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Livro_Amazônia(s) em História(s) diversidade, ensino e política

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Prévia do material em texto

Karla Leandro Rascke
Valéria Moreira Coelho de Melo
(Organizadoras)
Amazônia(s) 
em História(s)
Diversidade, ensino e política
Karla Leandro Rascke
Valéria Moreira Coelho de Melo
(Organizadoras)
Amazônia(s) em História(s): 
diversidade, ensino e política
1ª edição
Marabá-PA, 2021
 
© Karla Leandro Rascke, Valéria Moreira Coelho de Melo (Organizadoras) 2021.
A reprodução não autorizada desta publicação, por qualquer meio, 
seja total ou parcial, constitui violação da Lei nº 9.610/98.
Imagens capa e contracapa
Valéria Moreira Coelho de Melo
Projeto Gráfico e Diagramação
Rosivan Diagramação & Artes Gráficas
Catalogação da Publicação na Fonte.
Amazônia(s) em História(s): diversidade, ensino e política 
[recurso eletrônico] / Karla Leandro Rascke e Valéria 
Moreira Coelho de Melo (organizadoras). – Marabá: Rosivan 
Diagramação & Artes Gráficas, 2021.
1 PDF.
ISBN 978-65-993583-6-4
1. Ensino – História – Amazônia. 2. Política. 3. Recursos 
naturais. 4. Diversidade. I. Rascke, Karla Leandro. II. Melo, 
Valéria Moreira Coelho de.
CDU 908:93/94(81)
A489
Elaborada por Verônica Pinheiro da Silva CRB-15/692.
SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO
USO DOS RECURSOS NATURAIS NO SUL E SUDESTE DO PARÁ: OS 
IMPACTOS DA MINERAÇÃO E PROJETOS DE INFRAESTRUTURA 
SOBRE POVOS E COMUNIDADES TRADICIONAIS
Rita de Cássia Pereira da Costa
Valéria Moreira Coelho de Melo
Fabiano Campelo Bechelany
AUSÊNCIAS E SILENCIAMENTOS: APONTAMENTOS ACERCA 
DO COMPONENTE HISTÓRIA NO DOCUMENTO CURRICULAR 
DE RORAIMA
Monalisa Pavonne Oliveira
DESCOLONIZAR E ENEGRECER O ENSINO DE HISTÓRIA: UM 
OLHAR INTERSECCIONAL SOBRE RELATOS DE ESTUDANTES 
NEGRAS DO SUL DO PARÁ
Andreia Costa Souza
Dernival Venâncio Ramos Júnior
EDUCAÇÃO, EXPERIÊNCIA E JUVENTUDE: ESTUDANTES 
QUILOMBOLAS E A ESCOLA EM ARAGUATINS-TO
Luciano Laurindo dos Santos
Luziane Laurindo dos Santos
POLÍTICAS EM MOVIMENTO: AÇÕES AFIRMATIVAS PARA A 
GRADUAÇÃO NA UNIFESSPA/PA E NA UDESC/SC (2009-2019)
Janine Soares da Rosa de Moraes
Karla Leandro Rascke
Vera Márcia Marques Santos
O PROFHISTÓRIA E O ENSINO DE HISTÓRIA DA ÁFRICA E 
DA DIÁSPORA: OLHARES SOBRE AS DISSERTAÇÕES DOS 
PROGRAMAS DA REGIÃO NORTE DO BRASIL (2014-2020)
Karla Leandro Rascke
SOBRE AS AUTORAS E OS AUTORES
6
10
36
63
88
113
136
165
6 | Amazônia(s) em História(s): diversidade, ensino e política 
APRESENTAÇÃO
Conhecida, sobretudo, pela riqueza biológica, a Amazônia é lugar 
também de grande diversidade étnica, racial, social e cultural. Este as-
pecto é, entretanto, muitas vezes invizibilizado/silenciado, por meio, entre 
outras coisas, da dissolução da alteridade em uma ideia de diversidade ge-
nérica e pelo apagamento deliberado de sujeitos e grupos sociais da histó-
ria oficial da região. Tendo em vista que e nas escolas e nas universidades 
do Norte do país a presença de pretos, pardos, indígenas, quilombolas, 
Mulheres Quebradeiras de Coco Babaçu, de moradores do campo é mui-
to marcante, torna-se imperativo problematizar como tornar significativa 
a história ensinada quando os currículos e os materiais didáticos utiliza-
dos, permanecem, em muitos casos, pautados em uma lógica colonial, 
eurocêntrica e circunscritos a realidades de outras regiões do país.
Quais as dimensões e as implicações desse silenciamento nas tra-
jetórias desses sujeitos que frequentemente se veem à margem da histó-
ria? Como sujeitos e coletivos locais se articulam de modo a fazer fren-
te às violências e silenciamentos? Como esse processo de apagamento 
pode ser percebido nas escolas de Educação Básica e nos cursos de for-
mação de professores de História? Desafios que envolvem as demandas 
do presente, de viveres e saberes de diferentes povos e culturas, além 
universos ocidentais, mobilizam pesquisadores e pesquisadoras em tor-
no de fazeres da Amazônia.
Essas são algumas das questões que motivam a presente cole-
tânea. Ela reúne textos que, tomados em conjunto, lançam luz sobre a 
complexidade de processos e aspectos que caracterizam a região nos re-
metendo para possibilidades e desafios que nela perpassam a formação 
de professores e o ensino de história. 
Compete evidenciarmos um pouco da origem dessa coletânea 
e seu percurso, permitindo vislumbrar caminhos e compreender cone-
xões mesmo que entre capítulos com temáticas em especificidades que 
as potencializam e suscitam aprendizados sobre diferentes universos 
Amazônia(s) em História(s): diversidade, ensino e política | 7 
culturais. Assim, de antemão, essa apresentação também é momento 
de agradecimento, pois esse material é fruto de um esforço coletivo 
do corpo docente do Mestrado Profissional em Ensino de História 
(ProfHistória) da Unifesspa (campus Xinguara). Na figura do coor-
denador, Prof. Dr. Bruno Silva, agradecemos a todo o corpo docente 
que contribui para que o curso seja de qualidade e impacte a realida-
de educacional da região Norte. 
Oportunamente, sem cada um dos autores e das autoras que 
dedicaram tempo e reflexões valiosas em cada um dos textos que 
compõem esse material, nada seria possível para leitura e construção 
de conhecimento no âmbito de pesquisas acadêmicas. Esse produto 
em forma de E-book é coletivo, colaborativo e articulado a questões 
da realidade social.
A dinâmica de escolha de pesquisadores e temáticas passou 
por alguns aspectos e quesitos, dado tratar-se de uma publicação 
vinculada ao ProfHistória. Nesse sentido, essa obra possui debates 
conectados à Amazônia e suas diversidades, num esforço de valo-
rizar produções dessa região e sobre essa região. Ainda, em termos 
de autorias, todos os capítulos possuem autores ou autoras que inte-
gram a Rede do ProfHistória, sejam docentes ou discentes, incluindo 
ex-alunos e ex-alunas, recém-mestres.
Essa coletânea também constitui movimentos de pesquisas 
ancoradas em possibilidades outras, de epistemologias dos povos 
que compõem as multiplicidades de experiências da e na Amazônia. 
Contendo abordagens vinculadas ao ensino de História e aos viveres 
dos sujeitos dessa Amazônia plural, esse E-book procurou articular 
perspectivas anticolonias, emancipadoras e antirracistas, em estudos 
sobre sujeitos históricos subalternizados, marginalizados e social-
mente alienados de muitos direitos. 
Abrindo as produções, temos o texto “Uso dos recursos naturais 
no sul e sudeste do Pará: os impactos da mineração e projetos de infraes-
trutura sobre povos e comunidades tradicionais”. Elegendo como recor-
8 | Amazônia(s) em História(s): diversidade, ensino e política 
te geográfico a porção Sudeste do estado do Pará, os autores colocam 
em relevo relatos e experiências de diferentes grupos sociais locais em 
relação a conflitos socioambientais identificados na região em questão. 
Além de nos conduzir por entre aspectos importantes da história de ocu-
pação da região, o texto enfatiza as estratégias de resistência de Mulheres 
Quebradeiras de Coco, do povo indígena Akrãtikatêjê e de Agricultores 
Acampados no município de Canaã dos Carajás-PA frente a disputas ter-
ritoriais e pelo acesso a recursos naturais. Questiona, dessa maneira, po-
líticas estatais e determinadas interpretações acadêmicas que a partir de 
uma lógica hegemônica de pensar o desenvolvimento e a utilização dos 
recursos naturais, negam a história e as formas de existir desses grupos.
Já o texto “Ausências e silenciamentos: apontamentos acerca do 
componente História no documento curricular de Roraima”, ao evidenciar 
lacunas identificadas na proposta de currículo elaborada no estado de Ro-
raima, nos remete às especificidades locais e, ao mesmo tempo, à necessi-
dade e desafios em torno da inclusão da história regional nos currículos. 
Oportunamente, destaca como diferentes sujeitos históricos permanecem à 
margem dos processos históricos legitimados e ensinados na escola, como é 
o caso dos povos africanos, dos povos indígenas e quilombolas.
Os relatos de interlocutores da pesquisa articulam o cerne da 
análise construída no texto “Descolonizar e enegrecer o ensino de histó-
ria:um olhar interseccional sobre relatos de estudantes negras do sul do 
Pará”. Por meio das narrativas de três estudantes negras de uma escola 
pública localizada no município de Conceição do Araguaia-PA, os auto-
res chamam atenção para a importância de lançar luz sobre a trajetória 
de sujeitos “ainda invisíveis em diversos espaços que trazem histórias 
inquietantes de subordinação, opressão e resistência”. Aqui, é o ambien-
te escolar, o ensino de história e a discussão de gênero que ganham ên-
fase para a reflexão sobre o processo de cruzamento entre opressões, 
agências e construções identitárias. 
