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0 1 SUMÁRIO INTRODUÇÃO ............................................................................................................ 2 1 ORIGEM DOS PRINCÍPIOS E FUNDAMENTOS ........................................... 3 1.1 Conceito ......................................................................................................... 4 2 DOS PRINCÍPIOS PENAIS E PROCESSUAIS PENAIS ................................ 6 2.1 Princípio da Legalidade .................................................................................. 6 2.2 Princípio da Taxatividade e da Extra-atividade da lei penal ......................... 10 2.3 Princípio da Igualdade ou Isonomia .............................................................. 12 2.4 Princípio da Adequação Social ..................................................................... 15 2.5 Princípios da Dignidade da Pessoa Humana, e da Humanização da Pena. 18 2.6 Princípio da Individualização da Pena .......................................................... 22 2.7 Princípio da Intervenção Mínima, da Subsidiariedade e da Fragmentariedade ...................................................................................................................... 23 2.8 Princípio da Insignificância ........................................................................... 24 2.9 Princípios do Devido Processo Legal, do Contraditório e da Ampla Defesa 26 2.10 Princípios da Presunção de Inocência .......................................................... 29 2.11 Princípio do Juiz Natural ............................................................................... 31 2.12 Princípio da Indisponibilidade ....................................................................... 32 2.13 Princípio da Publicidade ............................................................................... 34 2.14 Princípio da Verdade Real ............................................................................ 35 2.15 Princípio da Lesividade ................................................................................. 37 2.16 Princípio da Independência das Instancias .................................................. 39 3 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................. 41 2 INTRODUÇÃO Prezado aluno, O Grupo Educacional FAVENI, esclarece que o material virtual é semelhante ao da sala de aula presencial. Em uma sala de aula, é raro – quase improvável - um aluno se levantar, interromper a exposição, dirigir-se ao professor e fazer uma pergunta, para que seja esclarecida uma dúvida sobre o tema tratado. O comum é que esse aluno faça a pergunta em voz alta para todos ouvirem e todos ouvirão a resposta. No espaço virtual, é a mesma coisa. Não hesite em perguntar, as perguntas poderão ser direcionadas ao protocolo de atendimento que serão respondidas em tempo hábil. Os cursos à distância exigem do aluno tempo e organização. No caso da nossa disciplina é preciso ter um horário destinado à leitura do texto base e à execução das avaliações propostas. A vantagem é que poderá reservar o dia da semana e a hora que lhe convier para isso. A organização é o quesito indispensável, porque há uma sequência a ser seguida e prazos definidos para as atividades. Bons estudos! 3 1 ORIGEM DOS PRINCÍPIOS E FUNDAMENTOS É impossível falarmos em Direito e surgimento da sociedade, sem vincular o direito penal. Desde os primórdios, quando houve as primeiras junções de diferentes grupos e raças, já começou então a existir os atos criminosos. O código de Hamurabi foi um dos primeiros a conter normas para organização da sociedade, porém, naquela época não existia registro em uma norma superior, o que acabou por causar discórdia entre os povos. Antes, todo pensamento de punição por algum ato inaceitável, era voltado a religião, costumes e tradições, esta fase ficou conhecida como a época da vingança privada. Fenômenos com a peste, eram vistos como punição dos deuses. Depois, com o surgimento das primeiras civilizações, veio também a imagem dos soberanos, foi então que surgiu os primeiros indícios de um Estado com poder absoluto, e o aparecimento da pena encarcerada. Das inúmeras fases, podemos citar o Direito Romano; o Germânico; e o Canônico. Mais tarde, por volta do século XVII, juntamente com as ideias iluministas, começou-se a perceber que era necessário banir as antigas formas de punição, e começar a criar um sistema mais humanitário, que ainda houvesse a pretensão de justiça. Esta época ficou conhecida como período humanitário. Desde então, o Direito penal vem evoluindo, com pensamentos voltados para o respeito e a dignidade do homem. 4 1.1 Conceito O Direito penal e processual penal, é regido por uma série de princípios, normas e regras. Juntos, eles atuam para aplicar o poder estatal, visando sempre a proteção do bem jurídico, o equilíbrio e a harmonização da sociedade. Porém, da mesma forma que existe sua atuação em face da proteção, exigindo os deveres do povo, ele também é regido por normas jurídicas que zelam pelo direito, para que, de certa forma, não ocorra abuso de poder. Todo esse conjunto de Princípios, direitos e normas presentes nessas legislações, formam os fundamentos do Direito. Explicitamente, o artigo 1º da Constituição expõe os fundamentos básicos a serem observados: Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui- se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: I - a soberania; II - a cidadania; III - a dignidade da pessoa humana; IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; V - o pluralismo político. Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição. De uma forma geral, a doutrina brasileira, afirma hoje, que os princípios são normas que norteiam todo o ordenamento jurídico, devendo, portanto, serem sempre observados em todos os ramos do Direito. 5 Sobre o conceito de Princípios, no entendimento de José Afonso da Silva: A palavra princípio é equívoca. Aparece com sentidos diversos. Apresenta a acepção de começo, de início. Norma de princípio (ou disposição de princípio), por exemplo, significa norma que contém o início ou esquema de um órgão, entidade ou de programa, como são as normas de princípio institutivo e as de princípio programático. Não é nesse sentido que se acha a palavra princípios da expressão princípios fundamentais do Título I da Constituição. Princípio aí exprime a noção de mandamento nuclear de um sistema. As normas são preceitos que tutelam situações subjetivas de vantagem ou de vínculo, ou seja, reconhecem, por um lado, a pessoas ou a entidades a faculdade de realizar certos interesses por ato próprio ou exigindo ação ou abstenção de outrem, e, por outro lado, vinculam pessoas ou entidades à obrigação de submeter-se às exigências de realizar uma prestação, ação ou abstenção em favor de outrem. Os princípios são ordenações que se irradiam e imantam os sistemas de normas, são [como observam Gomes Canotilho e Vital Moreira] núcleos de condensações nos quais confluem valores e bens constitucionais. Mas, como disseram os mesmos autores, os princípios que começam por ser a base de normas jurídicas, podem estar positivamente incorporados, transformando-se em normas-princípio e constituindo preceitos básicos da organização constitucional. (SILVA, 2013. p. 95/96) Luís Roberto Barroso assevera que: “O ponto de partida do intérprete há que ser sempre os princípios constitucionais, que são o conjunto de normas que espelham a ideologia da Constituição, seuspostulados básicos e seus fins. Dito de forma sumária, os princípios constitucionais são as normas eleitas pelo constituinte como fundamento ou qualificações essenciais da ordem jurídica que institui. A atividade de interpretação da Constituição deve começar pela identificação do princípio maior que rege o tema a ser apreciado, descendo do mais genérico ao mais específico, até chegar à formulação da regra concreta que vai reger a espécie” (BARROSO, 2004. p. 151) Trataremos a seguir de alguns Princípios que regem o Direito penal e processual penal. Outros já foram abordados no conteúdo de Prisão e Medidas Cautelares. 