Buscar

Leitura 2

Prévia do material em texto

1
UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DO SEMI-ÁRIDO
Centro de Ciências Exatas e Naturais - Ensino de Graduação
Equações Diferenciais – Leitura 2
Prof. Alexsandro Belém – email address: alexsandro.belem@ufersa.edu.br
Soluções de uma Equação Diferencial
De uma maneira bem mais geral, tomemos Ω um subconjunto de R×Rn (aqui escreveremos
um ponto de Ω como (t, x) onde t ∈ R e x = (x1, . . . , xn) ∈ Rn e, salvo menção expĺıcita em
caso contrário, adotaremos a norma do máximo em R× Rn, ou seja, dado (t, x) ∈ R× Rn,
||(t, x)|| = max. {|t|, ||x||},
onde ||x|| denota uma norma em Rn, por exemplo, a norma euclidiana, do máximo, ou da
soma).
Tomemos f : Ω → Rn uma aplicação cont́ınua e seja I um intervalo não degenerado da
reta, i.e., I é um subconjunto conexo de R não reduzido a um único ponto (o intervalo I
pode ser aberto, fechado, ou semi-aberto, ou semi-fechado, finito ou infinito).
Definição 0.1 Uma aplicação diferenciável ϕ : I → Rn é chamada solução da equação
dx
dt
= f(t, x) (1)
no intervalo I se:
i. O gráfico de ϕ em I, i.e., {(t, ϕ(t)) ; t ∈ I}, está contido em Ω e;
ii.
dϕ(t)
dt
= f(t, ϕ(t)) para todo t ∈ I, i.e., ϕ satisfaz a equação em I.
(Se t é um extremo do intervalo, a derivada em questão é a derivada lateral correspondente.)
A equação (1) chama-se equação diferencial de primeira ordem e é denotada abreviada-
mente por
x′ = f(t, x),
(aqui o sinal ′ de derivação sempre indica a derivada em relação a variável temporal, que
nesse caso é denotada por t).
Uma solução ϕ : I → Rn é, as vezes, chamada de curva integral.
2
Fixemos agora um ponto (t0, x0) ∈ Ω e uma solução ϕ : I → Rn de x′ = f(t, x). Se t0 ∈ I
e também ϕ(t0) = x0, dizemos que essa solução satisfaz a condição inicial x(t0) = x0, ou
então, o problema de valor inicial
x′ = f(t, x), x(t0) = x0. (2)
Este problema é também conhecido como problema de Cauchy.
Pelo Teorema Fundamental do Cálculo, a equação (2) é equivalente a equação integral
x(t) = x0 +
∫ t
t0
f(s, x(s)) ds (3)
ou seja, se t0 ∈ I, uma função ϕ : I → Rn cujo gráfico está contido em Ω é solução de (3) se,
e soemnte se, é solução de (2).
De fato, se ϕ : I → Rn é solução de (3), então
ϕ(t) = x0 +
∫ t
t0
f(s, ϕ(s)) ds,
derivando temos ϕ′(t) = f(t, ϕ(t)) e é claro que ϕ(t0) = x0 já que
∫ t0
t0
f(s, ϕ(s)) ds = 0.
Potanto, ϕ é solução de (2).
Reciprocamente, se ϕ : I → Rn é solução de (2), então ϕ′(t) = f(t, ϕ(t)) e ϕ(t0) = x0.
Integrando de t0 a t, temos
ϕ(t) = k +
∫ t
t0
f(s, ϕ(s)) ds.
Além disso, ϕ(t0) = k +
∫ t0
t0
f(s, ϕ(s)) ds o que implica k = ϕ(t0) = x0.
ϕ(t) = x0 +
∫ t
t0
f(s, ϕ(s)) ds
e, portanto, ϕ : I → Rn é solução de (3).
Isso mostra que em cada ponto de Ω passa uma única solução, i.e., dado (t0, x0) ∈ Ω
existe uma única soluação de x′ = f(t, x) tal que ϕ(t0) = x0.
Observação: Anteriormente usamos o Teorema Fundamental do Cálculo, a saber:
Se f for uma função cont́ınua em [a, b] então a função g definida por
g(x) =
∫ x
a
f(t) dt, a ≤ x ≤ b
é cont́ınua em [a, b] e derivável em (a, b) com g′(x) = f(x).
Por outro lado, Ω = R2 e f(t, x) = 3x2/3, então para todo c ∈ R a função ϕc : R → R
definida por
ϕc(t) =
{
(t− c)3, t ≥ c,
0, t ≤ c
é solução de x′ = 3x2/3 em I = R, o que é imediato de se verificar já que ϕ′c = 3(t − c)2
e f(t, ϕc(t) = 3((t − c)2)2/3, ou ainda, f(t, ϕc(t) = 3(t − c)2. Assim, para cada c tal que
t ≥ c, ϕ′c(t) = f(t, ϕc(t)). Claro que se t ≤ c, ϕc(t) = 0⇒ ϕ′c(t) = 0 e também f(t, ϕc(t)) =
3 · 02/3 = 0, consequentemente ϕc(t) = 0 é também solução de x′ = 3x2/3.