“Educação, Experiência e Juventude: Estudantes Quilombolas e 
a Escola em Araguatins-TO” traz à tona vozes de diferentes estudantes 
quilombolas e suas experiências na escola, enfatizando dificuldades so-
Amazônia(s) em História(s): diversidade, ensino e política | 9 
ciais e os impactos do racismo no cotidiano. O desafio da escola, en-
quanto instituição que se propõe inclusiva, também é discutido nesse 
texto, compreendendo o conceito de juventude como balizador para or-
ganizar o ensino de forma sistematizada, o qual insere-se no processo de 
construção do conhecimento.
As autoras de “Políticas em Movimento: Ações Afirmativas para 
a Graduação na Unifesspa/PA e na UDESC/SC (2009-2019)” discutem 
aspectos legais nacionais e regionais e os percursos institucionais da 
Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (Unifesspa) e da Univer-
sidade do Estado de Santa Catarina (UDESC) em relação à criação e a 
consolidação de políticas de ação afirmativa para a graduação. A partir 
de pesquisa realizada no contexto de acordo de cooperação técnico-
-científico estabelecido entre as duas universidades, as autoras abordam 
e historicizam perspectivas e diálogos sobre ações afirmativas no Ensino 
Superior. Contribuem desta maneira, para a necessária reflexão sobre as 
políticas voltadas para o acesso e a permanência de diferentes grupos 
sociais nas universidades brasileiras.
O debate crítico acerca do ensino de História, bem como a im-
portância de ampliação de determinadas temáticas, é assunto do último 
texto desse E-book: “O ProfHistória e o ensino de história da África e 
da cultura afro-brasileira: olhares sobre as dissertações dos programas da 
região Norte do brasil (2014-2020)”. A partir da análise das dissertações 
defendidas no ProfHistória na região Norte, a autora nos instiga a refle-
xão sobre o espaço que pode ser expandido para o ensino de História 
da África e da cultura afro-brasileira observado no contexto da matriz 
curricular do Mestrado Profissional em História.
Convidamos cada um e cada uma a percorrer as linhas dessa tes-
situra de histórias, memórias e narrativas sobre uma Amazônia que aqui 
se mostra plural, por meio dos desafios postos e pelas formas que sujeitos 
diversos nela existem e resistem. Do imergir constante desses homens e 
mulheres, das mais diferentes origens e atuações no mundo, trazemos à 
tona as vidas que se refazem, se reconectam, se repensam e se reestabele-
cem no cotidiano de suas lutas por dignidade, justiça e felicidade.
10 | Amazônia(s) em História(s): diversidade, ensino e política 
USO DOS RECURSOS NATURAIS NO SUL 
E SUDESTE DO PARÁ: OS IMPACTOS DA 
MINERAÇÃO E PROJETOS DE INFRAESTRUTURA 
SOBRE POVOS E COMUNIDADES TRADICIONAIS
Rita de Cássia Pereira da Costa
Valéria Moreira Coelho de Melo
Fabiano Campelo Bechelany
As estratégias governamentais e empresariais desenvolvidas na 
Amazônia brasileira, nos últimos anos, têm se voltado para a intensi-
ficação da exploração dos recursos naturais. Esse movimento reedita a 
atuação do Estado brasileiro na década de 1970, com planos de integra-
ção e desenvolvimento da região amazônica fundamentados em gran-
des projetos de infraestrutura e atividades econômicas agroextrativas. 
A expansão da fronteira econômica atual, com efeito, articula outros 
limites econômicos e políticos, mas atualiza semelhantes conflitos so-
ciais, territoriais e ambientais, que persistem e se ampliam, impactando 
a população e a natureza na Amazônia.
A porção sudeste do estado do Pará, localizada na confluência 
de dois grandes rios do território brasileiro — Araguaia e Tocantins — 
concentra fortes traços característicos desse processo histórico. Essa 
mesorregião é caracterizada por um considerável dinamismo socioe-
conômico, pautado em atividades extrativistas e agrárias centrais para o 
planejamento estatal. 
Se retomarmos a história de ocupação da região, veremos que 
sua ocupação mais intensiva se dá, sobretudo, a partir do século XX. Na 
década 1960, deu-se início à implantação de grandes empreendimentos 
e obras de infraestrutura, a fim de integrar a Amazônia ao restante do 
país. As construções da rodovia Transamazônica e da Usina Hidrelétri-
ca (UHE) de Tucuruí, bem como a implantação de polos minero-me-
talúrgicos e agropecuários e ainda projetos de colonização conduzida 
Amazônia(s) em História(s): diversidade, ensino e política | 11 
constituem alguns exemplos. Para entender o contexto dos conflitos que 
passam a se intensificar com esse processo, é preciso ter em vista que o 
sudeste do estado do Pará é caracterizado pela presença de uma miría-
de de grupos sociais e étnicos. Povos nativos e grupos sociais chegados 
em decorrência das migrações espontâneas e sazonais e das políticas de 
colonização dirigida (VELHO, 2013). Além daqueles oriundos de pro-
cessos migratórios diversos e mais recentes.
Associado ao esforço de ocupação regional pela produção agro-
pecuária, desenvolveu-se, no sudeste paraense, o maior projeto minera-
lógico do país, envolvendo exploração mineral e instalação de infraestru-
tura industrial. Criado na década de 1980 pela então estatal Companhia 
Vale do Rio Doce (CVRD), o Programa Grande Carajás (PGC) figura 
entre as ações do Estado executadas na região com essa finalidade. Sua 
abrangência, em uma área de 900 mil km2, englobava áreas da região 
sudeste do Pará e porções dos estados do Tocantins e Maranhão.
O Programa teve como ação principal viabilizar a extração de 
minério de ferro da Serra dos Carajás e, paralelamente, subsidiar o de-
senvolvimento de projetos agropecuários e da indústria de beneficia-
mento primário. Dentre as obras de infraestrutura construídas para dar 
suporte à atividade mineradora na região, está a Estrada de Ferro Cara-
jás (EFC), erigida na década de 1980. Perfazendo o chamado Corredor 
Carajás, a ferrovia tem 892km de extensão. Com a extinção do PGC e 
privatização da CVRD, o controle da mineração e de parte da infraes-
trutura, construída pelo Estado para viabilizar essa atividade, passou 
para a empresa Vale, que se tornou uma das maiores corporações do 
setor no mundo, com atuação diversificada em inúmeras regiões do pla-
neta. Uma das mudanças significativas da privatização refere-se à apro-
priação privada de diversas terras do sudeste paraense pela empresa, 
reorganizando a estrutura fundiária e gerando intensificação das restri-
ções de acesso à terra por camponeses.
Antes da implantação dos grandes projetos, apesar das tensões 
com os nativos, as transformações territoriais ainda eram de pequena 
escala. Em certos casos, os grupos sociais constituídos por força dos 
12 | Amazônia(s) em História(s): diversidade, ensino e política 
deslocamentos tinham, como alternativas de subsistência, a agricultura, 
o extrativismo, a caça, a coleta e a garimpagem (VELHO, 2013; MAGA-
LHÃES, 2002). Da posse temporária, fundada na sazonalidade dessas 
práticas, vigora uma memória sobre o acesso livre à terra e aos recursos 
naturais. Mas, aos poucos, a apropriação da terra ganhou outra lógi-
ca. Hoje, o Sudeste paraense é uma área bastante antropizada, restando 
apenas manchas de floresta amazônica, constituídas, sobretudo, pelas 
terras indígenas e pelas unidades de conservação.
As experiências de implantação dos grandes projetos, nessa re-
gião, têm se caracterizado por políticas autoritárias com fortes impac-
tos socioambientais,e pelo desencadeamento e acirramento de conflitos 
e violências. Assim, o Sudeste do Pará se notabilizou pela violência no 
campo e contra agentes sociais dedicados à causa ambiental e à luta por 
direitos (ALMEIDA, 1995; HALL, 1989). Os conflitos e as resistências 
têm tido como resultado a constituição de movimentos sociais variados e 
constituídos por identidades coletivas diferenciadas, com a forte marca da 
luta pela terra. Nessa perspectiva, e com o objetivo de levantar e sistema-
tizar um conjunto de informações sobre as situações sociais observáveis 
na região em questão, ganha sentido iniciativas de mapeamento social de 
povos e comunidades tradicionais impactados por grandes projetos.
A dinâmica regional sugere uma configuração territorial que 
redefine as relações das categorias sociais, compostas por sujeitos que 
nasceram e vivem na região, ou que para ela migraram, sobretudo, atraí-
dos pelas possibilidades de emprego prometidas pelas novas atividades 
econômicas. Nesse novo tecido social, distintos grupos se destacam por 
suas identidades singulares, construídas a partir da dinâmica sociopro-
dutiva estabelecida no território por eles ocupado. É por meio das expe-
riências desses grupos sociais diferenciados que este trabalho procura 
pensar a relação entre os projetos desenvolvimentistas implantados na 
região Sudeste do estado do Pará e seus impactos socioambientais. Para 
tanto, evidenciamos as experiências de três grupos, que serão descritos 
em seguida. São eles: as mulheres Quebradeiras de Coco Babaçu; o povo 
indígena Gavião Akrãtikatêjê e os Agricultores Acampados do municí-
pio de Canaã dos Carajás.
Amazônia(s) em História(s): diversidade, ensino e política | 13 
Trabalhamos, aqui, com o material etnográfico obtido em pro-
cessos de mapeamento social, cuja finalidade é, por meio da autocarto-
grafia, identificar e registrar um conjunto de situações. A autocartogra-
fia permite que os próprios agentes sociais externem as situações sociais 
a partir de categorizações e simbolizações que lhes são próprias, me-
diante relatos, narrativas e elaboração de mapas. Assim, pautado em ex-
periências de cartografia social, o objetivo é mapear os esforços mobili-
zatórios de grupos sociais, “[...] descrevendo-os e georreferenciando-se, 
com base no que é considerado relevante pelas próprias comunidades 
estudadas.” (ALMEIDA; FARIAS JÚNIOR, 2013, p. 28). 
