Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Laura Vieira Gomes de Oliveira - Medicina UNIFG Exame psíquico e questionário de apoio Habilidades Médicas O exame do estado mental (EEM) é o equivalente psiquiátrico do exame físico no resto da medicina. O EEM explora todas as áreas de funcionamento mental e mostra evidências de sinais e sintomas de doenças mentais. Os dados são obtidos ao longo de toda a entrevista, desde os momentos iniciais da interação, considerando o que o paciente está vestindo e sua apresentação geral. A maior parte das informações não requer questionamento direto, e as obtidas por observação podem dar ao médico um conjunto de dados diferente das respostas do paciente. O questionamento direto aumenta e completa o exame. O EEM dá ao médico um instantâneo do estado mental do paciente no momento da entrevista e é útil nas visitas subsequentes para comparar e monitorar mudanças ao longo do tempo. O EEM psiquiátrico inclui avaliação cognitiva mais frequentemente na forma do Miniexame do Estado Mental (MEEM), mas este não deve ser confundido com o EEM global. Os componentes do EEM são apresentados nesta seção na ordem em que se poderia incluí- los nas anotações escritas para fins de organização, mas, como já foi observado, os dados são obtidos ao longo de toda a entrevista. Aparência e comportamento. Esta seção consiste em uma descrição geral de como o paciente parece e age durante a entrevista. Ele parece ter a idade declarada, ser mais jovem ou mais velho? Ela está de acordo com o estilo de vestir, aspectos físicos ou estilo de interação do paciente? Os itens a serem observados incluem o que o paciente está vestindo, incluindo joias ou bijuterias, e se é adequado para o contexto. Por exemplo, um paciente com uma bata de hospital seria apropriado no pronto-socorro ou na ala do hospital, mas não em uma clínica ambulatorial. Aspectos característicos, como desfigurações, cicatrizes e tatuagens, são observados. A arrumação e a higiene também fazem parte da aparência geral e podem ser indícios do nível de funcionamento do paciente. A descrição do comportamento de um paciente inclui uma declaração geral sobre se ele está exibindo perturbação aguda e, então, uma declaração mais específica sobre a postura dele em relação à entrevista. O paciente pode ser descrito como cooperativo, agitado, desinibido, desinteressado, e assim por diante. Mais uma vez, a adequação é um fator importante a considerar na interpretação da observação. Se um paciente for trazido de forma involuntária para exame, pode ser apropriado, certamente compreensível, que ele seja pouco cooperativo, sobretudo no início da entrevista. Consciência É nossa percepção em 360º. É o principal fator psíquico; o palco para que todos os outros possam atuar. Isso porque, se a consciência estiver alterada, todos os outros quesitos estarão prejudicados de alguma forma – principalmente a atenção, orientação e memória –, impossibilitando uma avaliação fidedigna. Para o exame psiquiátrico importa o nível de consciência, de alerta, de quão desperto e funcionante está o sistema nervoso central. Normalmente vai do grau de maior alerta, o estado vigil, passando pela sonolência, torpor (obnubilado), estupor (semicomatoso) e coma, que são graus de rebaixamento do nível de consciência, quando o paciente é dito confuso. O paciente sonolento usualmente oscila entre dormindo e acordado, e com algum esforço desperta e estabelece contato. O torporoso acorda com dificuldade, não plenamente despertando e permanecendo algo confuso. O estuporoso só acorda mediante estímulos muito vigorosos, não sendo capaz de se manter alerta espontaneamente. O comatoso não acorda, apresentando o maior grau de rebaixamento do nível de consciência. Além das alterações quantitativas, a qualidade da consciência eventualmente se encontra alterada. O paciente pode apresentar estreitamento da consciência, quando o foco fica restrito, quer por alta ansiedade, intoxicações ou crises epilépticas; dissociação da consciência, quando vivencia momentos dos quais não se lembra ao retomar a integridade da consciência. Fazem