6 2 DOS PRINCÍPIOS PENAIS E PROCESSUAIS PENAIS 2.1 Princípio da Legalidade O surgimento deste princípio, teve suas origens marcadas por algumas revoluções, em meados do século XVII. Foi também nesta época que alguns pensadores iluministas, como Montesquieu, Rousseau, John Locke e Beccaria expressaram suas ideologias dando ênfase ao pensamento liberal. Logo após, foi criado a separação dos três poderes: O Legislativo, o Executivo e o Judiciário. O princípio da legalidade surgiu então para dar limite ao poder que o Estado tem de agir perante a sociedade, e está extremamente ligado ao conceito e a prática do Estado Democrático de Direito. Esse limite está tipificado nas leis e normas jurídicas, ou seja, não se pode punir além do que está expresso. Nas palavras de Alexandre Rezende da Silva: As garantias que este princípio propicia ao cidadão também são uma forma de segurança. Com a atividade estatal limitada aos mandames legais e com o aumento crescente, absurdo até, da interferência do Estado na sociedade civil, a previsibilidade de suas atitudes são da maior importância. Se o cidadão não tiver um mínimo desta previsibilidade relativamente ao Estado, estará vivendo uma situação absurda, em que um gigante pode invadir seu quintal a qualquer momento com a força de um elefante e a astúcia de uma raposa, vale dizer, viverá uma situação de angústia. (SILVA, 2003) 7 Sabemos que o Direito Penal é o ramo que possuí aplicações de penas mais severas que outros, e tem ainda, que trazer harmonização e equilíbrio entre a sociedade e o Estado. Portanto, o princípio da Legalidade neste campo foi de extrema importância, contribuindo, até nos dias de hoje, para a construção deste equilíbrio. Atualmente, o princípio da legalidade encontra se respaldado na Constituição federal de 1988, através do seu artigo 5º, inciso XXXIX: “Não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal. “ E assim segue o mesmo entendimento o artigo 1º do Código Penal com a seguinte redação “Não há crime sem lei anterior que o defina. Não há pena sem prévia cominação legal. “ Abaixo temos a pirâmide de como acontece a hierarquia entre as normas. * Quadro de Alexsandro M. Medeiros. 8 Adentrando aos estudos da doutrina, iremos falar a seguir das quatro funções do princípio da legalidade. Sendo elas: Proibir que a lei penal retroaja; evitar que sejam criadas penas com base nos costumes; extinguir o emprego de analogia para criar crime; evitar incriminações penais vagas, indeterminadas ou imprecisas. A primeira delas: É vedar a retroatividade da lei penal mais gravosa, que deve ser anterior ao fato praticado pelo agente. São proibidas as leis ex post facto. Está aí inscrito o princípio da irretroatividade da lei penal mais gravosa (lex gravior). A lei penal retroagirá para beneficiar o Réu, a qualquer tempo, salvo nos casos de leis excepcionais ou temporárias, na forma do artigo 3º do Código Penal. Corrente minoritária defende que a lei penal retroagirá mesmo nos casos de leis penais temporárias ou excepcionais, pois o artigo 3º do Código Penal não foi recepcionado pela Constituição da República de 1988, tendo em vista que o artigo 5º, inciso XL, não dispôs sobre nenhuma exceção à irretroatividade da lei penal mais gravosa. (SANTOS, 2010. p. 52 apud SILVA, 2020.p. 24) A segunda: É proibir a criação de crimes e penas pelo costume, em razão do princípio da legalidade. Só que o costume não foi completamente abolido do Direito Penal. Ele ainda possui uma função integrativa para a cognição de elementos do tipo penal, como, por exemplo, a definição do que é “ato obsceno” (art. 233, do CP) ou qual o significado da violação do dever objetivo de cuidado nos crimes culposos, quando a atividade que acarretou o acidente não está exaustivamente regulamentada, entretanto, em hipótese alguma poderá haver o emprego de normas consuetudinárias para criar delitos e penas. O costume ainda é utilizado na teoria da adequação social, que é abordada nesta obra no Capítulo IV. (BATISTA, 2007. p. 70/71 apud SILVA, 2020. p. 24/25) A lei penal deve ser escrita observando o processo legislativo previsto na Constituição da República de 1988. Compete privativamente à União legislar sobre Direito Penal (art. 22, inciso I, da CRFB/88), sendo o Congresso Nacional a sua fonte de produção (art. 48, da CRFB/88). É preciso haver lei em sentido formal para a cominação de crimes e penas, por força da exigência da reserva absoluta de lei. Nesse sentido, há divergência doutrinária sobre a constitucionalidade das 9 leis penais em branco heterogêneas ou próprias, que possuem pena determinada, mas preceito penal indeterminado, dependendo de atos normativos inferiores para definir o exato alcance do tipo penal, como, por exemplo, o tipo de omissão de notificação de doença, previsto no artigo 269 do Código Penal. A doutrina majoritária entende que as leis penais heterogêneas ou próprias respeitam o princípio da legalidade, quando o núcleo essencial da conduta está previsto na lei em sentido formal, restando aos atos normativos inferiores apenas especificar o alcance dos elementos já contidos no próprio tipo legal. (GRECO, 2010. p. 24. Apud SILVA, 2020) A doutrina minoritária diverge desse posicionamento, entendendo que as leis penais em branco heterogêneas ou próprias transferem a competência legislativa ao Poder Executivo ou a atos inferiores do próprio poder legislativo. Assim, desrespeita a reserva absoluta de lei. (SANTOS, 2010. p.52 apud SILVA, 2020) A terceira: É vedar a utilização da analogia (in malam partem) para criar crimes, agravar ou fundamentar penas. A analogia é um procedimento lógico que consiste na aplicação da norma jurídica de um caso previsto a um caso não previsto, em razão da semelhança entre ambos. Ela supre uma lacuna na lei. Está prevista no artigo 4º da Lei de Introdução do Código Civil, sendo proibida no Direito Penal, para agravar a situação do réu. Esse procedimento lógico é permitido, todavia, se beneficiar a defesa. A analogia in bonam partem é aceita pela doutrina amplamente majoritária (Heleno Fragoso, Anibal Bruno, Damásio de Jesus, Mirabete, Rogério Greco, Cezar Roberto Bitencourt, etc.), sob o argumento de que o princípio da legalidade existe para salva guardar o ser humano em face do Estado, e não para agravar a sua situação, pondo-se como um obstáculo à liberdade. (BITENCOURT, 2009. p. 166 apud SILVA, 2020. p. 26) Nelson Hungria isoladamente defende a impossibilidade do emprego da analogia in bonam partem, pois a lei penal seria um sistema fechado, que enfrentaria um grave perigo de subversão, caso se permita ao magistrado a criação arbitrária de causas de excepcional licitude, de impunibilidade ou não culpabilidade penal. Por fim, a analogia não se confunde com a interpretação analógica ou ainda com a interpretação extensiva. A primeira decorre de determinação expressa da própria lei penal, já a segunda tem como fim interpretar o sentido da norma, ampliando a sua abrangência. Ambas são permitidas pelo direito penal, em determinadas situações. (HUNGRIA, 1958. p. 91/93apud SILVA, 2020. p. 26) 10 A quarta: Proíbe incriminações vagas e indeterminadas. A lei penal deve ser certa. É necessário que o tipo contenha elementos claros, que definam precisamente o que se está proibindo. Evita-se, assim, ambiguidades, incertezas, indeterminações e elementos genéricos, que deixariam em aberto o conteúdo da lei, para ser preenchido pelo intérprete ao sabor das intempéries dos sentimentos humanos e da política criminal vigente. A doutrina costuma expor a Lei de Segurança Nacional (Lei nº 7110/83) como a grande violadora da referida função do princípio da legalidade no Brasil. (GRECO, 2010. p. 93 apud SILVA, 2020. p. 26) Por fim, vale lembrar que toda lei é regida por uma outra de nível hierarquicamente maior. O princípio da legalidade deverá estar em acordo sempre com a Constituição, pois esta é a base do Estado Democrático de Direito. 