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Libras AULA 4 - A educação de surdos (oralismo, comunicação total e bilinguismo). LÚCIA HELENA MENÓIA SILVA Objetivo Observar a realidade que os alunos surdos enfrentam no contexto escolar e a verdadeira inclusão, o que falta para que realmente ocorra? O oralismo, a comunicação total, o bilinguismo e a pedagogia surda como propostas educacionais e suas implicações. Nesta aula A educação dos surdos e as abordagens educacionais Oralismo Comunicação total Bilinguismo Pedagogia surda ou pedagogia da diferença. A educação dos surdos e as abordagens educacionais Figura 1- Mãozinhas da inclusão. Olá pessoal, hoje iremos abordar um tema bem pertinente com relação à educação que os surdos enfrentaram até hoje. É comum encontrarmos desafios em sala de aula, e quando temos um aluno com necessidades especiais esses desafios aumentam, porque exige do professor um maior conhecimento teórico para que o aluno se desenvolva e obtenha um aprendizado significativo e prazeroso. Ao se falar das abordagens educacionais, podemos nos voltar às metodologias utilizadas de maior destaque no ensino-aprendizagem da educação de surdos, desde a primeira até a mais atual, dentre elas o oralismo, a comunicação total, o bilinguismo e a mais defendida atualmente pela comunidade surda que é a pedagogia surda ou pedagogia da diferença. Oralismo Figura 2 - Criança surda aprendendo a falar. https://i2.wp.com/d2os8o1xb0dylp.cloudfront.net/wp- content/uploads/2015/11/boy-speech-letters.png?resize=342%2C213 A primeira abordagem que iremos estudar é o “oralismo”. Como a própria palavra induz, é o método que procura desenvolver a fala dos surdos. Os defensores desse método afirmam que a comunicação oral é uma das condições necessária para o desenvolvimento do ser humano viver em sociedade. Para ilustrar o pensamento dos oralistas, temos o Capovilla (2000, p.102) que ao esclarecer o método oralista, na comunicação com pessoas surdas, destaca: https://i2.wp.com/d2os8o1xb0dylp.cloudfront.net/wp-content/uploads/2015/11/boy-speech-letters.png?resize=342%2C213 https://i2.wp.com/d2os8o1xb0dylp.cloudfront.net/wp-content/uploads/2015/11/boy-speech-letters.png?resize=342%2C213 Segundo Goldfeld (2002, p.34 apud KALATAI E STREIECHEN), a surdez é vista como uma deficiência no oralismo e deve ser diminuída pela estimulação auditiva, podendo possibilitar a aprendizagem da língua portuguesa e do surdo integrar na convivência com os ouvintes, o oralismo tem por objetivo a reabilitação dos surdos para que se tornem próximos ao “normal”. Os profissionais da educação e fonoaudiólogos que são adeptos à metodologia do oralismo defendem que a aprendizagem dos surdos consiste em desenvolver a fala, ou seja, a comunicação oral, e alegam que é por meio da fala que ocorre o desenvolvimento do ser humano na sociedade. Segundo Goldfeld (2002, p.34 apud KALATAI E STREIECHEN, p.5), O método oralista objetivava levar o surdo a falar e a desenvolver a competência linguística oral, o que lhe permitiria desenvolver-se emocional, social e cognitivamente do modo mais normal possível, integrando-se como um membro produtivo do mundo dos ouvintes. “ O oralismo percebe a surdez como uma deficiência que deve ser minimizada pela estimulação auditiva. Essa estimulação possibilitaria a aprendizagem da língua portuguesa e levaria a criança surda a integrar-se na comunidade ouvinte e desenvolver uma personalidade como a de um ouvinte. Ou seja, o objetivo do oralismo é fazer uma reabilitação da criança surda em direção à normalidade. Como já vimos na aula anterior, houve o Congresso de Milão, na Itália, e no final teve uma votação para decidir o melhor método; o escolhido foi o método oralista, sendo muito criticada a língua de sinais e proibido o uso,, as escolas de vários países adotaram esse método para a educação de surdos, de forma que ocorreu uma grande mudança ao meio escolar, pois os alunos surdos ficaram impedidos de usar a língua de sinais para serem educados, e os professores não podiam mais utilizá-la em suas aulas, se persistissem, eram demitidos e contratados outros professores que aceitassem fazer o uso do método oralista. Também há relatos que, nas aulas, os alunos deveriam ficar sentados em cima das mãos, evitando a utilização delas para fazer os sinais, forçando