Com os dados obtidos, é possível refletir acerca das experiências 
das ecologias políticas dos grupos que participam ativamente das ativi-
dades que compõem o mapeamento. Procura-se analisar como esses co-
letivos — a partir de suas experiências sociais —, vivenciam e pensam os 
impactos da mineração e de grandes projetos de infraestrutura e como 
reagem a eles. O processo de mapeamento social junto às Quebradeiras 
de Coco Babaçu e ao povo indígena Gavião Akrãtikatêjê se deu entre 
2011 e 2014. Já o trabalho junto aos Agricultores Acampados de Canaã 
dos Carajás, ocorreu entre 2017 e 2019.
Mulheres Quebradeiras de Coco Babaçu: mobilização e simbolismo 
ecológico nos babaçuais
As mulheres Quebradeiras de Coco Babaçu do Sudeste do Pará 
formam parte de uma das “[...] diferentes unidades sociais, designadas 
como povos e comunidades tradicionais [...]” (ALMEIDA 2017, p. 9) 
presentes na região. Com tradições culturais vinculadas ao extrativismo 
do babaçu (Orbignya phalerata), suas experiências, na vasta região que 
ocupam, dão-se por meio de um rico conhecimento, determinado por 
um “[...] conjunto de saberes e saber-fazer a respeito do mundo natural 
e sobrenatural transmitido oralmente de geração em geração.” (DIE-
GUES; ARRUDA, 2001, p. 31–32).
14 | Amazônia(s) em História(s): diversidade, ensino e política 
As mulheres Quebradeiras de Coco Babaçu — tomadas, aqui, 
como um conjunto que define um grupo social —, são mulheres que 
se encontram em diferentes povoados e municípios de uma região que 
engloba e transcende o sudeste paraense. Nessa área, entretanto, elas 
se situam, principalmente, nos seguintes municípios: São João do Ara-
guaia, São Domingos do Araguaia, Palestina do Pará e Brejo Grande 
do Araguaia. Aí são constituídas suas experiências de vida mobilizadas 
em movimentos sociais, a partir de grupos locais que integram a seção 
“Regional Pará” do Movimento Interestadual das Quebradeiras de Coco 
Babaçu (MIQCB), organização presente em quatro estados da federa-
ção: Piauí, Tocantins, Maranhão e Pará.
No seu cotidiano e nas suas mobilizações, projetadas no campo 
político, as Quebradeiras de Coco Babaçu, organizadas com base em 
uma identidade coletiva, atuam em defesa do acesso livre aos babaçuais 
açambarcados pelos grandes proprietários de terra (ALMEIDA, 2011). 
O conflito social, no caso dessas mulheres extrativistas, dá-se pelo 
efeito dos processos históricos de ocupação que resultaram em áreas 
de concentração de terra, justificadas ou voltadas à indústria pecuária. 
Ressalta-se, também, o fato de a região ser representada como grande 
território mineral e, portanto, estar submetida aos reveses de projetos 
rodoviários, hidrelétricos e hidroviários. Em choque com essas deman-
das incidentes e com impactos sobre o território e recursos naturais, 
atuam as quebradeiras de coco.
É corrente e emblemático, no dizer dessas mulheres, que, antes, 
a terra “não era de dono”. E o ingresso nessas terras, em sua maioria, se 
dava mediante o livre acesso, em regime de uso caracterizado pela pos-
se, mais do que a propriedade formal. Narrativas como a de Cledeneuza 
Oliveira (2017) assinalam esse aspecto:
A gente não era diretamente dono de lote. Só alguns 
cercavam de madeira e ficavam usando aquela parte 
dele, e outros não, hoje fazia uma roça aqui, duas roças 
aí: “não aqui já não tá bom!”. Ia fazer mais distante. 
A criação do outro perturbava, ele já ia pra frente. A 
terra não era de dono, era só onde a gente quisesse 
Amazônia(s) em História(s): diversidade, ensino e política | 15 
ficar. Só dos anos sessenta – começou 68 – já começou 
cada um já tirar seu pedaço e dizer: “eu vou ficar aqui” 
(OLIVEIRA, 2017, p. 35).
Grande parte dos povoados e das terras onde vivem as que-
bradeiras de coco passou por processos de apropriação e expropria-
ção em diferentes momentos. Muitas dessas áreas incidem em an-
tigos castanhais, de onde se retira a castanha-do-pará (Bertholletia 
excelsa), um importante recurso que constituiu atividade econômica 
central na região durante o início do século passado até a década de 
1970. A princípio de livre acesso, esses castanhais coexistiam com os 
babaçuais nativos e outras vegetações. Posteriormente, essas áreas 
se tornaram objeto de exploração intensiva, com fins extrativos e 
madeireiros, e, por fim, deram lugar às grandes pastagens para a pe-
cuária intensiva na região (EMMI, 1987).
Ao longo dos anos, e, sobretudo, a partir das décadas de 1960, 
tem-se uma aceleração dos processos de controle institucional e empre-
sarial sobre o território, atrelada à produção e à circulação de merca-
dorias. Atualmente, boa parte das florestas de babaçu é secundária, em 
diferentes estágios de formação e em abundante florescência em áreas 
desmatadas. Assim sendo, as pesquisas em cartografia e mapeamento 
social têm indicado que a chamada região ecológica dos babaçuais se 
encontra em processo de expansão (NCSA, 2019).
As etapas da biologia da planta, atreladas a aspectos políticos, 
econômicos e culturais, fazem parte do repertório social das quebradei-
ras de coco. Suas narrativas permitem alargar a compreensão da ocor-
rência da espécie em termos geográficos e sob o ângulo da memória e 
da vida social no presente. Nessas histórias narradas, vários antigos po-
voados (hoje municípios) são indicados como referência no comércio 
da amêndoa do babaçu. Narram, assim, as práticas históricas, as atri-
buições de uso do território e as percepções acerca dessas áreas de exis-
tência de babaçuais, que se articulam a outras formas da relação entre 
os agentes sociais ea biodiversidade amazônica, como lugares de caça, 
coleta, cultivos de roças e criações.
16 | Amazônia(s) em História(s): diversidade, ensino e política 
Em diferentes ocasiões da pesquisa, as mulheres extrativistas des-
creveram as práticas atuais relacionadas ao recurso do babaçu, e refleti-
ram sobre quais são as várias situações que impactam o território e os re-
cursos naturais, provocando mudanças ambientais (alusivas à devastação 
das florestas na região), e situações de conflitos explícitos ou velados.
Nessas áreas, onde vivem e atuam as quebradeiras de coco, en-
contram-se vários projetos de assentamento que compõem um capítulo 
sem o qual não é possível compreender a história da região. As tensões 
fundiárias que sucederam o conflito político-militar entre o Estado e os 
integrantes do Partido Comunista, no início da década de 1970, conheci-
do como “Guerrilha do Araguaia”, resultaram na forte repressão pratica-
da pelo Estado brasileiro, mas também favoreceram a emergência da luta 
pela posse da terra na região. A grande presença de trabalhadores sem 
acesso à terra e ao trabalho ganhou força nos fluxos migratórios diante da 
pressão sobre as terras nos estados vizinhos ao Pará, a propaganda gover-
namental em torno da colonização da Amazônia e a atração dos garim-
pos, como Serra Pelada (MAGALHÃES, 2002; VELHO, 2013).
Sem serem absorvidos como força de trabalho, muitos desses 
sujeitos mobilizados em entidades representativas empreenderam o 
movimento de conquista da terra. As narrativas da liderança local do 
movimento das quebradeiras de coco, Cledeneuza Oliveira, detentora 
de oratória pujante, apontam para as condições vividas nesse momento 
histórico. Ela é parte de uma das famílias que, no passado, empreende-
ram sucessivos deslocamentos em busca de terra e trabalho, dedicando-
-se a diferentes atividades à procura do sustento familiar. Os garimpos e 
o extrativismo da castanha, da borracha (Hevea brasiliensis) e do baba-
çu, além dos cultivos de roças, constituíram algumas das modalidades 
de trabalho exercidas no contexto da apropriação do território ocupado 
na região em estudo. Esse processo de ocupação e luta pela posse da ter-
ra, protagonizado pela família de Cledeneuza e por outras famílias, teve 
como consequência a constituição de vários projetos de assentamentos.
Nos relatos de Cledeneuza Oliveira, a luta pela terra emerge 
como aspecto fundamental da atuação dos agentes sociais na região. 
Amazônia(s) em História(s): diversidade, ensino e política | 17 
Ela chama a atenção para o papel das Comunidades Eclesiais de Base 
(CEB’s) do Movimento de Educação e Base (MEB) e da Comissão Pas-
toral da Terra (CPT) no contexto dessa mobilização social. Segundo 
Cledeneuza, o apoio prestado por essas instituições na organização e na 
atuação sindical dos trabalhadores rurais foi fundamental no processo 
de ocupação e conquista da terra. Como lembra Cledeneuza, “Tinha 
aquela Campanha da Fraternidade: ‘terra para todos’. Aí a gente come-
çou a pensar que se a terra é de todos, então vamos ocupar!” (OLIVEI-
RA, 2017, p. 33).
Nesse contexto, anos posteriores à década de 1980, a geografia 
do Sudeste do Pará se configura pela presença de projetos de assenta-
mento. Grandes latifúndios foram ocupados e parte deles foi transfor-
mada pelo Estado em assentamentos para os trabalhadores da agricul-
tura familiar (OLIVEIRA, 2017).
