcionam como espaço de autoconsciência relativamente à função e problema da invenção na concepção da imagem. O desenho não representa o visível tal como é visível, mas o que se faz visível através do desenho. Ele próprio é um intermediário entre os conceitos, as emoções e as coisas capazes de motivar ações, que se necessário modifiquem o nosso “entorno”. Quando iniciamos um desenho, o lápis avança sobre o suporte com um forte carácter enunciativo na “espera” de determinar uma imagem. O desenho parece antecipar os sentidos mesmo antes de começarmos a enunciar, como que as linhas tivessem memória. O desenho funciona assim como uma espécie de consciência espacial de compreender a ideia e evidenciar o que existia na nossa memória. Enquanto elemento fundamental do pensamento criativo, o desenho possibilita a organização da experiência do nosso conhecimento. Quando desenhamos somos constantemente confrontados com novas e antigas aprendizagens, com novos e antigos conhecimentos. O desenho possibilita, sem hierarquia, organizar esta informação no sentido de tornar visível o que se conhece ou inventa num determinado momento. A necessidade de um desenho está muitas vezes presente na vinculação à definição prévia de objetivos, como um processo de conhecimento. Quem desenha, verdadeiramente, está interessado em algo que não pode expressar de outra forma (VIEIRA, 1995 apud MARQUES, 2006). Não importa as distinções relativamente às funções e propósitos do desenho, na medida em que todos os desenhos têm importância quando configuram esse sentido mais amplo que são as ideias. O desenho reivindica um aspecto fundamental do processo de conhecimento como elemento definidor da ideia. Assume-se também como um meio instrumental quando é necessário configurar os diversos aspectos da imagem, aspectos formais, estruturais ou de funcionamento, na hora de precisar o contexto, o “entorno”. A aprendizagem do desenho deve permitir, por isso, a cada um que desenha, ter a possibilidade de desenvolver competências gráficas e operativas que lhe permitam enfrentar e resolver problemas nomeadamente de representação. Aqui, cabe-nos adentrar a representação que decorre da experiência e conhecimento que cada um tem das coisas e do mundo. A dificuldade maior é 15 Todos os direitos reservados ao Grupo Prominas de acordo com a convenção internacional de direitos autorais. Nenhuma parte deste material pode ser reproduzida ou utilizada seja por meios eletrônicos ou mecânicos, inclusive fotocópias ou gravações, ou, por sistemas de armazenagem e recuperação de dados – sem o consentimento por escrito do Grupo Prominas. distinguir os níveis de conhecimento que a experiência do desenho proporciona. Não vamos naturalmente definir níveis, tão pouco comportamentos. Na hora de definir os limites, as intenções do desenho, logo veem à memória os nossos próprios limites e são a partir destes que encetamos um jogo de relações gráficas e mentais que têm sempre presentes todos os elementos que configuram o problema. São milhares de decisões que há que tomar, e nem todas são tomadas em plena consciência. Os desenhos através das suas marcas gráficas transformam-se, então, em representações, no sentido em que desenhar é fundamentalmente representar, voltar a ser presente, visível, aquilo que é enunciado no desenho. Ao representar, ao tornar visível, o desenho ajuda a clarificaro que antes eram apenas ideias, visualizando-as ao mesmo tempo da ação que as realiza (MARQUES, 2006). O esboço ou estrutura do desenho é uma das etapas mais importantes do próprio desenho, sua parte inicial, uma etapa fundamental para alocação de espaços, composições e afins. Quanto aos signos visuais, nada mais são do que uma das muitas formas de comunicar que o homem utiliza no seu dia a dia. Ou seja, para que o processo de comunicação se torne possível, é necessário a intervenção do uma série de elementos, que são os fatores de comunicação, relacionando-se entre si e entre eles o signo visual! Os signos visuais podem ser classificados em ícones, símbolos e indícios, sendo: � os ícones são signos que representam um modelo imitativo de um objeto, de uma forma, de um espaço ou de uma situação. É característico das artes plásticas e dos meios de comunicação de massa. Exemplos: uma fotografia, um mapa, um diagrama, entre outros; � os símbolos são signos visuais que designam o objeto de uma maneira totalmente livre, independentemente de semelhanças ou de uma ligação direta com ele. O significado é estabelecido através de normas e convenções. Para serem entendidos, necessitam de uma prévia explicação. Exemplos: leão – símbolo da força e do Sporting; � os indícios são signos visuais que têm origem em formas ou situações naturais ou casuais. Através da acumulação de experiências, devido à ocorrência de 16 Todos os direitos reservados ao Grupo Prominas de acordo com a convenção internacional de direitos autorais. Nenhuma parte deste material pode ser reproduzida ou utilizada seja por meios eletrônicos ou mecânicos, inclusive fotocópias ou gravações, ou, por sistemas de armazenagem e recuperação de dados – sem o consentimento por escrito do Grupo Prominas. situações idênticas, indicam algo e adquirem significado. Exemplo: nuvens negras indicam tempestade; marcas dos pneus de um carro indicam travagem brusca. Para fecharmos esta unidade, algumas constatações de Oliveira (2010) sobre o desenho: � o desenho é um meio de expressão privilegiado que nos permite compreender a visão do mundo dessas culturas primitivas, sem outras influências ou contaminação e compará-la com a atualidade. São também essas manifestações que podem testemunhar as vivências, os desejos, os medos, os mitos e cultos, que faziam dessas comunidades ancestrais sociedades, ao mesmo tempo tão próximas e tão distantes das nossas próprias vivências e práticas, desejos, e medo; � o desenho ajuda a entender a realidade e a redimensionar o mundo interior. É um instrumento de comunicação, através de pontos, de linhas, de formas, de sombras e luzes, que nos faz entender o mundo que conhecemos, o espaço em que vivemos, o que idealizamos, ou a que aspiramos; � o desenho é também um instrumento de análise, compreensão e comunicação da nossa realidade; � o desenho é estruturante do pensamento visual e