assim o oralismo. A justificativa do método oralista era que para acontecer uma efetiva integração dos surdos na sociedade era fundamental a comunicação entre a comunidade ouvinte e a comunidade surda por meio da fala, ou a leitura labial. Capovilla (2000, p.102 apud KALATAI E STREIECHEN [s/d], p.6) descreve a comunicação dos surdos no método oralista dizendo: Esta fala nos mostra que a comunicação oral é o ideal, mas se pensarmos na questão da aprendizagem dos surdos, não é tão simples assim, os surdos teriam que enfrentar um procedimento penoso e prolongado para desenvolver a fala e em alguns casos não conseguiria obter esse tipo de comunicação por motivos diversos. Já para os que nascem ouvintes torna-se muito fácil, pois estão adquirindo linguagem desde o nascimento. O método oralista objetivava levar o surdo a falar e a desenvolver a competência linguística oral, o que lhe permitiria desenvolver-se emocional, social e cognitivamente do modo mais normal possível, integrando-se como um membro produtivo do mundo dos ouvintes. “ Essa metodologia trouxe um transtorno conflitante para o desenvolvimento dos surdos, é possível notar conforme esclarece Skiliar, (1998, p1 apud KALATAI E STREIECHEN [s/d], p.6) Foram mais de cem anos de práticas enceguecidas pela tentativa de correção, normalização e pela violência institucional; instituições especiais que foram reguladas tanto pela caridade e pela beneficência, quanto pela cultura social vigente que requeria uma capacidade para controlar, separar e negar a existência da comunidade surda, da língua de sinais, das identidades surdas e das experiências visuais, que determinam o conjunto de diferenças dos surdos em relação a qualquer outro grupo de sujeitos. De acordo com Skiliar, a comunidade surda ficou no esquecimento da sociedade, o sofrimento foi imenso diante do método oralista utilizado por um longo período de cem anos, pois foi negada sua própria identidade, cultura e língua. Diante do ocorrido, muitos surdos não conseguiram ser alfabetizados, muitos se isolaram, surgiu então uma enorme quantidade de surdos analfabetos, os que tentaram utilizar o método oralista carregaram e carregam até hoje consequências e experiências negativas. Comunicação total A comunicação total, como a palavra mesmo nos leva a entender, é uma comunicação que permite todo o tipo linguístico e de tentativa para que aconteça a comunicação. Figura 3 – Comunicação total - uso da fala e uso do sinal. https://cutt.ly/Off1euK Devido ao fracasso da metodologia oralista, surgiu a comunicação total, com o intuito de recuperar a comunicação entre as pessoas surdas, foram aceitos quaisquer métodos que pudessem propiciar a comunicação, como a língua de sinais, gestos, leitura labial, alfabeto manual e outros, possibilitava desenvolver desde a linguagem oral das pessoas até meios clínicos como o uso de Aparelho de Amplificação Sonora Individual (AASI) nem que fosse apenas para os surdos ouvirem ruídos, sons da fala, etc. São os famosos “aparelhos auditivos” usados atrás das orelhas, https://cutt.ly/Off1euK existem vários padrões de fabricação e modelos. O usuário desse tipo de aparelho tem que fazer um molde da parte interna do ouvido, e conforme a criança cresce é necessário fazer outro molde. Segundo Ciccone (1996,p.06-08 apud KALATAI E STREIECHEN, p.7) A Comunicação Total é uma filosofia de trabalho voltada para o atendimento e a educação de pessoas surdas. Não é, tão somente, mais um método na área e seria realmente, um equívoco considerá-la, inicialmente, como tal (...). A Comunicação Total, entretanto, não é uma filosofia educacional que se preocupa com ideais paternalistas. O que ela postula, isto sim, é uma valorização de abordagens alternativas, que possam permitir ao surdo ser alguém, com quem se possa trocar ideias, sentimentos, informações, desde sua mais tenra idade. Condições estas que permitam aos seus familiares (ouvintes, na grande maioria das vezes) e às escolas especializadas, as possibilidades de, verdadeiramente, liberarem as ofertas de chances reais para um seu desenvolvimento harmônico. Condições, portanto, para que lhe sejam franqueadas mais justas oportunidades, de modo que possa ele, por si mesmo lutar em busca de espaços sociais a que, inquestionavelmente, tem direito. Podemos dizer que a comunicação