Apesar da importância e conquista da terra por muitos desses 
agentes sociais, boa parte das mulheres Quebradeiras de Coco Babaçu 
não dispõe da terra e do território livre para obtenção do babaçu. No 
dizer de Cledeneuza Oliveira, até hoje se está “enfrentando conflito” 
e “dificuldade” no que se refere à disponibilidade de terras para as-
sentamento. Não obstante às conquistas, parte das terras passou pelos 
reveses da reconcentração fundiária, em que pequenos lotes são acu-
mulados por um proprietário.
Além da dificuldade na garantia da terra e do território subme-
tido às dinâmicas socioambientais com ingerência sobre a natureza e na 
divisão desigual dos recursos, as Quebradeiras de Coco Babaçu também 
consideram outras ameaças que impactam o recurso do babaçu. Nos 
relatos e denúncias, elas apontam várias estratégias adotadas por seus 
opositores, que implicariam a perda e devastação dos babaçuais. Uma 
delas é a derrubada das palmeiras adultas, quando consideradas entra-
ves às práticas agropecuárias.
As perdas e ameaças à espécie do babaçu também ocorrem pelo 
envenenamento das pindovas — árvores jovens, consideradas infestan-
18 | Amazônia(s) em História(s): diversidade, ensino e política 
tes (invasoras) nessa fase. Quando extirpadas, portanto, inviabilizam 
o crescimento de novos babaçuais. Além disso, as mulheres apontam 
a queima do coco inteiro em fornos de cerâmicas, no beneficiamento 
mineral de ferro gusa, entre outras utilizações. Isso significa a perda da 
amêndoa, que é de grande importância no processo de aproveitamento 
da espécie. Outra prática que ameaça o recurso babaçu, no dizer das 
extrativistas, é o “arrastão”, ou seja, a derrubada efetuada por trator e 
correntes. Ou, ainda, a prática de ceifar o entorno, de forma que a pal-
meira permanece erguida, mas, com o tempo e o vento, tende a cair — 
argumenta Cledeneuza Oliveira (2017).
Como lembra o antropólogo Alfredo Wagner de Almeida, “[...] 
os empreendimentos dos agronegócios, que hoje se expandem por esta 
região ecológica dos babaçuais, desmatam para plantar eucalipto, mon-
tar pastagens artificiais e plantio de soja” (2017, p.10). Na região sudes-
te do Pará, não é diferente. A introdução desses monocultivos se dá, 
principalmente, pela chegada de espécies como o eucalipto (Eucalyptus 
grandis) e a teca (Tectona grandis L.f.), além da entrada no bioma ama-
zônico da soja (Glycine max L.) e do milho (Zea mays).
No que diz respeito à utilização de veneno para exterminar os 
babaçuais, as mulheres Quebradeiras de Coco Babaçu ampliam a aná-
lise que fazem da destruição que as afeta, incluindo, em seus relatos, a 
preocupação com o impacto dessa ação predatória sobre a terra, a agri-
cultura, os rios, as águas e as plantas.
Face a essas experiências, as Quebradeiras de Coco se mobili-
zam contra o latifúndio, pelo livre acesso e pela preservação dos baba-
çuais; por direitos sociais fundamentais e políticas públicas. Elas mo-
bilizam o babaçu na produção da sua existência material e simbólica. 
Essa mobilização é atravessada por um discurso ambiental concreto, 
pautado em ações práticas.
Em agosto de 2016, o MIQCB realizou, no sudeste do Pará, a 
apresentação da campanha anual em defesa dos babaçuais, contra a 
devastação ambiental e pelo livre acesso às florestas de babaçu. Reu-
Amazônia(s) em História(s): diversidade, ensino e política | 19 
nidas em sessão especial na Câmara Municipal de São Domingos do 
Araguaia, juntamente com representantes regionais, parceiros institu-
cionais e pesquisadores, o grupo debateu e reforçou sua agenda de luta 
pelo acesso aos babaçuais.
Habitando a chamada “região ecológica dos babaçuais”, um ter-
ritório caracterizado por características ambientais específicas e práti-
cas, e por modalidades de uso de terras particulares, as Quebradeiras 
de Coco desenvolvem relações culturais específicas com os recursos 
naturais. Essas relações ecológicas são sustentadas por complexos sabe-
res sobre a biodiversidade e por tecnologias no manejo do ecossistema 
local. As quebradeiras produzem diferentes formas de aproveitamento 
do babaçu a partir da elaboração de óleos, sabões, sabonetes, farinhas, 
artesanatos, carvão, entre outros produtos. Além dessa transformação 
da matéria-prima em bens, o babaçu é o símbolo de suas lutas nos espa-
ços de reuniões e eventos.
Nossa inserção de campo permitiu observar que as relações 
ecológicas também são refletidas em uma concepção muito própria da 
relação entre essas mulheres e a palmeira do babaçu. Nas narrativas, 
frequentemente a palmeira é mencionada como “mãe”. Osafetos esta-
belecidos nesse universo e que dominam as percepções socioecológicas 
estão, assim, compreendidos dentro de um quadro de significados em 
que o idioma do parentesco é importante e se constitui para além das 
relações estritamente humanas, abarcando entes da natureza.
Para as quebradeiras de coco, a árvore que oferece leite por meio 
de suas amêndoas guarda uma identidade com a mulher. Assim, um 
símbolo concêntrico que faz lembrar a mama feminina, estampa a cam-
panha babaçu livre. Na estampa, é possível ler a frase “Floresta de baba-
çu é vida. Deixa em pé. Deixa viver”.
Todos esses aspectos são acionados nas mobilizações políticas 
das quebradeiras de coco, estruturadas sob a identidade sociocultural e 
de gênero, e referidas nas formas de extrativismo tradicional. É funda-
mental notar que essa identidade é mobilizada, politicamente, em con-
20 | Amazônia(s) em História(s): diversidade, ensino e política 
texto de disputas, em que as quebradeiras enfrentam questões relativas 
à produção, à problemática ambiental e à luta pela terra e pelo território. 
Como mulheres, reivindicam seus direitos fundamentais e seu prota-
gonismo enquanto categoria social e identitária. É nesse sentido que, 
historicamente, a existência das quebradeiras de coco babaçu implicou 
a abertura de espaço para suas demandas nos próprios sindicatos de 
trabalhadores rurais, e a posterior constituição de uma entidade que as 
representasse — o MIQCB.
Fica claro, mediante as experiências de pesquisa entre as que-
bradeiras de coco, que a utilização do babaçu constitui uma alternativa 
de existência para muitas mulheres e suas famílias e que, além disso, 
esse modo de relacionar produz concepções, práticas e saberes vincu-
lados ao território. Quando esses aspectos se coadunam com a atuação 
política, imprimem resistência às ações e aos discursos dominantes do 
mercado sobre os usos dos recursos naturais e do espaço.
Tais ações e discursos, originados na ação empresarial e do pró-
prio Estado, apresentam uma representação da região onde as Quebra-
deiras de Coco Babaçu e os Agricultores Acampados, entre outros gru-
pos sociais, são invisibilizados. Assim, negam os símbolos do babaçu 
e afirmam a ideia de que o sudeste do Pará não forma parte da região 
de ocorrência dessa espécie e, portanto, das relações características dos 
babaçuais. Uma análise desses procedimentos, por exemplo, presentes 
nos mapas e documentos oficiais do Estado, permite identificar o pro-
cesso de denegação que visa à liberalização de suas terras por meio da 
extinção dos babaçuais. Isso ocorre através de métodos discursivos e de 
práticas de envenenamento, derrubada e queima dos babaçuais, recor-
rentemente apontados pelas mulheres.
Demarcando uma posição contrária a essa concepção, em feve-
reiro de 2019, ocorreu, no município de São Domingos do Araguaia, o 
VIII Encontrão do Movimento Interestadual das Quebradeiras de Coco 
Babaçu. Com a temática central “Mulheres Quebradeiras de Coco: Re-
sistência nos Babaçuais”, o encontro reuniu cerca de 400 participantes 
de diferentes estados e localidades. Entre parceiros e convidados, foram 
Amazônia(s) em História(s): diversidade, ensino e política | 21 
analisadas as conjunturas social e política e, nos grupos de trabalhos, 
discutidos os vários eixos temáticos ligados a organização, economia e 
educação. Além disso, ocorreram feiras de produtos naturais e artesana-
tos, e momentos culturais com homenagens, ritos e cantos.
O que a pesquisa de caráter etnográfico, as inserções de campo 
e, sobretudo, a produção da cartografia pelas próprias quebradeiras de 
coco permitem concluir é que as diferentes mulheres, em suas locali-
dades (ou em rede) e no movimento social produzem formas de resis-
tência frente às práticas estatais e do mercado, gerando uma outra sig-
nificação de território. Formulando um repertório de experiências no 
território e acerca do uso da biodiversidade no ecossistema amazônico, 
essas mulheres se mobilizam para dar a conhecer e serem reconhecidas 
em suas práticas sociais particulares que informam modos de vida das 
populações regionais.
Povos Indígenas: o caso dos Gavião Akrãtikatêjê
Outro grupo social presente na região sudeste do Pará, cuja ex-
periência singular do território se cruza com uma identidade social di-
ferenciada, são os povos indígenas. Os grupos indígenas de diferentes 
etnias que habitam a região vivenciaram, ao longo do tempo, uma sé-
rie de investidas sobre seus territórios. Contudo, a partir da década de 
1960, essa pressão aumenta. Nas décadas que se seguem, e tendo como 
justificativa a necessidade de garantir a expansão das frentes econômi-
cas, o Estado e os grupos de atuação econômica variada comprimem e 
ocupam os territórios indígenas tradicionais, alguns habitados por po-
vos que já tinham o contingente populacional drasticamente diminuído 
pelo contato com os não indígenas (FERRAZ, 1984). 
De maneira lenta, o Estado demarcou algumas terras indígenas, 
colocando os grupos em pequenas parcelas dos seus antigos territórios e 
liberando as demais áreas para atividades econômicas e urbanização da 
região. Ainda assim, algumas das terras indígenas da região possuíam 
garantias jurídicas bastante precárias até a década de 1980 (CEDI, 1985).
