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Aula-51-a-60-Estudos-da-Matemática-na-Educação-Infantil

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FACULDADE DOM ALBERTO 
 
 
 
 
 
 
 
ESTUDOS DA MATEMÁTICA NA 
EDUCAÇÃO INFANTIL 
 
 
 
 
 
 
SANTA CRUZ DO SUL – RS 
 
2 
 
1 REFERENCIAL CURRICULAR NACIONAL PARA A EDUCAÇÃO INFANTIL 
 
Fonte: basenacionalcomum.mec.gov.br 
 
Há mais de dez anos, foi lançado pelo Ministério da Educação brasileiro o 
Documento “Referencial Curricular Nacional para Educação Infantil” — RCNEI (Brasil, 
1998), com o objetivo de constituir-se como “um guia de reflexão para os profissionais 
que atuam diretamente com crianças de 0 a 6 anos”. 
Passados todos esses anos desde sua publicação, o Documento continua 
tendo sua validade referendada não apenas pela Secretaria de Educação Básica do 
MEC, mas também por inúmeras instituições de Educação Infantil, que o 
compreendem como um “guia de reflexão” e, na falta de outros instrumentos de 
organização pedagógica, como o instrumento oficial para “o planejamento, o 
desenvolvimento e a avaliação de práticas educativas”, embora não possua caráter 
mandatório. Logo após a publicação do RCNEI, pudemos observar uma intensa 
produção acadêmica, tratando especificamente desse tema. 
AULAS 51 A 60 
 
3 
 
Destacam-se o trabalho organizado por Ana Lúcia Faria e Marina Silveira 
Palhares (1999) e a produção do Grupo de Trabalho Educação de Crianças de 0 a 6 
anos, da Associação Nacional de Pós- Graduação e Pesquisa em Educação (ANPEd), 
sobretudo no ano de 2001. Atualmente, o tema sobre a organização curricular na 
Educação Infantil permanece em pauta nos círculos acadêmicos e também se 
apresenta na agenda do MEC. 
Evidência disso foi a publicação da Resolução CNE/CEB n° 5/2009, em 18 de 
dezembro de 2009, que fixa as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação 
Infantil, esse sim, documento de caráter mandatário. Ou seja, em termos legais, deve 
ser observado seu cumprimento. Ainda que o RCNEI não se apresente como centro 
das discussões, isso não significa que este seja um debate superado. No que diz 
respeito ao ensino de matemática para a Educação Infantil, essa é uma discussão 
ainda por fazer. No momento, encontra- se aberta, no site do MEC, uma consulta 
pública sobre Orientações Curriculares Nacionais da Educação Infantil, documento 
em construção, que visa a elaborar orientações para a implementação das diretrizes 
estabelecidas em 2009. No eixo de matemática, a proposta intitula-se: “As crianças e 
o conhecimento matemático: experiências de exploração e ampliação de conceitos e 
relações matemáticas”. 
Acreditamos que este seja um momento relevante para discutirmos sobre 
referenciais para a organização curricular de matemática para a infância. Nosso 
estudo recai sobre o Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil — 
RCNEI (Brasil, 1998), na área de Matemática, visto ser o documento ainda vigente. 
Todavia, esperamos que as contribuições deste trabalho possam ser incorporadas na 
nova proposta de orientação curricular que se encontra em desenvolvimento. 
O RCNEI (Brasil, 1998), mesmo não se constituindo legalmente como 
parâmetro curricular obrigatório, em muitas instituições assim se estabeleceu, a 
despeito de desconsiderar as realidades regionais, locais e, sobretudo, a possibilidade 
apresentada pela LDB de a instituição de ensino organizar sua proposta pedagógica. 
Seu uso é frequentemente justificado porque, apesar das inúmeras críticas ao RCNEI, 
este pode ser, de certa forma, considerado um avanço, por tratar-se de um documento 
que se diz voltado especificamente para a Educação Infantil. 
Ainda que possamos ter muitas reservas em relação a ele, seja pela forma 
pouco participativa com que foi elaborado; pela visão em relação ao processo de 
ensino e aprendizagem; pela compreensão cosmopolita presente nas atividades 
 