parte ainda das alterações qualitativas os estados crepusculares, vistos em quadros orgânicos como epilepsia. Atenção e Concentração É a capacidade de focalizar um objeto de maneira intencional. Pode ser de natureza voluntária (ativa), quando se pretende direcionar a atenção a este objeto (lendo este texto, por exemplo), ou involuntária (passiva ou espontânea), dirigida a um foco que não é o principal, denotando a capacidade de mudar de foco (notar ruídos da rua enquanto continua lendo). Quanto maior o grau de atenção voluntária, menor o de atenção involuntária e vice-versa. A concentração reflete a capacidade de manter a atenção voluntária. Classificada quanto a: Tenacidade: capacidade de se manter concentrado; Vigilância: capacidade de se distrair. Pacientes com mania, em geral, apresentam-se com hipotenacidade e hipervigilância. Já pacientes com esquizofrenia, é comum observar uma hipotenacidade e uma hipovigilância. Orientação É a capacidade de um indivíduo estimar precisamente o tempo, o espaço e as pessoas, inclusive a si mesmo, em seu ambiente corrente. A orientação temporal (capacidade de se localizar adequadamente quanto a datas, dias, horários) é facilmente perturbada pela concentração profunda, emoção forte ou quadros orgânicos. A orientação espacial (saber onde mora, onde está) é alterada mais tarde no processo mórbido. A orientação autopsíquica refere-se ao conhecimento do próprio nome e da identidade pessoal e é prejudicada nos casos avançados de deterioração orgânica. Dividida em: Alopsíquica: quanto ao tempo e espaço; Autopsíquica: quanto a si mesmo (crítica em relação a si) https://www.medicinanet.com.br/pesquisas/consciencia.htm https://www.medicinanet.com.br/pesquisas/concentracao.htm https://www.medicinanet.com.br/pesquisas/orientacao.htm Laura Vieira Gomes de Oliveira - Medicina UNIFG Todo psicótico tem desorientação autopsíquica, visto que estes têm uma perda da crítica de si mesmo/do que está fazendo. Entretanto, existe uma corrente mais extrema que diz que os indivíduos só estariam desorientados autopsiquicamente quando perdessem a total noção de si, de quem é (mas isso é muito raro de se ver na prática). Memória De evocação: quanto a fatos passados; De fixação: quanto a fatos recentes. Clinicamente é subdividida em memória de longa duração, de curta duração e imediata. A memória de longa duração, ou remota, refere-se aos fatos gravados há mais tempo, às recordações antigas, e pode ser avaliada enquanto o paciente conta sua história; a de curta duração, ou recente, trata de dados a serem mantidos por pouco tempo, como um número de telefone até que ele seja discado. A memória imediata, chamada memória de trabalho, permite, por exemplo, que um leitor entenda a coerência de uma frase, embora já não lembre exatamente de quais eram as primeiras palavras lidas. Está intimamente ligada à atenção. As memórias podem ser medidas com testes simples específicos, como gravar palavras ou nomes. Os déficits podem dar ensejo a confabulações, que são falsas memórias criadas pelo paciente para suprir as lacunas abertas na memória, sendo associadas a quadros de amnésia orgânica, como nas demências. Em geral, os psicóticos não apresentam déficits de memória primários, embora possa haver um comprometimento em virtude de uma falta de atenção ou desinteresse do paciente. Atividade motora. Pode ser descrita como normal, lentificada (bradicinesia) ou agitada (hipercinesia). Isso pode dar indícios para diagnósticos (p. ex., depressão vs mania), bem como para problemas neurológicos ou clínicos confundidores. A marcha, a liberdade de movimentos, quaisquer posturas incomuns ou continuadas, andar de um lado para outro e torcer as mãos são descritos. Deve ser observada a presença ou ausência de tiques, que podem ser nervosismo, tremor, aparente inquietação, estalar a boca e protusões da língua. Estes podem ser indícios de reações adversas ou efeitos colaterais de medicamentos,como discinesia tardia, acatisia ou parkinsonismo decorrente de medicações antipsicóticas, ou sintomas de doenças, como transtorno de déficit de