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Indaial – 2020 História da Psicologia Prof. Rodrigo Diaz De Vivar Y Soler 1a Edição Copyright © UNIASSELVI 2020 Elaboração: Prof. Rodrigo Diaz De Vivar Y Soler Revisão, Diagramação e Produção: Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri UNIASSELVI – Indaial. Impresso por: S685h Soler, Rodrigo Diaz de Vivar Y História da psicologia. / Rodrigo Diaz de Vivar Y Soler. – Indaial: UNIASSELVI, 2020. 207 p.; il. ISBN 978-65-5663-139-4 ISBN Digital 978-65-5663-140-0 1. Psicologia - História. - Brasil. Centro Universitário Leonardo Da Vinci. CDD 150.9 III aPresentação Apresentamos a você, leitor, este livro sobre os aspectos relacionados à disciplina de História da Psicologia. Neste material, você poderá encontrar elementos que subsidiarão os seus estudos e a sua formação. O presente livro é composto por três unidades subdividas em tópicos. Na primeira unidade, você será apresentado ao contexto histórico do aparecimento da psicologia, desde suas raízes filosóficas na antiguidade, até a sua consolidação como ciência no final do século XIX. Desta maneira, apresentaremos o contexto das ideias psicológicas na Grécia antiga, passando pelo império romano, pelos primeiros anos do cristianismo, pela visão psicológica na Idade Média e, também no Renascimento. Em seguida, apresentaremos as condições de possibilidades para o nascimento da psicologia científica desde os primeiros trabalhos desenvolvidos por Wundt, passando pelas primeiras escolas psicológicas, no caso o funcionalismo, o estruturalismo e o associacionismo. A segunda unidade é dedicada à contextualização das escolas psicológicas no século XX. Iniciaremos o nosso percurso pela emergência do behaviorismo, desde as primeiras descobertas promovidas pela reflexologia até as principais aplicações do comportamentalismo. Em seguida, apontaremos as contribuições do saber psicanalítico para a consolidação da psicologia como ciência e profissão na nossa sociedade. Esse percurso é inaugurado por Freud e as suas contribuições acerca da subjetividade e as estruturas do nosso inconsciente. Falaremos também da psicologia da Gestalt e as suas ressonâncias para os estudos sobre a subjetividade. Em um quarto momento, apontaremos as principais correntes ligadas ao movimento psicológico conhecido como humanismo. Por fim, apontaremos os elementos ligados a relações da psicologia com a América Latina, ocasião que permitirá apresentar ao leitor, os elementos singulares de uma prática psicológica ligada aos enfrentamentos sociais e políticas do nosso continente. Por fim, a terceira unidade deste livro é dedicada a pensar as correlações e o debate entre a psicologia e o mundo contemporâneo. Desse modo serão apresentadas aqui as relações entre a subjetividade e a religião no contexto da sociedade brasileira contemporânea. Em seguida, os tensionamentos existentes entre a subjetividade, a psicologia e as relações de gênero. Por fim, contextualizaremos os problemas ligados ao contexto da subjetividade, da psicologia e das relações étnico-raciais. Boa leitura e bons estudos! Prof. Rodrigo Diaz De Vivar Y Soler IV Você já me conhece das outras disciplinas? Não? É calouro? Enfim, tanto para você que está chegando agora à UNIASSELVI quanto para você que já é veterano, há novidades em nosso material. Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos os acadêmicos desde 2005, é o material base da disciplina. A partir de 2017, nossos livros estão de visual novo, com um formato mais prático, que cabe na bolsa e facilita a leitura. O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura interna foi aperfeiçoada com nova diagramação no texto, aproveitando ao máximo o espaço da página, o que também contribui para diminuir a extração de árvores para produção de folhas de papel, por exemplo. Assim, a UNIASSELVI, preocupando-se com o impacto de nossas ações sobre o ambiente, apresenta também este livro no formato digital. Assim, você, acadêmico, tem a possibilidade de estudá-lo com versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador. Eu mesmo, UNI, ganhei um novo layout, você me verá frequentemente e surgirei para apresentar dicas de vídeos e outras fontes de conhecimento que complementam o assunto em questão. Todos esses ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos nas pesquisas institucionais sobre os materiais impressos, para que você, nossa maior prioridade, possa continuar seus estudos com um material de qualidade. Aproveito o momento para convidá-lo para um bate-papo sobre o Exame Nacional de Desempenho de Estudantes – ENADE. Bons estudos! NOTA V VI Olá, acadêmico! Iniciamos agora mais uma disciplina e com ela um novo conhecimento. Com o objetivo de enriquecer teu conhecimento, construímos, além do livro que está em tuas mãos, uma rica trilha de aprendizagem, por meio dela terás contato com o vídeo da disciplina, o objeto de aprendizagem, materiais complementares, entre outros, todos pensados e construídos na intenção de auxiliar teu crescimento. Acesse o QR Code, que te levará ao AVA, e veja as novidades que preparamos para teu estudo. Conte conosco, estaremos juntos nessa caminhada! LEMBRETE VII UNIDADE 1 – CONTEXTO HISTÓRICO DO APARECIMENTO DA PSICOLOGIA: DA FILOSOFIA À CIÊNCIA ...............................................................................................1 TÓPICO 1 – AS ORIGENS FILOSÓFICAS DA PSICOLOGIA .......................................................3 1 INTRODUÇÃO .......................................................................................................................................3 2 A PSICOLOGIA NA GRÉCIA ANTIGA ............................................................................................4 3 A PSICOLOGIA NA ROMA ANTIGA .............................................................................................9 4 A PSICOLOGIA E O CRISTIANISMO ...........................................................................................15 5 A PSICOLOGIA NA IDADE MÉDIA ..............................................................................................21 6 A PSICOLOGIA NO NASCIMENTO DA MODERNIDADE: DO RENASCIMENTO AO ILUMINISMO .......................................................................................................................................25 RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................................................31 AUTOATIVIDADE .................................................................................................................................32 TÓPICO 2 – O NASCIMENTO DA PSICOLOGIA CIENTÍFICA E AS PRIMEIRAS ESCOLAS PSICOLÓGICAS ..................................................................................... 33 1 INTRODUÇÃO .....................................................................................................................................33 2 A PSICOLOGIA CIENTÍFICA E O POSITIVISMO ......................................................................34 3 WUNDT, O PAI DA PSICOLOGIA ..................................................................................................38 4 O FUNCIONALISMO ..........................................................................................................................42 5 O ESTRUTURALISMO .......................................................................................................................47 6 O ASSOCIACIONISMO .....................................................................................................................50 LEITURA COMPLEMENTAR ...............................................................................................................55 RESUMO DO TÓPICO 2........................................................................................................................60AUTOATIVIDADE .................................................................................................................................61 UNIDADE 2 – AS PRINCIPAIS ESCOLAS PSICOLÓGICAS .......................................................63 TÓPICO 1 – A PSICOLOGIA BEHAVIORISTA ...............................................................................65 1 INTRODUÇÃO .....................................................................................................................................65 2 OS PRIMEIROS ESTUDOS DO COMPORTAMENTO E A REFLEXOLOGIA .....................65 3 PAVLOV E A FISIOLOGIA DO COMPORTAMENTO CLÁSSICO .........................................66 4 WATSON E A PRIMEIRA TEORIA SOBRE O COMPORTAMENTO HUMANO .................70 5 SKINNER E O COMPORTAMENTALISMO RADICAL .............................................................74 6 PRINCIPAIS APLICAÇÕES DO COMPORTAMENTALISMO .................................................80 RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................................................82 AUTOATIVIDADE .................................................................................................................................83 TÓPICO 2 – FREUD E A EMERGÊNCIA DA PSICANÁLISE .......................................................85 1 INTRODUÇÃO .....................................................................................................................................85 2 A PSICANÁLISE E CONSTITUIÇÃO DO SUJEITO ...................................................................85 3 SIGMUND, ANTES DE FREUD: ASPECTOS BIOGRÁFICOS ..................................................88 4 FREUD COMO PENSADOR DA CULTURA .................................................................................90 5 A EMERGÊNCIA DO INCONSCIENTE .........................................................................................91 sumário VIII 6 PSICANÁLISE E A