4 
 
sugeridas, ele foi uma primeira tentativa de conferir uma sistematização curricular à 
Educação Infantil, mérito que não pode ser desprezado. 
Kulhmann Jr. (1999, p. 6), ao tratar do uso do documento, acrescenta que as 
propostas, 
[...] embora contribuam para o trabalho dos educadores, não têm esse caráter 
mandatório. Isso reafirma a autonomia das instituições, que podem adotar 
essas ou outras propostas na íntegra ou associadas, sendo indispensável, 
entretanto, que se norteiem pelas Diretrizes Curriculares Nacionais. 
Em termos legais, a normatização da organização dessas propostas 
pedagógicas para a Educação Infantil deu-se com a Resolução CEB nº 1, de 7 de abril 
de 1999, que instituiu as “Diretrizes Curriculares para Educação Infantil”, 
recentemente substituída pela Resolução CNE/CEB n° 5/2009 . Chama a atenção o 
fato de que a Resolução CEB nº1/1999 seja posterior ao RCNEI. Talvez isso justifique 
por que algumas de suas diretrizes, especialmente a expressa no Art. 3º, inciso II, que 
trata particularmente da elaboração das propostas pedagógicas, pareçam ir de 
encontro à própria conformação do RCNEI: 
As Instituições de Educação Infantil ao definir suas Propostas Pedagógicas 
deverão explicitar o reconhecimento da importância da identidade pessoal de 
alunos, suas famílias, professores e outros profissionais, e a identidade de 
cada Unidade Educacional, nos vários contextos em que se situem. (BRASIL, 
1999b) 
Os princípios instituídos pelas Diretrizes Curriculares para a Educação Infantil 
ainda não são, na maioria das vezes, considerados, quando da elaboração de 
propostas pedagógicas para essa modalidade de ensino. Na prática, revela-se certo 
desconhecimento desse documento e seu caráter mandatório, seja por parte dos 
órgãos municipais, seja por parte dos educadores. Isso demonstra que não basta a 
legalização de tais princípios, é necessária sua legitimação. 
Nesse sentido, o documento Política Nacional de Educação Infantil: pelo direito 
das crianças de zero a seis anos à Educação, apresentado em 2006 pela Secretaria 
de Educação Básica (SEB) do MEC (Brasil, 1994), por meio da Coordenação Geral 
de Educação Infantil (COEDI), do Departamento de Políticas de Educação Infantil e 
 
5 
 
do Ensino Fundamental (DPE), foi um marco para as diretrizes da política nacional de 
Educação Infantil, das quais cumpre ressaltar: 
A Educação e o cuidado das crianças de 0 a 6 anos são de responsabilidade 
do setor educacional. 
A Educação Infantil deve pautar-se pela indissociabilidade entre o cuidado e 
a educação. 
A Educação Infantil tem função diferenciada e 
complementar à ação da família, o que implica uma profunda, permanente e 
articulada comunicação entre elas. É dever do Estado, direito da criança e 
opção da família o atendimento gratuito em instituições de Educação Infantil 
às crianças de 0 a 6 anos (Brasil, 2006). 
Esse documento representou um avanço nas políticas públicas para Educação 
Infantil. Resta-nos trilhar, igualmente, o caminho entre a legalidade e a legitimação. O 
que nos parece claro é a defesa de uma função pedagógica na Educação Infantil e a 
solicitação de uma nova prática por parte dos profissionais envolvidos. Isso significa, 
entre outras questões, que a legitimidade do RCNEI ou de outro documento que venha 
a tomar seu lugar em termos de forma e conteúdo continua sendo um tema que 
merece estar na agenda de debate dos que defendem uma Educação Infantil de 
qualidade para todos. E, também, dos que defendem que o conhecimento 
matemático, como produção humana, pode e deve ser apropriado pelas crianças 
desde a Educação Infantil. 
Desse modo, realizamos uma análise crítica do documento Referencial 
Curricular Nacional para a Educação Infantil de Matemática (Brasil, 1998), à luz da 
teoria histórico-cultural e da Teoria da Atividade de Leontiev (1988). O objetivo do 
trabalho foi o de analisar a organização do ensino de matemática na Educação Infantil 
defendida pelo RCNEI. 
Para desenvolver o trabalho analítico apoiamo-nos nas contribuições da teoria 
histórico-cultural, por meio de seus principais autores, Vygotsky e Leontiev, bem como 
em autoresque defendem o ensino de matemática nessa perspectiva, particularmente 
Manoel Oriosvaldo de Moura. Obviamente, outros tantos pesquisadores foram 
fundamentais, no que se refere à Educação Infantil; podemos destacar Bernard 
Charlot e Moiysés Kuhlmann Jr., entre outros. Na questão sobre legislação 
dialogamos, sobretudo, com Ana Beatriz Cerisara, Marina Palhares e Cláudia 
Martinez. 
 