22 | Amazônia(s) em História(s): diversidade, ensino e política 
No processo de ocupação e desenvolvimento promovido pelo 
Estado brasileiro, as terras indígenas da região sudeste do Pará foram 
afetadas pela construção de rodovias e ferrovias, e por linhas de trans-
missão de energia que cortaram seus territórios. Outras foram, parcial ou 
totalmente, inundadas pela formação do lago da UHE de Tucuruí, grande 
obra que transformou a região. Outras, por fim, foram e ainda são im-
pactadas por mais de um desses empreendimentos. É o caso dos Awae-
té-Parakanã que, na época da construção da rodovia Transamazônica, na 
década de 1970, ainda não haviam sido contatados. Parte desse povo foi 
alvo de desastrosas ações de pacificação que resultaram em uma acentua-
da depopulação. Entretanto, não foi apenas a rodovia que redesenhou o 
território tradicional Parakanã. Parte dele ficou, também, submersa com a 
formação do lago da UHE de Tucuruí. Outra parte foi desmembrada pelo 
Grupo Executivo de Terras do Araguaia-Tocantins/Instituto Nacional de 
Colonização e Reforma Agrária (Getat/Incra) com o propósito de reas-
sentar colonos também atingidos pelo reservatório da UHE. 
Uma das atividades econômicas de intensa ação e sobreposição 
às terras indígenas é a mineração. Para além da atividade garimpeira, os 
territórios indígenas, localizadas na área de influência do Projeto Ferro 
Carajás, passaram a ser afetadas direta ou indiretamente pela extração 
do minério de ferro e por outras atividades a ela relacionadas. No início 
da implementação do programa
[...] diante de denúncias veiculadas pela imprensa 
nacional e internacional [...], sobre o não-
reconhecimento pelo governo brasileiro e pelas 
agências de desenvolvimento associadas ao PGC, 
da presença de populações indígenas na área de 
abrangência do PFC e do PGC, e sobre os impactos que 
adviriam sobre as mesmas com a implantação desses 
empreendimentos, o Banco Mundial (BIRD) – um dos 
seus principais agentes financiadores – condicionou 
a concessão de novos recursos para a continuidade 
ao PFC e ao PGC, à implementação pelo Governo 
brasileiro, de ações visando a garantia das condições 
de sobrevivência desses povos, especialmente levando-
se em conta a necessidade de demarcação das terras 
indígenas situadas na esfera de ação desses programas 
(OLIVEIRA, 2004, p. 145).
Amazônia(s) em História(s): diversidade, ensino e política | 23 
Em 1982, em decorrência da exigência do Banco Mundial, foi 
elaborado pela então CVRD o “Projeto Ferro-Carajás: Apoio às Comu-
nidades Indígenas”, voltado para a aplicação, até 1986, de 13,6 milhões 
de dólares junto a povos indígenas do Maranhão, leste do Pará e nor-
te de Goiás. Entretanto,contrariando os termos do próprio convênio, 
a maior parte do recurso foi investida na máquina administrativa da 
agência tutelar, em detrimento de ações voltadas para o fortalecimento 
e a autonomia dos povos atingidos (CEDI, 1985; OLIVEIRA, 2004).
Na TI Mãe Maria, localizada no município de Bom Jesus de To-
cantins, a 30km da cidade Marabá, residem três grupos que ficaram 
conhecidos pelo termo genérico “Gavião”, mas que se autodenominam 
Akrãtikatêjê, Kyikatêjê e Parkatêjê. Essa TI é atravessada pela EFC, linha 
ferroviária por onde é escoado o minério de ferro extraído da região. 
Além disso, é cortada pela rodovia BR-222 e por linhas de transmissão 
de alta tensão da empresa Eletronorte. Para a instalação das torres da 
linha de transmissão, foi “[...] desmatada uma faixa de 19 quilômetros 
de extensão por 150 metros de largura dentro da TI, o que resultou na 
destruição de parte significativa dos castanhais essenciais nas práticas 
socioculturais e econômicas dos Gavião.” (SANTOS; NACKE, 1988). 
Pela passagem da linha de transmissão, os Gavião foram indenizados 
em 40 milhões de cruzeiros, moeda corrente na época (CEDI, 1985, p. 
95). Outros fatores que exercem pressão sobre a TI e seus recursos é o 
fato de ela estar cercada por fazendas e cidades.
Os Akrãtikatêjê (também conhecidos como “Gavião da Mon-
tanha”) que hoje residem na TI Mãe Maria, no passado habitavam as 
cabeceiras do rio Capim. Esse grupo foi contatado, em 1958, quando 
somava em torno de 74 pessoas. Apenas três anos após o contato, a po-
pulação estava reduzida a 31 pessoas. Em 1970, a instalação do canteiro 
de obras da UHE Tucuruí foi estabelecida nas terras do Posto Indígena 
da Montanha, concedida por decreto estadual no ano de 1945. Em de-
corrência desse fato, o grupo foi transferido compulsoriamente para a 
TI Mãe Maria, onde passou a viver junto aos Kyikatêjê e aos Parkatêjê.
24 | Amazônia(s) em História(s): diversidade, ensino e política 
Payaré, o então líder dos Akrãtikatêjê, ficou conhecido pela resis-
tência em deixar seu território tradicional. Após o deslocamento com-
pulsório, Payaré empreendeu uma longa batalha judicial, de maneira 
autônoma, contra a Eletronorte. No ano de 2008, após muitos recursos, 
agravos de instrumentos e outros procedimentos jurídicos, a empresa 
foi condenada a ressarcir os Akrãtikatêjê com uma área de 3.600 hec-
tares contígua à TI Mãe Maria e com condições ecológicas semelhantes 
às daquela de onde foram transferidos de maneira irregular (GUIMA-
RÃES, 2017). Entretanto, os Akrãtikatêjê ainda aguardam que a Eletro-
norte cumpra a decisão judicial.
No trabalho realizado junto a esse grupo, emergiu, das narrativas 
dos agentes sociais, uma série de situações que ajudam a entender os 
impactos e pressões atuais das obras de infraestrutura e da exploração 
mineral sobre a TI Mãe Maria. Como assinalaram nas oficinas de carto-
grafia social, a presença desses empreendimentos não significa somente 
a perda de espaço físico, mas também impõe limites às atividades coti-
dianas. Em relação à rodovia que atravessa a TI, os Akrãtikatêjê mencio-
nam que ela torna as aldeias vulneráveis ao acesso de pessoas estranhas. 
No que diz respeito à linha de transmissão, eles enfatizam o re-
ceio em relação à exposição aos campos magnéticos que elas produzem. 
Além disso, anualmente, a vegetação que fica sob as torres é queimada. 
Nesse sentido, o grupo se ressente do risco de propagação do fogo e 
da fumaça na área. Em relação à linha férrea, apontam o ruído causa-
do pela passagem do trem. Já o pó de minério deixado pelo caminho é 
entendido por eles como prejudicial. Ainda apontam essa linha férrea 
como um empecilho ao livre trânsito dentro da própria TI, devido ao 
controle que a empresa exerce sobre a faixa de domínio estabelecida às 
margens da ferrovia.
No contexto da duplicação da EFC, o Ministério Público Fede-
ral (MPF) de Marabá, no ano de 2016, sugeriu a suspensão das obras, 
no trecho da estrada que passa na TI Mãe Maria, em função de ques-
tionamentos levantados pelo estudo de impacto realizado no território. 
Um dos problemas apontados pelo MPF foi a não atenção à obrigatorie-
Amazônia(s) em História(s): diversidade, ensino e política | 25 
dade de consulta prévia e informada, estabelecida pela Convenção 169 
da Organização Internacional do Trabalho, de 1989, e ratificada pelo 
Brasil em 2002. Na mesma ação em que pede a suspensão das obras, 
o MPF aponta a necessidade de construção de um Plano Básico Am-
biental (PBA) que estabeleça ações para mitigar os impactos identifica-
dos (MPF, 2016). Mais recentemente, a empresa de mineração Vale tem 
proposto a elaboração desse PBA. A negociação para sua elaboração, 
entretanto, tem provocado divisões entre as aldeias dos Gavião.
O contexto que caracteriza o entorno também exerce pressão so-
bre a TI e seus recursos. Na ocasião do trabalho de cartografia, os Ga-
vião relataram a preocupação com a retirada, por parte de fazendeiros, 
de matas ciliares nas proximidades da TI. As invasões do território com 
o objetivo de caçar, pescar e/ou coletar castanha e açaí também foram 
mencionadas, pois resultam na pressão sobre os recursos disponíveis 
na TI. A expansão urbana de Marabá, por sua vez, com a construção de 
residenciais e habitações populares, ameaça o território de Mãe Maria 
com obras de esgotos sanitários para ele direcionados.
É importante enfatizar que os povos indígenas que habitam a TI 
Mãe Maria mobilizam relações diferenciais com os recursos naturais e 
com o ecossistema local, orientados por uma lógica oposta àquela que 
caracteriza a racionalidade econômica e empresarial projetada sobre o 
território do sudeste do Pará. Não à toa, a área da TI Mãe Maria se des-
taca como um dos poucos redutos de floresta em uma paisagem desma-
tada e ameaçada pela devastação ambiental.
No mapa elaborado pelos Akrãtikatêjê, sinaliza-se, também, a 
infraestrutura que caracteriza a aldeia, os lugares tidos como impor-
tantes para as práticas socioculturais, a biodiversidade característica do 
território e a distribuição dos recursos naturais na TI.
No âmbito da comunidade, eles promovem cultivos diversifica-
dos, criações de animais e se organizam para o manejo extrativo da cas-
tanha. Encontra-se em fase de implantação, na aldeia Akrãtikatêjê, uma 
cooperativa que visa a comercializar a castanha extraída na área. A ideia 
26 | Amazônia(s) em História(s): diversidade, ensino e política 
é unir as diferentes aldeias de modo a não necessitar de intermediários e 
obter valorização do produto. A logística e a venda têm sido administra-
das por jovens, como forma de envolvê-los nas questões políticas e nos 
processos decisórios. O objetivo é, portanto, fortalecer, cada vez mais, a 
autonomia do grupo. 