CURA PELA PALAVRA...................................................................................93 7 A PSICANÁLISE E A SEXUALIDADE INFANTIL ........................................................................93 8 OS PRINCIPAIS CONCEITOS DA PSICANÁLISE ......................................................................94 9 A PSICANÁLISE DEPOIS DE FREUD .............................................................................................95 RESUMO DO TÓPICO 2........................................................................................................................96 AUTOATIVIDADE .................................................................................................................................97 TÓPICO 3 – A PSICOLOGIA DA GESTALT E A EXPERIÊNCIA DA PERCEPÇÃO ................99 1 INTRODUÇÃO .....................................................................................................................................99 2 O QUE É GESTALT?.............................................................................................................................99 3 MAX WERTHEIMER E OS ESTUDOS SOBRE A PERCEPÇÃO ..............................................103 4 KURT KOFFKA E OS ESTUDOS SOBRE O DESENVOLVIMENTO DA MENTE ..............108 5 KURT LEWIN E A TEORIA DE CAMPO ......................................................................................110 RESUMO DO TÓPICO 3......................................................................................................................113 AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................114 TÓPICO 4 – A PSICOLOGIA HUMANISTA...................................................................................115 1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................115 2 DETERMINANTES PARA O NASCIMENTO DA PSICOLOGIA HUMANISTA ...............116 3 CARL ROGERS E A ABORDAGEM CENTRADA NA PESSOA .............................................118 4 MARTIN BUBER E A VOCAÇÃO DIALÓGICA ........................................................................120 5 VIKTOR FRANKL E A LOGOTERAPIA .......................................................................................124 RESUMO DO TÓPICO 4......................................................................................................................126 AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................127 TÓPICO 5 – A PSICOLOGIA DESDE A AMÉRICA LATINA .....................................................129 1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................129 2 MARTIN-BARÓ E A PSICOLOGIA DA LIBERTAÇÃO ...........................................................129 3 PICHON-RIVIÈRE E OS PROCESSOS GRUPAIS ......................................................................133 4 SILVIA LANE E UMA NOVA VISÃO DE SUBJETIVIDADE ...................................................137 5 ANTIPSIQUIATRIA E DESINSTITUCIONALIZAÇÃO: A LUTA ANTIMANICOMIAL NO BRASIL .................................................................................................................................................141 LEITURA COMPLEMENTAR .............................................................................................................145 RESUMO DO TÓPICO 5......................................................................................................................147 AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................148 UNIDADE 3 – HISTÓRIA POLÍTICA DA SUBJETIVIDADE: UM DIÁLOGO COM O CONTEMPORÂNEO .................................................................................................149 TÓPICO 1 – SUBJETIVIDADE, RELIGIÃO E POLÍTICA NO BRASIL CONTEMPORÂNEO .....................................................................................................151 1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................151 2 RELIGIOSIDADE, SUBJETIVIDADE E ESTADO LAICO ........................................................151 3 RELIGIÃO, SUBJETIVIDADE E ARQUÉTIPOS .........................................................................155 4 RELIGIOSIDADE, SUBJETIVIDADE E DIREITOS HUMANOS ...........................................159 RESUMO DO TÓPICO 1......................................................................................................................163 AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................164 TÓPICO 2 – SUBJETIVIDADE E RELAÇÕES DE GÊNERO .......................................................165 1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................165 2 OS ESTUDOS DE GÊNERO E A PSICOLOGIA ..........................................................................165 3 GÊNERO, SUBJETIVIDADE E RELAÇÕES DE PODER ...........................................................169 IX 4 GÊNERO, SUBJETIVIDADE E BIOPOLÍTICA ............................................................................173 RESUMO DO TÓPICO 2......................................................................................................................178 AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................179 TÓPICO 3 – SUBJETIVIDADE E RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS .............................................181 1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................1812 A PRODUÇÃO DA SUBJETIVIDADE RACIAL NO BRASIL ..................................................181 3 SUBJETIVIDADE, RELAÇÕES ETNICORRACIONAIS E ESTUDOS SOBRE A BRANQUITUDE .................................................................................................................................185 4 SUBJETIVIDADE, RACISMO E NECROPOLÍTICA ..................................................................189 LEITURA COMPLEMENTAR .............................................................................................................193 RESUMO DO TÓPICO 3......................................................................................................................197 AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................198 REFERÊNCIAS .......................................................................................................................................199 X 1 UNIDADE 1 CONTEXTO HISTÓRICO DO APARECIMENTO DA PSICOLOGIA: DA FILOSOFIA À CIÊNCIA OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM PLANO DE ESTUDOS A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de: • conceituar os determinantes históricos do aparecimento da psicologia desde a filosofia à ciência; • caracterizar as relações entre a psicologia, a filosofia e a ciência; • compreender as condições de possibilidades em torno do saber psicológi- co ao longo da história; • apresentar um panorama crítico sobre as principais ideias psicológicas que contribuíram para a constituição da psicologia como ciência. Esta unidade está dividida em dois tópicos. No decorrer da unidade, você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado. TÓPICO 1 – AS ORIGENS FILOSÓFICAS DA PSICOLOGIA TÓPICO 2 – O NASCIMENTO DA PSICOLOGIA CIENTÍFICA E AS PRIMEIRAS ESCOLAS PSICOLÓGICAS Preparado para ampliar teus conhecimentos? Respire e vamos em frente! Procure um ambiente que facilite a concentração, assim absorverás melhor as informações. CHAMADA 2 3 TÓPICO 1 UNIDADE 1 AS ORIGENS FILOSÓFICAS DA PSICOLOGIA 1 INTRODUÇÃO Caro acadêmico! Meus parabéns pela sua escolha. Você optou por uma profissão em constante expansão no Brasil. Atualmente, segundo dados do Conselho Federal de Psicologia (LHULLIER, 2013), somos 359.101 profissionais atuando nas mais variadas áreas de intervenção. Desde a clínica, passando pelas áreas da educação, das organizações, da saúde pública e da assistência social, até as consideradas áreas emergentes como as ligadas ao judiciário, a prática hospitalar e, mesmo a área ambiental. O Conselho Federal de Psicologia – regulamentado pelo Decreto nº 79.822, de 17 de junho de 1977 – é uma autarquia responsável pela orientação e fiscalização da psicologia como profissão no Brasil. Todo o profissional que atua como psicólogo deve possuir o seu registro profissional para o exercício da sua prática. Você pode conhecer mais detalhes do CFP acessando o site: <site.cfp.org.br>. No site você encontra muitas informações importantes que, certamente, o auxiliarão desde a sua formação acadêmica até a sua futura prática profissional. NOTA A Psicologia é uma área muito importante para a nossa sociedade. Justamente, por conta de tal aspecto, é que devemos conhecer a sua história, seus contornos e suas possibilidades. Enquanto ciência, a psicologia é muito recente – falaremos mais adiante sobre o seu nascimento – mas, enquanto leitura sobre a subjetividade a psicologia é um saber que nasce nos horizontes filosóficos da nossa civilização, mas especificamente na Grécia Antiga. Este tópico será dividido em cinco itens. No primeiro deles, “A psicologia na Grécia Antiga”, você será apresentado às principais reflexões elaboradas por filósofos como Sócrates e Platão, acerca do conhecimento sobre a alma humana. Já no segundo item, “A psicologia na Roma Antiga”, você irá conhecer um pouco mais sobre à maneira, pela qual, os filósofos romanos compreendiam a psicologia como um elemento fundamental para a vida em sociedade. No terceiro item, “A psicologia e o cristianismo”, você conhecerá as relações existentes entre o discurso cristão sobre a alma e a psicologia. No quarto item, “A psicologia na Idade UNIDADE 1 | CONTEXTO HISTÓRICO DO APARECIMENTO DA PSICOLOGIA: DA FILOSOFIA À CIÊNCIA 4 Média”, você será apresentado às primeiras tradições escolásticas responsáveis por pensar as bases da psicologia em um mundo marcado, sobretudo, pela crença na espiritualidade e nos dogmas religiosos. Por fim, "A Psicologia no nascimento da modernidade: do Renascimento ao Iluminismo” você será apresentado as principais reflexões elaboradas por filósofos ligados ao campo da psicologia. 