6 
 
Apresentaremos, a seguir, os fundamentos da teoria histórico- cultural, 
destacando, particularmente, o conceito de criança e de educação matemática que 
servirão de critérios para a análise dos conteúdos matemáticos propostos pelo RCNEI. 
Então traremos a análise sobre o documento, considerando a sua estrutura 
organizacional, a sua concepção de infância e de matemática e os conteúdos 
matemáticos. Na última parte, “Considerações Finais”, apontaremos algumas 
possibilidades de discussão sobre a organização do ensino de matemática na 
Educação Infantil, a partir da realização deste trabalho. 
1.1 Infância e Matemática 
A discussão sobre a infância, no âmbito deste trabalho, implica, inicialmente, 
uma discussão sobre a Educação Infantil. Em outros trabalhos (Araujo,1998), ao 
discorrer sobre a visão que a sociedade possui acerca da escola de Educação Infantil, 
salientamos que: 
Ainda é corrente, tanto por parte dos professores como da sociedade em 
geral, uma visão equivocada em relação à Escola de Educação Infantil. A 
consideração sobre sua concepção é normalmente perpassada pelo 
preconceito, o que acarreta necessariamente um “pré- juízo”, na medida em 
que esta é percebida como um período anterior ao processo de 
escolarização, de caráter preparatório à primeira série e/ou ainda com uma 
intensa função, na maioria das situações, assistencialista e/ou 
“recreacionista” (Araujo, 1998, p. 14, grifos da autora). 
Na última década, em especial, o caráter assistencialista da Educação Infantil 
tem sido revisto, por meio de um entendimento da inter-relação entre educar e cuidar 
(Kuhlmann Jr, 1999; ECA, 1990; Brasil, 1996). Nesse sentido, é difícil sustentar, legal 
e teoricamente, o assistencialismo como função exclusiva da Educação Infantil. 
Todavia, o caráter preparatório para a escola permanece. Exemplo explícito disso é a 
propaganda que foi amplamente veiculada na mídia nacional, em agosto de 2007, 
sobre o Plano de Desenvolvimento da Educação, em que a Educação Infantil é 
declarada como “a que prepara para a escola”. 
Ao fazer ampla propaganda sobre a natureza preparatória da Educação Infantil, 
o governo federal confirma, na verdade, o seu entendimento sobre a infância presente 
 