Nesse sentido, o território e a sua biodiversidade significam, para 
os Akrãtikatêjê, não apenas prover a existência, mas também a possibili-
dade de autonomia frente aos recursos repassados pela mineradora como 
indenização pelos danos causados na TI. O território se constitui, assim, 
como parte fundamental do discurso político do grupo. Em meio às si-
tuações descritas, os Akrãtikatêjê têm-se disposto a resistir, afirmando a 
sua identidade étnica como categoria política de modo a se posicionarem 
frente aos grandes projetos de mineração e infraestrutura da região.
Agricultores Acampados de Canaã dos Carajás
Os Agricultores Acampados do município de Canaã dos Carajás, 
constituídos em categoria identitária, têm-se mobilizado coletivamente 
em ações voltadas para a ocupação e permanência na terra. Ligados a 
movimentos sociais e entidades de apoio aos trabalhadores rurais, esses 
agricultores têm estabelecido unidades denominadas “acampamentos”. 
Nelas, eles residem e cultivam a terra em busca de assegurar sua pos-
se. A mobilização dos Agricultores Acampados constitui mais um caso 
histórico bastante significativo dos processos sociais desencadeados em 
área de mineração no sudeste do Pará. Essas situações combinam-seem 
um quadro de relações estabelecidas na apropriação do território e de 
recursos naturais que assinalam para a ecologia política da mineração.
Canaã dos Carajás, na região Sudeste do Pará, carrega no próprio 
nome o anúncio de terra prometida. Entretanto, o que se estabelecia 
como promessa para colonos e migrantes em busca de terra e trabalho 
foi mais bem alcançado pelos grandes projetos definidos para a região, 
em função da prevalência de seus interesses que tiveram a anuência e 
contrapartida do Estado. O município de Canaã dos Carajás surgiu a 
Amazônia(s) em História(s): diversidade, ensino e política | 27 
partir da construção de assentamentos implementados pelo Estado, efe-
tivados como estratégia de ocupação espacial e econômica dessa região 
do país. Portanto, tem seu processo de crescimento estruturado pela 
materialidade e pelos signos dos grandes projetos pecuários e minerá-
rios, expressos na ação desenvolvimentista estatal.
As narrativas de agricultores dos antigos assentamentos e dos 
Agricultores Acampados, que atualmente empreendem ocupações de 
terra na área, são elucidativas dessa história no contexto de mineração. 
Eles informam que a área foi, primeiramente, ocupada por pequenos 
agricultores e por colonos assentados pelo Estado brasileiro, a partir de 
1982, no Projeto de Assentamento Carajás I, II e III. Esse projeto foi 
criado com o propósito de assentar mais de 1.500 famílias de colonos 
que, após se estabelecerem no local, passaram a conviver com as recor-
rentes pesquisas de mineração nos lotes de terra ocupados. As incursões 
realizadas na área, sem autorização prévia dos colonos, eram justifica-
das, segundo relatos, a partir do argumento de que a mineração traria o 
progresso à região.
Ainda segundo relatos dos agentes sociais, quando as empresas 
chegaram à região, um colono, ao abrir uma roça, autorizou a um garim-
peiro realizar buscas por ouro no terreno. O achado de algumas pepitas 
no local, por volta de 1985, coincidiu com as tensões em torno do fecha-
mento do garimpo de Serra Pelada e provocou significativa afluência de 
garimpeiros para a área. Já em 1997, as empresas de pesquisa acusaram 
a descoberta de cobre nas áreas conhecidas como Sossego e Sequeiri-
nho. No dizer de um líder sindical de Canaã dos Carajás, para instalação 
da chamada Mina do Sossego (que ocorreu em 2002), teve início uma 
gradual retirada dos agricultores e garimpeiros que se encontravam na 
área, que durou até 1999, quando saíram os últimos ocupantes.
O Projeto Ferro Carajás, em Parauapebas, município vizinho a 
Canaã dos Carajás, e a implantação do Projeto Sossego e Projeto S11D, 
operados pela empresa Vale, constituem empreendimentos de mine-
ração de grande monta. Esses empreendimentos, juntamente com um 
conjunto de obras de infraestrutura instaladas na região, têm gerado 
28 | Amazônia(s) em História(s): diversidade, ensino e política 
um quadro significativo de questões sociais e mudanças ambientais no su-
deste do Pará. Nesse contexto, a expropriação do território, a disputa por 
recursos naturais, entre outros, tanto pode ocorrer pela agressão direta 
como pela violência simbólica e oculta. De um lado, observa-se a ocor-
rência de deslocamentos forçados, expropriações, ameaças e agressões. 
De outro, há o incentivo à negociação da terra pautada na justificativa de 
que esses empreendimentos são mais viáveis e emissários do progresso.
No final da década de 1980, Anthony Hall (1989), ao analisar 
os impactos do PGC, chamava a atenção para o que nomeou de “crise 
agrária” na Amazônia. O autor enfatiza, no trabalho em questão, as im-
plicações que essa crise teria para os pequenos lavradores e migrantes. 
Atualmente, pode-se dizer que as transformações fundiárias e os confli-
tos analisados por Hall se agravaram com o tempo.
As políticas de desenvolvimento seguem, hoje, marginalizando 
diversas categoriais sociais. Em decorrência desse processo, a região su-
deste do Pará vivencia problemas agudos, relativos a expropriação, con-
centração fundiária e disputas no território. No quadro representativo, 
o recurso às mobilizações sociais tem sido uma forma de garantir a ter-
ra para viver e produzir. O fenômeno das ocupações, como estratégia de 
acesso à terra, permitiu, recentemente, um registro de 514 assentamentos 
da reforma agrária. Embora reconhecidos legalmente, muitos deles tam-
bém são afetados por mineração, de maneira semelhante ao que aconte-
ce com os Agricultores Acampados em disputas pela terra e diretamente 
confrontados com a empresa mineradora em Canaã dos Carajás.
Os projetos de mineração e de infraestrutura têm influenciado 
importantes deslocamentos para essa parte da Amazônia, tanto por 
força da colonização dirigida como por migrações motivadas pela mo-
mentânea dinamização econômica. A migração constitui um dos efei-
tos associados a impactos socioambientais de grande envergadura e, em 
alguma medida, também está relacionada com ações de expropriação 
e conflitos. Desde sua implantação, o Projeto S11D responde por atos 
dessa natureza, o que culminou no remanejamento de vilas inteiras, a 
exemplo de Mozartinópolis e Racha Placa. Esse último nome provém da 
Amazônia(s) em História(s): diversidade, ensino e política | 29 
resistência à empresa mediante a quebra de placas proibitivas de caça e 
pesca, instaladas em locais aos que, até então, a comunidade local tinha 
acesso (REIS, 2014).
Os Agricultores Acampados de Canaã de Carajás se encontram 
distribuídos em uma extensão do município com situação fundiária 
complexa. Reiteradamente, entidades e Agricultores Acampados rela-
tam que, hoje, a área de domínio da empresa Vale incide sobre antigos e 
novos assentamentos agrícolas, a exemplo do que ocorre nas imediações 
e na área em que foi instituído o Projeto Carajás I, II, e III em 1982.
Dessa maneira, os acampados associam à mineradora atos de 
compra irregular de terras do Estado, além de impactos sobre impor-
tantes rios e sítios arqueológicos. Estes são indicativos da antiguidade 
das terras tradicionalmente ocupadas por indígenas e, posteriormente, 
por agricultores e garimpeiros.
A mineradora Vale, adquirindo terra para a pesquisa, a lavra e 
o reflorestamento, exigido como contrapartida pelas áreas impactadas 
pelos projetos minerários, tornou-se uma das principais proprietárias 
de terras na região. As áreas obtidas em caráter de compensação am-
biental, assim como aquelas destinadas à proteção ambiental, formam 
um cordão de isolamento no entorno da área de lavra. Isso significa 
dizer que a apropriação desses empreendimentos não se restringe à área 
de exploração em si, mas abarcam um espaço mais amplo no território 
com fins locacionais, de modo a garantir o suporte logístico complexo e 
o controle sobre os recursos naturais.
Todo esse processo tem uma série de consequências — apropria-
ção, expropriação, concentração fundiária e especulação —, que aca-
bam por gerar tensas situações de litígio judicial. Essas tensões, efeito de 
processos de expropriação, estão na origem das insurgências dos grupos 
de Agricultores Acampados, que passam a ocupar as terras na região. 
Isso tem ocasionado choques entre esses agentes sociais e os empresa-
riais, assim como situações de controle e ameaças contra os agricultores 
da região. Além disso, são recorrentes as informações alusivas aos im-
30 | Amazônia(s) em História(s): diversidade, ensino e política 
pactos ambientais, com transformações e perdas decorrentes da apro-
priação destrutiva da natureza. O amplo repertório de narrativas locais 
denuncia os impactos sobre os rios, as perdas materiais e a interferência 
na cultura, na saúde, na reprodução e no equilíbrio ecossistêmico.
Em Canaã dos Carajás, no processo de pesquisa e elaboração da 
autocartografia, os Agricultores Acampados indicaram as tensões vivi-
das, dando destaque para diversas ameaças que incidem nas condições 
de existência. Entre elas, há as oriundas do interesse na desocupação 
da área,que gera liminares judiciais com ordem de despejos dirigidas a 
esses grupos. E há, igualmente, ações que objetivam acionar individual-
mente os Acampados e suas lideranças, com o objetivo de descaracte-
rizar suas ações coletivas. Todas essas ações, de acordo com os relatos, 
têm o intuito de impedir o acesso à terra e a permanência nela.