total surgiu para agregar ao método oralista, de forma que os dois pudessem ser usados, porém não produziu os resultados esperados, pois o oralismo e a comunicação total abordavam duas línguas (a oral e a de sinais) consecutivas, como essas línguas tem estruturas gramaticas diferentes, a aprendizagem dos alunos surdos se tornou difícil por conta da mistura dessas duas modalidades. Bilinguismo Vamos ver agora a proposta pedagógica bilíngue, desenvolvida e realizada com os alunos surdos, que utiliza a LIBRAS como primeira língua e a língua portuguesa como a segunda língua dos surdos na modalidade escrita. Figura 4 – O uso de sinais com a língua portuguesa. https://cutt.ly/Jff1yF1 https://cutt.ly/Jff1yF1 A proposta bilíngue iniciou-se pelo fato dos surdos reivindicarem o direito à sua língua, voltada a pesquisas linguísticas sobre a língua de sinais. Estudos e pesquisas têm indicado que o bilinguismo é a proposta que proporciona um aprendizado mais adequado para as crianças surdas, por saber que é natural a língua de sinais (primeira língua dos surdos) e, ao mesmo tempo, dá condições à aprendizagem da língua portuguesa, favorecendo à criança surda duas línguas no âmbito escolar. Bernardino (2000, p. 29 apud KALATAI E STREIECHEN, [s/d] p. 09) cita que os surdos necessitam da língua para seu desenvolvimento cognitivo e social, sua fala é importante quando diz que: [...] a língua é considerada importante via de acesso para o desenvolvimento do surdo em todas as esferas do conhecimento, propiciando não apenas a comunicação do surdo com o ouvinte, mas também com o surdo, desempenhando também a função de suporte do pensamento e de estimulador do desenvolvimento cognitivo e social. O Bilinguismo considera que a língua oral não preenche todas essas funções, sendo imprescindível o aprendizado de uma língua visual-sinalizada desde tenra idade, possibilitando ao surdo o preenchimento das funções linguísticas que a língua oral não preenche. Assim, as línguas de sinais são tanto o objetivo quanto o facilitador do aprendizado em geral, assim como do aprendizado da língua oral. É fundamental que todos tenhamos noção de que a educação bilíngue deve ser oferecida desde a educação infantil para crianças surdas, LIBRAS como primeira língua (L1) e língua portuguesa como segunda língua (L2). Utilizando a metodologia do bilinguismo o surdo assume sua identidade e cultura própria. É importante salientar que, na proposta bilíngue, a presença de um interprete é fundamental para interpretar as aulas e também para ensinar os alunos a língua de sinais, pois há alunos surdos que desconhecem a Libras, entra aí o papel do intérprete de ensinar a língua de sinais e propor uma comunicação entre professor, alunos surdos e alunos ouvintes. Podemos perceber a importância da proposta bilíngue para a construção do conhecimento dos surdos. Porém, é necessária a colaboração de todos os profissionais envolvidos, se for somente o professor da sala, o aprendizado fica comprometido. Não podemos esquecer que a proposta política-pedagógica deve proporcionar a verdadeira aprendizagem desses alunos. Para que realmente haja aprendizado, é fundamental aplicar atividades que desperte o aprender e o interesse do aluno. Para isso, o professor deve elaborar um planejamento que possibilite a interação do aluno surdo. Para Zabalza (2004), o processo de aprendizagem [...] é essa atividade mental que leva o aprendiz a reestruturar constantemente seus conhecimentos e suas habilidades [...] Já o nosso papel como docentes consiste em apoiar o processo, dar pistas, estimulá-lo, oportunizar situações em que cada nova estrutura conceitual possa ser posta à prova e questionada de maneira tal que o aprendiz se veja em situação de ter de introduzir novos reajustes em seus conhecimentos prévios. (ZABALZA, 2004, p.193). A comunidade escolar e todos os profissionais pertencentes à comunidade surda, que convivem com o aluno surdo, se preocupam com o processo de ensino- aprendizagem, e buscam propor a eles a acessibilidade da língua de sinais. A pedagogia da diferença para o surdo A pedagogia da diferença, ou pedagogia surda, consiste numa pedagogia em que a educação dos surdos seja oferecida por educadores surdos. Essa metodologia inicia-se com o objetivo de tomar outro rumo a educação dos surdos, recuperando