7 
 
no RCNEI: “As crianças possuem uma natureza singular, que as caracteriza como ser 
que sentem e pensam o mundo de um jeito muito próprio” (Brasil, 1998, p. 213). Tal 
compreensão acerca da Educação Infantil, como período preparatório, vai de encontro 
ao sentido que a teoria histórico-cultural atribui ao termo. 
A função da Educação Infantil que defendemos não é a de preparar para a 
escola, para o primeiro ano do Ensino Fundamental. O sentido de preparatório para a 
teoria histórico-cultural é outro. A função preparatória da primeira etapa da educação 
básica relaciona-se com a assunção de um papel central na criação das condições e 
circunstâncias para a ocorrência do processo de formação histórica dos indivíduos, 
na formação de funções psíquicas e formas de comportamentos essencialmente 
culturais, que tem início desde a infância. (Araujo et al., 2009). 
Soma-se a essa discussão sobre a função social da Educação Infantil o 
entendimento abstrato da condição infantil, que não considera, de fato, a situação real 
da criança em relação à classe social à qual pertence (Charlot, 1979), compreensão 
disfarçada por um pretenso discurso de respeito à diversidade cultural do Brasil. 
Entretanto, não se trata apenas de uma diversidade cultural, há que considerar as 
desigualdades sociais e econômicas que marcam a sociedade brasileira. 
No nosso entendimento, a concepção de criança, como sujeito histórico que 
ocupa um lugar no sistema das relações sociais, fundamenta-se na compreensão 
marxista do homem como ser social, rompendo, assim, com a ideia de que a infância 
é apenas uma fase que antecede a vida adulta, fase essa marcada, sobretudo, pela 
dimensão cronológica, no sentido biológico do termo, ou seja, de idade. 
Aqui cabe lembrar que, por viver a criança em um ambiente socializado, até as 
próprias características biológicas da infância tomam um sentido social, sem, no 
entanto, perder sua matriz biológica (Charlot, 1979). Isso não significa, como alerta 
Charlot (1979, p. 107), que se possam negligenciar “os traços biológicos próprios à 
infância, mas que é preciso conceder- lhes seu sentido no processo dinâmico de 
ações entre a criança e o adulto que define a infância”. 
Por isso, é importante compreender que, para uma determinada concepção de 
criança, corresponde uma determinada organização de ensino. Isso é claramente 
percebido pela forma como o RCNEI discorre sobre o conhecimento matemático: 
Fazer Matemática é expor idéias próprias, escutar a dos outros, formular e 
comunicar procedimentos de resolução de problemas, confrontar, 
 
8 
 
argumentar e procurar validar seu ponto de vista, antecipar resultados de 
experiências não realizadas, aceitar erros, buscar dados que faltam para 
resolver problemas, entre outras coisas. Dessa forma as crianças poderão 
tomar decisões, agindo como produtoras de conhecimento e não apenas 
executoras de instruções (Brasil, 1998, p. 2007). 
Assim, para o RCNEI, a ideia fundamental é a de proporcionar aos sujeitos o 
acesso a um conjunto de signos e regras que articulam o conhecimento matemático, 
de modo que o sujeito possa resolver problemas. Mas será apenas esse o papel da 
matemática? Da escola? Na educação de infância, segundo Moura (2007), o objetivo 
principal é o de fazer com que a criança compreenda o mundo simbólico que a cerca. 
Nesse sentido, ainda de acordo com Moura, a aprendizagem da matemática, 
como ferramenta simbólica, é imprescindível para que a criança, ao mesmo tempo 
que se aproprie de uma determinada linguagem, aproprie-se, também, dos seus 
modos de produção: 
Aprender matemática não é só aprender uma linguagem, é adquirir também 
modos de acção que possibilitem lidar com outros conhecimentos 
necessários à sua satisfação, às necessidades de natureza integrativas, com 
o objectivo de construção de solução de problemas tanto do indivíduo quanto 
do colectivo. (Moura, 2007, p. 62). 
A teoria histórico-cultural, ao defender o conhecimento matemático como 
produção humana, atribui aos saberes um valor social que não se restringe à produção 
de conhecimento. De fato, os saberes matemáticos já estão dados e são, portanto, 
conhecimento pronto. Todavia, a criança, ao apropriar-se do significado social desses 
conhecimentos, atribui-lhes, também, um sentido pessoal. Isso faz com que esse seja 
um conhecimento feito e fazendo-se (Diadema, 1992). 
A ideia de que, desde que nascemos, estamos inseridos em um mundo no qual a 
Matemática está presente é amplamente difundida no RCNEI. (Brasil, 1998, p. 207, p. 
212) A partir dessa ideia, o documento expõe quais objetivos e conteúdos devem ser 
aprendidos pelas crianças nas instituições de Educação Infantil, destacando o recurso 
das situações-problema: “Historicamente a Matemática tem-se caracterizado como 
uma atividade de resolução de problemas de diferentes tipos. A instituição de 
EducaçãoInfantil poderá constituir um contexto favorável para propiciar a exploração 
de situações-problema.” (Brasil, 1998, p. 211). 
 