2.2 Princípio da Taxatividade e da Extra-atividade da lei penal O princípio da taxatividade, se resume em aquilo que deve ser claro, de fácil compreensão para quem é destinado as normas. Ou seja, o legislador, ao elaborar uma lei, não basta ditar o que pode ou não se pode fazer, mas deve também dar fundamento ao que exatamente se refere. Nas palavras de Nucci: Trata-se de princípio corolário da legalidade, exigindo a descrição detalhada do crime, por meio do tipo penal, sem margem à dúvida, que possa colocar em risco o seu entendimento. Note-se o preceituado pelo princípio da legalidade: não há crime sem lei anterior que o defina. A especificação do delito é fundamental para a segurança individual. (NUCCI, 2013. p. 299) 11 No mesmo sentido, ainda sobre conceito, Luiz Luisi afirma: O postulado em causa expressa a exigência de que as leis penais, especialmente as de natureza incriminadora, sejam claras e o mais possível certas e precisas. Trata-se de um postulado dirigido ao legislador vetando ao mesmo a elaboração de tipos penais com a utilização de expressões ambíguas, equívocas e vagas de modo a ensejar diferentes e mesmo contrastantes entendimentos. O princípio da determinação taxativa preside, portanto, a formulação da lei penal, a exigir qualificação e competência do legislador, e o uso por este de técnica correta e de uma linguagem rigorosa e uniforme. (LUISI, 1991. p. 18) Vale ressaltar, que alguns doutrinadores acreditam que o princípio da taxatividade, faz parte de uma das funções do princípio da legalidade que foi exposto no tópico acima. Mas, independentemente de estar inserido ou não neste outro princípio, o objetivo e conceito é o mesmo. O princípio da extra-atividade, refere-se à possibilidade da lei se movimentar no tempo sempre que for benéfico para o réu. Silva nos explica da seguinte forma: Quando a lei penal for mais benéfica para o réu, ela retroagirá no tempo, regulando fenômenos penais do passado, ainda que eles já tenham sido decididos por sentença condenatória transitada em julgado (art. 2o, parágrafo único, do Código Penal). Caso contrário, havendo sucessão de leis penais no tempo e sendo a lei penal posterior mais gravosa para o réu, então a lei penal anterior será ultra- ativa, ou seja, continuará emanando efeitos nos fatos ocorridos antes de sua vigência, mesmo estando revogada. (SILVA, 2020.p. 28/29) Este princípio possuí duas espécies distintas, sendo: a ultra-atividade e a retroatividade da lei. 12 Sobre estas duas modalidades, Greco explica que: Fala-se em ultra-atividade quando a lei, mesmo depois de revogada, continua a regular os fatos ocorridos durante sua vigência; retroatividade seria a possibilidade conferida à lei penal de retroagir no tempo, a fim de regular os fatos ocorridos anteriormente à sua entrada em vigor. (GRECO, 2016. p. 159) A Constituição trata da extra-atividade em seu artigo 5º, inciso XL: “ a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu; ” E também o Código Penal em seu artigo 2º: “Ninguém pode ser punido por fato que lei posterior deixa de considerar crime, cessando em virtude dela a execução e os efeitos penais da sentença condenatória.” (BRASIL, 1988) 2.3 Princípio da Igualdade ou Isonomia O princípio da igualdade, tem como objetivo garantir que as partes do processo tenham o mesmo tratamento. O artigo 5º da Constituição nos traz a base deste princípio quando diz que: “ Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade [...]” Mas, antes mesmo da Constituição, a Declaração Universal dos Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas já havia se manifestado, afirmando em seu artigo 1° que: "Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão e de consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade’’ (ONU, 1948) 13 Segundo o entendimento de Alves: Este princípio é requisito indispensável para a efetivação do sistema acusatório no país. Ademais, pode ser apontada como consequência direta do princípio a regra de que, no Processo Penal, o réu não pode se defender sozinho (a não ser que ele próprio seja advogado), consoante disposto no art. 263 do CPP, pois não teria condições técnicas para tanto, ao contrário do seu oponente, o autor da ação penal (Ministério Público ou querelante representado por procurador). (ALVES, 2021. p. 36) Existe uma intensa discussão no que diz respeito à aplicação deste princípio no âmbito penal. Pois de fato, a desigualdade social, racial, e econômica, advém desde séculos passados, e, mesmo com todos os esforços, ainda nos dias de hoje não foi superado. Algumas dicas para memorização sobre o princípio da igualdade: *Quadro de Licínia Rossi. 14 Conforme nos ensina Capez: "As partes devem ter, em juízo, as mesmas oportunidades de fazer valer suas razões, e ser tratadas igualitariamente, na medida de suas igualdades, e desigualmente, na proporção de suas desigualdades. Na execução penal e no processo penal, o princípio sofre alguma atenuação pelo, também constitucional, princípio favor rei, postulado segundo o qual o interesse do acusado goza de alguma prevalência em contraste com a pretensão punitiva. ‘’ (CAPEZ, 2008, p. 19) A doutrina divide hoje este princípio em duas espécies: a igualdade formal, que é a própria lei, elencada no artigo 5º da Constituição, defendendo que todos deverão ser tratados de forma igualitária, independente do caso ou do grupo social; e a igualdade material, que é a prática de tratamento diferenciado, para o que for também situação diferente. No Direito Penal, importa em dizer que as pessoas em igual situação devem receber idêntico tratamento jurídico, e aquelas que se encontram em posições diferentes merecem um enquadramento diverso, tanto por parte do legislador como também pelo juiz. Exemplificativamente, um traficante de drogas, primário e com o qual foi apreendida a quantidade de dez gramas de cocaína, deve ser apenado mais suavemente do que outro traficante reincidente e preso em flagrante pelo depósito de uma tonelada da mesma droga. (MASSON, 2008. p. 41 apud SILVA, 2020. p. 67) Ainda prevalece a tendência de certos privilégios para algumas classes da sociedade. O que se percebe é que o princípio da igualdade, mesmo sendo fundamental sua aplicação no Direto Penal, ainda se faz ausente em grande parte dos processos. Este é o entendimento de Alessandro Baratta: "O Direito Penal, como instrumento do discurso de (re) produção de poder, tende a privilegiar os interesses das classes sociais dominantes, imunizando de sua intervenção condutas características de seus integrantes, e dirigindoo processo de criminalização para comportamentos típicos das camadas sociais subalternas, dos socialmente alijados e marginalizados (BARATTA, 2002, p. 165) ’’ 15 Podemos então concluir, que a igualdade formal e a material devem andar juntas. A ausência deste princípio, não só traz a consequência de estar em desacordo com a Constituição, mas também fere a dignidade do indivíduo. Após décadas de luta por um sistema mais justo e equilibrado, a aplicação do princípio da igualdade é fundamental para alcançar este objetivo. 