atenção/hiperatividade. Fala. A avaliação da fala é uma parte importante do EEM. Os elementos considerados incluem fluência, quantidade, ritmo, tom e volume. Fluência pode se referir a se o paciente tem total comando da língua ou problemas de fluência possivelmente mais sutis, como tartamudez, dificuldade para encontrar as palavras ou erros parafásicos. (Um paciente de língua espanhola com um intérprete seria considerado não fluente na língua do país, mas deve ser feita uma tentativa de estabelecer se ele é fluente em espanhol.) A avaliação da quantidade de fala diz respeito a se ela é normal, aumentada ou diminuída. Menos quantidade de fala pode sugerir diversas coisas, variando de ansiedade ou desinteresse a bloqueio de pensamento ou psicose. Mais quantidade de fala com frequência (mas nem sempre) é sugestivo de mania ou hipomania. Um elemento relacionado é a velocidade ou o ritmo da fala. Ela é lenta ou rápida (pressão para falar)? Por fim, a fala pode ser avaliada por seu tom e volume. Os termos que descrevem esses elementos incluem irritável, ansioso, disfórico, alto, silencioso, tímido, zangado ou infantil. Humor. Os termos humor e afeto variam em sua definição, e alguns autores têm recomendado combinar os dois elementos em um novo rótulo “expressão emocional”. Tradicionalmente, o humor é definido como o estado emocional interno e continuado do paciente. Sua experiência é subjetiva; portanto, é melhor usar as próprias palavras do paciente para descrever seu humor. Termos como “triste”, “irritado”, “culpado” ou “ansioso” são descrições comuns do humor. Afeto. Afeto difere de humor, visto que é a expressão do humor ou o que o humor do paciente parece ser para o médico. O afeto é descrito, muitas vezes, com os seguintes elementos: qualidade, quantidade, variação, adequação e congruência. Os termos usados para descrever a qualidade (ou o tom) do afeto de um paciente incluem disfórico, feliz, eutímico, irritável, irritado, agitado, choroso, soluçante e embotado. A fala é frequentemente um sinal importante para a avaliação do afeto, mas não é exclusiva. A quantidade de afeto é uma medida de sua intensidade. Dois pacientes descritos com afeto deprimido podem ser muito diferentes se um for descrito como levemente deprimido e o outro como gravemente deprimido. Pode variar entre plano, normal ou lábil. Embotamento afetivo é um termo que tem sido usado para o afeto severamente restrito que é observado em alguns pacientes com esquizofrenia. A adequação do afeto refere-se a como ele está correlacionado com o ambiente. Um paciente que esteja rindo em um momento solene durante um enterro é considerado com afeto inadequado. O afeto também pode ser congruente ou incongruente com o humor ou o conteúdo de pensamento do paciente. Um paciente pode relatar se sentir deprimido ou descrever um tema depressivo, mas fazê-lo rindo, sorrindo e sem sugestão de tristeza. Conteúdo do pensamento. É essencialmente os pensamentos que estão ocorrendo ao paciente, deduzidos pelo que ele expressa de maneira espontânea, bem como pelas respostas a perguntas específicas visando evocar determinada patologia. Alguns pacientes podem perseverar ou ruminar sobre conteúdo ou pensamentos específicos. Podem focar em material considerado obsessivo ou compulsivo. Pensamentos obsessivos são aqueles indesejados e repetitivos que invadem a consciência. São, em geral, alheios ao ego, e o paciente resiste a eles. As compulsões são comportamentos repetitivos e ritualizados que os pacientes se sentem compelidos a realizar para evitar um aumento na ansiedade ou algum desfecho temido. Outra grande categoria de patologia do conteúdo do pensamento são os delírios. Delírios são ideias fixas, falsas, que não são compartilhadas por outras pessoas e podem ser divididos em bizarros e não bizarros (delírios não bizarros referem-se ao conteúdo de pensamento que não é verdadeiro, mas não está fora da esfera da possibilidade). Delírios comuns podem ser grandiosos, erotomaníaco, de ciúmes, somáticos e persecutórios. Muitas vezes, é útil sugerir conteúdo delirante a pacientes que podem ter aprendido a não discuti-los espontaneamente. As perguntas que podem ter utilidade incluem: “Você sempre se sente como se alguém o estive https://www.medicinanet.com.br/pesquisas/confabulacoes.htm Laura Vieira Gomes de Oliveira - Medicina UNIFG seguindo ou fosse pegá-lo?” e “Você sente que a TV ou o rádio têm uma mensagem especial para você?”