9 
 
O ensino de matemática, nesse sentido, passa pela resolução de problemas. 
Mas, quais são as situações-problema para a Educação Infantil? A matemática, nessa 
etapa de educação se resume a isso? A teoria histórico-cultural preconiza 
a necessidade de ruptura com um ensino deslocadodo processo cognitivo e 
cultural da criança. O conhecimento matemático é entendido a partir de seu 
valor cultural, da construção social, abre possibilidades para que o sujeito se 
veja como aquele que se apropria de conhecimentos, que é capaz de 
confrontar teorias e estabelecer relações com outros sujeitos e objetos 
(Araujo, 2005, p. 3). 
Por essa razão, defendemos a dimensão histórico-lógica para ensinar a 
matemática, o que significa perceber o movimento histórico- cultural do homem, ao 
transformar a natureza em busca de melhores condições de vida. No caso específico 
da matemática, a necessidade de contar promoveu o controle das quantidades por 
meio de sistemas de signos, conhecimentos matemáticos que foram sendo 
desenvolvidos ao longo do tempo, desencadeando a necessidade de serem 
compartilhados com todos os membros do grupo, com a finalidade de promover a 
comunicação entre os sujeitos, para a realização de ações colaborativas. (Moura, 
2007). 
O objetivo da situação-problema, para o RCNEI, é o de desenvolver o raciocínio 
lógico da criança, como se a aprendizagem de matemática fosse uma iniciação, para 
que o sujeito, ao adquirir competência para resolver problemas de seu cotidiano, 
torne-se capaz de lidar satisfatoriamente com as situações que irá resolver mais tarde, 
em sua vida profissional. Essa é uma visão restrita ao utilitarismo e tem como meta 
educacional, como salienta Duarte (2001, p. 63), “a formação de um indivíduo 
preparado para a constante adaptação às demandas do processo de reprodução do 
capital”. 
O RCNEI afirma que a situação-problema é aquela que 
[...] deve ser criteriosamente planejada, a fim de que esteja contextualizada, 
remetendo a conhecimentos prévios, possibilitando a ampliação de 
repertórios de estratégias no que se refere à resolução de operações, 
notação numérica, formas de representação e comunicação etc., e 
mostrando-se como uma necessidade que justifique a busca de novas 
informações (Brasil, 1998, p. 212). 
 
10 
 
Na teoria histórico-cultural, o papel principal da escola é humanizar através da 
instrução, e isso significa que ela possui o poder de intervir na realidade dos sujeitos, 
por isso deve ser significativa. Nesse contexto, o ensino de Matemática deve ser 
tomado como situação- problema, como define Moura: 
Tomar o ensino na perspectiva de uma situação- problema envolve assumir 
a educação como significativa, isto é, os objetivos serão relevantes para o 
conjunto de sujeitos no processo educacional. Assumir que os objetivos 
sejam relevantes passa a exigir que se escolham conteúdos que os traduzam 
na ação educativa e na criação de atividades que coloquem os sujeitos na 
perspectiva de aprender algo que os desenvolva tanto do ponto de vista 
psicológico como o da instrumentalização para resolver problemas onde 
aquele conteúdo específico se faz necessário (Moura, 1996, p.34). 
Nessa perspectiva de Educação Matemática, evidencia-se a importância do 
planejamento das ações educativas pelo professor, responsáveis por possibilitar a 
apropriação do conhecimento através de condições específicas e objetivas e, 
principalmente, de atividades significativas para os alunos. 
O RCNEI, em diversos momentos, afirma que se deve considerar o 
conhecimento prévio dos alunos para, a partir destes, desenvolver estratégias de 
ensino que permitam a aquisição de novos conteúdos. A perspectiva histórico-lógica 
não despreza a importância desses conhecimentos, mas amplia o seu papel na 
apropriação da linguagem matemática, como assevera Moura: 
A atividade de ensino que traduz em conteúdos os objetivos de uma 
comunidade e que considera as diferenças individuais e as particularidades 
dos problemas deve ter como preocupação básica colocar em ação os vários 
conhecimentos presentes em sala de aula no processo de construção de 
novos conhecimentos. A atividade de ensino que respeita os diferentes níveis 
dos indivíduos e que define um objetivo de formação como problema coletivo 
é o que chamamos de Atividade Orientadora de Ensino (Moura, 1996, p. 32, 
grifos do autor). 
Portanto, o jogo é considerado como parte do universo da criança que a 
auxiliará na apropriação do conhecimento produzido historicamente pelo homem. 
Assim, humaniza-se através da instrução, como afirma Moura em relação à 
matemática: 
 