2 A PSICOLOGIA NA GRÉCIA ANTIGA Etimologicamente, a palavra Psicologia é proveniente do grego – ψυχή – a qual psyché significa alma e λογία, designa, por sua vez, a logia, ou seja, o estudo. Não foram os gregos que criaram a psicologia, mas é certo que eles foram um dos precursores das reflexões sobre os sentidos existenciais acerca de um possível compreensão e/ou articulação entre existência e conduta humana. Em outras palavras, no interior da história da nossa civilização, podemos encontrar também, os elementos responsáveis por indicar a necessidade de os sujeitos buscarem estabelecer uma linha de raciocínio sobre os sentidos e os significados da sua própria experiência, ou seja, a cultura grega foi responsável pela criação de um estilo próprio responsável por endossar as explicações racionais para todos os acontecimentos presentes nesse mundo. Vejamos um exemplo dessa reflexão a partir da seguinte charge: FIGURA 1 – CHARLIE BROWN E O AMIGUINHO CONVERSAM SOBRE O SENTIDO DA EXISTÊNCIA FONTE: <https://br.pinterest.com/pin/629518854134466590/>. Acesso em: 24 abr. 2020. TÓPICO 1 | AS ORIGENS FILOSÓFICAS DA PSICOLOGIA 5 A essa reflexão, os gregos nomearam Filosofia. A filosofia foi a primeira forma de sistematização racional e especulativa sobre a condição humana. As razões pelas quais somos afetados pelas experiências ao nosso redor. Os primeiros filósofos ficaram conhecidos, posteriormente como pré- socráticos-socráticos. Os filósofos pré-socráticos são assim nomeados por se localizarem, no tempo anterior as primeiras sistematizações construídas por Sócrates e seus discípulos. Suas obras foram agrupadas a partir de fragmentos voltados à compreensão da relação entre o sujeito e a natureza. NOTA Os pré-socráticos procuravam introduzir, nas suas reflexões, os elementos antropológicos aos quais se relacionavam as experiências éticas e estéticas do humano. Nos seus quadros, podemos destacar os nomes de Tales de Mileto (624- 547 a.C.) para quem tudo era considerado um grande devir e, nesse sentido, a vida do sujeito participara ativamente de todo o cosmos. Já Heráclito de Éfeso (500 – 400 a.C.) elaborou suas reflexões, no sentido de estabelecer as constantes transformações pelas quais o sujeito passara ao longo de toda a sua existência como podemos destacar nos fragmentos a seguir: Frag. 04: Se a felicidade consistisse nos prazeres do corpo, deveríamos proclamar felizes os bois, quando encontram ervilhas para comer. Frag. 45: Mesmo, percorrendo todos os caminhos, jamais encontrarás os limites da alma. Frag. 82: O mais belo símio é feio comparado ao homem. Frag. 101: Eu me procurei a mim próprio. Frag. 125: Mesmo uma bebida se decompõe se não for agitada (HERÁCLITO apud NOGARE, 1985, p. 28). O pensamento de Heráclito representa, portanto, a primeira aventura antropológica voltada para a compreensão do tensionamento entre os espaços teológico e cosmológico. Nesse sentido, o sujeito para Heráclito, é, antes de tudo, uma parte do cosmos estando submetido as suas leis. Entretanto, ao adquirir consciência de si, esse mesmo sujeito reflete em si mesmo, as experiências das leis divinas. Ainda com relação aos pré-socráticos podemos destacar à figura de Parmênides(530 – 460 a.C.) para quem a essência do ser era a permanência. Parmênides propunha que o ser só poderia manifestar a sua verdade pela sua UNIDADE 1 | CONTEXTO HISTÓRICO DO APARECIMENTO DA PSICOLOGIA: DA FILOSOFIA À CIÊNCIA 6 própria afirmação já que ele é o único responsável por afirmar quem ele mesmo é. Dessa forma, Parmênides inaugura uma reflexão muito aprofundada sobre a natureza ontológica do ser. Para que possamos esclarecer melhor essa afirmativa, convidamos você, leitor, a observar os primeiros versos do clássico poema escrito por Fernando Pessoa, intitulado Tabacaria no qual podemos ler: Não sou nada. Nunca serei nada. Não posso querer ser nada. À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo (ÁLVARO DE CAMPOS, s.d.). Como podemos observar, a partir da leitura de “Parmênides”, a imutabilidade do ser, reside na capacidade deste em formular uma reflexão sobre aquilo que ele mesmo é. É justamente essa capacidade que distingue o ser das outras coisas em geral, pois estas não podem questionar o seu sentido existencial. FIGURA 2 - O POETA FERNANDO PESSOA (1888-1935) FONTE: <https://www.todamateria.com.br/fernando-pessoa/>. Acesso em: 24 abr. 2020. O poeta Fernando Pessoa (1888-1935) certamente fora influenciado pela filosofia de Parmênides. Após o desaparecimento dos pré-socráticos, a sociedade grega fora tomada pela formação do que, os historiadores costumam chamar de Paideia que, segundo Jaeger (1995), compreende a composição de um mosaico sobre distintas práticas voltadas a formação intelectual, estética, moral e ética do sujeito. A Paideia configura-se como a primeira tentativa da nossa civilização de estabelecer uma estruturação pedagógica do sujeito, desde sua infância até à velhice. TÓPICO 1 | AS ORIGENS FILOSÓFICAS DA PSICOLOGIA 7 FIGURA 3 - A ACRÓPOLE DE ATENAS: UMAS DAS PRIMEIRAS EXPERIÊNCIAS PROVENIENTES DA PAIDEIA GREGA FONTE: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Acr%C3%B3pole_de_Atenas>. Acesso em: 24 abr. 2020. É nesse contexto que aparecem os primeiros educadores, responsáveis por transmitir aos cidadãos gregos os rumos e percursos da Paideia. Esses educadores em geral, acabavam transmitindo esses conhecimentos mediante o pagamento ofertado pelos seus serviços. Embora a cidadania seja uma invenção da civilização grega, o seu sentido é radicalmente diferente dos dias atuais. Na Grécia Antiga, o cidadão era aquele que possuía terras e demais propriedades, além de ser natural de Atenas. A cidadania, portanto, era um conceito muito restrito as elites intelectuais e políticas da época. Com a Revolução Francesa é que esse conceito passa a se estender a todos os sujeitos como um direito natural. NOTA Esses profissionais da educação, por assim dizer, ficaram conhecidos como sofistas, isto é, pessoas esclarecidas e habilidosas que ofertavam seus serviços mediante pagamento. Os sofistas fizeram parte da Paideia nos mais variados campos. Desde a filosofia, mas também das artes, do militarismo e da medicina, somente para ilustrarmos alguns exemplos. Poucos estudados nos dias de hoje, os sofistas foram alvo de muitas críticas por conta do aparecimento da figura de Sócrates (469 - 399 a.C.), considerado o pai da filosofia. Pouco se sabe sobre a figura histórica de Sócrates até suas primeiras atividades filosóficas, mas muito se sabe sobre a figura simbólica de Sócrates devido ao seu legado registrado pelos seus discípulos, dentre os quais destaca-se Platão (428 – 347 a.C.). UNIDADE 1 | CONTEXTO HISTÓRICO DO APARECIMENTO DA PSICOLOGIA: DA FILOSOFIA À CIÊNCIA 8 Basicamente a relevância de Sócrates para a filosofia consiste no fato de que ele, foi o primeiro pensador a realmente sistematizar uma reflexão em torno de uma atitude filosófica a partir do enfrentamento e problematização dos valores da sociedade ateniense. Enquanto os sofistas preocupavam-se unicamente com as questões materiais da Paideia valendo-se da educação como instrumento de mercantilização e manutenção dos seus privilégios, Sócrates procurava demonstrar como, as experiências voltadas ao conhecimento eram resultado de um cuidado do sujeito em relação a ele mesmo. O papel da filosofia designada por Sócrates não consistia no acúmulo de propriedades, nem mesmo do próprio conhecimento, mas na atitude do sujeito buscar, ao longo da sua própria existência um trabalho de aperfeiçoamento do sujeito em relação a ele mesmo, ou o que Foucault (2012) chama de ascese. No diálogo Apologia de Sócrates podemos ler essa recomendação feita por Sócrates perante seus acusadores: Além disso, os jovens ociosos, os filhos dos ricos, seguindo-me espontaneamente, gostam de ouvir-me examinar os homens, e muitas vezes me imitam, por sua própria conta, e empreendem examinar os outros; e então, encontram grande quantidade daqueles que acreditam saber alguma coisa, mas, pouco ou nada sabem. Daí, aqueles que são examinados por eles encolerizam-se comigo assim como com eles, e dizem que há um tal Sócrates, perfidíssimo, que corrompe os jovens (PLATÃO, 1979). É diante de tal perspectiva que o pensamento socrático se configura como a pedra angular do cuidado do sujeito em relação a si mesmo a partir da filosofia como forma de vida. Essa experiência corresponde à atitude voltada para o autoconhecimento, o exame de consciência e a vigilância ética presente em todos os momentos da vida do sujeito. Em torno dessa problemática é que Platão inaugurou a especulação metafísica sobre a relação entre o sujeito, a alma e a matéria. De um modo geral, Platão expressa que o mundo real, o mundo da matéria é inferior as experiências sensíveis que poderiam ser acessadas mediante à filosofia. TÓPICO 1 | AS ORIGENS FILOSÓFICAS DA PSICOLOGIA 9 FIGURA 4 – NEO, PERSONAGEM PRINCIPAL DO FILME MATRIX FONTE: <https://www.einerd.com.br/matrix-4-jovem-neo/>. Acesso em: 28 abr. 2020. O filme Matrix escrito e dirigido por Lily e Lana Wachowski é claramente influenciado pelas ideias platônicas acerca da relação entre matéria e ideia. Nesse filme, os diretores resgatam o mito da caverna proposto por Platão em A República. Neo, o personagem principal do filme Matrix é apresentado como alguém que consegue apreender o significado da essência das coisas para além do mundo material. A imortalidade da alma, o valor das ideias, o amor pela sabedoria faziam parte para Platão, de uma forma superior de vida contrária a todas as atividades materiais. Nesse sentido, o objetivo da sensibilidade idealista presente no sujeito seria o de promover a busca, pelo acesso a esse outro mundo distante das preocupações meramente materialistas. Em oposição a essa concepção, Aristóteles (384 – 322 a.C.) irá discorrer sobre o valor da matéria como elemento fundamental acerca da psiché. Para Aristóteles, o sujeito era um resultado de uma constituição dialética que envolvia a contradição como elemento fundamental. Isso significa que, o sujeito existe primeiro, constrói suas experiências em relação a esse mundo apropriando-se da natureza. E, é a partir dessa apropriação que o sujeito desenvolve o seu conhecimento. 