. Uma resposta afirmativa à última pergunta indica uma “ideia de referência”. A paranoia pode estar intimamente relacionada a material delirante e variar de paranoia “branda”, por exemplo, desconfiança geral, a formas mais graves que têm impacto sobre o funcionamento diário. As questões que evocam paranoia incluem perguntar sobre a preocupação do paciente com câmeras, microfones ou o governo. O potencial suicida e o potencial homicida enquadram-se na categoria de conteúdo do pensamento, mas aqui são discutidos separadamente devido à particular importância de serem tratados em toda entrevista psiquiátrica inicial. Apenas perguntar se alguém é suicida ou homicida não é adequado. Deve-se obter uma noção de ideação, intenção, planejamento e preparação. Embora o suicídio completado seja extremamente difícil de prever com precisão, existem fatores de risco identificados, e estes podem ser usados em conjunto com uma avaliação da intenção e do plano do paciente para colocar em prática esses pensamentos. Juízo de realidade Crítica que o paciente tem de si, do que está fazendo, etc. Ideia delirante primária/verdadeira. Ideia delirante secundária (deliroide): a alteração em outra função psíquica “contaminar” a ideia. Tal que, uma vez corrigida a alteração primária, a ideia é reestabelecida e o paciente volta a apresentar crítica. Ex.: paciente com depressão → a ideia pode ser afetada pela alteração de humor. Além disso, O juízo é a capacidade de dar valor a fatos e idéias, e apresenta-se alterado no paciente que tem delírios. Estes são certezas subjetivas de algo, não encadeadas no fluxo normal de pensamentos, não compartilhadas (não fazem parte de um conjunto de crenças culturalmente aceitas), irrefutáveis e de conteúdo improvável. Embora normalmente de conteúdo bizarro, podem ser plausíveis, como no exemplo do alcoolista traído que tem delírios de ciúme. Por isso é importante determinar a forma de surgimento da idéia em questão: o delírio surge por interpretação delirante, quando o paciente interpreta fatos corriqueiros de forma psicótica; por intuição delirante, caso em que o delírio simplesmente surge, como uma revelação inquestionável que não carece de explicação; ou por percepção delirante, quando, ao receber um estímulo qualquer, o paciente o entende como explicação para os delírios, como quando, ao ver a garrafa de cerveja na mesa, o paciente descobre que a mulher o estava traindo. Os delírios podem incluir os mais diversos temas, mas os mais comuns são os místicos, de persecutoriedade e de grandeza. Crítica é definida arbitrariamente como a capacidade do paciente de entender sua condição, ter insight sobre seu estado, podendo estar preservada, abolida ou ser parcial, quando o paciente entende que algo está diferente, mas não consegue definir bem o que ocorre. Processo de pensamento. Difere de conteúdo do pensamento porque não descreve o que a pessoa está pensando, mas, em vez disso, como os pensamentos são formulados, organizados e expressos. Um paciente pode ter processo de pensamento normal com conteúdo do pensamento significativamente delirante. De modo inverso, pode haver conteúdo do pensamento normal, mas processo de pensamento bastante prejudicado. O processo de pensamento normal costuma ser descrito como linear, organizado e orientado ao objetivo. Com a fuga de ideias, o paciente passa com rapidez de um pensamento para outro, em um ritmo que é difícil para o ouvinte acompanhar,mas todas as ideias estão conectadas de forma lógica. O paciente circunstancial inclui excesso de detalhes e material que não é diretamente relevante ao assunto ou a uma resposta à pergunta, mas em algum momento retorna para tratar do assunto ou responder à pergunta. Via de regra, o examinador pode acompanhar uma linha de pensamento