2.4 Princípio da Adequação Social Tal princípio foi inserido no meio penal através do jurista Hans Welzel e tem uma característica subjetiva, pois sua origem é vinculado ao processo de vivência e adequação dos indivíduos. As normas criadas pelos legisladores, não podem, de certa forma, estar em total desacordo com o conceito de justiça que é aceito pela sociedade. Verdan, nos dá um breve contexto e exemplo que contribui para este entendimento: Tal fato ocorre, haja vista que a evolução dos costumes e hábitos, adotados pela população, diante de específicos assuntos e "instituições", deve prevalecer e, por conseguinte, estar em consonância com o anseio geral. Como forma de ilustrar o exposto, basta analisar a questão da descriminação do artigo 240, do Código Penal Brasileiro, que antes cominava uma pena para os crimes que configurassem como adultério e que foi revogado pela Lei N° 11.103/2005. Tornou-se pungente esse fato, devido ao cenário de concepção do diploma legal, ano de 1940, e a sociedade que hoje ele rege, século XXI. (VERDAN, 2013) Neste mesmo sentido, Maria Paula Bonifácio Ribeiro de Faria relata seu conceito sobre o princípio da adequação social: Na verdade, a adequação social é sinônimo da normatização da acção, da concessão de um papel determinante ao desvalor da conduta, permitindo pensar o significado ético e social da actuação da agente 16 face ao recorte de vida que o legislador quis abranger com o tipo legal de crime. A vida nunca surge como uma descrição formal de factos, as circunstâncias mudam, o contexto em que os factos têm lugar é diferente, o problema tem uma dimensão fundamental que não pode ser esquecida, e que não é devidamente apreendida onde o tipo legal é entendido e aplicado como uma fórmula vazia de significado, opaca ou fechada aos sentidos sociais a que se dirige. (FARIA, 2005, p. 32- 33) Podemos dizer, que este princípio tem como principal característica acompanhar a evolução da sociedade. Em termo penal, dizer então que adequa os delitos a visão de justiça do indivíduo. Importante observar que as infrações penais são acontecimentos normais, de caráter social, pois acontece mesmo antes de existir as legislações que temos nos dias de hoje. Não podemos limitar o conceito e os resultados do princípio da adequação social penal, nos meros costumes morais e éticos, há também que se considerar os fatos que são danosos e relevantes aos bens jurídicos de quem é lesado. Neste embasamento, Prado ressalta que: “O juízo de adequação social funciona como um filtro que seleciona e exclui da esfera do tipo aquelas condutas que, embora finalistas, ajustam-se aos padrões ético-social dominantes. ” (PRADO, 2006, p. 439). O princípio da adequação social influencia decisivamente na tutela dos bens jurídicos, já que está diretamente relacionado às concepções ético-sociais, jurídicas e políticas dominantes, motivo pelo qual tem grande importância. (PRADO, 2006, p. 436). Silva em sua obra de princípios penais, expõe uma observação sucinta e clara: Por fim, algumas informações cruciais sobre o princípio da adequação social: a) está relacionado ao direito penal mínimo; b) pequenas lesões corporais nas práticas de esporte não possuem tipicidade material, em razão da sua adequação social; c) as condutas de colocar um piercing, furar a orelha ou tatuar o corpo de outrem não são típicas, por força da sua adequação social; d) a adequação social é majoritariamente entendida como uma causa supralegal de exclusão da tipicidade. (SILVA, 2020. p. 92) 17 Porém, é necessário entender e não confundir o princípio da adequação, com as causas que justificam ou excluem a tipicidade de algum ato. Alguns atores relatam sobre esta diferenciação: A ação socialmente adequada está desde o início excluída do tipo, porque se realiza dentro do âmbito da normalidade social, ao passo que a ação amparada por uma causa de justificação só não é crime, apesar de socialmente inadequada, em razão de uma autorização especial para a realização típica. (LOPES, 1997, p. 118). Fragoso complementa sobre o assunto: A ação socialmente adequada não se confunde com as causas de exclusão de antijuridicidade (porque inexiste norma permissiva), sendo, antes, princípio regulador geral da conduta típica. Esta há de ser necessariamente aspecto patológico da vida de relação. (FRAGOSO, 1994, p. 184). Apesar de ser um princípio idealizado e inserido já há alguns anos no ordenamento, existem discussões e críticas sobre ele em relação a relatividade, imprecisão, e alguns critérios limitadores. Rogério Greco afirma que: Embora sirva de norte para o legislador, que deverá ter a sensibilidade de distinguir as condutas consideradas socialmente adequadas daquelas que estão a merecer a reprimenda do Direito Penal, o princípio da adequação social, por si só, não tem o condão de revogar tipos penais incriminadores. Mesmo que sejam constantes as práticas de algumas infrações penais, cujas condutas incriminadoras a sociedade já não mais considera perniciosas, não cabe, aqui, a alegação, pelo agente, de que o fato que pratica se encontra, agora, adequado socialmente. Uma lei somente pode ser revogada por outra, conforme determina o caput do art. 2.º da Lei de Introdução ao Código Civil. (GRECO, 2006, p. 62). 18 A seguir, um quadro com as principais características deste princípio: *Feito por Letícia Souza. Todavia, é um princípio amparado por grande parte dos juristas, e, apesar das críticas e discussões, ainda não há regulamento que proíba ou vete sua aplicação no Direito Penal. 2.5 Princípios da Dignidade da Pessoa Humana, e da Humanização da Pena. A dignidade da pessoa humana não se trata somente de um princípio regulador da área penal, mas sim também um fundamento importante da República Federativa do Brasil. 19 * Retirado de https://bit.ly/3xXK9Hr, acesso em 05 de maio de 2021. Um dos artigos que expressa nitidamente tal princípio, é o 1º da Constituição: Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui- se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: I - a soberania; II - a cidadania; III - a dignidade da pessoa humana; IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; V - o pluralismo político. Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição. 20 Este princípio é a base de toda criação do Direito penal, qualquer norma que venha a estar em desacordo com seu conteúdo, é passível de ser considerada inconstitucional. Silva corrobora que: Esse princípio constitui o núcleo limitador por excelência do modo de ser da pena, tendo fortes influências das conquistas iluministas do Direito Penal do século XVIII, que postulavam a existência de direitos intrínsecos à natureza humana. Aliás, a ideia de humanizar as penas está intrinsecamente ligada à evolução do Direito Penal. As penas são humanizadas e suavizadas no decorrer da história. (SILVA, 2020. p. 103) E nas palavras de Sarlet: [...] não se deverá olvidar quea dignidade – ao menos de acordo com o que parece ser a opinião largamente majoritária – independe das circunstâncias concretas, já que inerente a toda e qualquer pessoa humana, visto que, em princípio, todos – mesmo o maior dos criminosos – são iguais em dignidade, no sentido de serem reconhecidos como pessoas – ainda que não se portem de forma igualmente digna nas suas relações com seus semelhantes, inclusive consigo mesmos. Assim, mesmo que se possa compreender a dignidade da pessoa humana – na esteira do que lembra José Afonso da Silva – como forma de comportamento (admitindo-se, pois, atos dignos e indignos), ainda assim, exatamente por constituir – no sentido aqui acolhido – atributo intrínseco da pessoa humana (mas não propriamente inerente à sua natureza, como se fosse um atributo físico!) e expressar o seu valor absoluto, é que a dignidade de todas as pessoas, mesmo daquelas que cometem as ações mais indignas e infames, não poderá ser objeto de desconsideração. (SARLET, 2007. p. 45) O princípio da humanidade caminha juntamente com a dignidade de pessoa humana, e está explícito na Constituição, através do artigo 5º, inciso III: “ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante; ”. Outros incisos do mesmo artigo também nos trazem este princípio, como: 21 XLVII - não haverá penas: a) de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do art. 84, XIX; b) de caráter perpétuo; c) de trabalhos forçados; d) de banimento; e) cruéis; XLIX - é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral; Bitencourt, em seus ensinamentos diz que: O princípio da humanidade do Direito Penal é o maior entrave para a adoção da pena capital e da prisão perpétua. Esse princípio sustenta que o poder punitivo estatal não pode aplicar sanções que atinjam a dignidade da pessoa humana ou que lesionem a constituição físico- psíquica dos condenados. A