3
Neste caso, para cada ponto da forma (t0, 0) ∈ R2 passa uma infinidade de soluções de
x′ = f(t, x).
Sob hipóteses bem gerais sobre f (por exemplo se f e
∂f
∂x
são cont́ınuas em Ω) existe uma
única solução de (1) num intervalo que contém t0 e tal que ϕ(t0) = x0.
Veremos isso em um outro momento.
Exemplos:
13. A função y =
x4
16
é uma solução para a equação não-linear
dy
dx
= xy1/2 no intervalo
(−∞,+∞).
De fato, nesse caso temos f(x, y) = x
√
y cujo domı́nio é Ω = R × R+ e f é cont́ınua
em Ω. Sendo ϕ : (−∞,+∞) → R dada por ϕ(x) = y = x
4
16
=
(
x2
4
)2
, então ϕ(x) > 0
para todo x ∈ (−∞,+∞). Assim, o gráfico de ϕ está contido em Ω, i.e., a condição (i)
da definição (0.1) é satisfeita.
Basta verificar então que y satisfaz a equação dada: y =
x4
16
⇒ ∀ x ∈ (−∞,+∞)
dy
dx
= 4
x3
16
=
x3
4
= x
x2
4
= x
√
x2√
16
= x
(
x4
16
)1/2
logo,
dy
dx
= xy1/2.
14. y = x · ex é uma solução para a equação y′′ − 2y′ + y = 0 em R. De fato,
y′ = xex + ex e y′′xex + 2ex ⇒ xex + 2ex − 2(xex + ex) + xex = 0, ∀ x ∈ R.
15. Nem toda equação diferencial tem solução, por exemplo(
dy
dx
)2
+ 1 = 0
não possui soluções em R, isso significa que não existe uma função real que satisfaça
essa equação.
A condição (i) da definição (0.1) é, em geral, satisfeita, o que nos resta verificar é apenas
a condição (ii), ou seja, que a função candidata a solução satisfaz a equação dada.
Observe ainda que a função y = 0, para todo x ∈ R, também satisfaz as equações dos
exemplos 1 e 2. Uma solução para uma equação diferencial que é identicamente nula em um
intervalo I é chamada solução trivial.
As soluções de equações diferenciais podem ser dadas explicitamente, quando escrevemos
y = f(x), ou implicitamente.
Dizemos que uma relação G(x, y) = 0 é uma solução impĺıcita de uma equação diferencial
F (x, y, y′, . . . , y(n)) = 0 em um intervalo I se ela define uma ou mais soluções expĺıcitas dessa
equação em I.
Exemplo 16: A relação x2 +y2−4 = 0 fornece soluções impĺıcitas para a equação dy
dx
= −x
y
no intervalo (−2, 2). De fato, derivando implicitamente temos
d
dx
(x2) +
d
dx
(y2)− d
dx
(4) = 0⇒ 2x+ 2y dy
dx
= 0⇒ dy
dx
= −x
y
.
4
Observe que a relação x2 +y2−4 = 0 define duas funções diferenciáveis y =
√
4− x2, y =
−
√
4− x2 no intervalo (−2, 2) as quais são as soluções da equação em suas formas expĺıcitas.
Do mesmo modo que uma equação pode não ter soluções, essas soluções, em existindo,
podem não ser únicas.
Exemplos:
17. É imediato verificar que, para cada constante k ∈ R, y = kex2 é uma solução para a
equação
dy
dx
= 2xy.
A função y é chamada famı́lia a um parâmetro de soluções dessa equação. A solução
trivial é um membro dessa famı́lia, basta tomar k = 0.
18. Dado qualquer c ∈ R, y = c
x
+ 1 é uma solução para x
dy
dx
+ y = 1 em (0,+∞).
19. Sendo conhecida uma, ou mais de uma, solução de uma equação diferencial, podemos
“construir”novas soluções. As funções y1 = cos 4x, y2 = sin 4x são soluções para
a equação y′′ + 16y = 0, o que imediato verificar. Multiplicando essas funções por
quaisquer constantes, tembém é imediato ver que y3 = k1cos 4x, y4 = k2 sin 4x são
novas soluções para essa mesma equação. Analogamente, se somarmos quaisquer desas
soluções obtemos outras soluções para a equação.
Esse fato é conhecido como Prinćıpio da Superposição para Equações Homogêneas e
será generalizado posteriormente.
Quando resolvemos uma equação diferencial de ordem n, F (x, y, y′, . . . , y(n)) = 0, espe-
ramos obter uma famı́lia G(x, y, k1, . . . , kn) = 0 chamada famı́lia a n-parâmetros de soluções
de F (x, y, y′, . . . , y(n)) = 0. Ao escolhermos parâmetros espećıficos nessa famı́lia, obtemos o
que chamamos de uma solução particular da equação. Uma solução de uma equação que não
pode ser obtida especificando-se parâmetros em uma famı́lia de soluções é chamada solução
singular.