circunstancial, vendo conexões entre as afirmações sequenciais. O processo de pensamento tangencial pode, a princípio, parecer semelhante, mas o paciente nunca retorna ao ponto ou à questão original. Os pensamentos tangenciais são considerados irrelevantes e relacionados de uma maneira menor, insignificante. Pensamentos ou associações frouxos diferem dos pensamentos circunstanciais e tangenciais, uma vez que, com os pensamentos frouxos, é difícil ou impossível ver conexões entre o conteúdo sequencial. Perseveração é a tendência a focar-se em uma ideia ou conteúdo específicos sem a capacidade de mudar para outros tópicos. O paciente perseverativo repetidamente voltará ao mesmo tópico apesar das tentativas do entrevistador de mudar de assunto. Bloqueio do pensamento refere-se a um processo de pensamento perturbado no qual o paciente parece ser incapaz de completar um pensamento. Ele pode parar no meio da frase ou no meio do pensamento e deixar o entrevistador esperando que complete. Quando perguntados sobre isso, os pacientes com frequência comentarão que não sabem o que aconteceu e podem não lembrar o que estava sendo discutido. Neologismo diz respeito a uma palavra nova ou a uma combinação condensada de várias palavras que não são uma palavra verdadeira e não são facilmente compreensíveis, embora às vezes o significado pretendido ou o significado parcial possam ser evidentes. Salada de palavras é o discurso caracterizado por linguagem confusa, e em geral repetitiva, sem aparente significado ou relação ligada a ela. A Tabela 5.1-4 fornece uma descrição dos transtornos do pensamento formal. Alterações na sensopercepção. Incluem alucinações, ilusões, despersonalização e desrealização. Alucinações são percepções na ausência de estímulos que as justifiquem. Alucinações auditivas são aquelas encontradas com mais frequência no contexto psiquiátrico. Outras alucinações podem incluir visuais, táteis, olfativas e gustativas (paladar). Na cultura da América do Norte, as alucinações não auditivas são, muitas vezes, indícios de que existe um problema neurológico, clínico ou associado à abstinência de substâncias mais do que um problema psiquiátrico primário. Em outras culturas, alucinações visuais foram relatadas como a forma mais comum de alucinação na esquizofrenia. O entrevistador deve fazer uma distinção entre uma alucinação verdadeira e uma percepção errônea de estímulos (ilusão). Ouvir o vento sussurrar por entre as árvores do lado de fora e pensar que um nome está sendo chamado é uma ilusão. As alucinações hipnagógicas (na interface da vigília e do sono) podem ser fenômenos normais. Às vezes, os pacientes sem psicose podem ouvir seu nome sendo chamado ou ver clarões ou sombras pelos cantos dos olhos. Ao descrever as alucinações, o entrevistador deve incluir o que o paciente está vivenciando, quando ela ocorre, com que frequência e se é ou não desconfortável (egodistônica). No caso de alucinações auditivas, pode ser útil saber se o paciente ouve vozes, comandos ou conversas e se reconhece a voz. https://www.medicinanet.com.br/pesquisas/delirios.htm Laura Vieira Gomes de Oliveira - Medicina UNIFG Despersonalização é uma sensação de ser estranho a si mesmo ou de que alguma coisa mudou. Desrealização é uma sensação de que o ambiente mudou de alguma forma estranha que é difícil de descrever. Linguagem Avaliada principalmente em seu componente verbal, devem considerados também a forma e o conteúdo. Quanto à forma, analisa-se a velocidade do discurso, que pode estar lentificado, caso em que normalmente se nota a latência de resposta, definida como uma pausa acima do normal entre as perguntas feitas pelo entrevistador e a resposta do paciente. É comum ocorrer nas depressões ou em casos de desorganização do pensamento, pois o paciente demora-se ao procurar as respostas em meio à desorganização em que se encontra. Em casos extremos de depressão e em casos de catatonia, verifica- se mutismo. Entretanto, o discurso pode estar acelerado; quando o paciente, além de falar rapidamente, fala em grande quantidade, dizemo-no logorréico; se associada à logorréia