propiciador de um percurso de aprendizagem estética. É através do desenho que podemos transformar, criar, investigar, construir e comunicar. Quem sente e pensa o desenho, exprime-se pela organização dos espaços visíveis e pela dinâmica vivencial que constrói, reconstrói, transforma e cria; � quem desenha constrói imagens, buscando uma síntese que seja o seu eixo referencial e, ao mesmo tempo, o reflexo da sua experiência; � quem desenha coloca-se assim no campo da própria representação, sendo simultaneamente sujeito e objeto do desenho; � a expressão do desenho é individual, impossível de copiar exatamente. A forma como o artista desenha é individual, não se pode reproduzir, pois tem tantas variáveis, resultantes do conhecimento, técnica e instrumentos de desenho usados, que são impossíveis de imitar; � para além destes fatores, a percepção visual da forma desenhada e a sua representação são individuais e são fruto duma prática e duma cultura visual adquirida que não podem ser imitadas, porque são sempre diferentes. 17 Todos os direitos reservados ao Grupo Prominas de acordo com a convenção internacional de direitos autorais. Nenhuma parte deste material pode ser reproduzida ou utilizada seja por meios eletrônicos ou mecânicos, inclusive fotocópias ou gravações, ou, por sistemas de armazenagem e recuperação de dados – sem o consentimento por escrito do Grupo Prominas. UNIDADE 3 – O DESENHO COMO PARTE DE UM SISTEMA DE SIGNIFICAÇÃO De imediato vamos esclarecer que o desenho é um meio privilegiado de expressão de que nos servimos naturalmente desde crianças, que nos é inato para representar o mundo que vamos conhecendo. Esse impulso acompanha-nos durante toda a vida, de diferentes maneiras e com diferentes níveis de intenção. É uma disciplina estruturante do pensamento visual (OLIVEIRA, 2010). Quem desenha constrói imagens que, antes de serem representação, são apropriação. Quem desenha, desenha-se numa unidade de experiências, percepções e construções, que são fruto do seu sentir, do seu pensar, das suas referências pessoais. Mais alguns pontos de importância imediata: � precisamos buscar os significados da arte na educação e na socialização dos educandos porque nesses processos a arte desempenha importante papel de mediadora no diálogo entre o sujeito e sua realidade, facilitando a tradução da experiência de vida em conceitos significativos; � precisamos conhecer como o aluno se expressa através da linguagem do desenho e como adquire aproveitamento da disciplina em sua vida, pois ao expressar-se através do desenho, o aluno coloca sua vida no papel, com toda a emoção. Através do desenho, o aluno desenvolve noções de espaço, tempo, quantidade, sequência, apropriando-se do próprio conhecimento, que é construído respeitando seu ritmo. O professor atento terá a oportunidade de: � conhecer seus alunos e o sentimento que cada um carrega dentro de si; � identificar também quais temas eles preferem, suas dificuldades e potencialidades em expressarem-se na linguagem do desenho e, até mesmo, descobrir dons. Além disso, desenhar é uma atividade extremamente prazerosa, pois o desenvolvimento e a prática do fazer artístico são muito importantes para o ser humano, pela própria necessidade que temos de nos comunicar com os nossos semelhantes e alcançarmos nossas realizações (FONTES, 2011). 18 Todos os direitos reservados ao Grupo Prominas de acordo com a convenção internacional de direitos autorais. Nenhuma parte deste material pode ser reproduzida ou utilizada seja por meios eletrônicos ou mecânicos, inclusive fotocópias ou gravações, ou, por sistemas de armazenagem e recuperação de dados – sem o consentimento por escrito do Grupo Prominas. Temos falado ao longo do curso que nos primórdios da humanidade, quando as letras alfabéticas não existiam, comunicava-se através de desenhos, mostrando sentimentos e valores. Graças a estas obras de arte registradas nas pedras, hoje podemos conhecer um pouco nossos ancestrais através desta linguagem simbólica. E assim acontece com nossas crianças que ainda não conhecem a simbologia das letras, expressam seus sentimentos através de riscos, rabiscos e mais tarde o desenho propriamente dito. Desenhando mais o que “sente” do que aquilo que vê. Percebe-se, portanto, que o desenho sempre foi importante para a comunicação do ser humano (SIO, 2004). Se quiser que a criança realmente se desenvolva da melhor maneira possível, precisa-se dar a atenção que responda a seus interesses, consciente das possibilidades, encorajando-a a continuar. 3.1 Evolução dos estudos sobre os desenhos infantis Os primeiros estudos sobre a produção gráfica das crianças datam do final do século XIX e início do XX e estão fundados nas concepções psicológicas e estéticas de então que estavam calcadas em uma produção estética idealista e naturalista de representação da realidade, sendo a habilidade técnica um fator prioritário(BALESTRERI, 2005; PAIVA; CARDOSO, 2010). Assim, são os psicólogos, que no final do século XIX descobrem a originalidade dos desenhos infantis e publicam as primeiras notas e observações sobre o assunto, influenciando positivamente a maneira de ver e de pensar o desenho da criança e o seu desenvolvimento. Modo de expressão próprio da criança, o desenho constitui uma linguagem que possui vocabulário e sintaxe. Ao prazer do gesto associa-se o prazer da inscrição, a satisfação de deixar marcas. Seu desenvolvimento é progressivo e implica mudanças significativas que, no início, dizem respeito à passagem dos rabiscos das garatujas para construções cada vez mais ordenadas, fazendo surgir os primeiros símbolos. No início, a criança trabalha sobre a hipótese de que o desenho serve para imprimir tudo o que ela sabe sobre o mundo, então ela passa a articulá-los no espaço bidimensional do papel, na areia, na parede ou em qualquer outra superfície. 