Se toda solução para F (x, y, y′, . . . , y(n)) = 0 em um intervalo I puder ser obtida de
G(x, y, k1, . . . , kn) = 0 por uma escolha apropriada dos parâmetros ki, i = 1, . . . , n, dizemos
que a famı́lia a n−parâmetros é a solução geral para a equação diferencial.
Exemplos:
20.. A função x(t) = e2t é uma soluçãoda equação x′′ − 5x′ + 6x = 0.
21. x(t) =
t2
2
é uma solução da equação (x′)2 − 2tx′ + t2 = 0.
22. y(x) = ex
2
é uma solução de y′ = 2xy.
5
EXERCÍCIOS SUGERIDOS:
1. Defina solução de uma equação diferencial.
2. Prove que o problema de Cauchy
x′ = f(t, x), x(t0) = x0 (4)
é equivalente à equação integral
x(t) = x0 +
∫ t
t0
f(s, x(s)) ds. (5)
Isto é, se t0 ∈ I, uma função φ : I → Rn cujo gráfico está, contido em Ω é uma solução
de (4) se, e somente se, é solução de (5).
3. Nos itens a seguir, verifique se cada função dada é solução da equação diferencial.
(a) y′′ − y = 0; y1(t) = et, y2(t) = cosh t
(b) y′′ + 2y′ − 3y = 0; y1(t) = e−3t, y2(t) = et.
(c) ty′ − y = t2; y = 3t+ t2.
(d) y′ − 2ty = 1; y = et
2
∫ t
0
e−s ds+ et
2
.
4. Encontre valores de λ para que y = eλx seja solução para cada equação
(a) y′′ − 5y′ + 6y = 0 (b) y′′ + 10y′ + 25y = 0.
5. Encontre valores de λ para que y = xλ seja solução para cada equação
(a) x2y′′ − y = 0 (b) x2y′′ + 6xy′ + 4y = 0.
6. Prove que y1 = 2x+ 2 e y2 =
−x2
2
são soluções de y = xy′ +
(y′)2
2
. As funções c1y1 e
c2y2, com c1 e c2 constantes arbitrárias, são também soluções dessa equação? A soma
y1 + y2 é solução?
7. Os passos indicados nesse exerćıcio nos levarão a dedução da equação de movimento
de um pêndulo (equação (9), da leitura 1). Suponha que a barra do pêndulo é rigida e
sem peso, que a massa é pontual e que não existe atrito ou resistência em algum ponto
do sistema.
(a) Suponha que a massa está em uma posição deslocada arbitrária, indicada pelo
ângulo θ. Desenhe um diagrama mostrando as forças que agem sobre a massa.
(b) Aplique a lei do movimento de Newton na direção tangencial ao arco circular sobre
o qual a massa se move. Então, a força de tensão sobre a barra não aparece na
equação. Note que é necessário encontrar a componente da força gravitacional na
direção tangencial. Note, também, que a aceleração linear (para diferenciá-la da
aceleração angular) é `
d2θ
dt2
, onde ` é o comprimento da barra.
6
(c) Soimplifique o resultado obtido no item (b) para obter a equação (1) do texto
(equação do pêndulo)
8. Um outro modo de se obter a equação do pêndulo baseia-se no prinćıpio de conservação
da energia.
(a) Mostre que a energia cinética T do pêndulo em movimento é
T =
1
2
m`2
(
dθ
dt
)2
.
(b) Mostre que a energia pontencial V do pêndulo, em relação a sua posição de repouso
é
V = mg`(1− cos θ).
(c) Pelo prinćıpio de conservação da energia, a energia total E = T + V é constante.
Calcule
dE
dt
, iguale a zero e mostre que a equação resultante pode ser reduzida à
equação do pêndulo.
9. Uma terceira dedução da equação do pêndulo depende do prinćıpio do momento angu-
lar: a taxa de variação do momento angular em torno de um ponto é igual ao momento
externo total do mesmo ponto.
(a) Mostre que o momento angular M em torno do ponto de apoio é dado por M =
m`2
dθ
dt
.
(b) Iguale
dM
dt
ao momento da força gravitacional e mostre que a equação resultante
pode ser reduzida à equação do pêndulo. Note que os momentos positivos são no
sentido trigonométrico.
10. Veja os exerćıcios do livro do Zill, caṕıtulo 1, seção 1.1.
Referências Bibliográficas
[1] Boyce, W. E. e DiPrima, R. C. – Equações Diferenciais Elementares e Problemas de
Valores de Contorno. 8ed. Rio de Janeiro, L.T.C.
[2] Doering, C. I. e Lopes., A. O. – Equações Diferenciais Ordinárias. Matemática Univer-
sitária. Rio de Janeiro: IMPA, segunda edição, 2007.
[3] Palis Jr, J. e Melo, W. – Introdução aos Sistemas Dinâmicos. Projeto Euclides. Rio de
Janeiro: IMPA, 1978.
[4] Sotomayor, J. – Lições de Equaçõe Diferenciais Ordinárias. Projeto Euclides. Rio de
Janeiro: IMPA, 1979.
[5] Zill, D. G. e Cullen, M. R. – Equações Diferenciais, vol. 1. São Paulo, PEARSON, 2007.
7
	Referências

Continue navegando