houver fala em alto volume e ininterrupta, fala-se em pressão de discurso, sendo usual ocorrer em mania e em quadros ansiosos mais graves. Mussitação, verbigeração e ecolalia são automatismos verbais, semelhantes a uma reza contínua em voz baixa, no primeiro caso; no segundo, trata-se da repetição sem sentido de frases ou palavras incessantemente; no último, da repetição automática das palavras pronunciadas pelo interlucutor. O conteúdo do discurso acompanha usualmente o conteúdo do pensamento, devendo ser descritos eventuais temas prevalentes. Ressaltamos a importância de afastar quadros de afasias com propedêutica adequada no exame da linguagem, que podem confundir o médico que não considerar a possibilidade de tais quadros. Juízo e Crítica O juízo é a capacidade de dar valor a fatos e idéias, e apresenta-se alterado no paciente que tem delírios. Estes são certezas subjetivas de algo, não encadeadas no fluxo normal de pensamentos, não compartilhadas (não fazem parte de um conjunto de crenças culturalmente aceitas), irrefutáveis e de conteúdo improvável. Embora normalmente de conteúdo bizarro, podem ser plausíveis, como no exemplo do alcoolista traído que tem delírios de ciúme. Por isso é importante determinar a forma de surgimento da idéia em questão: o delírio surge por interpretação delirante, quando o paciente interpreta fatos corriqueiros de forma psicótica; por intuição delirante, caso em que o delírio simplesmente surge, como uma revelação inquestionável que não carece de explicação; ou por percepção delirante, quando, ao receber um estímulo qualquer, o paciente o entende como explicação para os delírios, como quando, ao ver a garrafa de cerveja na mesa, o paciente descobre que a mulher o estava traindo. Os delírios podem incluir os mais diversos temas, mas os mais comuns são os místicos, de persecutoriedade e de grandeza. Crítica é definida arbitrariamente como a capacidade do paciente de entender sua condição, ter insight sobre seu estado, podendo estar preservada, abolida ou ser parcial, quando o paciente entende que algo está diferente, mas não consegue definir bem o que ocorre. Cognição. Os elementos do funcionamento cognitivo que devem ser avaliados são o estado de alerta, orientação, concentração, memória (tanto de curto como de longo prazos), cálculo, cabedal de conhecimento, raciocínio abstrato, insight e julgamento. Deve ser observado o nível de alerta do paciente. A quantidade de detalhes na avaliação da função cognitiva dependerá do propósito do exame e também do que já foi apreendido na entrevista sobre o nível de funcionamento, o desempenho no trabalho, o manejo das tarefas diárias, o equilíbrio das finanças, entre outros aspectos. Além disso, o psiquiatra já terá extraído dados relativos à memória do paciente para o passado remoto e recente. Uma noção geral de seu nível intelectual e de sua escolaridade pode ajudar a diferenciar inteligência e questões educacionais de prejuízo cognitivo, que poderia ser observado no delirium ou na demência. A Tabela 5.1-5 apresenta uma visão geral das questões usadas para testar a função cognitiva no exame do estado mental. Raciocínio abstrato. É a capacidade de compreender e abstrair a partir de conceitos gerais e exemplos específicos. Pedir ao paciente para identificar semelhanças entre objetos ou conceitos semelhantes (maçã e pera, ônibus e avião ou um poema e uma pintura), bem como interpretar provérbios, pode ser útil para avaliar a capacidade da pessoa de abstrair. Fatores e limitações culturais e educacionais devem ser considerados na avaliação dessa capacidade.Ocasional mente, a incapacidade de abstrair ou a maneira idiossincrática de agrupar itens pode ser grave. Insight. Na avaliação psiquiátrica, refere-se ao entendimento do paciente de como está se sentindo, se apresentando e funcionando, bem como das possíveis causas de sua apresentação psiquiátrica. Ele pode não ter entendimento, ter entendimento parcial ou entendimento total. Um componente desse entendimento com frequência é o teste de realidade no caso de um paciente com psicose. Um exemplo de teste de