3 A PSICOLOGIA NA ROMA ANTIGA Assim como os gregos, os romanos deixaram inúmeros legados à civilização ocidental. Suas influências são nitidamente sentidas até os nossos dias seja pela contextualização dos saberes jurídicos/institucionais, seja pelo aperfeiçoamento das diretrizes organizacionais da política. UNIDADE 1 | CONTEXTO HISTÓRICO DO APARECIMENTO DA PSICOLOGIA: DA FILOSOFIA À CIÊNCIA 10 No entanto, com relação à psicologia, quais seriam precisamente, as influências dos romanos? Alguns séculos após o declínio das cidades-Estados gregas, emergem inúmeras escolas filosóficas ao redor da Europa, da Ásia e da África no período nomeado pelos historiadores como helenismo. Em uma tradução livre, podemos dizer que o “helenismo “significa algo como “viver como os gregos.” Esse período da história compreende desde a morte de Alexandre, O Grande – 323 a.C. até a anexaçãoda península grega e suas ilhas por Roma em 146 a.C. O helenismo registrou um grande impacto e influência no encontro entre as culturas ocidentais e orientais desde a filosofia, passando pelas artes, pela ciência e, até mesmo, pela religião. NOTA A partir de tal perspectiva passam a existir inúmeras escolas filosóficas responsáveis por inserir, na cultura romana, os elementos de uma leitura sobre o conhecimento humano, bem como as suas perspectivas éticas e estéticas. Um dos maiores estudiosos da filosofia antiga, o francês Pierre Hadot (2006) costuma-se referir-se ao helenismo como um importante e potente espaço para o fortalecimento da filosofia como forma de vida. FIGURA 5 – O FILÓSOFO FRANCÊS PIERRE HADOT (1922 – 2010) FONTE: <https://www.optimize.me/authors/pierre-hadot/>. Acesso em: 28 abr. 2020. Pierre Hadot foi um dos maiores estudiosos das escolas filosóficas da antiguidade. Dentre essas escolas filosóficas podemos destacar, em primeiro lugar, o cinismo. Criado por Diógenes (404 a.C. – 323 a.C.), o cinismo defendia a radicalização da própria atividade filosófica. O filósofo cínico deveria promover uma atitude de completo despojamento das regras elementares para a existência. TÓPICO 1 | AS ORIGENS FILOSÓFICAS DA PSICOLOGIA 11 Desse modo, o cinismo era compreendido como um ataque frontal a toda moralização vigente. Diógenes, por exemplo, fazia amor em público, bem como praticava seus rituais de escatologia sem o menor pudor. Contudo, nenhuma atividade cínica era mais radical do que o exercício da parresía. A coragem do sujeito expressar-se livremente não temendo sequer a mais absoluta tirania. Foucault (2013) nos lembra que a parresía praticada pelos cínicos compreendia uma prática de verdade fundamental aos horizontes políticos, pois por meio dela, os cínicos desafiavam toda ordem social vigente. A parresía significa, em uma tradução livre, “coragem da verdade”, ou, ainda, “franco dizer”. Sua proveniência remete ao período conhecido como democracia pericliniana. Uma época marcada, sobretudo, pela experiência de radicalização da atividade política. NOTA O epicurismo foi outra escola filosófica muito importante dentro do helenismo. Seu criador foi Epicuro (342 a.C. – 271 a.C.). Basicamente, o epicurismo defendia a tese de que a obtenção da felicidade se daria pela mais absoluta vigília do sujeito em relação aos seus próprios apetites carnais. Hadot recupera uma importante mensagem transmitida por Epicuro a seus discípulos aonde podemos ler: “A voz da carne diz: não se deve sofrer a fome, a sede e o frio; aquele que é senhor disso, e tem a esperança de possuí-lo no futuro, pode lutar até mesmo com Zeus pela felicidade (EPICURO apud HADOT, 2006, p. 170). É importante lembrarmos que, por “carne”, Epicuro refere-se ao corpo do sujeito. Logo, para os epicuristas não havia a separação entre corpo e alma, da mesma maneira que, não existia prazer ou sofrimento sem que se tivesse um estado de consciência capaz de permitir ao sujeito escolher, de forma racional, os seus prazeres. Justamente por conta de tal perspectiva, é que Epicuro, em conjunto com seus discípulos, passa a compreender que essa busca pela felicidade não estaria mais no espaço do embate político, da guerra, das conquistas ou da aquisição dos bens materiais, mas justamente do equilíbrio entre racionalidade e emoção. Nesse sentido, Epicuro formulou nas suas escolas, o que ele mesmo chamou de jardins, espaços clínicos onde seus discípulos poderiam, antes de tudo, aplicar o ensino fundamental das experiências do prazer a partir de uma condição terapêutica. UNIDADE 1 | CONTEXTO HISTÓRICO DO APARECIMENTO DA PSICOLOGIA: DA FILOSOFIA À CIÊNCIA 12 FIGURA 6 - LE SACRE DU PRINTEMPS OU A SAGRAÇÃO DA PRIMAVERA IGOR STRAVINSKY & VASLAV NIJINSKY REGISTRA, COM PRECISÃO OS EFEITOS TERAPÊUTICOS DO JARDIM DE EPICURO FONTE: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Le_Sacre_du_Printemps>. Acesso em: 24 abr. 2020. Por fim, outra escola que merece destaque dentro do helenismo foi o estoicismo. Criada por Zenão (495 a. C. – 425 a.C.) essa escola foi, a que mais encontrou adeptos dentro o que via a ser conhecido mais tarde como Império Romano. Basicamente, o estoicismo defendia a tese de que os sujeitos deveriam abster-se de todas as formas de vícios e prazeres, por meio da aplicação de exercícios espirituais. Os estoicos foram muito importantes por ilustrarem toda uma performatividade moral em torno das escolhas do sujeito como a preponderância pelo vínculo matrimonial, pela abstinência sexual e pelo despojamento dos bens materiais. Um dos filósofos romanos mais influenciados pelo estoicismo foi Sêneca (4 d.C. – 65 d.C.), um importante interlocutor e guia espiritual com grande influência no interior do Império. Sêneca escreveu uma vasta obra, na qual exortava todos os políticos a exercitarem seu espírito de modo a desenvolverem suas práticas de governo. Entre esses textos destacam-se “As Cartas”, documentos prescritivos e correspondências nas quais Sêneca procurava estabelecer as regras fundamentais para o exercício da prática filosófica, do amor pelo conhecimento e do cuidado do sujeito com relação a si mesmo. TÓPICO 1 | AS ORIGENS FILOSÓFICAS DA PSICOLOGIA 13 Um dos discípulos mais ilustres de Sêneca fora o imperador romano Nero. Sêneca foi um importante conselheiro político, buscando exercer sua influência de modo a fazer com que Nero pudesse exercer o seu governo a partir de uma política justa e humanitária. No ano de 65, porém, Sêneca foi acusado de uma conspiração pela tentativa de assassinato de Nero, sendo, dessa maneira, sentenciado à morte. NOTA Conforme podemos observar, o helenismo exerceu uma influência decisiva para a filosofia romana e para a contextualização de uma possível existência da psiché na vida ativa do Império Romano. Muitos imperadores foram influenciados pelas escolas filosóficas, mas em absoluto, nenhum deles foi tão fortemente influenciado como Marco Aurélio (161 – 180). O imperador filósofo – como também é conhecido – publicou uma série de reflexões influenciado pelo estoicismo. Esses livros receberam o título de “Meditações”. Basicamente, suas ideias giram em torno de reflexões sobre o necessário controle das emoções que, por sua vez, poderiam libertar o sujeito do sofrimento causado pelo mundo material. Nesse sentido, ele recomendava ao sujeito desenvolver o que ele mesmo chamava de exame de consciência. Tratava-se de uma atitude crítica, por meio da qual o sujeito deveria examinar cotidianamente todos os seus atos, buscando o seu aperfeiçoamento pessoal. Da mesma forma que Marco Aurélio, outro filósofo muito importante para a época fora Artemidoro (Séc. II d.C.) um amante da filosofia grega e que, dedicou, grande parte de sua vida ao estudo interpretativo e analítico dos sonhos. A essa perspectiva Artemidoro desenvolveu um método de trabalho nomeado por ele de Onirocrítica. UNIDADE 1 | CONTEXTO HISTÓRICO DO APARECIMENTO DA PSICOLOGIA: DA FILOSOFIA À CIÊNCIA 14 FIGURA 7 - MUITO ANTES DA PSICANÁLISE OU MESMO DO SURREALISMO OS SONHOS FORAM OBJETOS DE ADMIRAÇÃO E INTERPRETAÇÃO, POR PARTE DAS ESCOLAS FILOSÓFICAS DA ANTIGUIDADE FONTE: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Surrealismo>. Acesso em: 24 abr. 2020. Para Artemidoro, a interpretação dos sonhos era possível graças a justaposição das semelhanças. Nesse caso, as chaves para essa análise dependiam de uma série de características como: a idade, o gênero e a posição social do sujeito. Ainda com relação a essa análise, os sonhos sexuais ganhavam um destaque muito importante a partir de uma tripla perspectiva: em primeiro lugar havia os atos consonantes com a lei – kata nomom –, em segundo lugar, os atos contrários à lei – para nomom – e, finalmente, os contrários à natureza – para phusin – de todo o modo, essas subdivisões eram importantes para destacar as rupturas e diferenças entre às leis e à natureza, ou seja, os atos contrários a ordem socialvigente e, os contrários à conduta humana. Nesse contexto Foucault nos lembra que: [...] a prática interpretativa tal como ele opera no discurso de Artemidoro mostra que o próprio sonho sexual é percebido, elaborado, analisado, como uma cenário social; se ele anuncia o “bom” e o “mau” no campo do ofício, do patrimônio, da família, da carreira