Os relatos dos grupos também informam sobre a vigilância com 
drones e os impedimentos de acesso e trânsito por determinadas áreas. 
A mineradora faz uso de serviços de segurança privado, à cuja ação se 
soma, segundo os agentes sociais, o cerceamento de serviços básicos 
por parte do poder público municipal. Em meio a essas situações, os 
Acampados acionam estratégias políticas locais de resistência e também 
enfrentam, judicialmente, a empresa em audiências na Vara Agrária de 
Marabá, no Fórum municipal e no órgão fundiário.
Portanto, a pesquisa sugere elementos significativos desse espaço 
e das relações empreendidas pelos Acampados. São ações pelo reconhe-
cimento de direitos sobre as terras, associadas às lutas socioambientais 
travadas por meio de denúncias das situações de impacto sobre a natu-
reza e o ambiente onde vivem. Envolvidos nesse processo, demarcam 
um campo de ação em que formulam categorias que abarcam as práticas 
alternativas de uso da terra e dos recursos naturais. 
Dessa maneira, fortemente atreladas ao acesso à terra, os Acam-
pados buscam realizar a produção agrícola diversificada para o consu-
mo alimentar com garantia da biodiversidade. Essas práticas se reves-
tem de força política, em condição de notabilizar uma lógica diferente 
Amazônia(s) em História(s): diversidade, ensino e política | 31 
na relação com a natureza perante a escassez de produtos alimentícios 
locais e a redução da diversidade biológica. Em resposta, afirmam a re-
levância da produção agrícola dedicada ao consumo próprio, associada 
ao abastecimento do campo e da cidade. Isso ocorre com a oferta dos 
produtos em feira livre, espaço ao qual buscam assegurar o acesso.
Considerações finais - Transformações e Estratégias Políticas Locais
Para concluir, recordamos que as experiências de pesquisa da 
cartografia social fornecem aspectos históricos e sociológicos das situa-
ções vivenciadas pelas Quebradeiras de Coco Babaçu, pelos Akrãtika-
têjê e pelos Agricultores Acampados, que nos são apresentadas a partir 
do ponto de vista dos próprios sujeitos. Essas experiências são situadas 
no território vivido por esses grupos e referem-se a esse território do 
qual suas identidades sociais emergem. Sobre outro ângulo de análise, 
e como um contraponto à perspectiva oficial, as realidades autocarto-
grafadas elucidam o forte impacto do neoextrativismo no Brasil e as 
diferentes respostas dadas pelos grupos afetados nesse processo.
No que toca o Sudeste do Pará, região de enorme complexidade 
social, os projetos de mineração e de infraestrutura impõem à histó-
ria da região um conjunto de implicações socioambientais. Pensar seus 
impactos sobre povos e comunidades tradicionais a partir das autocar-
tografias nos permite acessar uma percepção da região que, em muitos 
casos, é diversa daquela que emerge a partir dos mapas oficiais. A elabo-
ração de mapas pelos próprios grupos, como ferramenta utilizada para 
tratar das questões sociais, visa, portanto, a reforçar o conhecimento 
dessas realidades e identidades coletivas, além de contribuir com um 
instrumento de reflexão e ação política para as comunidades.
As experiências, aqui relatadas, muito longe de representarem 
casos isolados, fornecem um quadro com discursos, práticas e pressu-
postos culturais que podem ser tomados para análise das situações de 
um campo de luta, em que se entreveem elementos de uma determinada 
ecologia política na Amazônia e, em especial, no sudeste paraense. O 
32 | Amazônia(s) em História(s): diversidade, ensino e política 
modo como essas realidades locais se organizam, configura, do ponto 
de vista de suas formas de resistência apresentadas pelos grupos sociais, 
um campo de força frente às ações dos grandes projetos que afetam o 
acesso à terra e a seus recursos naturais, e as condições necessárias à 
produção de suas existências. O que esse campo de luta assinala é a dis-
tribuição desigual das terras e do território que caracterizam o sudeste 
do Pará (LEFF, 2006; MARTINEZ ALIER, 2015).
Na acepção rígida e autoritária de acumulação do capital, o de-
senvolvimento com pretexto de progresso atua, em realidade, como 
projeto cultural da modernidade capitalista que marginaliza amplas 
dimensões das dinâmicas socioculturais de povos e comunidades tra-
dicionais. Esse projeto cultural, que informa as ações do Estado e dos 
agentes empresariais, opera por uma lógica econômica e binária da re-
lação humano-natureza. Esse modo de operação, sob o escopo de mo-
dernizante, acaba por invisibilizar a mediação ecológica na dinâmica da 
vida e nas experiências das comunidades tradicionais, impondo uma 
razão econômica para a vida na terra e a relação com o ambiente.
A pesquisa desses contextos, que aliam instrumentos da etno-
grafia à produção de mapas, apontou para importantes mudanças nas 
práticas tradicionais. Como estratégia de resistência e luta social, têm 
emergido práticas alternativas de cultivo e extrativismo entre os grupos 
analisados. A produção de roças com cultivos diversificados, o desen-
volvimento da piscicultura e o aproveitamento dos recursos extraídos 
dos territórios tradicionais cresce entre agricultores, indígenas e que-
bradeiras de coco. Para além da importância social e econômica, essas 
ações também demarcam e articulam a relação com o meio ambiente 
e a atuação política dos grupos em questão. Tornam-se, assim, formas 
de enfrentamento às situações postas pelo contexto de mudanças no 
meio ambiente e conflitos socioambientais, implicados na distribuição e 
apropriação desiguais do território e dos recursos naturais.
Amazônia(s) em História(s): diversidade, ensino e política | 33 
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36 | Amazônia(s) em História(s): diversidade, ensino e política 
AUSÊNCIAS E SILENCIAMENTOS: 
APONTAMENTOS ACERCA DO COMPONENTE 
HISTÓRIA NO DOCUMENTO CURRICULAR DE 
RORAIMA
Monalisa Pavonne Oliveira
Introdução
O presente capítulo objetiva fazer uma breve análise, devido aos 
limites deste texto, do Documento Curricular de Roraima promulgado 
em 2018. Tal documento faz parte da Base Nacional Curricular Comum 
(BNCC), e corresponde à parte atinente ao currículo regional, que deve 
atender 40% de toda a proposta, sendo 60% relativos aos conteúdos co-
muns a serem compartilhados por todo o território nacional.
Desse modo, a análise dedica-se aos textos introdutórios que pre-
cedem às seções concernentes às diferentes disciplinas que compõem o 
currículo, e à parcela destinada à disciplina de História, examinando os 
programas prescritos para a área em todo o Ensino Fundamental.
A produção do documento
A confecção do Documento Curricular de Roraima (DCR) teve 
como ponto de partida a Portaria Nº. 2812/17/SEED/GAB/RR (RO-
RAIMA, 2017), que institui a Comissão Estadual e o Comitê Execu-
tivo da Base Nacional Curricular Comum (BNCC). Em seu Art. 2º, a 
portaria designou para a elaboração do documento os representantes 
das seguintes funções/instituições: Secretário Estadual de Educação; 
Diretora do Departamento de Educação Básica; Secretário executivo da 
UNDIME; Coordenadora Estadual da BNCC; Presidente do Conselho 
Estadual de Educação; representante da Assembleia Legislativa; Presi-
dente do Sindicato dos Trabalhadores em Educação do Estado de Rorai-
Amazônia(s) em História(s): diversidade, ensino e política | 37 
ma (SINTER); Presidente da União Nacional dos Conselhos Municipais 
de Educação - seção Norte (UNCME); representante da Universidade 
Federal de Roraima (UFRR); representante da Universidade Virtual 
de Roraima (UNIVIRR); representante da Universidade Estadual de 
Roraima (UERR); representante do Ministério Público; presidente da 
União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (UNDIME); 
representante da Organização de Professores Indígenas de Roraima 
(OPIR); representante da Associação dos Prefeitos; representante da 
União Municipal dos Estudantes Secundaristas (UMES); representante 
do Instituto Federal de Roraima (IFRR); representante do Sindicato das 
Escolas Particulares; representante do Instituto Nacional de Coloniza-
ção e Reforma Agrária (INCRA) e representante das Instituições de En-
sino Superior Privadas1.
A proposta da BNCC e os documentos estaduais apoiam-se na 
argumentação da sua produção em bases democráticas. Nessa seara, 
o artigo “BNCC e o Currículo de História: interpretações docentes no 
contexto da prática”, escrito por Francisco José Balduíno da Silva, Jean 
Mac Cole Tavares Santos e Márcia Frota Fernandes (2019) sobre o do-
cumento nacional com relação ao Ensino Médio, contribui para a aná-
lise do processo de confecção do documento como um todo, conforme 
afirmação dos autores:
Somam-se às contribuições via internet a realização de 
5 audiências públicas realizadas entre julho e setembro 
de 2017 em cada região do país, e mais de 27 seminários 
estaduais. Com esses números o MBNC defende a 
ideia de processo democrático na organização da 
BNCC, construindo assim, por meio de sua rede de 
articulações discursos de legitimação de uma Base 
constituída democraticamente e que viria a garantir as 
aprendizagens necessárias aos alunos do Ensino Médio 
de todo o Brasil, defendendo desta forma o currículo 
prescritivo como garantia de qualidade educacional. 
(SILVA; SANTOS; FERNANDES, 2019, p. 1016).
1 Com relação à composição dos grupos de trabalho que contribuíram com as partes especí-
ficas do documento voltadas às disciplinas, no nosso caso História, não consta na portaria 
citada a designação dos membros desses grupos.