realidade intacto seria: “Eu sei que na verdade não existem homenzinhos falando comigo quando estou sozinho(a), mas sinto como se pudesse vê-los e ouvir suas vozes”. Como indicado por esse exemplo, a quantidade de entendimento não é um indicador de gravidade da doença. Uma pessoa com psicose pode ter bom entendimento, enquanto uma pessoa com um transtorno de ansiedade leve pode ter pouco ou nenhum entendimento. Julgamento. Refere-se à capacidade da pessoa de tomar boas decisões e agir de acordo com elas. O nível de julgamento pode ou não estar correlacionado com o nível de entendimento. Um paciente pode não ter consciência de sua doença, mas ter bom julgamento. Tem sido tradicional usar exemplos hipotéticos para testar o julgamento – por exemplo: “O que você faria se encontrasse um envelope selado na calçada?”. É melhor usar situações reais da própria experiência do paciente para testar o julgamento. As questões importantes na avaliação do julgamento incluem se um paciente está fazendo coisas perigosas ou procurando problemas e se é capaz de participar efetivamente de seu próprio tratamento. Julgamento comprometido de forma significativa pode ser motivo para considerar um nível de cuidado mais elevado ou um contexto mais restritivo, como a hospitalização. A Tabela 5.1-6 lista algumas questões comuns para a história psiquiátrica e o estado mental. https://www.medicinanet.com.br/pesquisas/linguagem.htm https://www.medicinanet.com.br/pesquisas/delirios.htm Laura Vieira Gomes de Oliveira - Medicina UNIFG Volição, Impulso e Prospecção Vontade é um empenho ou intenção dirigida ao objetivo, com base em motivação cognitivamente planejada. A redução ou abolição da vontade, em quadros de grande desânimo, denominam-se hipobulia ou abulia, respectivamente. Impulso é a inclinação para satisfazer certas necessidades primárias. Atos impulsivos podem ser esporádicos ou repetidos, com os mais diversos fins – impulso suicida, impulsos de compra, de roubo, alimentares, de fuga etc. Prospecção é a capacidade de projetar os desejos para o futuro; fica limitada em diversas síndromes psiquiátricas. Psicomotricidade É a exteriorização comportamental motora dos estados psíquicos; divide-se entre as síndromes hipercinéticas e hipocinéticas. Nas primeiras, em que há aumento da atividade motora, o paciente pode se apresentar inquieto – com dificuldade de permanecer parado, senta-se e levanta-se repetidas vezes, mexe-se constantemente na cadeira (usual em quadros ansiosos) – ou agitado – quando já perdeu o controle de seu comportamento, podendo ser desde agitação leve até grave, em que ocorrem atos agressivos e destrutivos. As hipocinéticas são caracterizadas por inibição motora, com lentificação, inibição, até catatonia – quando há total ausência de atividade motora concomitantemente à flexibilidade cérea (em que o paciente assume a posição em que é deixado como se fosse um boneco de cêra) –, e catalepsia – em que há aumento do tônus e rigidez muscular. Inteligência Embora algumas vezes possa-se solicitar ao paciente que interprete provérbios populares para se inferir sua capacidade de abstração (reduzida na oligofrenia e em algumas formas de esquizofrenia), normalmente a inteligência não é testada de forma estruturada no exame psíquico; uma idéia do seu nível já é dada no decorrer da própria entrevista, contudo. As funções mentais também podem ser agrupadas de acordo com o modo como são acessados durante a entrevista. Assim, a aparência, o nível de consciência e o comportamento psicomotor serão imediatamente perceptíveis à observação. Durante a conversação, poderão ser avaliados atenção e concentração, fala, linguagem e pensamento, orientação, memória e afeto. Mediante exploração ativa, por fim, serão analisados humor e volição, percepção, conteúdo do pensamento, crítica e julgamento. Poderão ainda ser realizados testes breves para melhor avaliação de memória e orientação, bem como pensamento abstrato e inteligência, quando necessários. FONTE: Compêndio de Psiquiatria - 11ª edição, MedicinaNet https://www.medicinanet.com.br/pesquisas/inteligencia.htm
Compartilhar