política, do status, das amizades e das proteções, é porque os atos sexuais que ele representa são constituídos pelos mesmos elementos que ele (FOUCAULT, 1985, p. 36). É a partir dessas experiências evocadas por esses pensadores que a psicologia no Império Romano vai, aos poucos tomando a forma, de conselheira espiritual dos sujeitos. Esses sistemas filosóficos passam a influenciar diretamente as práticas cotidianas durante o Império. TÓPICO 1 | AS ORIGENS FILOSÓFICAS DA PSICOLOGIA 15 Um dos maiores historiadores do mundo romano, chamado Paul Veyne (1980), chega mesmo a afirmar que, diferentemente do que se convencionou a acreditar, a lei que regia Roma não era o “sangue”, mas a formação do que ele chama de “vínculo familiar”. Diferentemente da Grécia Antiga em que as sistematizações da política e da cidadania ou mesmo da filosofia eram restritas a um círculo muito reduzidos de sujeitos, em Roma passa a existir, por meio das famílias a universalização dos próprios sujeitos. FIGURA 8 - O HISTORIADOR FRANCÊS PAUL VEYNE FONTE: <https://booksandideas.net/The-Curious-Monsieur-Veyne.html>. Acesso em: 28 abr. 2020. Os desdobramentos da psicologia na Roma Antiga reverberam sobre as práticas culturais voltadas para os sujeitos trabalharem as suas emoções a partir de uma doutrina fortemente amparada nas perspectivas filosóficas das formas de vidas voltadas para o aperfeiçoamento e o cuidado de si mesmo. Portanto, o papel da cultura romana sobre a psicologia será de fundamental importância no que se refere à popularização desse acontecimento nomeado como cuidado de si. 4 A PSICOLOGIA E O CRISTIANISMO O cristianismo é uma doutrina espiritual criada por Jesus e seus discípulos para anunciar, por um lado, a iminência do fim do mundo e, por outro lado, o advento do Reino de Deus. Trata-se de uma mensagem radicalmente oposta às culturas gregas e romanas. Essas duas últimas, jamais preocuparam-se em estabelecer um vínculo entre a existência dos sujeitos e a revelação escatológica dos fins dos tempos. UNIDADE 1 | CONTEXTO HISTÓRICO DO APARECIMENTO DA PSICOLOGIA: DA FILOSOFIA À CIÊNCIA 16 A ideia de inferno que conhecemos não é uma invenção do Cristianismo, mas, sim, uma apropriação do que os gregos chamavam de Hades? Geralmente, o Hades é representado na mitologia grega como o “mundo inferior”. Essa terra dos mortos era aonde todos deveriam esperar pelo seu julgamento após a morte. Com o Cristianismo cria-se a ideia de que o inferno é um lugar aonde apenas os hereges deverão expiar pelos seus pecados. INTERESSA NTE Contudo, a história mostra que após um século do desaparecimento de Jesus, alguns pensadores se esforçaram para apresentar o cristianismo não somente como uma filosofia, mas como a filosofia. Por conta de tal aspecto, a pergunta a ser feita seria: quais as condições de possibilidades que permitiram, durante muitos anos, o cristianismo tornar-se uma força hegemônica? Para que possamos esclarecer essa questão devemos compreender as possíveis relações entre as culturas grega e judaica. Essas duas perspectivas encontram-se representadas pelos trabalhos desenvolvidos por Fílon de Alexandria (15 a.C. – 45), filósofo judeu contemporâneo da era cristã. Por meio dos seus terapeutas de Alexandria, Fílon criou todo um estilo, ou melhor, uma exegese capaz de estabelecer a relação entre o inefável e o logos. Para Fílon, o logos designava não somente o discurso, mas a possibilidade de criação do mundo e de todas as coisas. Essa inspiração de Fílon foi extraída do Evangelho de João onde nos primeiros versículos podemos ler: No princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus. Ele estava no princípio com Deus. Todas as coisas foram feitas por ele, e sem ele nada do que foi feito se fez. Nele estava a vida, e a vida era a luz dos homens. E a luz resplandece nas trevas, e as trevas não a compreenderam. Houve um homem enviado de Deus, cujo nome era João. Este veio para testemunho, para que testificasse da luz, para que todos cressem por ele. Não era ele a luz, mas para que testificasse da luz. Ali estava a luz verdadeira, que ilumina a todo o homem que vem ao mundo. Estava no mundo, e o mundo foi feito por ele, e o mundo não o conheceu. Veio para o que era seu, e os seus não o receberam. Mas, a todos quantos o receberam, deu-lhes o poder de serem feitos filhos de Deus, aos que creem no seu nome; Os quais não nasceram do sangue, nem da vontade da carne, nem da vontade do homem, mas de Deus. E o Verbo se fez carne, e habitou entre nós, e vimos a sua glória, como a glória do unigênito do Pai, cheio de graça e de verdade (JOÃO EVANGELISTA, BÍBLIA SAGRADA, 1995, 01:14, p. 1082). TÓPICO 1 | AS ORIGENS FILOSÓFICAS DA PSICOLOGIA 17 Em todo esse conjunto de palavras, a que mais chama a atenção é o Verbo/logos. Por conta dessa palavra, é que uma filosofia cristã foi possível. Evidentemente que encontramos o emprego do logos entre os gregos e romanos. Contudo, para eles o significado de tal termo é resumido na relação entre discurso e razão. No Prólogo do Evangelho de João, o logo ganha uma representação eterna, uma vez que, a figura de Deus é tida como a razão responsável por instituir um guia de conduta não somente para o pensamento, mas também para as ações do sujeito. Ao proclamar que o “Verbo era Deus” e, mais tarde que o “logos se fez carne e habitou entre nós”, João constituiu, de acordo com Hadot (2006), uma experiência filosófica que liga a alma do mundo com o corpo do sujeito. Os primeiros cristãos, portanto, produziram uma experiência filosófica que aproxima, portanto, a doutrina cristã de temas até então tipicamente comuns à filosofia. Para os filósofos cristãos do século II, os gregos e romanos possuíam apenas uma limitação da compreensão totalizada do logos e, somente com a emergência do cristianismo é que passa a existir, o discurso verdadeiro da razão encarnada na figura de Jesus. Os primeiros filósofos cristãos são chamados pelos historiadores de apologistas. Eles receberam essa designação por desenvolverem uma reflexão voltada para a aproximação das formas de vidas filosóficas com as questões ligadas ao cristianismo. NOTA Ao considerarem o fato de que, o exercício filosófico consistia em estabelecer uma aproximação do discurso com a razão, os cristãos passaram a compreender que também eram filósofos, pois viviam em consonância com o logos divino. O cristianismo, por conseguinte, é a revelação completa do logos, transformando-se em uma atitude filosófica responsável por incitar todos os sujeitos a se conduzirem buscando se assemelhar a Deus como princípio de uma vida transcendental. Por se afirmar como uma experiência revelada, o cristianismo procura articular a relação do discurso com o modo de vida. Dessa maneira, desde seu aparecimento operou as suas reflexões tanto no texto bíblico, como nos ensinamentos filosóficos. Desse modo, da mesma maneira que os platônicos propunham cursos baseados nos diálogos do seu mestre, cristãos como Orígenes (184 – 253) propunham exercícios espirituais a partir da leitura de livros como os Provérbios e o Eclesiastes. UNIDADE 1 | CONTEXTO HISTÓRICO DO APARECIMENTO DA PSICOLOGIA: DA FILOSOFIA À CIÊNCIA 18 FIGURA 9 - O CRISTIANISMO EM ROMA FONTE: <https://mundoeducacao.bol.uol.com.br/historiageral/cristianismo-primitivo.htm>. Acesso em: 28 abr. 2020. Todo esse conjunto de ensinamentos deve ser observado como uma como uma introdução para a vida espiritual em consonância com o desenvolvimento espiritual do sujeito. Isso quer dizer que, o estudo sistemático das escrituras, constituiua base para a formação da subjetividade cristã. Por meio da ascese, os primeiros cristãos elaboravam um procedimento de aprendizagem do discurso filosófico, como também a produção de uma estética da existência que constituirá o modo de vida cristão. Se o logos é a revelação divina e a manifestação de Deus, é possível encontramos as ressonâncias de uma teologia sistemática já nos filósofos gregos. Tomemos como exemplo os livros Timeu, de Platão (2003) e Metafísica, de Aristóteles (1979). Nesses livros, enxergamos de diferentes fontes de revelação, modos de conduta e, distintos graus de manifestações divinas que serão incorporadas ao cristianismo. Isso significa que, a partir dessa perspectiva, a filosofia grega será o alicerce sob o qual toda arquitetura cristã foi construída. Ocorre que a estratificação do cristianismo como filosofia precisa ser observada não somente como uma cultura exegética, mas também como um estilo de vida, um modo de ser. Em outras palavras, não devemos conceber o cristianismo como um dogma religioso tão somente, mas sim uma sabedoria de vida e uma maneira de se viver de acordo com a razão divina. Justino (100 – 165) – um dos primeiros apologistas – costumava afirmar que, mesmo aqueles que vieram antes de Jesus – levando uma vida em consonância com o logos – eram cristãos, pois praticavam exercícios espirituais semelhantes aos primeiros praticantes do cristianismo. TÓPICO 1 | AS ORIGENS FILOSÓFICAS DA PSICOLOGIA 19 Da mesma maneira, Clemente de Alexandria prescrevia que, alguns dos prazeres precisariam levar em conta a tranquilidade da alma – amrimnia –, a prudência – eulaeia –, e à atenção do sujeito consigo mesmo – prosoche – essas três prescrições constituem o núcleo do pensamento da filosofia cristã a partir de uma experiência muito importante, no caso, o exame de consciência. Desse modo, o sujeito deveria dirigir seu exame para os sentimentos e ações, bem como questionar-se constantemente quanto as suas ações éticas e morais. Esse procedimento seria responsável por provocar no sujeito, uma minuciosa análise sobre seus atos e sentimentos. Nesse sentido, a filosofia cristã ganhará, cada vez mais, o tom de uma luta travada pelo cristão contra si mesmo, a tal ponto que, a partir do século IV muitos filósofos ligados