19 Todos os direitos reservados ao Grupo Prominas de acordo com a convenção internacional de direitos autorais. Nenhuma parte deste material pode ser reproduzida ou utilizada seja por meios eletrônicos ou mecânicos, inclusive fotocópias ou gravações, ou, por sistemas de armazenagem e recuperação de dados – sem o consentimento por escrito do Grupo Prominas. Passa também a constatar a regularidade nos desenhos presentes no meio ambiente e nos trabalhos aos quais tem acesso, incorporando esse conhecimento em suas próprias produções. É assim que, por meio do desenho, a criança cria e recria individualmente formas expressivas, integrando percepção, imaginação, reflexão e sensibilidade, que podem ser então apropriadas pelas leituras simbólicas de outras crianças e dos adultos. O desenho está também intimamente ligado ao desenvolvimento da escrita. Dotada de prestígio por ser “secreta”, a escrita exerce uma verdadeira fascinação sobre as crianças, e isso bem antes de ela própria poder traçar seus signos. Muito cedo ela tenta imitar a escrita dos adultos, e quando ingressa na escola verifica-se uma diminuição da sua produção gráfico-plástica, já que a escrita, considerada mais importante, passa a ser concorrente do desenho (PAIVA; CARDOSO, 2010). Enfim, o desenho como possibilidade de brincar, o desenho como possibilidade de falar, de registrar, marca o desenvolvimento da infância. Entretanto, em cada estágio ou etapa, o desenho assume um caráter próprio, definindo a maneira do desenhar que são similares em todas as crianças, apesar das diferenças individuais de temperamento e sensibilidade. Esta maneira própria de desenhar de cada idade varia, inclusive, muito pouco de cultura para cultura (BALESTRERI, 2005; PAIVA; CARDOSO, 2010). 3.2 Justificativas para o trabalho com o desenho na educação básica Muitos alunos, quando chegam ao ensino fundamental, apresentam dificuldades de aprendizagem relacionadas à escrita. É possível que estas crianças não tenham tido oportunidades significativas de interação na infância, fase na qual se desenvolve a função simbólica e consequentemente os sistemas de representação, fato que pode ter prejudicado o seu desenvolvimento. Em situações como esta, é perceptível a importância do trabalho na educação infantil que priorize e preserve os momentos lúdicos e prazerosos, que certamente contribuirão para o desenvolvimento do desenho e, posteriormente, da escrita. O ato de desenhar deve ser considerado um fator essencial no processo do desenvolvimento da linguagem, 20 Todos os direitos reservados ao Grupo Prominas de acordo com a convenção internacional de direitos autorais. Nenhuma parte deste material pode ser reproduzida ou utilizada seja por meios eletrônicos ou mecânicos, inclusive fotocópias ou gravações, ou, por sistemas de armazenagem e recuperação de dados – sem o consentimento por escrito do Grupo Prominas. bem como uma espécie de documento que registra a evolução da criança (FONTES, 2011). Segundo Paiva e Cardoso (2010), Picasso, ao discorrer acerca de suas observações sobre o desenho infantil, escreveu: “Quando criança, eu desenhava como Rafael. À medida que fiquei mais velho, passei a desenhar como criança”. Isso quer dizer que a forma de uma criança conhecer o objeto passa por significativas transformações em sua evolução no processo de adaptação ao meio, que se dá por seguidos movimentos de equilibração, isto é, integração entre assimilação e acomodação. Veremos pelas teorias a seguir que existe uma estreita relação entre a evolução da escrita e a do desenho. Para Ferreiro e Teberosky (1999), a aprendizagem da língua escrita é a construção de um sistema de representação, assim como o desenho. E para Piaget (1948 apud PILLAR, 1996, p. 32), a aprendizagem, nesse enfoque, converte-se na apropriação de um novo objeto de conhecimento, ou seja, em uma aprendizagem conceitual. [...] para conhecer os objetos, é preciso agir sobre eles de maneira a decompô-los e a recompô-los. [...] para que a criança se aproprie do sistema de representação da escrita, ela terá que reconstruí-lo, diferenciando os elementos e as relações próprias ao sistema, bem como a natureza do vínculo entre o objeto de conhecimento e a sua representação. As pesquisas realizadas por Emília Ferreiro indicam que cada sujeito, no processo de construção da escrita, parece refazer o caminho percorrido pela humanidade, qual seja: Pictográfica – forma de escrita mais antiga que permitia representar só os objetos que podiam ser desenhados: desenho do próprio objeto para representar a palavra solicitada. Ideográfica – consistia no uso de um simples sinal ou marca para representar uma palavra ou conceito: uso de símbolos diferentes para representar palavras diferentes. Logográfica – escrita constituída por desenhos, referentes ao nome dos objetos e não ao objeto em si. Assim como as primeiras civilizações faziam inscrições na pedra e a “escrita” representava o próprio objeto, para Ferreiro e Teberosky (1999), a criança associa o 21 Todos os direitos reservados ao Grupo Prominas de acordo com a convenção internacional de direitos autorais. Nenhuma parte deste material pode ser reproduzida ou utilizada seja por meios eletrônicos ou mecânicos, inclusive fotocópias ou gravações, ou, por sistemas de armazenagem e recuperação de dados – sem o consentimento por escrito do Grupo Prominas. significante ao significado. Sendo assim, considerando a escrita como sistema de representação, as autoras observam que [...] quando uma criança começa a escrever, produz traços visíveis sobre o papel, e além disso, e fundamentalmente, põe em jogo suas hipóteses acerca do significado mesmo da representação gráfica. 3.3 O sistema de representação Em Piaget voltamos a falar um pouco da representação, para ele há dois sentidos, num sentido mais amplo, que ele chamou de representação conceitual, é confundido com o pensamento, ou seja, com toda a inteligência que se apoia num sistema de conceitos e, num sentido mais estrito, ele chamou de representação simbólica que se reduz às imagens mentais, isto é, às lembranças simbólicas da realidade ausentes. Elas se relacionam entre si, pois enquanto a imagem é um símbolo concreto, o conceito é mais abstrato. Isto se deve ao fato que, embora o pensamento não se reduza a um sistema de imagens, ele se faz acompanhar de imagens. Portanto, segundo Piaget (1978, p. 87) “se pensar consiste em interligar significações, a imagem será um 'significante' e o conceito, um 'significado'”. Piaget (1969 apud ALEXANDROFF, 2010) distinguiu cinco condutas representativas, que ele chamou de desenvolvimento da função simbólica. Segundo o autor, elas aparecem mais ou menos ao mesmo tempo, mas ele as