11 
 
Tratar a aprendizagem da matemática com uma actividade implica fazer com 
que a criança tenha um motivo para aprendê-la, que defina as ações 
necessárias para a sua aprendizagem, que utilize instrumentos que lhe 
permitam ter acesso à linguagem matemática, para ter acesso a novos 
conhecimentos em que ela se faz presente. Isso significa que, ao estudá-la e 
apreendê-la, irá adquirindo um modo de actuar frente a outros conhecimentos 
a serem adquiridos. (Moura, 2007, p. 62). 
De modo geral, podemos dizer que o RCNEI assume um discurso ambíguo, 
“que o torna mais facilmente assimilável por um grande contingente de educadores” 
(Duarte, 2001, p. 65), sobretudo quando ressalta a formação de cidadania: 
O trabalho com a Matemática pode contribuir para a formação de cidadãos 
autônomos, capazes de pensar por conta própria, sabendo resolver 
problemas. Nessa perspectiva, a instituição de educação infantil pode ajudar 
as crianças a organizarem melhor as suas informações e estratégias, bem 
como proporcionar condições para a aquisição de novos conhecimentos 
matemáticos. O trabalho com noções matemáticas na educação infantil 
atende, por um lado, às necessidades das próprias crianças de construírem 
conhecimentos que incidam nos mais variados domínios do pensamento; por 
outro, corresponde a uma necessidade social de instrumentalizá-las para 
melhor viver, participar e compreender um mundo que exige diferentes 
conhecimentos e habilidades (Brasil, 1998, p. 207). 
O que vemos aqui é que a criança “construiria” conhecimento, pensamento, 
representações, capacidades. Como já afirmamos anteriormente neste texto, isso 
delega uma responsabilidade à criança pelo seu processo de aprendizagem e 
desenvolvimento. Sem uma compreensão histórico-cultural de infância, qualquer 
proposta curricular configura-se como vácuo epistemológico e filosófico do 
conhecimento. 
Por essa razão é que priorizamos, também em educação matemática, essa 
discussão. A compreensão sobre o processo de aprendizagem e desenvolvimento 
infantil deveria pautar a organização do ensino de matemática. Discussão que parece 
ausente no RCNEI, ao tratar da definição dos conteúdos matemáticos para a 
Educação Infantil, questão que apresentaremos a seguir. 
 
12 
 
1.2 Conteúdos matemáticos 
No título sobre os conteúdos matemáticos, o documento apresenta uma divisão 
para tratar deles para as crianças de zero a três anos e para as de quatro a seis anos. 
Na primeira parte, destaca que: 
Os bebês e as crianças pequenas estão começando a conhecer o mundo e 
a estabelecer as primeiras aproximações com ele. As situações cotidianas 
oferecem oportunidades privilegiadas para o trabalho com a especificidade 
das idéias matemáticas. As festas, as histórias e, principalmente, os jogos e 
as brincadeiras permitem a familiarização com elementos espaciais e 
numéricos, sem imposição. Assim, os conceitos matemáticos não são o 
pretexto nem a finalidade principal a ser perseguida. As situações deverão ter 
um caráter múltiplo para que as crianças possam interessar-se, fazer 
relações sobre várias áreas e comunicá-las (Brasil, 1998, p. 218, grifos 
nossos). 
Essas considerações vão de encontro ao assinalado no próprio documento em 
trecho anterior: “aprender matemática é um processo contínuo de abstração no qual 
as crianças atribuem significados e estabelecem relações com base nas observações, 
experiências e ações que fazem, desde cedo, sobre elementos do seu ambiente físico 
e sociocultural” (Ibidem, p. 217, grifos do autor), ou seja, ao mesmo tempo que afirma 
a aproximação com a matemáticapor meio das experiências, acaba negando essa 
afirmação, ao dizer que “os conceitos matemáticos não são o pretexto nem a 
finalidade principal a ser perseguida” (Ibidem, p.218). A definição dos conteúdos para 
as crianças de zero a três anos é exemplo da confusão conceitual entre objetivos, 
conteúdos e estratégias: 
• Utilização da contagem oral, de noções de quantidade, de tempo e de 
espaço em jogos, brincadeiras e músicas junto com o professor e nos 
diversos contextos nos quais as crianças reconheçam essa utilização como 
necessária. 
• Manipulação e exploração de objetos e brinquedos, em situações 
organizadas de forma a existirem quantidades individuais suficientes para 
que cada criança possa descobrir as características e propriedades principais 
e suas possibilidades associativas: empilhar, rolar, transvasar, encaixar etc. 
(Brasil, 1998, p. 217, grifos do autor). 
 