ao cristianismo desenvolveram a ideia de que, para o sujeito ser um bom cristão, era necessário ser um herói e, esse heroísmo, consistia em produzir um estilo de vida próximo a de Jesus. É diante de tal cenário que emergem no cristianismo, os primeiros rituais de isolamento, de meditação, de batismo enfim, uma série de práticas voltadas para a produção de um rompimento absoluto da vida considerada devota com o mundo exterior. FIGURA 10 - BATISMO DE CRISTO DE PERUGINO FONTE: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Batismo_de_Jesus>. Acesso em: 24 abr. 2020. O batismo é uma das formas mais tradicionais do martírio instituído pelo cristianismo. UNIDADE 1 | CONTEXTO HISTÓRICO DO APARECIMENTO DA PSICOLOGIA: DA FILOSOFIA À CIÊNCIA 20 Quando Basílio de Cesareia (330 – 379) proclama a frase: “[...] guarda-te de ter em teu coração um pensamento vil (BASÍLIO DE CESAREIA, 1999, p. 85)”, refere-se ao fato de que, guardar a si mesmo significa constituir um guia para a vida cotidiana baseado nos princípios racionais de pensamento e ação, por meio de um cuidado com o corpo e com a alma. Da mesma forma que os filósofos gregos e romanos, os cristãos ao promoverem o martírio, estabeleciam uma ruptura em relação aos bens materiais e examinar detalhadamente a consciência procurando estetizar-se da melhor forma possível segundo a filosofia cristã. A ascese cristã é um ritual de aproximação do corpo e da alma e, somente quando ocorre essa aproximação é que um estilo de subjetividade cristã possui a condição preliminar do sujeito viver de acordo com a vontade de Deus. Isto é, ao adotar um estilo de vida cristão, o sujeito associava a racionalidade com a palavra por meio do estudo aprofundado da Bíblia. Contudo, esse projeto só pôde ser concretizado quando o sujeito estaria apto a reconhecer a verdadeira realidade. Esse empreendimento encontra-se ancorado na busca pela coragem da verdade e, dessa maneira, os primeiros cristãos resgatam inclusive o conceito de parresía. A parresía aparece no Novo Testamento como uma convocação para o sujeito possuir uma fé contagiante a partir da abertura total do seu coração. De acordo com Foucault (2013), esse modelo de parresía seria uma modalidade da manifestação humana em consonância com o logos divino. Nesse sentido, essa prática de acordo com Foucault (2013) possui dois contextos muitos específicos: em primeiro lugar, essa é a inscrição de um processo de subjetivação dos primeiros cristãos. E, ao mesmo tempo essa inscrição não é da ordem verbal, mas manifestada a partir da confiança do sujeito em relação a Deus. A confiança é o ponto de partida do recurso parresiástico empregado no contexto do cristianismo. Isso significa por um lado que, ao crer no nome de Deus, o cristão sabe automaticamente que a vida eterna é o presente mais precioso concedido por Deus. Por outro lado, ao dirigir-se a Deus, o cristão não deveria esperar nada além dos desejos de Deus. Por conta desses aspectos, a prece ou a vontade do sujeito nada mais era do que uma remissão a Deus da sua própria vontade. Isso significa que a relação de confiança e de segurança presente na parresía cristã circula pelo princípio de obediência e, dentro dessa circularidade, encontra-se a crença na vida eterna e o pedido sincero para que seja feita sempre a vontade de Deus. Por conta desses aspectos, é que os primeiros cristãos construíam as suas experiências éticas e estéticas baseadas na vida do próprio Jesus. Esse símbolo de confiança significava o estabelecimento de uma aliança nos quais os cristãos que possuem fé não deviam pedir a Deus nada além daquilo que era a sua vontade. TÓPICO 1 | AS ORIGENS FILOSÓFICAS DA PSICOLOGIA 21 Existia, portanto, nesse estilo de vida uma atitude voltada para a confiança do sujeito em relação ao seu destino. Por exemplo, a biografia de João Crisóstomo (347 – 407), retratada no livro Tratado das Providências relata que, no momento de perseguição aos cristãos por forças políticas muitos, não hesitaram em se tornarem almas invencíveis, cuja sabedoria não se deixava subjulgar por meio da audácia e da coragem. Esses dois elementos são inscrições da perspectiva que enaltecia a capacidade de certos sujeitos em se tornarem mártires de uma forma proveitosa e útil. Da mesma maneira, Gregório de Nissa (335 – 394) em Tratado da Virgindade elabora uma reflexão importantíssima sobre o estilo de vida dos cristãos a partir do estabelecimento de um estilo de vida ligado ao despojamento e a confiança em relação a Deus. Nesse sentido, podemos afirmar que o estilo de vida dos primeiros cristãos ligados a essa experiência instituiu toda uma reflexão sobre os modos de conduta responsável pelo desenvolvimento e pela própria institucionalização do cristianismo com a emergência da Igreja Católica. 5 A PSICOLOGIA NA IDADE MÉDIA A Idade Média compreende o período marcado pela decadência do Império Romano até a expulsão dos árabes da Europa. Esse período – que durou do século V ao XV – entrou para a história como uma época marcada pela hegemonia da Igreja Católica nos campos da filosofia, das artes e das ciências. FIGURA 11 – O FILME O NOME DA ROSA FONTE: <http://www.adorocinema.com/filmes/filme-2402/>. Acesso em: 28 abr. 2020. O filme “O Nome da Rosa” é um retrato muito importante sobre a Idade Média. UNIDADE 1 | CONTEXTO HISTÓRICO DO APARECIMENTO DA PSICOLOGIA: DA FILOSOFIA À CIÊNCIA 22 Durante esse período destaca-se um alto grau de despovoamento das cidades devido às invasões bárbaras. Dessa maneira, o cristianismo passa a se disseminar a partir da estruturação dos primeiros monastérios. Esses monastérios desenvolveram todo um estilo de vida,próprio a ortodoxia católica. Geralmente, administrado por comunidades eclesiásticas subordinadas a Roma, os monastérios eram edificados como espaços de uma profunda reflexão interior, por parte do sujeito, acerca da sua condição e também para o exercício da expiação. Contudo, havia também outras ordens religiosas que procuravam estabelecer os pressupostos da forma de vida como elemento de subjetivação. Essas ordens receberam o nome de mendicantes e, eram formadas por homens e mulheres que procuravam renunciar a toda e qualquer ordem material a partir dos princípios da pobreza. Hierarquicamente, as ordens religiosas são estruturadas a partir de quatro grandes categorias: as monásticas, as mendicantes, as regrantes e as de clérigos regulares. Muitas dessas ordens nascem durante a Idade Média e se perpetuam até os dias de hoje. NOTA Essas ordens buscam administrar toda a vida da sociedade a partir dos elementos voltados para a busca pelo conhecimento. É nesse período que Bento de Nurcia (480 – 547) – conhecido depois como São Bento – elaborou um manual muito importante em torno do processo de subjetivação. As Regras Monásticas caracterizam-se como um conjunto de preceitos voltados para a regulação da vida monástica. As questões envolviam desde o ritual da ascese, como também os elementos voltados para o cuidado com a alimentação, o vestuário, as orações e todo um conjunto disciplinar para os elementos de uma virtude cristã. Assim como São Bento, outro intelectual muito importante para esse período foi São Francisco de Sales (1567 – 1622), responsável pela publicação do livro Introdução a Vida Devota, na qual Sales desenvolve, por meio de um conjunto de epístolas, os elementos voltados para a vocação religiosa e para a devoção. Essas duas perspectivas, apontadas por São Bento e São Francisco de Sales, são muito interessantes para visualizarmos um acontecimento relevante proveniente da Idade Média, no caso, o poder pastoral. TÓPICO 1 | AS ORIGENS FILOSÓFICAS DA PSICOLOGIA 23 FIGURA 12 - MICHEL FOUCAULT FONTE: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Michel_Foucault>. Acesso em: 24 abr. 2020. O filósofo francês Michel Foucault (1926-1984) desenvolveu muitos estudos sobre o poder pastoral. Para Foucault (2008) o poder pastoral desenvolvido na Idade Média caracterizava-se como uma economia de poder responsável, por administrar a vida dos homens em consonância com o cristianismo. Tratava-se, portanto, de um estilo de governo voltado para a salvação das almas por parte do pastor. Segundo aponta Martin (2010, p. 28): [...] através de um controle insidioso sobre o indivíduo e, é dessa maneira que a sua subjetividade será moldada. O poder pastoral é uma forma de poder na qual um sujeito (um guia) influencia a subjetividade de outro sujeito através do reforço do controle e da dependência, tanto através de uma política de identidade como pelo conhecimento de si. O poder pastoral torna-se possível pelo conhecimento em termos de conscientização e a capacidade do pastor em dirigir permanentemente a consciência do indivíduo. Dessa maneira, um dos traços fundamentais do poder pastoral refere- se ao fato dessa modalidade de poder indicar, por meio do seu agenciamento de governo, a formação de uma economia da salvação na qual o sujeito ligava o problema do conhecimento de si – como um instrumento que dependia da capacidade dele aceitar incondicionalmente todas as diretrizes estipuladas pelo pastor – com os elementos das regras monásticas e da vida devota. Esse processo de condução das condutas está baseado na relação fundamental da aliança de Deus, o pastor e os homens. Nesse caso, o pastor, mais especificamente, atuaria como um mediador da experiência política com a experiência religiosa. Nesse contexto, o pastor era aquele que recebia a responsabilidade de conduzir todo o rebanho à terra prometida a partir de uma constatação bíblica. Quando escravos no Egito, Deus confiara a Moisés a responsabilidade de conduzir o rebanho por todo o deserto. UNIDADE 1 | CONTEXTO HISTÓRICO DO APARECIMENTO DA PSICOLOGIA: DA FILOSOFIA À CIÊNCIA 24 FIGURA 13 - A ALIANÇA ENTRE DEUS E OS HOMENS DEPENDIA DA MEDIAÇÃO DO PASTOR REPRODUÇÃO DA