proscrição de penas cruéis e infamantes, a proibição de tortura e maus-tratos nos interrogatórios policiais e a obrigação imposta ao Estado de dotar sua infraestrutura carcerária de meios e recursos que impeçam a degradação e a dessocialização dos condenados são corolários do princípio de humanidade. (BITENCOURT, 2010. p. 48) E para complementar, nas palavras de Ferrajoli: Faz-se em suma uma perspectiva histórica e estratégica: da mesma maneira que no começo da época moderna a privação carcerária foi sobretudo uma medida de prevenção extrapenal e disciplinar (para os ociosos, os vagabundos, etc.) e se converteu em pena principal graças ao projeto de humanização das penas do século XVIII, também hoje, dentro de um novo projeto de humanização e racionalização penal, algumas das atuais medidas alternativas e de prevenção (...) parecem destinadas a serem as futuras penas principais. (FERRAJOLI, 2009. p. 419) Um bom exemplo da aplicação deste princípio, é o artigo 121, § 5º do Código Penal: “ Na hipótese de homicídio culposo, o juiz poderá deixar de aplicar a pena, se as consequências de a infração atingirem o próprio agente de forma tão grave que a sanção penal se torne desnecessária” 22 Silva ainda assevera que “O Direito Penal não pode jamais retirar a humanidade dos apenados. É vital que as penas sejam dignas, racionais e providas de alguma utilidade para o condenado, para a sociedade e para o Estado Democrático de Direito. ” (SILVA, 2020. p. 105) 2.6 Princípio da Individualização da Pena O princípio da individualização da pena também está previsto no artigo 5º da Constituição: XLVI - a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as seguintes: a) privação ou restrição da liberdade; b) perda de bens; c) multa; d) prestação social alternativa; e) suspensão ou interdição de direitos; A doutrina nos revela a existência de três fases da individualização da pena. E Silva nos explica sobre elas: a) Fase legislativa (cominação da pena): o legislador deve cominar aos delitos penas proporcionais, que sejam coerentes com a gravidade do injusto penal. Por exemplo, a vida é um bem jurídico mais valioso do que o patrimônio, portanto, a pena do crime de homicídio deve ser mais severa do que a do roubo. Essa individualização se dá no plano abstrato, referente ao processo legislativo em que a pena é cominada; b) Fase judicial (aplicação da pena): estando em vigor a lei penal, estabelecendo a pena no plano abstrato, cabe ao juiz a missão de realizar uma ponderada dosimetria da pena, para que faça valer concretamente a sua individualização. É mandamental a observância dos critérios para a sua fixação, conforme disposto no artigo 59 do Código Penal, e do sistema trifásico (art. 68, do CP), referente às penas privativas de liberdade, ou bifásico (art. 49 do CP), no tocante à pena de multa; c) Fase de execução (execução da pena): o juiz da execução penal e a administração penitenciária devem zelar pelo indivíduo encarcerado, de forma a lhes garantir todos os direitos previstos na Lei de Execução Penal, possibilitando a progressão de regime e tomando as medidas necessárias para diminuir a vulnerabilidade do preso (prevenção especial). A Lei de Execução Penal, em seu artigo 5º, menciona expressamente a individualização da pena na dimensão da execução: “Os condenados serão classificados, segundo os seus antecedentes e personalidade, para orientar a individualização da execução penal”. (SILVA, 2020. p. 180/181) 23 Entende-se então que a individualidade da pena nada mais é que a garantia para que o acusado receba exatamente uma pena proporcional ao seu histórico e ao crime cometido. 2.7 Princípio da Intervenção Mínima, da Subsidiariedade e da Fragmentariedade Este princípio limita o poder estatal, enfatizando que o Direito Penal só será aplicado em último caso, quando os demais ramos não tiverem sido suficientes para solucionar o conflito. A Declaração dos Direitos dos Homens e do cidadão de 1789, em seu art. 8º, estabelece que a lei somente deve prever as penas estritamente necessárias. Desde então, este princípio passa a fazer parte no momento da criação das leis. Silva estabelece em sua obra de Princípios Penais que: O Direito Penal é a ultima ratio do ordenamento jurídico. Em regra, as suas sanções são extremamente invasivas para o desenvolvimento do ser humano. Daí a necessidade de que ele tenha um papel subsidiário em relação aos outros ramos do direito. A sua intervenção deve ocorrer no âmbito do estritamente necessário, quando outras instâncias do ordenamento jurídico não forem suficientes para atingir os seus fins preventivos e retributivos. (SILVA, 2020) O princípio da intervenção mínima, tem como pressuposto a subsidiariedade e a fragmentariedade. Sobre a subsidiariedade, “se refere ao fato de o sistema penal ter um caráter secundário em relação aos outros ramos do direito. ” (SILVA, 2020). Já a fragmentariedade, “ O Direito Penal tutela tão somente os valores mais importantes para a existência da sociedade. Portanto, não são todos os bens que são protegidos por ele, apenas aqueles mais essenciais. ” (SILVA, 2020) 24 Ainda complementa o mesmo autor: O Direito Penal somente deve tratar de problemas sociais que sejam insolúveis por outras instâncias de controle social. O Direito Civil e o Direito Administrativo possuem prioridade de intervenção em relação ao Direito Penal, que apenas atua para salvaguarda do sistema, tendo uma intervenção reduzida e mínima. Ele é o ramo do direito subsidiário por excelência, pois só deve intervir quando for estritamente necessário. (SILVA, 2020) Portanto, o Direito Penal só deve atuar quando extremamente necessário, e em razão de proteger um bem jurídico passível de lesividade irreparável. 2.8 Princípio da Insignificância Este princípio rege que o Direito Penalnão deve punir ações que não lesam o meio jurídico. Silva nos explica que: Ao exercer uma função de garantia, o tipo penal não se limita ao seu aspecto formal, ou seja, à absoluta adequação da conduta do agente ao molde previsto na lei. É necessário ainda que o fato seja materialmente típico, pois não é toda lesão ao bem jurídico que importa ao Direito Penal. A sua incidência limita-se àquelas condutas que produzam uma relevante afetação ao bem juridicamente protegido. (SILVA, 2020) Toda ação, para ser considerada crime, deve ser, portanto, dotada de tipicidade, o princípio da Insignificância expõe que alguns fatos são tão irrelevantes, que carecem de tipicidade e não afetam o bem jurídico. Ainda no entendimento de Silva: Essa natureza excepcional de intervenção do sistema criminal na vida das pessoas, explicada conforme os postulados da intervenção mínima, da fragmentariedade e da subsidiariedade, leva à cognição de que o Direito Penal só se justifica se houver uma ofensa intolerável ao bem jurídico. Um ramo do direito que impõe sanções tão incisivas à liberdade humana não pode tratar de bagatelas. (SILVA, 2020) 25 Para identificar a ausência de tipicidade material, deve-se observar não só o bem jurídico lesado, se é relevante ou não, mas também a extensão das consequências causadas. Neste sentido, Paulo Queiroz diz: Por meio do princípio da insignificância (ou bagatela), o juiz, à vista da desproporção entre a ação (crime) e a reação (castigo), fará um juízo (valorativo) acerca da tipicidade material da conduta, recusando curso a comportamentos que, embora formalmente típicos (criminalizados) não o sejam materialmente, dada a sua irrelevância. (QUEIROZ, 2001. p. 30) Importante ressaltar, que o fato de não haver legislação que verse sobre este princípio, torna difícil a aplicação na prática. A respeito disto, Queiroz relata: É de notar, por fim, que há diversos precedentes do Supremo Tribunal Federal condicionando a adoção do princípio aos seguintes requisitos: a) mínima ofensividade da conduta; b) nenhuma periculosidade social da ação; c) reduzidíssimo grau de reprovabilidade; d) inexpressividade da lesão jurídica. Parece-nos, porém, que tais requisitos são tautológicos. Sim, porque, se mínima é a ofensa, então a ação não é socialmente perigosa; se a ofensa é mínima e a ação não perigosa, em consequência, mínima ou nenhuma é a reprovação; e, pois, inexpressiva a lesão jurídica. Enfim, os supostos requisitos apenas repetem a mesma ideia por meio de palavras diferentes, argumentando em círculo. (QUEIROZ, 2010. p. 63) 26 Para memorizar: *Feito por Letícia Souza. O princípio da insignificância é um tema que vem sendo construído ao longo do tempo, e mesmo ainda não sendo taxativo, toma cada vez mais lugar na jurisprudência. 