enumerou por ordem crescente de complexidade. A primeira delas é a imitação diferida, em que a criança imita o comportamento de uma pessoa quando estanão está mais presente. Constitui-se o começo do aparecimento de um significante diferenciado. Em segundo lugar, há o jogo simbólico, em que a criança brinca de faz-de- conta, utilizando gestos imitativos com objetos, que se tornam simbólicos porque lhes é atribuído um significado qualquer. Em terceiro lugar, há o desenho ou a imagem gráfica, que inicialmente é uma ponte entre o jogo simbólico e a imagem mental. Até aproximadamente oito/nove anos as crianças desenham o que sabem e não o que veem. Em quarto lugar estão as imagens mentais que são representações internalizadas. Elas são diferentes tanto das percepções quanto das operações 22 Todos os direitos reservados ao Grupo Prominas de acordo com a convenção internacional de direitos autorais. Nenhuma parte deste material pode ser reproduzida ou utilizada seja por meios eletrônicos ou mecânicos, inclusive fotocópias ou gravações, ou, por sistemas de armazenagem e recuperação de dados – sem o consentimento por escrito do Grupo Prominas. mentais, pois as imagens não lidam com conceitos, mas com os objetos como tais e, com toda a experiência perceptiva passada ao sujeito. Em último lugar, surge a evocação verbal de ações passadas através da linguagem. Surge então, a capacidade de verbalizar os acontecimentos. Considerando o que há de comum entre as cinco funções semióticas, Piaget (1985, p. 79) afirma que: [...] a despeito da espantosa diversidade das suas manifestações, a função simbólica apresenta notável unidade. Quer se trate de imitações diferidas, de jogo simbólico, de desenho, de imagens mentais, e de lembranças- imagens ou de linguagem, consiste sempre em permitir a evocação representativa de objetos ou acontecimentos não percebidos atualmente. Assim, segundo o autor, a representação é uma condição básica para o surgimento do pensamento, como a capacidade de evocar e articular ações interiorizadas. Este fato é muito importante porque ao se analisar desenho e escrita como linguagens, elas só poderão aparecer depois do surgimento da função simbólica (ALEXANDROFF, 2010). Ainda, segundo o autor, a capacidade de a criança usar abstrações desenvolve-se de modo ordenado e previsível e Piaget descreve três níveis de desenvolvimento da abstração dos materiais escritos: índice ou sinal, símbolos e signos. No índice ou sinal, a parte representa o todo. Se de uma janela se vê a copa de uma árvore, isto é sinal que ali existe uma árvore, mesmo que não se consiga vê- la em sua totalidade. O símbolo é a primeira forma verdadeira de representação. Os símbolos são construídos socialmente, mas mantém uma relação com o objeto que representa, não são arbitrários ou convencionais, isto é, diferentes grupos podem ter símbolos originais que os represente. Pode-se afirmar, conforme posto anteriormente, que os desenhos estão próximos dos símbolos (ALEXANDROFF, 2010). Os signos são abstrações inteiramente arbitrárias ou convencionais, que não têm nenhuma relação com o objeto que representam, mesmo sendo construídos socialmente. Dentre eles, por exemplo, temos as letras do alfabeto, os numerais, as notas musicais. 23 Todos os direitos reservados ao Grupo Prominas de acordo com a convenção internacional de direitos autorais. Nenhuma parte deste material pode ser reproduzida ou utilizada seja por meios eletrônicos ou mecânicos, inclusive fotocópias ou gravações, ou, por sistemas de armazenagem e recuperação de dados – sem o consentimento por escrito do Grupo Prominas. Ao longo da humanidade, as representações da realidade têm se articulado com os sistemas simbólicos, pois os signos não se mantêm como marcas externas, isoladas, referentes como objetos avulsos nem como símbolos usados por pessoas particularmente, mas os signos são mediadores da comunicação entre os membros de uma comunidade, justamente por compartilhar significados comuns (ALEXANDROFF, 2010). Portanto, os sistemas de representação da realidade são dados socialmente e a linguagem é o sistema simbólico básico de todos os grupos humanos. Em relação à linguagem escrita, Vygotsky afirma que “[...] o brinquedo de faz-de-conta, o desenho e a escrita devem ser vistos como momentos diferentes de um processo essencialmente unificado [...]” (1989 p.131), o que nos leva a conclusão de que “[...] brincar e desenhar deveriam ser estágios preparatórios do desenvolvimento da linguagem escrita[...] (p.134). Logo, tratar o desenho e a escrita como sistemas de representação gráfica e não apenas como o aprendizado de um código, implica em considerar o ponto de vista da criança, que aprende produzindo e interpretando estes sistemas de forma complementar. Como afirma Pillar (1996, p. 32): [...] para que a criança se aproprie dos sistemas de representação do desenho e da escrita, ela terá de reconstruí-los, diferenciando os elementos e as relações próprias aos sistemas, bem como a natureza do vínculo entre o objeto do conhecimento e sua representação. Esse vínculo pode ser arbitrário, como no caso da escrita, por se valer de signos, ou analógico, como no desenho, por utilizar símbolos. 3.4 Teorias sobre o desenvolvimento gráfico-plástico da criança São muitos os teóricos que se debruçaram a trabalhar sobre o desenvolvimento gráfico-plástico da criança, dentre eles Henry Wallon; Jean Piaget; Lev. S. Vygotsky; Georges Henri Luquet; Howard Gardner; Rudolf Arnheim; Victor Lowenfeld; só para citar alguns. Esses estudiosos do grafismo infantil, sem exceção, reconhecem haver determinadas fases, etapas ou períodos que são comuns aos sujeitos em processo de apropriação do desenho enquanto sistema de representação. E, de fato, desde o rabisco sem intencionalidade de representação até a representação gráfico-plástica propriamente dita, podemos claramente identificar aspectos visuais invariantes no 24 Todos os direitos reservados ao Grupo Prominas de acordo com a convenção internacional de direitos autorais. Nenhuma parte deste material pode ser reproduzida ou utilizada seja por meios eletrônicos ou mecânicos, inclusive fotocópias ou gravações, ou, por sistemas de armazenagem e recuperação de dados – sem o consentimento por escrito do Grupo Prominas. processo