ABERTURA DO MAR VERMELHO FONTE: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Mar_Vermelho>. Acesso em: 24 abr. 2020. A escolástica foi um movimento teológico responsável por orientar os preceitos da fé a partir da filosofia e da ciência. A escolástica foi um método adotado por muitos monastérios e universidades a partir da articulação entre os saberes cristãos, a filosofia de Platão e de Aristóteles e das ciências naturais. NOTA Da mesma forma que Agostinho, outro nome muito importante dessa perspectiva foi Thomas de Aquino (1225 – 1323). Thomas de Aquino foi responsável pelo desenvolvimento de uma epistemologia voltada para o conhecimento da verdade a partir da elaboração da fé como elemento fundamental da vida cristã. Desse modo, Thomas de Aquino acreditava que a fonte de toda a verdade era encontrada na natureza da fé a partir da revelação natural e sobrenatural. A fonte de toda essa inspiração é refletida pelo Espírito Santo. Ainda com relação a esse aspecto, acreditava que a existência de Deus era possível de demonstração a partir de um conceito muito importante, no caso, o de causa primeira. Deus, para ele é movimento a partir de uma elaboração, segundo a qual todas as finalidades residem na vontade de Deus. Essas premissas levantadas por esses dois intelectuais foram de extrema relevância para o exercício da vida religiosa na Idade Média. Desse modo, a psicologia, nesse período, compreendia as relações entre a vida sagrada a partir de um momento muito importante para as experiências dos processos de subjetivação e dos movimentos ondulatórios que fizerem aparecer outros acontecimentos intrínsecos a esse período como o Renascimento e, mais tarde, o Iluminismo. TÓPICO 1 | AS ORIGENS FILOSÓFICAS DA PSICOLOGIA 25 6 A PSICOLOGIA NO NASCIMENTO DA MODERNIDADE: DO RENASCIMENTO AO ILUMINISMO Com a crise dos sistemas econômicos, políticos e culturais da Idade Média, começam a emergir uma série de novas forças que ousarão questionar o sistema hegemônico e ideológico da Igreja Católica. Esses movimentos estão intimamente ligados a dois acontecimentos muito importantes para a nossa sociedade: o Renascimento e o Iluminismo. Contudo, antes de definirmos esses dois episódios, é necessário compreendermos alguns aspectos relevantes para uma problematização dessa hegemonia. O primeiro deles ficou conhecido, em linhas gerais, como Reforma Protestante. Essas reformas foram desenvolvidas a partir de três grandes linhas de atuação religiosa, como também política. A Reforma Protestante não foi meramente um movimento reformista, mas um movimento de contraconduta. No ano de 1517, às portas da Igreja de Wittenberg, Martinho Lutero (1483-1543) desenvolve as suas 95 teses voltadas, sobretudo, às críticas em relação às vendas de indulgências por parte da Igreja Católica. O desenvolvimento dessas teses gerou uma forte onda de insurreições espirituais e políticas por toda a Europa. Diversos reinados começaram a desenvolver uma problematização em relação a aspectos centrais da vida pública e privada. Com a insurgência de Lutero, outros dois intelectuais foram fortemente influenciados por essa dinâmica. Na Inglaterra por exemplo, o Rei Henrique VIII – fortemente influenciado pelos ideais de Lutero – resolve romper as relações com a Igreja Católica a partir da fundação do anglicanismo. O anglicanismo torna-se a primeira religião de Estado da era moderna. No ano de 1561, o anglicanismo desenvolve uma exortação à reforma modificando radicalmente, os seus dispositivos de liderança a partir do desenvolvimento com o congregacionismo. Ou seja, a finalidade de congregação do sacramento, por parte do pastor, a partir de eleições voltadas para o sacramento religioso. Da mesma forma João Calvino (1509 – 1564), foi um importanteinterlocutor do protestantismo. Responsável pela criação do calvinismo, João Calvino defendeu as suas teses refutando a tese católica do pecado original. Para Calvino, a herança teológica de Deus aos homens em relação às suas riquezas era sinal da graça divina. Logo, a experiência religiosa deveria ser voltada para o acúmulo da riqueza, por meio da ascensão burguesa. UNIDADE 1 | CONTEXTO HISTÓRICO DO APARECIMENTO DA PSICOLOGIA: DA FILOSOFIA À CIÊNCIA 26 FIGURA 14 - O MURO DOS REFORMADORES LOCALIZADO NO PARQUE DOS BASTIÕES EM GENEBRA. DA ESQUERDA PARA À DIREITA: GUILHERME FAREL, JOÃO CALVINO, TEODORO DE BEZA E JOÃO KNOX FONTE: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Muro_dos_Reformadores>. Acesso em: 24 abr. 2020. Como vimos, o papel da Reforma Protestante foi imprescindível para o nascimento da Modernidade. No campo da economia, por exemplo, muitos reinados tornaram-se protestantes com o intuito de estabelecer uma fissura em relação ao poder da Igreja Católica. A crescente ascensão burguesa fez explodir na Itália, berço do catolicismo um elemento cultural muito importante que ficou conhecido como Renascimento. Basicamente, o Renascimento trata-se de um movimento cultural que procurava estabelecer os elementos de um retorno às origens da nossa civilização, ou seja, suas matrizes grega e romana. O Renascimento caracteriza-se, portanto, como um crivo potencialmente humanista no qual o homem passa a ser o centro do Universo e não mais a figura de Deus. O Renascimento é um período de valorização acentuada do Humanismo. Etimologicamente, o humanismo deriva do latim humanitas que significa erudição e/ou cultura. NOTA Um dos maiores renascentistas foi Nicolau Copérnico (1473 – 1543). Copérnico foi responsável pelo desenvolvimento do heliocentrismo. Em Da Revolução das Esferas Celestes Copérnico desenvolve sua teoria no sentido de propor que a terra não era o centro do Universo, mas o sol. TÓPICO 1 | AS ORIGENS FILOSÓFICAS DA PSICOLOGIA 27 Essa ruptura foi, de fundamental importância, para o desenvolvimento das experiências do humano em detrimento ao transcendentalismo teológico. Enquanto que, na Idade Média, todas as reflexões eram dedicadas a pensar as bases da teologia, no Renascimento o sujeito – sem negar obviamente a Deus – deve encontrar o seu lugar no mundo a partir das experiências da filosofia, das artes, da economia e da ciência. FIGURA 15 - O FILME O CÓDIGO DA VINCI FONTE: <https://pt.wikipedia.org/wiki/O_C%C3%B3digo_Da_Vinci_(filme>. Acesso em: 24 abr. 2020. O filme “O Código da Vinci”, de Ron Howard é uma importante alegoria sobre os impactos do Renascimento na Modernidade. Os pontos destacados pelos renascentistas compreendiam a contemplação do humano que, por meio da arte e da ciência poderia reaproximar-se das suas condições originárias. Isso significa que o sujeito deveria se elevar sobre a natureza. Isso porque ele é o único capaz de compreendê-la, modelá-la e dominá-la. Desse modo, as obras renascentistas buscaram estabelecer um grau de complexidade o nível de excelência do humanismo como referência para o desenvolvimento da cultura moderna. É nesse contexto que, no campo da psicologia e da filosofia inúmeros pensadores irão dedicar grandes esforços no sentido de pensar os elementos fundamentais ligados à experiência moderna da nossa própria subjetividade. Um desses intelectuais foi Rene Descartes (1596 – 1650). Nascido na França, Descartes fez toda a sua formação junto aos jesuítas. Ele era, portanto, discípulo da escolástica vigente. A época de Descartes, o pensamento filosófico era fortemente influenciado pela lógica aristotélica, segundo a qual as coisas ocupam seu lugar no mundo buscando retornar a elas mesmas. Afastando-se dessa concepção, Descartes elabora o seu método racionalista, para afirmar que o motor principal do espírito científico não são as coisas em si, mas a dúvida. É por meio da dúvida que a ciência pode ocupar um lugar no mundo. Essa dúvida é expressa na clássica fórmula: cogito ergo sum, ou penso, logo sou. Esse enunciado contribuirá para o desenvolvimento do momento cartesiano nas ciências como um todo, pois até UNIDADE 1 | CONTEXTO HISTÓRICO DO APARECIMENTO DA PSICOLOGIA: DA FILOSOFIA À CIÊNCIA 28 para Descartes o sujeito não possuía qualquer estatuto. É somente a partir de suas reflexões que serão estabelecidas as bases de um racionalismo intrínseco ao sujeito. Isso significa que somente pode pensar aquele que duvida, mas esta dúvida se encontra no horizonte de racionalidade a qual é inata ao sujeito. Ao formular as bases para o seu método racionalista, Descartes acaba lançando a ciência moderna em um debate complexo sobre as origens do conhecimento. Os seguidores de Descartes ficaram conhecidos como racionalistas e, formulavam suas reflexões no sentido de compreender o sujeito como alguém naturalmente dotado das faculdades racionais do pensar. Descartes, portanto, inaugura o que mais tarde veio a ficar conhecido como inatismo, ou seja, o fato de que o sujeito já nasce pronto e, tudo o que lhe resta a fazer, é resgatar esse conhecimento. NOTA Na contramão das teses cartesianas sobre o conhecimento e sobre o sujeito, os empiristas ingleses passam a desenvolver outra teoria que também será decisiva para o nascimento da psicologia na Modernidade. Esses empiristas foram responsáveis pelo desenvolvimento da tese de que, o sujeito é como uma tábula rasa e, tudo o que ele aprende, bem como as suas potencialidades, só pode ser objeto das suas experiências. Entre esses empiristas, destaca-se em primeiro lugar Thomas Hobbes (1588 – 1679), um eminente jurista e filósofo. Hobbes vivera em uma Inglaterra assolada por diversas guerras, insurreições e revoltas. Portanto, muitas de suas obras são uma reflexão direta sobre à formação de um Estado moderno e com características voltadas para a soberania. Em Leviatã: matéria, palavra e poder de um governo eclesiástico e civil, Hobbes aponta que, no estado de natureza, os sujeitos são impelidos ao confronto uns contra os outros. A essa perspectiva Hobbes nomeia esses conflitos