2.9 Princípios do Devido Processo Legal, do Contraditório e da Ampla Defesa Estes princípios, englobam, que cada ato processual durante o percurso até a sentença final, importa e deve ser observado. É a garantia do direito de só sentenciar a pena, depois que passar por todas as etapas do processo. 27 Nas palavras de Mirabete: Dos mais importantes no processo acusatório é o princípio do contraditório (ou da bilateralidade da audiência), garantia constitucional que assegura a ampla defesa do acusado (art.5º, LV). Segundo ele, o acusado goza do direito de defesa sem restrições, num processo em que deve estar assegurada a igualdade das partes (MIRABETE, 2004, p. 46). O princípio do devido processo legal, está tipificado no artigo 5º, inciso LIV, da Constituição: “ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal” (BRASIL, 1988), e também se encontra no artigo XI, n° 1 da Declaração Universal dos Direitos do Homem: “Todo homem acusado de um ato delituoso tem o direito de ser presumido inocente até que a sua culpabilidade tenha sido provada de acordo com a lei, em julgamento público, no qual lhe tenham sido asseguradas todas as garantias necessárias à sua defesa”. Para memorizar: * Feito por Letícia Souza. 28 Para Silva, este princípio possuí dois sentidos: “O primeiro abrange as garantias de natureza processual, como o contraditório, a imparcialidade do juiz e a assistência de advogado. O segundo diz respeito à exigência de um processo penal em harmonia com o princípio da razoabilidade ou da proporcionalidade. ” (SILVA, 2020. p. 315-316) Para efeito de conceito, Carvalho afirma que: Na sua acepção puramente processual (...) o devido processo legal vai impor a obediência estrita das normas processuais de forma que o processo penal traduza iguais oportunidades das partes no plano processual, a ampla defesa, com todos os recursos inerentes, o contraditório, as demais garantias de juiz natural, publicidade e motivação dos atos judiciais. Siqueira Castro aponta, ainda, como consectários da cláusula a presunção de inocência, a suficiência da identificação civil, simetria entre imputação e condenação, a proibição das provas ilícitas, o dever de o defensor dativo recorrer, presença do réu preso aos atos instrutórios e rapidez processual. (CARVALHO, 2009. p. 142) O princípio do contraditório e da ampla defesa, encontram respaldo no artigo 5º inciso LV: “aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”. Segundo Mirabete: Do princípio do contraditório decorre a igualdade processual, ou seja, a igualdade de direitos entre as partes acusadora e acusada, que se encontram num mesmo plano, e a liberdade processual, que consiste na faculdade que tem o acusado de nomear o advogado que bem entender, de apresentar as provas que lhe convenham etc. (MIRABETE, 2006. p. 24) 29 E a ampla defesa, nas palavras de Dovale: [...] se manifesta ao interrogatório, e no direito à audiência. Por esse direito o acusado tem a prerrogativa e o direito de estar presente à audiência, quando da oitiva das testemunhas de acusação e defesa. É dever do Estado assegurar ao réu preso o direito de comparecer à audiência de inquirição de testemunhas, ainda mais quando arroladas pelo Ministério Público. (DOVALE, 2009. p. 277) 2.10 Princípios da Presunção de Inocência O princípio da presunção de inocência, garante ao réu um estado de não culpabilidade, enquanto não houver prova da culpa. Esse é um dos motivos pelo qual a prisão cautelar no Brasil deve ser usada em somente em casos de extrema necessidade. Sobre o conceito, Lima nos ensina: Na verdade, o chamado princípio da presunção de inocência, que decorre do princípio do devido processo legal, deve ser visto como um ‘princípio de não-culpabilidade’, já que não tem efeitos extremos, como é comum considerarem alguns intérpretes, pois, não se presume a inocência, mas sim apenas prevê a Constituição, no art. 5º, LVII: Que ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória. (LIMA, 2006. p. 41) No mesmo sentido, Mirabete nos dá um complemento: Em decorrência do princípio do estado de inocência deve-se concluir que: (a) a restrição à liberdade do acusado antes da sentença definitiva só deve ser admitida a título de medida cautelar, de necessidade ou conveniência, segundo estabelece a lei processual; (b) o réu não tem o dever de provar sua inocência; cabe ao acusador comprovar a sua culpa; (c) para condenar o acusado, o juiz deve ter a convicção de que é ele responsável pelo delito, bastando, para a absolvição, a dúvida a respeito da sua culpa (...). (MIRABETE, 2006. p. 23) 30 Este princípio tem previsão legal na Constituição atravésdo artigo 5º, inciso LVII: ““ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória”. O artigo 9º, da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, também dispõe: “Todo acusado é considerado inocente até ser declarado culpado e, se se julgar indispensável prendê-lo, todo o rigor desnecessário à guarda de sua pessoa deverá ser severamente reprimido pela lei”. O ônus da prova também estende como pressuposto deste princípio. Este, cabe a quem acusa, e não ao acusado. O artigo 5º, inciso LXIII, da Constituição, definiu que: “o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado”. Nas palavras de Silva: Remete-se o direito ao silêncio ao princípio da não autoincriminação (nemo tenetur se detegere), dado que ninguém é obrigado a produzir provas contra si, sendo o silêncio um comportamento lícito em prol da defesa. As provas fornecidas pelo réu somente são lícitas caso sejam apresentadas de modo voluntário e consciente. Nenhum ser humano pode ser coagido a se auto incriminar, produzindo declarações ou entregando documentos que o incriminem. Tal postura integra a sua autodefesa e constitui o seu instinto de autopreservação e conservação. (SILVA, 2020. p. 334) Para concluir, Mirabete nos deu uma conclusão sobre o princípio da inocência: Em decorrência do princípio do estado de inocência deve-se concluir que: (a) a restrição à liberdade do acusado antes da sentença definitiva só deve ser admitida a título de medida cautelar, de necessidade ou conveniência, segundo estabelece a lei processual; (b) o réu não tem o dever de provar sua inocência; cabe ao acusador comprovar a sua culpa; (c) para condenar o acusado, o juiz deve ter a convicção de que é ele responsável pelo delito, bastando, para a absolvição, a dúvida a respeito da sua culpa (...). (MIRABETE, 2006. p. 23) 31 2.11 Princípio do Juiz Natural Este princípio prioriza que a atuação do juiz seja imparcial frente aos processos, e que seja indicado de acordo com a sua competência. Mirabete conceitua o princípio do juiz natural: Dentro da Jurisdição competente, pode o legislador ordinário estabelecer normas destinadas a regular a distribuição do poder jurisdicional entre os órgãos que componham cada uma dessas justiças, mas não lhe é lícito atribuir a uma outra a competência para o processo e julgamento de infrações penais desrespeitando a prévia demarcação constitucional que separa as funções das justiças especiais e da justiça comum. Além disso, não pode a lei criar órgãos jurisdicionais nem designar magistrados especiais para o julgamento de pessoas ou fatos determinados. (MIRABETE, 2006. p. 29) Para memorizar: *Feito por Letícia Souza. 