de apropriação do desenho como sistema semiótico de representação por parte do sujeito. Essas teorias têm sido separadas em dois grandes grupos: a) Teorias de concepções interacionista: Representação e Interação Social na Construção do Conhecimento. b) Teorias centradas na individualidade: Potencialidades Expressivas, Perceptivas e Cognitivas do Saber. Vejamos um pouco sobre as teorias desses estudiosos. JEAN PIAGET Piaget (1948 apud PAIVA e CARDOSO, 2010) diz que a representação é gerada pela função semiótica, a qual possibilita à criança reconstruir em pensamento um objeto ausente por meio de um símbolo ou signo. A representação é condição básica para o pensamento existir, uma vez que, sem ela, não há pensamento, só inteligência puramente vivida como no nível sensório-motor. É através do surgimento da função semiótica que a criança consegue evocar e reconstruir em pensamento ações passadas e relacioná-las com as ações atuais. Essa passagem é possível por interações da criança com o ato de desenhar e com desenhos de outras pessoas. Na garatuja, a criança tem como hipótese que o desenho é simplesmente uma ação sobre uma superfície, e ela sente prazer ao constatar os efeitos visuais que essa ação produziu. No decorrer do tempo, as garatujas, que refletiam o prolongamento de movimentos rítmicos de ir e vir transformam-se em formas definidas que apresentam maior ordenação, e podem estar se referindo a objetos naturais, objetos imaginários ou mesmo a outros desenhos. Na evolução da garatuja para o desenho de formas mais estruturadas, a criança desenvolve a intenção de elaborar imagens no fazer artístico. Começando com símbolos muito simples, elapassa a articulá-los no espaço do papel, na areia, na parede ou em qualquer outra superfície. Passa também a constatar a regularidade nos desenhos presentes no meio ambiente e nos trabalhos aos quais ela tem acesso, incorporando esse conhecimento em suas próprias produções. No início, a criança trabalha sobre a 25 Todos os direitos reservados ao Grupo Prominas de acordo com a convenção internacional de direitos autorais. Nenhuma parte deste material pode ser reproduzida ou utilizada seja por meios eletrônicos ou mecânicos, inclusive fotocópias ou gravações, ou, por sistemas de armazenagem e recuperação de dados – sem o consentimento por escrito do Grupo Prominas. hipótese de que o desenho serve para imprimir tudo o que ela sabe sobre o mundo. No decorrer da simbolização, a criança incorpora progressivamente regularidades ou códigos de representação das imagens do entorno, passando a considerar a hipótese de que o desenho serve para imprimir o que se vê. É assim que, por meio do desenho, a criança cria e recria individualmente formas expressivas, integrando percepção, imaginação, reflexão e sensibilidade, que podem então ser apropriadas pelas leituras simbólicas de outras crianças e adultos. O desenho como possibilidade de brincar, o desenho como possibilidade de falar de registrar, marca o desenvolvimento da infância, porém em cada estágio, o desenho assume um caráter próprio. Estes estágios definem maneiras de desenhar que são bastante similares em todas as crianças, apesar das diferenças individuais de temperamento e sensibilidade. Esta maneira de desenhar própria de cada idade varia, inclusive, muito pouco de cultura para cultura (PAIVA; CARDOSO, 2010). Vejamos as fases do desenho segundo Piaget: a) Garatuja: faz parte da fase sensória motora (zero a dois anos) e parte da pré-operacional (dois a sete anos), indo aproximadamente até três ou quatro anos. A criança demonstra extremo prazer em desenhar e a figura humana é inexistente. A garatuja pode ser dividida em: � garatuja desordenada – os movimentos são amplos e desordenados, parecendo mais um exercício motor. Não há preocupação com a preservação dos traços, que são cobertos com novos rabiscos várias vezes; Figura 4: Garatuja desordenada. � garatuja ordenada – os movimentos aparecem com traços longitudinais e circulares e a figura humana ainda aparece de forma imaginária, podendo começar a surgir um interesse pelas formas. 26 Todos os direitos reservados ao Grupo Prominas de acordo com a convenção internacional de direitos autorais. Nenhuma parte deste material pode ser reproduzida ou utilizada seja por meios eletrônicos ou mecânicos, inclusive fotocópias ou gravações, ou, por sistemas de armazenagem e recuperação de dados – sem o consentimento por escrito do Grupo Prominas. Figura 5: Garatuja ordenada longitudinal. Figura 6: Garatuja ordenada circular. Nessa fase a criança diz o que vai desenhar, mas não existe relação fixa entre o objeto e sua representação. Por isso, ela pode dizer que um círculo ovalado seja um avião, e antes de terminar o desenho, dizer que é um peixe. b) Pré-esquematismo: esta fase faz parte da segunda metade da fase pré- operatória, indo normalmente até os sete anos quando ocorre a descoberta da relação entre desenho, pensamento e realidade. Observa-se que os elementos ficam dispersos e não são relacionados entre si. Figura 7: Pré-esquematismo. c) Esquematismo: faz parte da fase das operações concretas (7 a 10 anos), mas costuma ir até mais ou menos, nove anos. Dentro dos esquemas representativos, começa a construir formas diferenciadas para cada categoria de objeto. Nesta etapa surgem duas grandes conquistas: o uso da linha de base e a descoberta da relação cor objeto. Já tem um conceito definido quanto à figura humana, no entanto podem surgir desvios do esquema, tais como: exagero, 27 Todos os direitos reservados ao Grupo Prominas de acordo com a convenção internacional de direitos autorais. Nenhuma parte deste material pode ser reproduzida ou utilizada seja por meios eletrônicos ou mecânicos, inclusive fotocópias ou gravações, ou, por sistemas de armazenagem e recuperação de dados – sem o consentimento por escrito do Grupo Prominas. negligência, omissão ou mudança de símbolo. Aparecem também dois fenômenos como a transparência e o rebatimento. Figura 8: Esquematismo. d) Realismo: normalmente surge no final das operações concretas, tendo maior consciência do sexo e começa uma autocrítica pronunciada. No espaço, descobre o plano e a superposição, mas abandona a linha de base. As formas geométricas aparecem, junto com uma maior rigidez e