13 
 
Poderíamos aludir que essa confusão se dê, por um lado, em função dos 
poucos estudos dedicados à educação matemática para crianças pequenas, 
sobretudo para as com idade entre 0 e 3 anos. E, por outro, mais especificamente, 
porque ainda não temos acúmulo suficiente de pesquisa e debates sobre a relação 
entre organização curricular e desenvolvimento infantil que focalizem o conhecimento 
matemático no espaço creche, instituição que legalmente atende crianças nessa faixa 
etária. Todavia, esses fatos não justificam uma indiferenciação entre conteúdos, 
objetivos e estratégias, conceitos básicos da teoria didática. 
O título dos conteúdos dedica maior expressão às crianças de 4 a 6 anos, talvez 
por entender que: “Nesta faixa etária aprofundam-se os conteúdos para as crianças 
de zero a três anos, dando-se crescente atenção à construção de conceitos e 
procedimentos especificamente matemáticos.” (Ibidem, p. 219, grifos nossos). 
Após a introdução, há três blocos de conteúdos, o de Números e Sistema de 
Numeração, o de Grandezas e Medidas e o de Espaço e Forma. O primeiro deles 
“envolve contagem, notação e escrita numéricas e as operações matemáticas”, 
(Ibidem, p. 218). 
A seguir, traremos alguns extratos do documento que mostram como esses 
conteúdos são apresentados. Buscaremos fazer as discussões cabíveis sobre cada 
um deles, fundamentadas na teoria histórico-cultural. 
Sobre a contagem, cabe salientar que a importância de contar está no fato de 
que quem domina a contagem domina a ideia de quantidades, ou seja, o movimento 
de controlar, comparar e representar as quantidades (Moura, 1996). 
Para entender o movimento de controle de quantidades, remetemo-nos à 
história da humanidade que, em busca de melhores condições de vida e diante de 
necessidades que exigiam o domínio dessas quantidades, desenvolveu um sistema 
de contagem que é conhecido como correspondência um a um (Ifrah, 1992), que 
consiste em associar a cada objeto de um conjunto um objeto de um outro conjunto. 
A correspondência um a um foi um dos passos decisivos para o surgimento da noção 
de número. 
A forma como o RCNEI define contagem não revela o movimento de produção 
humana no conceito de contagem, cuja ideia basilar reside na correspondência entre 
um conjunto que conta e um conjunto contado. Para o documento, contar 
 