32 A Constituição dispõe sobre o princípio do juiz natural no artigo 5º, incisos XXXVII (“não haverá juízo ou tribunal de exceção”), LIII (“ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente”) e LIV (“ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”). (BRASIL, 1988) Segundo Didier Júnior: Todas as garantias do juiz natural visam a proteção da ordem democrática. Ao vedar os tribunais de exceção, verifica-se que o órgão judiciário responsável pelo julgamento deve preexistir aos fatos, o que impede a arbitrariedade do Estado. O juiz competente é a autoridade definida pela Constituição Federal ou pela lei que tem a atribuição de processar e julgar determinada causa. A imparcialidade significa que o julgador é equidistante das partes, o que é necessário a um julgamento justo e demonstra a igualdade entre os litigantes da relação processual. (JUNIOR, 2009. p. 92) Ainda sobre este princípio, faz menção também a Convenção Americana de Direitos Humanos. O artigo 8º descreve que todo indivíduo tem o direito de ser ouvido por um "juiz ou tribunal competente, independente e imparcial, estabelecido anteriormente pela lei". (CIDH, 1992) 2.12 Princípio da Indisponibilidade Este princípio está ligado aos deveres que o poder estatal tem, mediante os processos penais. Ou seja, depois que iniciado um processo, não pode por exemplo o Ministério público desistir de uma ação, ou ocorrer arquivamento da mesma por autoridade policial. https://www.cidh.oas.org/basicos/portugues/c.convencao_americana.htm https://www.cidh.oas.org/basicos/portugues/c.convencao_americana.htm 33 O artigo 42 e 576 do CCP trata do assunto, expondo, respectivamente: “O Ministério Público não poderá desistir da ação penal.” e “O Ministério Público não poderá desistir de recurso que haja interposto.” (BRASIL, 1941) Em relação ao conceito, Mirabete diz que: “O princípio da indisponibilidade não cabe na ação penal privada (renúncia, desistência, perdão, perempção etc.) e a ação penal pública depende de representação permite a retratação antes do oferecimento da denúncia (art.25 do CPP). ” (MIRABETE, 2007, p. 28-29) E ainda sobre o conceito: No que diz respeito à ação pública, por exemplo, várias destas regras decorrem do próprio princípio da obrigatoriedade. É o que ocorre com o chamado princípio da indisponibilidade, traduzido na impossibilidade de o Ministério Público dispor da ação penal a que era inicialmente obrigado. Parece-nos, em tais, hipóteses, que a apontada regra não vai além de consequência fundamental do princípio da obrigatoriedade, que estaria irremediavelmente atingido se se permitisse ao Ministério Público, obrigado a propor a ação penal, dela desistir após sua propositura. A única distinção que se pode observar entre a obrigatoriedade e indisponibilidade seria em relação ao momento processual do respectivo exercício sendo o primeiro aplicável antes da ação penal e o segundo a partir dela. (PACELLI, 2006, p. 105-106). Nas palavras de Capez: Outros temperamentos à regra da indisponibilidade no processo penal ocorrem também: a) nos crimes de ação penal privada, em que o ius accusationis fica a cargo do ofendido, que poderá ou não exercê-lo, como melhor lhe aprouver; b) nos crimes de ação penal pública condicionada à representação, nos quais a atividade dos órgãos oficiais fica condicionada à manifestação de vontade do ofendido; c) nos crimes de ação penal pública condicionada à requisição do ministro da justiça. (CAPEZ, 2016) 34 2.13 Princípio da Publicidade O princípio da publicidade surgiu para dar garantia que o processo seja público, ou seja, estar disponível para as partes que o integram, salvo os casos de sigilo processual fundamentados. Capez dispõe sobre a publicidade dos atos: A publicidade é garantia de independência, imparcialidade, autoridade e responsabilidade do juiz. Encontra exceção nos casos em que o decoro ou o interesse social aconselhem que eles não sejam divulgados (CPP, arts. 485, § 11, e 792, § 1º). Esta é a chamada publicidade restrita, segundo a qual os atos são públicos só para as partes e seus procuradores, ou para um reduzido número de pessoas. (CAPEZ, 2016) Este princípio encontra respaldo no art. 5º, inciso LX, da Constituição Federal, que declara: "a lei só poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem", e também no art. 5º, XXXIII, assegurando a todos o direito de "receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral (...)". (BRASIL, 1988) Conforme os artigos acima, percebemos então que para ser aplicado o princípio da publicidade, deve ser respeitado dois requisitos: a existência da lei que a defina; e que o ato a ser publicado não prejudique o interesse público a informação. Nos ensinamentos de Mirabete: O princípio da publicidade dos atos processuais, profundamenteligado a humanização do processo penal, contrapõe-se ao procedimento secreto, característica do sistema inquisitório. É ele regra em nosso direito e foi elevado à categoria constitucional pelo art. 5º, LX, da Carta Magna: “a lei só poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa da intimidade ou interesse social o exigirem”. No mesmo sentido dispõe que “todos os julgamentos dos órgãos do poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei, se o interesse público exigir limitar a presença em determinados atos, as próprias partes ou a seus advogados, ou somente a estes” (MIRABETE, 2004, p. 46). 35 2.14 Princípio da Verdade Real Em todo processo existe uma série de caminhos a serem percorridos para obter a verdade sobre o crime cometido. O mais próximo que se consegue chegar, é uma verdade adquirida pelo que foi dito entre as partes, ou seja, uma verdade processual. Sobre este princípio, Soares preceitua que: O princípio da verdade real, também conhecido como princípio da verdade material ou da verdade substancial, determina, portanto, que o fato investigado no processo deve corresponder ao que está fora dele, em toda sua plenitude, sem quaisquer artifícios, sem presunções, sem ficções (SOARES, 2007. p. 41). Antigamente, para se chegar a verdade real do crime, eram usados meios extremamente severos com o acusado, meios que são hoje, perante a lei, totalmente ilegais. Tortura e chantagem era algo comum feito para obter respostas. Oliveira Costa nos dá um breve apontamento de como ocorriam essas ilegalidades: As principais provas eram: a prova da água fria: jogando o indiciado na água, caso submergisse era inocente, caso viesse à tona, era culpado. A prova do ferro em brasa: o pretenso culpado, com os pés descalços, teria de passar por uma chapa de ferro em brasa; caso nada lhe acontecesse, era inocente, porém, se queimassem os seus pés, a culpa era manifesta. A prova do judicium affae: o indivíduo deveria engolir de uma só vez grande quantidade de alimento, que era farinha de trigo. Se não conseguisse, era culpado. Prova do pão e queijo: acusado deveria engolir um pedaço de pão e queijo, em não conseguindo era culpado” (COSTA, 2010, p. 04). Após algum tempo, foram surgindo as primeiras legislaçoes e aos poucos ficou definido que somente poderiam ser usadas no processo, as provas que fossem adquiridas de forma legal. 