38 | Amazônia(s) em História(s): diversidade, ensino e política 
No entanto, algumas entidades não celebram a produção do do-
cumento como democrática dada a rapidez com a qual o processo trans-
correu, principalmente após o golpe-jurídico-midiático-parlamentar de 
2016 (MATTOS; BESSONE; MAMIGONIAN, 2016), desconsideran-
do, em alguma medida, as discussões travadas nos anos anteriores en-
tre a “Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação 
(ANPED) e a Associação Brasileira de Currículo (ABdC), bem como 
entidades sindicais como a Confederação Nacional dos Trabalhadores 
em Educação (CNTE), as quais vieram se posicionar contrárias à ideia 
de Base Nacional e sua implantação” [da forma como foi concebida]. 
“Em termos específicos disciplinares, a Associação Nacional de História 
(ANPUH)” questionou a rapidez e as bases sobre as quais se estrutura-
ram a proposta (SILVA; SANTOS; FERNANDES, 2019, p. 1016).
A produção de currículos torna-se, geralmente, pauta de diversos 
setores da sociedade, para além daqueles diretamente envolvidos com a 
educação, quando dos debates públicos impulsionados por esferas do go-
verno e a grande mídia. Esta, em larga medida, comunga uma perspectiva 
político-ideológica neoliberal com instituições privadas interessadas na 
concepção da educação como mercado que atenda às expectativas desse 
modelo econômico. Nessa perspectiva, os autores supracitados elencam 
também as instituições e fundações privadas entusiastas na promoção 
da elaboração do documento nacional, sendo elas: Centro de Estudos e 
Pesquisas em Educação (Cenpec), Comunidade Educativa CECAD, Fun-
dação Maria Cecília Souto Vidigal, Instituto Inspirare, Instituto Ayrton 
Senna, Fundação Lemann, Fundação Roberto Marinho, Instituto Natura 
e Instituto Unibanco (SILVA; SANTOS; FERNANDES, 2019, p. 1014).
Diante do exposto, valorizamos e reconhecemos o esforço dos 
colegas que trabalharam sempre na intenção de contribuir para a educa-
ção, especificamente, o ensino de história, especialmente, no estado de 
Roraima e por todo o país. Por outro lado, é importante ter em vista ascondições e as intenções de produção desse documento, que em última 
instância, alinha-se às prioridades educacionais que atendam às deman-
das das políticas socioeconômicas neoliberais.
Amazônia(s) em História(s): diversidade, ensino e política | 39 
Análise do Documento de Roraima – textos introdutórios
A BNCC e a DCR expressam em seus textos primar por valores 
como democracia e tolerância, especialmente o respeito à diversidade 
étnico-racial, social e cultural, além de frisar a construção das propostas 
de currículo calcadas em bases democráticas. Tais premissas compõem 
os textos introdutórios do documento, relativas à formação do sujeito 
nos mais diferentes aspectos.
No documento estadual, bem como no nacional, há uma parte 
que abrange questões amplas relativas à formação dos educandos, a qual 
chamamos de textos introdutórios. Esta seção precede a que trata espe-
cificamente daquelas direcionadas às disciplinas. Em consonância com 
os valores democráticos e de tolerância como basilares na formação dos 
estudantes, o documento em seus “Princípios filosóficos, sociológicos e 
pedagógicos do currículo” notabiliza-se pela:
abordagem sociointeracionista, na concepção 
vygotskyana, visto que parte do princípio de que o 
sujeito não nasce pronto e acabado, nem mesmo é 
uma cópia do ambiente em que está inserido, pois sua 
evolução intelectual pressupõe uma interação com o 
outro, com o meio e, sua interação social promove a 
transformação de um ser biológico em um ser humano.
Partindo desse princípio, a escola tem como função 
social fazer com que os conhecimentos empíricos 
construídos pelo sujeito a partir da vivência com 
o outro, o meio, evoluam para construção dos 
conhecimentos científicos, de forma que este se 
reconheça como um ser social, histórico e cultural, 
transformando-se num sujeito crítico reflexivo e 
participativo (DOCUMENTO CURRICULAR DE 
RORAIMA, 2018, p. 10).
No excerto observamos uma preocupação com a formação dos 
educandos levando em consideração a interação com o meio e as rela-
ções interpessoais como parte do processo, todavia a “concepção vygo-
tskyana” aparece no texto sem maiores aprofundamentos e sem referên-
cia das obras que comportam tal concepção.
40 | Amazônia(s) em História(s): diversidade, ensino e política 
Alinhado com a diretriz nacional, o documento reafirma a preo-
cupação com a formação integral do sujeito na perspectiva de que “Não 
basta que o aluno aprenda apenas conceitos básicos dos componentes 
curriculares; o ideal é que consiga usar o que aprendeu na sua vida” (DO-
CUMENTO CURRICULAR DE RORAIMA, 2018, p. 11). Se por um 
lado, tal premissa nos conduz ao entendimento da intenção de um ensi-
no significativo para os sujeitos envolvidos, por outro lado, constitui-se 
como necessário pensar a educação para além de termos utilitaristas, que 
abarquem possibilidades de crescimento e descobertas que viabilizem a 
percepção de diferentes modos de viver, alargando a compreensão e a 
problematização do próprio meio no qual o indivíduo está inserido.
A percepção que extrapola o próprio meio e a própria vida é pon-
to fulcral para a formação do sujeito na perspectiva da educação para 
uma cultura de cidadania, paz e tolerância. Tais aspectos se relacionam 
diretamente com a diversidade social, cultural e econômica do País. 
Nesse sentido, a afirmação “consiga usar o que aprendeu na sua vida”, 
pode remeter a um ensino voltado para questões prementes, apoiado na 
lógica econômica neoliberal que reproduz as desigualdades sociais, ao 
invés de um ensino estimulante e questionador, que valorize a descober-
ta e a problematização, proporcionando o exercício do descentramento.
A importância do descentramento pode ser observada pela di-
versidade presente nas escolas roraimenses que o próprio documento 
menciona:
Segundo o Censo Escolar (BRASIL, 2017), a Rede 
Estadual de Educação de Roraima conta atualmente 
com 381 escolas, dentre as quais, 258 são escolas 
indígenas, distribuídas entre as 32 Terras Indígenas 
homologadas, que representa 46,2% do território do 
Estado, com algumas que já estão na zona urbana 
da capital Boa Vista. Outro aspecto importante a ser 
destacado, é a migração maciça de venezuelanos que, 
de acordo com os dados da Secretaria Estadual de 
Educação, entre 2017 e 2018, gerou uma demanda de 
atendimento de mais de 1300 alunos nas classes de 
Ensino Fundamental II e Médio, e o número crescente 
Amazônia(s) em História(s): diversidade, ensino e política | 41 
de alunos a serem atendidos no âmbito da Educação 
Especial, que representa cerca de 1,7% do total de 
matrículas (DOCUMENTO CURRICULAR DE 
RORAIMA, 2018, p. 14).
Na parte destinada à disciplina História, percebemos que as pre-
missas da área podem contribuir para a formação dos sujeitos a partir 
da incorporação dos pressupostos teóricos e metodológicos que preco-
nizam a “des-hierarquização das histórias”, ou seja, tratamento equâni-
me para os diversos assuntos abordados na disciplina História, e pela 
adoção efetiva das inovações e as extensas pesquisas em relação ao en-
sino de história.
A adoção das pesquisas e da renovação historiográfica referente 
ao ensino de história oportuniza o exercício do descentramento, contu-
do, o documento em tela, na nossa perspectiva, carece de certo aprofun-
damento de dois fundamentos básicos do conhecimento historiográfi-
co: a problematização e a historicização.
Sendo assim, apesar do documento propor um ensino significa-
tivo que favoreça a “formação integral”, conforme consta no item “2.2 
Formação Integral do Sujeito” (DOCUMENTO CURRICULAR DE 
RORAIMA, 2018, p. 11), a proposta perde um pouco da sua vitalidade 
quando nos referimos à concatenação dos preceitos mais amplos com o 
proposto na disciplina História, sobretudo no que diz respeito à aborda-
gem acerca dos conteúdos.
A parcela dedicada à disciplina História, com relação aos con-
teúdos divididos entre as “Unidades Temáticas” e os seus respectivos 
“Objetos de Conhecimento”, não se distancia de uma proposta de con-
teúdo tradicional com uma concepção de história linear. Isso se reflete 
na forma como o documento compreende as questões teóricas e meto-
dológicas da área e a metodologia de ensino, que envolvem o modo de 
inserção de fontes históricas na sala de aula e a maneira de trabalhá-las 
em âmbito escolar, como veremos adiante.
42 | Amazônia(s) em História(s): diversidade, ensino e política 
A disciplina história no Documento Curricular de Roraima
Na seção dedicada ao Ensino de História nos Ensinos Funda-
mentais I e II, assim como para as outras áreas, há o estabelecimento de 
competências (conceitos e procedimentos) e habilidades (práticas, cog-
nitivas e socioemocionais) a serem desenvolvidas. Tais determinações 
exigem, por conseguinte, de acordo com o documento estadual “o rede-
senho curricular que possibilite o alcance de uma rede de aprendizagem 
entre as competências gerais, competências da área e as competências 
do componente curricular” (DOCUMENTO CURRICULAR DE RO-
RAIMA, 2018, p. 464), o que indica o caráter prescritivo e balizador do 
documento, que entende a gama de conhecimentos dispostos, compe-
tências e habilidades como “essenciais”.
No processo de ensino e aprendizagem da História, a DCR ex-
prime a importância da inserção das fontes na sala de aula, essa tônica é 
recorrente ao longo do texto, como poderemos evidenciar mais adiante 
a partir dos quadros designados “Organizadores Curriculares”. Toda-
via, observamos com clareza algumas fragilidades na proposta, sendo a 
maior delas a falta de problematização no trabalho com as fontes, que 
advém da indefinição do que se considera fonte, limitando-se à sua des-
crição, e uma frágil contextualização sem análise e problematização:
Para se pensar o ensino de História, é fundamental 
considerar a utilização de diferentes fontes e tipos 
de documento (escritos, iconográficos, materiais, 
imateriais) capazes de facilitar a compreensão da 
relação tempo e espaço

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