formalismo. Nesta etapa normalmente usam roupas diferenciadas para cada um dos sexos. Figura 9: Início do realismo. e) Pseudo Naturalismo: faz parte da fase das operações abstratas (10 anos em diante). É o fim da arte como atividade espontânea e muitos desistem de desenhar nesta etapa do desenvolvimento. Inicia a investigação de sua própria personalidade, transferindo para o papel suas inquietações e angústias, característica do início da adolescência. Nos desenhos aparecem muito o realismo, 28 Todos os direitos reservados ao Grupo Prominas de acordo com a convenção internacional de direitos autorais. Nenhuma parte deste material pode ser reproduzida ou utilizada seja por meios eletrônicos ou mecânicos, inclusive fotocópias ou gravações, ou, por sistemas de armazenagem e recuperação de dados – sem o consentimento por escrito do Grupo Prominas. a objetividade, a profundidade, o espaço subjetivo e o uso consciente da cor. Na figura humana, as características sexuais podem aparecer de forma exageradas. Figura 10: Transformações do desenho da criança. LEV S. VYGOTSKY Vygotsky busca compreender as características do homem, através do estudo da origem e desenvolvimento da espécie humana, tomando o surgimento do trabalho e a formação da sociedade humana. Ao longo de sua história, o homem tem utilizado signos como instrumentos psicológicos em diversas situações, o signo é uma marca externa, que auxilia o homem em tarefas que exigem memória ou atenção, são inúmeras as formas de utilizar signos como instrumentos que auxiliam no desempenho de atividades psicológicas. Na evolução da espécie humana e do desenvolvimento de cada indivíduo, ocorrem duas mudanças fundamentais no uso dos signos. A utilização de marcas externas, vai transformando em processos internos de mediação, mecanismo chamado por Vygotsky em: processo de internalização. No decorrer da história da espécie humana, onde o surgimento do trabalho propicia o desenvolvimento de atividade coletiva, das relações sociais do uso de instrumentos, as representações da realidade têm se articulado em sistemas simbólicos. Os sistemas de representação da realidade e a linguagem, são sistemas simbólicos básicos de 29 Todos os direitos reservados ao Grupo Prominas de acordo com a convenção internacional de direitos autorais. Nenhuma parte deste material pode ser reproduzida ou utilizada seja por meios eletrônicos ou mecânicos, inclusive fotocópias ou gravações, ou, por sistemas de armazenagem e recuperação de dados – sem o consentimento por escrito do Grupo Prominas. todos os grupos humanos. É o grupo cultural, onde o indivíduo se desenvolve que lhe fornece formas de perceber e organizar o real (OLIVEIRA, 1999). Para Vygotsky, o desenvolvimento do desenho requer duas condições. A primeira é o domínio do ato motor, por isso, para o autor, inicialmente, o desenho é o registro do gesto e logo passa a ser o da imagem. Assim, a criança percebe que pode representar graficamente um objeto. E essa característica é um indício de que o desenho é precursor da escrita, pois a percepção do objeto, no desenho, corresponde à atribuição de sentido dada pela criança, constituindo-serealidade conceituada (ALEXANDROFF, 2010). Outra condição fundamental na evolução do desenho é a relação com a fala existente no ato de desenhar. Num primeiro momento, o objeto representado só é reconhecido após a ação gráfica quando a criança fala o que desenhou identificado pela sua semelhança como objeto. Depois ela passa a antecipar o ato gráfico, verbalizando o que vai fazer, indicando que há um planejamento da ação. Por isso, Vygotsky (1989, p. 141) afirma que a linguagem verbal é a base da linguagem gráfica. Este fato é essencial na visão do autor porque aqui se pode perceber já “um certo grau de abstração” da criança que desenha, pois ao fazê-lo, libera conteúdo da memória. Ele afirma que “[...] os esquemas que caracterizam os desenhos infantis lembram conceitos verbais que comunicam somente aspectos essenciais do objeto” (VYGOTSKY, 1989, p.127). Ao descrever as etapas de desenvolvimento do grafismo infantil, o autor não se preocupa em detalhar o período da aquisição do sistema de representação do desenho. Vygotsky não faz uma investigação sistemática do processo de apropriação do desenho como processo semiótico, mas efetua um recorte no desenvolvimento cultural do grafismo infantil desprezando a “pré-história” do desenho. A fase dos rabiscos, garatujas e da expressão amorfa de elementos gráficos isolados não interessa aos objetivos que ele possui em seu ensaio psicológico, pois realmente, o desenho, enquanto sistema semiótico, só existe efetivamente após o período dos rabiscos. Vygotsky identifica ao longo do desenvolvimento da expressão gráfico- plástica infantil as seguintes etapas: 30 Todos os direitos reservados ao Grupo Prominas de acordo com a convenção internacional de direitos autorais. Nenhuma parte deste material pode ser reproduzida ou utilizada seja por meios eletrônicos ou mecânicos, inclusive fotocópias ou gravações, ou, por sistemas de armazenagem e recuperação de dados – sem o consentimento por escrito do Grupo Prominas. a) Etapa simbólica (escalão de esquemas): é a fase dos conhecidos bonecos que representam, de modo resumido, a figura humana. Esta etapa é descrita por Vygotsky como o momento em que as crianças desenham os objetos “de memória” sem aparente preocupação com fidelidade à coisa representada. É o período em que a criança “representa de forma simbólica objetos muitos distantes de seu aspecto verdadeiro e real” (VYGOTSKY, 1987, p.94). Segundo o autor, é grande a arbitrariedade e a licença do desenho infantil nesta etapa. b) Etapa simbólico-formalista (escalão de formalismo e esquematismo): é a etapa na qual já se percebe maior elaboração dos traços e formas do grafismo infantil. É o período em que a criança começa a sentir necessidade de não se limitar apenas à enumeração dos aspectos concretos do objeto que representa, buscando estabelecer maior número de relações entre o todo representado e suas partes. Percebe-se que os desenhos permanecem ainda simbólicos, mas já se pode identificar o início de uma representação mais próxima da realidade. c) Etapa formalista veraz (escalão da representação mais aproximada do real): nesta