36 Atualmente, A Constituição tem declarada no inciso LVI do art. 5º que são inadmissíveis as provas obtidas por meio ilícito no processo penal. (BRASIL, 1988). No mesmo sentido, o CPP, em seu art. 157, com redação dada pela Lei 11.690/08, determina: "São inadmissíveis, devendo ser desentranhadas do processo, as provas ilícitas, assim entendidas as obtidas em violação a normas constitucionais ou legais". (BRASIL, 1941) Capez explica, que este princípio comporta algumas exceções: (a) a impossibilidade de leitura de documento ou a exibição de objeto que não tiver sido juntado aos autos com a antecedência mínima de três dias úteis, dando-se ciência à outra parte (CPP, art. 479, caput); compreende-se nessa proibição a leitura de jornais ou de qualquer outro escrito, bem como a exibição de vídeos, gravações, fotografias, laudos, quadros, croqui ou qualquer outro meio assemelhado, cujo conteúdo versar sobre a matéria de fato submetida à apreciação e ao julgamento dos jurados (CPP, art. 479, parágrafo único); (b) a inadmissibilidade das provas obtidas por meios ilícitos (CF, art. 5º, LVI, e CPP, art. 157); (c) os limites para depor de pessoas que, em razão de função, ofício ou profissão, devam guardar segredo (CPP, art. 207); (d) a recusa de depor de parentes do acusado (CPP, art. 206); (e) as restrições à prova, existentes no juízo cível, aplicáveis ao penal, quanto ao estado das pessoas (CPP, art. 155, parágrafo único). (CAPEZ, 2016) Quanto ao objetivo de prova, Tourinho Filho afirma que: O objetivo ou finalidade da prova é formar a convicção do Juiz sobre os seus elementos necessários para a decisão da causa. Para julgar o litígio, precisa o Juiz ficar conhecendo a existência do fato sobre o qual versa a lide. Pois bem: a finalidade da prova é tornar aquele fato conhecido do Juiz, convencendo-o da sua existência. As partes, com as provas produzidas, procuram convencer o Juiz de que os fatos existiram, ou não, de que ocorreram desta ou daquela maneira. (TOURINHO FILHO, 2009, p. 553) 37 Ainda sobre as provas, dispoe o artigo 155 do Código de Processo Penal: Art. 155. O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvados as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas. (BRASIL, 1941) 2.15 Princípio da Lesividade Este princípio, traz a exigencia de que um ato, para ser tipifiado como crime, deve produzir lesão ou perigo ao bem jurídico. Nesse sentido, somente poderão ser criminalizadas e apenadas as condutas que efetivamente lesionarem ou causarem perigo ao bem jurídico. (SILVA, 2020) Juarez Cirino também expoe seu entendimento: Do ponto de vista quantitativo (extensão da lesão do bem jurídico), o princípio da lesividade exclui a criminalização primária ou secundária de lesões irrelevantes de bens jurídicos. Nessa medida, o princípio da lesividade é expressão positiva do princípio da insignificância em Direito Penal: lesões insignificantes de bens jurídicos protegidos, como a integridade ou saúde corporal, a honra, a liberdade, a propriedade, a sexualidade etc., não constituem crime. Todo indivíduo tem direito a sua liberdade moral, não se pode punir uma pessoa que faz mal somente a ela mesma. Neste sentido, é necessário diferenciar os atos que lesam o bem jurídico, ou aquele que somente ofende alguma ideia moral da sociedade. Sobre essa diferença, assevera Bitencourt: A diferença entre ambos pode ser resumida no seguinte: no princípio da exclusiva proteção de bens jurídicos, há uma séria limitação aos interesses que podem receber a tutela do Direito Penal; no princípio da ofensividade, somente se admite a configuração da infração penal quando o interesse já selecionado (reserva legal) sofre um ataque (ofensa) efetivo, representado por um perigo concreto ou dano. (BITENCOURT, 2009. p. 54) 38 Ainda neste entendimento, ele afirma que “existe um segmento na doutrina penal que defende a inconsti-tucionalidade dos crimes de perigo abstrato, pois neles não há efetivoe concreto ataque ao bem jurídico penalmente tutelado.” (BITENCOURT, 2009. p. 54) Quanto a função, Nilo Batista diz em sua obra que são quatro, sendo: a) proibir a incriminação de uma atitude interna: o Estado não poderá punir a cogitação, que constitui um mero “projeto mental do cometimento de um crime”. As ideias e os afetos humanos não podem fundamentar uma criminalização, que precisa ser associada a uma conduta externa; b) proibir a incriminação de uma conduta que não exceda o âmbito do próprio autor: as condutas que se restringem ao campo do autor não são puníveis, por não lesionar direito alheio. Essa função do princípio da lesividade é a que veda a incriminação da autolesão, pois esta é uma conduta externa que, apesar de violar um bem jurídico, não excede o âmbito de quem a produziu. Nilo Batista explana também que é essa função que determina a exclusão da possibilidade de punição dos atos preparatórios e do simples conluio (art. 31 do CP224), quando a execução não for iniciada, bem como fundamenta parcialmente a impunibilidade do crime impossível; c) proibir a incriminação de simples estados ou condições existenciais: está vedada a criminalização de questões existenciais, queversem sobre o ser. O ser humano é livre para busca o seu próprio desenvolvimento, portanto, o Direito Penal somente pode proibir o agir de alguém, sendo um Direito Penal da Ação. Assim, ninguém poderá ser punido pelo que é. O Direito Penal do Autor contraria o Estado Democrático de Direito, pois persegue o indivíduo na sua liberdade, incriminando-o pelo seu modo de vida, por ser o que é. Uma corrente minoritária na doutrina, representada por Nilo Batista, defende ainda a exclusão da medida de segurança de campo penal, por compreender a periculosidade como um resquício do Direito Penal do Autor; d) proibir a incriminação de condutas desviadas que não afetem qualquer bem jurídico: o Direito Penal não poderá tutelar a moral da maioria, de forma a criminalizar as práticas das minorias, simplesmente por elas serem desaprovadas pela sociedade. (BATISTA, 2007 p. 92/94) 39 2.16 Princípio da Independência das Instancias Sabemos que o Direito, é uma ciência jurídica composta por vários ramos. O princípio da independência das instancias, rege a possibilidade de ser julgado por um único crime, em várias esferas diferentes. Uma determinada conduta pode caracterizar um ilícito civil, administrativo e penal ao mesmo tempo. Nesse caso, não há violação do princípio do ne bis in idem, que estabelece que ninguém poderá ser responsabilizado mais de uma vez pela prática de um determinado crime, pois as instâncias são, em princípio, independentes. (SILVA, 2020) As esferas que geralmente esbarram entre si perante os delitos, são a penal, administrativa e a civil. Fragoso nos dá seu conceito em relação a este princípio: Como ramo do ordenamento jurídico, o Direito Penal se distingue precisamente pelo meio de coação e tutela com que atua e que é a pena criminal. Os demais ramos do direito interno distinguem-se não pela natureza da sanção, que é a mesma para todos, mas pela natureza dos preceitos e relações jurídicas que estabelecem. (FRAGOSO, 2004. p. 3) Silva nos lembra sobre as exceções que compõem este princípio: Notório o entendimento unânime e reiterado das cortes em afirmarem as ações penais, cíveis e administrativas como independentes, mas é necessária a observância do reconhecimento de inexistência do fato ou negativa de autoria na ação penal para que, na instância administrativa, não haja punição. Trata-se das exceções ao princípio da independência das instâncias. O Código de processo penal, aponta para duas exceções ao princípio da independência das instancias: Art. 386. O juiz absolverá o réu, mencionando a causa na parte dispositiva, desde que reconheça: I – estar provada a inexistência do fato; IV – estar provado que o réu não concorreu para a infração penal; 40 Portanto, lembrem-se: * Feito por Licínia Rossi. Silva relata que: O Pleno do STF decidiu que, em havendo insuficiência de provas na esfera penal, tal ocorrência não inviabiliza a instauração de processo administrativo que vise a responsabilização dos mesmos fatos que deram causa à rejeição penal. Isso porque entendem os Srs. Ministros que há e deve haver sempre a aplicação do princípio da independência das instâncias consoante ao não prejuízo dos operadores do Direito. Independência esta a qual permite que as esferas atuem juntas, sem, contudo, afetarem-se de modo que prejudique a punição daquele que, supostamente, mereça sanção por ato ilícito, sendo penal ou administrativo. (SILVA, 2020) 41 3 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALVES, Leonardo Barreto Moreira. Processo Penal Parte Geral. 11 ed. Revista, ampliada e atualizada. Salvador: JusPodivm, 2021. BARROSO, Luis Roberto. Interpretação e Aplicação da Constituição. 6 ed. – São Paulo: Saraiva, 2004. BATISTA, Nilo. Introdução crítica ao Direito Penal Brasileiro. 11 ed. 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