de estado de natureza. Logo, os sujeitos devem abrir mão dessas táticas e, consequentemente estabelecer a mediação desse processo por meio do contrato social, pois na natureza o homem é lobo do homem. Nesse sentido, podemos entender que Hobbes propõe uma aliança entre os sujeitos e o Estado na qual, os primeiros abrem mão da sua liberdade, em troca da segurança prometida nos mais variados níveis – saúde, educação, transporte, moradia etc. Um segundo empirista muito importante para a modernidade foi John Locke (1632 – 1704). Locke é considerado, por muitos, como o pai da doutrina econômica chamada liberalismo. No livro Ensaio Acerca do Entendimento Humano, TÓPICO 1 | AS ORIGENS FILOSÓFICAS DA PSICOLOGIA 29 Locke fundamenta as bases do direito natural, intrinsecamente ligado ao problema da propriedade privada. Diferentemente de Hobbes, Locke acreditava que os sujeitos poderiam, diante de um governo injusto, recusar as formas de governo as quais eram submetidos. Desse modo, quando algum governante retira direitos ou viola as garantias fundamentais, o exercício da resistência torna-se uma obrigação. Nesse contexto, passa a existir, segundo Locke, uma forte ocupação por parte do Estado, em garantir os interesses individuais e não o bem comum como se acreditava até então. Por fim, outro grande empirista, nascido já nos limiares do século XVIII, fora David Hume (1711 – 1776). Hume criou o que se conhece hoje por ceticismo filosófico. Trata-se de um método capaz de estabelecer uma crítica ao dogmatismo racionalista a partir da seguinte constatação: não há, na natureza humana, uma verdade absoluta. Isso porque é o sujeito quem define e, portanto, contamina toda experiência por conta da sua própria subjetividade. Logo, todo conhecimento, por mais confiável que seja, não pode abrir mão de dois princípios básicos: a causalidade e a necessidade.Por conta das reflexões elaboradas tanto por Descartes, quanto pelos empiristas ingleses é que uma ciência psicológica se tornará possível no século XIX. Entretanto, o debate sobre as origens do conhecimento humano quase ocasionou o fim da filosofia e das ciências do homem, propriamente ditas até o aparecimento da filosofia crítica de Kant. Immanuel Kant (1724 – 1804) foi um filósofo alemão entusiasta da modernidade e do iluminismo. Kant desenvolveu a sua filosofia já em um estágio muito avançado da sua idade e, basicamente, seus livros compõem o que seus interpretadores chamam de filosofia crítica. Essa filosofia é composta pelos livros: Crítica da Razão Pura, Crítica da Razão Prática e Crítica da Faculdade de Juízo. Em relação à primeira crítica, Kant interessa-se em definir os limites e as possibilidades do conhecimento. Para ele, a faculdade do conhecimento não é atributo de uma razão universal e dogmática, mas um processo de síntese entre o sujeito e o objeto. Isso significa que não é a razão quem define os rumos para o conhecimento, mas o sujeito. Este sujeito encontra-se no centro e no fundamento de todas as coisas, contudo, esse conhecimento é sempre parcial e relativo, jamais absoluto. Logo, os sujeitos não podem conhecer tudo, mas apenas delimitar experiências e sensações daquilo que compreendem ser a totalidade. Em relação à Crítica da Razão Prática, Kant mostra-se inclinado a pensar as bases da doutrina moral humana. Para ele, a moral é um imperativo categórico mediado pela seguinte afirmação: Age de tal modo que a máxima da tua ação se possa tornar princípio de uma legislação universal. Esse imperativo designa, por sua vez, as regras de convivência dos seres humanos em uma sociedade iluminista. Por fim, a terceira e última crítica é ligada diretamente ao problema estético, ou seja, aos juízos de valores estabelecidos pelos sujeitos. Nesse contexto, Kant analisa por meio de categorias ligadas ao sublime voltado para o contexto da moral. Isso significa que, para Kant, a beleza estética é um produto ligado aos problemas das afeições e não uma questão racional como se acreditava até então. UNIDADE 1 | CONTEXTO HISTÓRICO DO APARECIMENTO DA PSICOLOGIA: DA FILOSOFIA À CIÊNCIA 30 Essas perspectivas abertas por Kant, na esteira do debate sobre o Iluminismo foram de fundamental importância para o fortalecimento das reflexões que levaram à criação das ciências humanas no final do século XIX, entre elas a Psicologia. De todo o modo, as experiências conceituais produzidas no debate e nas revoluções que antecederam a criação dos primeiros Estados democráticos de direito favorecerão todo um conjunto de reflexões sobre os modos pelos quais os seres humanos, a partir da Modernidade, devem tomar a palavra, sendo definidores do seu próprio destino nos horizontes da história da psicologia a partir da Modernidade, ou seja, conforme apontamos até aqui, os elementos dessa nova conjetura moderna abriu as possibilidades para a criação da ciência psicológica. O PENSAMENTO ILUMINISTA E O DESENCANTAMENTO DO MUNDO: MODERNIDADE E A REVOLUÇÃO FRANCESA COMO MARCO PARADIGMÁTICO Essa mudança subjetiva surgiria com a ideia de progresso, de ruptura com o passado – tratado brevemente na introdução. E, em geral, se encontraria associada com algum evento significativo tomado como um marco histórico – neste caso, a Revolução Francesa. Estaria por um lado, o prognóstico do racionalismo e, do outro, a filosofia da história. Assim, estes conceitos surgiriam em antagonia às antigas profecias, onde os homens poderiam ser os senhores de seu próprio destino e conhecedor das leis naturais – física e humana. Assim, o progresso se desenvolveria na medida em que o Estado e seus prognósticos não fossem mais capazes de satisfazer a exigência soteriológica, e sua motivação seria forte o suficiente para chegar a um Estado que, em sua existência, dependesse da eliminação das profecias apocalípticas (KOSELLECK, 2007, p. 35-36). Deste modo, o futuro desse progresso se caracteriza pela aceleração que se poria à nossa frente e ao seu caráter desconhecido. A aceleração tornar-se-ia uma tarefa de planejamento temporal, principalmente a partir do século XVIII e pós-Revolução, onde o vetor fundamental da moderna filosofia da história seria o cidadão emancipado do absolutismo e da Igreja. Mas, isto só adviria através da arte do cálculo político, adquirindo seu refino ao longo dos séculos XV ao XVIII, sendo os pensadores do século XVIII, responsáveis sobremaneira pela mudança histórica abarcada pela Revolução. Resultado auferido pelo aprofundamento do pensamento iluminista, que acabaria por se conhecer como Século das Luzes. Pensamento este que tornaria o futuro um campo de possibilidades finitas, organizadas segundo o grau de probabilidade. Eliminava, então, a certeza ideológica dos partidos religiosos da chegada de um Juízo Final e de uma única alternativa entre o Bem ou o Mal. Ou seja, o Iluminismo introduzia a problemática da secularização no momento em que as ordens religiosas eram questionadas, além de denunciar as intromissões e injustiças promovidas pela instituição na política dos Estados. FONTE: MELLO, Vicco Denis S. DONATO, Manuella Riane A. O pensamento iluminista e o desencantamento do mundo: modernidade e Revolução Francesa como marco paradigmático. Revista Crítica Histórica. 2 (4), 248-264, 2011. Disponível: em: <http://www. revista.ufal.br/criticahistorica/attachments/article/118/O%20Pensamento%20Iluminista%20 e%20o%20Desencantamento%20do%20Mundo.pdf>. Acesso em: 24 abr. 2020. IMPORTANT E 31 Neste tópico, você aprendeu que: • Foram os gregos que elaboraram as primeiras reflexões sobre o questionamento filosófico em relação às experiências subjetivas. • Com os romanos, a filosofia tornou-se um estilo de vida voltado para o desenvolvimento do autoconhecimento e de uma doutrina moral baseada no cuidado de si. • Durante o cristianismo primitivo, muitas das ideias gregas e romanas foram retomadas no sentido de pensar o bem viver como prática fundamental. • Na Idade Média, o mundo se viu diante da hegemonia do catolicismo e do poder pastoral. • O Renascimento e o Iluminismo desenvolveram inúmeras reflexões sobre o antropocentrismo como prática voltada para o desenvolvimento das ciências e, em especial, para a psicologia. RESUMO DO TÓPICO 1 32 1 Qual é o significado ético do poder pastoral elaborado pela Igreja Católica? 2 O que é o racionalismo proposto por Descartes? 3 Por que os filósofos gregos tinham tanto apreço pelos processos de subjetivação? AUTOATIVIDADE 33 TÓPICO 2 O NASCIMENTO DA PSICOLOGIA CIENTÍFICA E AS PRIMEIRAS ESCOLAS PSICOLÓGICAS UNIDADE 1 1 INTRODUÇÃO Dando continuidade aos estudos sobre os saberes psicológicos, passamos a destacar o conjunto desses mesmos conhecimentos reunidos em uma realidade metodológica, verificada sistematicamente e controlada, que reúne hipóteses na tentativa de possibilitar maior entendimento ao objeto de estudo da ciência do comportamento, qual seja, o ser humano. Na esteira dos acontecimentos produzidos pelo Renascimento e pelo Iluminismo, as ciências humanas colocaram-se a favor de um projeto voltado para o progresso tecnológico da civilização ocidental. Falaremos sobre o momento histórico em que o saber psicológico é proposto como ciência psicológica e, desta forma, observaremos que a ciência tal qual reconhecemos hoje foi organizada a partir de uma necessidade da modernidade, tendo como fundamentação a epistemologia positivista. Deste movimento surge o primeiro laboratório de psicologia experimental em Leipzig, na Alemanha, organizado por Wilhelm Wundt, que é considerado o pai da psicologia moderna; a partir daí vários outros laboratórios de psicologia experimental foram estabelecidos por universidades de outros países, mas foi na América, onde se destacaram, dentro da escola de pensamento estruturalista, as primeiras abordagens psicológicas. Em outras
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