fase, as representações gráficas são fiéis ao aspecto observável dos objetos representados, acabando os aspectos mais simbólicos, presentes nas etapas anteriores. d) Etapa formalista plástica (escalão da representação propriamente dita): observa-se uma nítida passagem a um novo modo de desenhar, pois como um desenvolvimento viso-motor mais acentuado, o sujeito acaba se utilizando de técnicas projetivas e de convenções mais realistas. O grafismo deixa de ser uma atividade com fim em si mesma e converte-se em trabalho criador. No entanto, há uma diminuição do ritmo dos desenhos que permanecem mais entre aqueles que realmente desenham porque sentem prazer neste ato criador. Embora os dois pesquisadores tenham focado diferentes aspectos do desenho, Piaget, focando mais os aspectos epistêmicos e Vygotsky, os aspectos mais sociais, eles se aproximam em dois pontos básicos: em relação à importância do desenho no desenvolvimento da criança e à característica de que a criança desenha o que lhe interessa e o que sabe a respeito de um objeto (ALEXANDROFF, 2010). 31 Todos os direitos reservados ao Grupo Prominas de acordo com a convenção internacional de direitos autorais. Nenhuma parte deste material pode ser reproduzida ou utilizada seja por meios eletrônicos ou mecânicos, inclusive fotocópias ou gravações, ou, por sistemas de armazenagem e recuperação de dados – sem o consentimento por escrito do Grupo Prominas. HENRI WALLON Segundo sua teoria, a gênese da inteligência é genética e organicamente social, ou seja, o ser humano é organicamente social e sua estrutura supõe a intervenção da cultura para se atualizar. Nesse sentido, a teoria do desenvolvimento cognitivo de Wallon é centrada na psicogênese da pessoa completa. Assim, o desenvolvimento da criança aparece descontínuo, marcado por contradições e conflitos, resultado da maturação e das condições ambientais, provocando alterações qualitativas no seu comportamento em geral (BALESTRERI, 2005). Wallon apresenta cinco estágios de desenvolvimento do ser humano que se sucedem em fases com predominância afetiva e cognitiva. São eles: a) Impulsivo-emocional: que ocorre no primeiro ano de vida. A predominância da afetividade orienta as primeiras reações do bebê com as pessoas, as quais, intermediam sua relação com o mundo físico. b) Sensório-motor e Projetivo: que vai até os três anos. A aquisição da marcha e da prensão, dão à criança maior autonomia na manipulação de objetos e na exploração dos espaços. Também, nesse estágio, ocorre o desenvolvimento da função simbólica e da linguagem. O termo projetivo refere-se ao fato da ação do pensamento precisar dos gestos para se exteriorizar. O ato mental “projeta-se” em atos motores. c) Personalismo: ocorre dos três aos seis anos. Nesse estágio desenvolvesse a construção da consciência de si mediante as interações sociais, reorientando o interesse das crianças pelas pessoas. d) Categorial: os progressos intelectuais dirigem o interesse da criança para as coisas, para o conhecimento e conquista do mundo exterior. e) Predominância funcional: ocorre nova definição dos contornos da personalidade, desestruturados devido às modificações corporais resultantes da ação hormonal. Questões pessoais, morais e existenciais são trazidas à tona. Com isso, Wallon nos deixou uma nova concepção da motricidade, da emotividade, da inteligência humana e, sobretudo, uma maneira original de pensar a Psicologia Infantil e reformular os seus problemas. Procura explicar os fundamentos da Psicologia como Ciência, seus aspectos epistemológicos, objetivos e metodológicos. Admite o organismo como condição primeira do pensamento, pois 32 Todos os direitos reservados ao Grupo Prominas de acordo com a convenção internacional de direitos autorais. Nenhuma parte deste material pode ser reproduzida ou utilizada seja por meios eletrônicos ou mecânicos, inclusive fotocópias ou gravações, ou, por sistemas de armazenagem e recuperação de dados – sem o consentimento por escrito do Grupo Prominas. toda a função psíquica supõe um componente orgânico. No entanto, considera que não é condição suficiente, pois o objeto de ação mental vem do ambiente no qual o sujeito está inserido, ou seja, de fora. Considera que o homem é determinado fisiológica e socialmente, sujeito às disposições internas e às situações exteriores (BALESTRERI, 2005). Wallon propõe a psicogênese da pessoa completa, ou seja, o estudo integrado do desenvolvimento. Considera que não é possível selecionar um único aspecto do ser humano e vê o desenvolvimento nos vários campos funcionais nos quais se distribui a atividade infantil (afetivo, motor e cognitivo). Para ele, o estudo do desenvolvimento humano deveconsiderar o sujeito como “geneticamente social” e estudar a criança contextualizada nas relações com o meio. Segundo este autor, a atividade do homem é inconcebível sem o meio social; porém as sociedades não poderiam existir sem indivíduos que possuam aptidões como a da linguagem que pressupõe uma conformação determinada do cérebro, haja vista que certas perturbações de sua integridade privam o indivíduo da palavra. Vemos então que para ele não é possível dissociar o biológico do social no homem. Portanto, concebe-o como sendo genética e organicamente social e a sua existência se realiza entre as exigências da sociedade e as do organismo. Quanto ao grafismo infantil, Wallon assim se posiciona: os primeiros trabalhos da criança, como consequência e extensão de um gesto que deixa marcas vigorosas em uma superfície, são seus rabiscos. Mas, existem diferentes manifestações entre o gesto e o seu traço. Para ele, a origem do desenho está no gesto, mesmo quando o traço tenha começado de modo casual, pois esta aptidão está ligada às funções de equilíbrio e não é, sem dúvida, acaso se as primeiras garatujas da criança pertencerem à mesma época que seus primeiros passos. Dessa maneira, pode-se dizer que as representações gráficas da criança surgem simultaneamente às suas representações gestuais. Mais, o rabisco, ao se realizar, torna-se para a criança um objeto privilegiado, porque é o objeto em vias de ser criado pela própria criança, que podem começar por ser fortuitos, mas que depois são destinados a realizar um jogo mais complexo, evoluindo para o desenho. 