a cultura histórica deste grupo. Para que aconteça a pedagogia surda, a escola deve repensar a proposta curricular e considerar o aluno surdo como um ser histórico, social e cultural. Como cita Rangel e Stumpf (2010, p.116) [...] Os surdos querem receber mais do que a devida atenção aos aspectos psicológicos que permitem a formação de identidades saudáveis. Eles querem ir à escola para deixarem de ser analfabetos e para receberem a educação que lhes permita o acesso a reais perspectivas nos campos laboral e social. Figura – 5 - Professora e alunos surdos. https://cutt.ly/Zff1z0F https://cutt.ly/Zff1z0F A metodologia da pedagogia surda veio mostrar a verdadeira identidade surda, como o surdo é e pensa, a sua cultura, a sua necessidade, que há tempos a comunidade surda vem defendendo em estabelecer a sua individualidade. Por isso, defendem que os professores surdos ensinam de maneira mais satisfatória os alunos surdos. Com o professor surdo em sala, os alunos surdos sentirão segurança e valorização em todos os seus aspectos, as aulas ficam mais interativas, com trocas de experiências, pois de acordo com Rangel e Stumpf (2010, p.115): Quando o professor e o aluno utilizam a mesma língua, no caso a língua de sinais, a comunicação deixa de ser um problema. Quando ambos são surdos, os interesses e a visão de mundo passam a ser os mesmos. A fluidez de comunicação possibilita as mais variadas trocas. Com a atuação do professor surdo, o aluno compreende sua língua, obtém diálogos entre professor e aluno favorecendo a realização da comunicação, por vezes essa comunicação não ocorre nem na própria família, pois a maioria não busca aprender a língua de sinais. Os alunos surdos, diante aos professores ouvintes, sentem que eles não os veem como um ser completo. Como relata Rangel e Stumpf (2010, p.115) Os alunos surdos, muitas vezes veem o professor ouvinte como um sujeito que não os reconhecem em sua completude. O mesmo, infelizmente, também acontece na relação com os pais, seus irmãos, seus parentes, os adultos, quase todos ou todos os ouvintes com quem o surdo convive. Quando essas pessoas não se inserem na comunidade surda ou não aprendem a língua de sinais, os surdos não podem projetar-se neles. Suas expectativas de vida ficam reduzidas a espelhar-se na realidade dos surdos com quem têm oportunidadede conviver. Podemos perceber que os alunos surdos sentem que os professores ouvintes não se envolvem e nem se interagem, por isso eles não sentem muita confiança nos mesmos, e com essa insegurança sua esperança de aprendizagem fica prejudicada e até mesmo o social não acontece de forma desejável. Os alunos surdos que participam de aulas com professores surdos ou professores ouvintes fluentes em LIBRAS, sentem a satisfação por haver diálogos entre ambos, e ocorre uma mudança no processo de ensino- aprendizagem deixando-os na certeza de que terão um futuro melhor e de grandes conquistas. Conclusão Nesta aula vimos as metodologias que surgiram ao longo do tempo: o oralismo, a comunicação total, o bilinguismo e a pedagogia dos surdos ou pedagogia da diferença, suas propostas, os prós e os contras encontrados em cada uma. Assistam à videoaula sobre as cores e cumprimentos. Na próxima aula estudaremos sobre a surdez: visão clínica versus a visão sócio antropológica. Biblioteca virtual- UNIFEV Indicação da leitura do livro até a página 68. “Libras: conhecimento além dos sinais” Referências CAPOVILLA, Fernando C. Filosofias Educacionais em relação ao surdo: do oralismo à comunicação total ao bilinguismo. Revista Brasileira de Educação Especial, v.6, nº1, 2000, p.99- 116. GOLDFELD, Marcia. A criança surda – linguagem e cognição numa perspectiva sociointeracionista. 2ª ed. São Paulo: Plexus, 2002. KALATAI, Patricia; STREIECHEN, Eliziane Manosso. As principais metodologias utilizadas na educação dos surdos no Brasil. Disponível em: <anais.unicentro.br/seped/pdf/iiiv3n1/120.pdf>. Acesso em: 01 de setembro de 2020. RANGEL, G. M. M; STUMPF, M. R. A pedagogia da diferença para o surdo. In: LODI, A. C. B; MÉLO, A. D. B; FERNANDES, E. (Orgs). Letramento, bilinguismo e educação de surdos. Porto Alegre: Medição. 2012. P. 113-133.In: Anais de congresso, Paraná. 2012. ZABALZA, M. A. O ensino universitário, seu cenário, seus protagonistas. Porto Alegre: Artmed, 2004.