33 Todos os direitos reservados ao Grupo Prominas de acordo com a convenção internacional de direitos autorais. Nenhuma parte deste material pode ser reproduzida ou utilizada seja por meios eletrônicos ou mecânicos, inclusive fotocópias ou gravações, ou, por sistemas de armazenagem e recuperação de dados – sem o consentimento por escrito do Grupo Prominas. Assim, no início, a criança pode estar rabiscando pelo prazer de rabiscar, à medida que vai dominando o gesto e percebendo visualmente que entre o gesto e as marcas que faz existe uma ligação, seus atos passam a ser intencionais. Aparecem então, linhas contínuas ou interrompidas, curvas que se entrecruzam, rabiscos enovelados, ou simplesmente pequenas marcas que se contrastam na superfície. Neste momento, o rabisco está representando algo. Além disso, Wallon aprofunda os estudos sobre a influência do meio e da cultura que afetam diretamente as crianças de várias idades e aponta porque as crianças podem ter evoluções artísticas diferentes, mesmo quando pertencem à mesma faixa etária, região ou classe social. O meio e a cultura, para este autor como para Gardner e Vygotsky, interferem no desenvolvimento gráfico da criança: “já se tornou consciência da solidariedade existente entre a ambiência e o indivíduo, este não podendo existir sem aquela, sendo, entretanto o indivíduo capaz de também modificar o meio”. Resumindo, a criança se educa por meio da cultura e com o mundo social. Guarde... 1. Lowenfeld, Read e kellogg — defendem a autoexpressão ou livre expressão da criança. A arte não pode ser ensinada. A expressividade infantil tem correspondência com a evolução física, psicológica, cognitiva. O professor é um guia. Corrente dos Inatistas. 2. Luquet e Piaget — cognição artística da criança. Os seus desenhos são considerados resultantes da compreensão que tem do mundo e das expressões de seu desenvolvimento intelectual. Corrente dos Ambientalistas. 3. Rudolf Arnhein — teorias perceptuais: desenha o que percebe e não existe relação entre a idade e o estágio. Corrente dos Ambientalistas. 4. Wallon, Vygotsky e Gardner — interação espacial como parte da constituição da imagem mental e da representação infantil. O meio e as vivências do sujeito são fatores que determinam sua formação mental e intelectual. Corrente dos Interacionistas. Por trás de toda a prática pedagógica existem concepções teóricas sobre o processo de ensino, aprendizagem e desenvolvimento. Muitas vezes o professor 34 Todos os direitos reservados ao Grupo Prominas de acordo com a convenção internacional de direitos autorais. Nenhuma parte deste material pode ser reproduzida ou utilizada seja por meios eletrônicos ou mecânicos, inclusive fotocópias ou gravações, ou, por sistemas de armazenagem e recuperação de dados – sem o consentimento por escrito do Grupo Prominas. não tem consciência disso e desconhece os vínculos da sua prática. Mas de forma geral, podemos organizar essas concepções em três grandes grupos, no que se refere ao desenho infantil. São eles: INATISTAS ou APRIORISTAS: abordagens que enfatizam a herança genética que emerge com o nascimento da criança. Isso se traduz na espera de que algumas qualidades “desabrochem” ou não de acordo com as características do indivíduo. O ditado “filho de peixe, peixinho é” pode servir de ilustração às teorias inatistas, bem como a palavra “dom”. Em tais concepções o desenho é considerado uma atividade natural da criança e pouco se pode fazer para desenvolvê-lo, já que “espontaneamente” a criança passará pelas etapas do grafismo infantil. A arte não se ensina, se nasce com ela. Tem que ter talento. AMBIENTALISTAS ou EMPIRISTAS: as abordagens ambientalistas destacam o meio ambiente como responsável pelo processo de desenvolvimento e aprendizagem. É a conhecida história da “tábua rasa”: a criança nasce como uma folha de papel em branco, a ser preenchida pelo meio. O ditado “é de pequenino que se torce o pepino” é representativo dessa concepção, que, ao contrário da visão anterior, propõe uma atuação do professor extremamente intervencionista, pois considera que, sem orientação o aluno não consegue se desenvolver. INTERACIONISTAS: são abordagens que se distanciam das duas concepções acima e propõem um diálogo entre aquilo que a criança traz ao nascer e as condições materiais concretas de existência que encontra. Nesse caso, o professor é o mediador que apresenta atividades que considera as características individuais de cada aluno e aproveita a riqueza da heterogeneidade cultural e social dos grupos, pois cada grupo tem a sua especificidade. A diversidade é positiva, pois as diferenças é que definem o crescimento do indivíduo e do grupo. É importante ressaltar que o olhar de cada estudioso traz contribuições para o educador de Arte. Teorias não são excludentes, mas é pela combinatória delas, refletida e avaliada, que podemos construir a nossa própria teoria e prática (BALESTRERI, 2005). 35 Todos os direitos reservados ao Grupo Prominas de acordo com a convenção internacional de direitos autorais. Nenhuma parte deste material pode ser reproduzida ou utilizada seja por meios eletrônicos ou mecânicos, inclusive fotocópias ou gravações, ou, por sistemas de armazenagem e recuperação de dados – sem o consentimento por escrito do Grupo Prominas. UNIDADE 4 – BREVE PANORAMA DO DESENHO NA ARTE OCIDENTAL 4.1 O que é desenho O desenho é uma forma de linguagem, talvez a mais antiga. Provavelmente, o homem das cavernas, bem antes de se comunicar com palavras, tenha feito isso através de rabiscos. Ainda hoje, quando não conseguimos nos comunicar verbalmente, tentamos fazê-lo por meio de um desenho. Um mapa, por exemplo (GALESSO, 2016). Assim sendo, aprender a desenhar é uma necessidade, tanto pelo aspecto da comunicação como pelo prazer que esta atividade proporciona. Além disso, desenhar é uma atividade extremamente prazerosa, pois o desenvolvimento e a prática do fazer artístico são muito importantes para o ser humano, pela própria necessidade que temos de nos comunicar com os nossos semelhantes e alcançarmos nossas realizações. Nesse sentido, a arte desenvolve a criatividade, proporciona autoconfiança, amplia a bagagem cultural, facilita o processo de sociabilidade e ainda
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