14 
 
é uma estratégia fundamental para estabelecer o valor cardinal de conjuntos 
de objetos. Isso fica evidenciado quando se busca a propriedade numérica 
dos conjuntos ou coleções em resposta à pergunta “quantos?” (cinco, seis, 
dez etc.). É aplicada também quando se busca a propriedade numérica dos 
objetos, respondendo à pergunta “qual?”. Nesse caso está também em 
questão o valor ordinal de um número (quinto, sexto, décimo etc.). Na 
contagem propriamente dita, ou seja, ao contar objetos as crianças aprendem 
a distinguir o que já contaram do que ainda não contaram e a não contar duas 
(ou mais) vezes o mesmo objeto; descobrem que tampouco devem repetir as 
palavras numéricas já ditas e que, se mudarem sua ordem, obterão 
resultados finais diferentes daqueles de seus companheiros; percebem que 
não importa a ordem que estabelecem para contar os objetos, pois obterão 
sempre o mesmo resultado. Pode-se propor problemas relativos à contagem 
de diversas formas. É desafiante, por exemplo, quando as crianças contam 
agrupando os números de dois em dois, de cinco em cinco, de dez em dez, 
etc. (Brasil, 1998, p. 220). 
A Atividade Orientadora de Ensino (AOE) estabelece as diretrizes do ensino da 
contagem a partir do movimento histórico do conceito. Ifrah (1992) esclarece-nos que 
contar é uma faculdade humana, não é uma aptidão natural e, por ser um atributo 
exclusivamente humano, diz respeito a um fenômeno mental muito complicado, 
intimamente ligado ao desenvolvimento mental. 
Contar, ou seja, controlar quantidades faz com que a criança trabalhe não 
apenas com o aspecto cardinal do número, como afirma Moura, mas também com 
seu aspecto ordinal (1996, p. 23): “Através da contagem um a um lida principalmente 
com o aspecto cardinal do número, possibilitando a conquista da conservação das 
quantidades. E através da comparação de quantidade, desenvolve outro aspecto 
constitutivo do número: o aspecto ordinal”. 
O aspecto ordinal do número é importante porque possibilita a organização da 
contagem em uma determinada sequência, desenvolvendo o conceito de inclusão 
hierárquica, que “é a compreensão de que cada quantidade se forma a partir da 
anterior, acrescentando mais um” (Moura, 1996, p. 61). 
A questão da notação numérica é discutida no RCNEI, sem considerar o 
movimento humano de criação de um conjunto finito de signos com os quais se podem 
representar quantidades infinitas, que é o atual sistema de numeração decimal. A 
contagem por agrupamento é limitada, pois não permite representar quantidades 
 
15 
 
muito grandes. Esse problema foi resolvido com a criação do valor posicional dos 
algarismos, cada um dos quais representa uma quantidade; e do zero, que vem 
consolidar a ideia do valor posicional e ordinal dos números. 
É sabido que foram os hindus que criaram tal sistema, por sua vez divulgado 
pelos árabes. Daí o nome de sistema de numeração indo- arábico, ou sistema de 
numeração decimal que, a partir do século XVI, passou a ser usado amplamente e 
hoje podemos considerar de âmbito universal. A proposta do RCNEI, relativa ao 
sistema de numeração decimal, centra-se, sobretudo, no uso do número como 
registro: 
A importância cultural dos números e do sistema de numeração é indiscutível. 
A notação numérica, na qual os símbolos são dotados de valores conforme a 
posição que ocupam, característica do sistema hindu-arábico de numeração, 
é uma conquista do homem, no percurso da história, e um dado da realidade 
contemporânea. [...] Para as crianças, os aspectos relevantes da numeração 
são os que fazem parte de suas vidas cotidianas. Pesquisar os diferentes 
lugares em que os números se encontram, investigar como são organizados 
e para que servem, é tarefa fundamental para que possam iniciar a 
compreensão sobre a organização do sistema de numeração. Quando o 
professor lê histórias para as crianças, pode incluir a leitura do índice e da 
numeração das páginas, organizando a situação de tal maneira que todos 
possam participar. É importante aceitar como válidas respostas diversas e 
trabalhar a partir delas. Histórias em capítulos, coletâneas e enciclopédias 
são especialmente propícias para o trabalho com índice. Fichas que indicam 
a ordinalidade — primeiro, segundo, terceiro — podem ser sugeridas às 
crianças como material para uso nas brincadeiras de faz-de- conta, quando é 
necessário, por exemplo, decidir a ordem de atendimento num posto de 
saúde ou numa padaria; em jogos ou campeonatos (Brasil, 1998, p. 222). 
O conceito de aprendizagem apresentado no RCNEI é fundamentado nas 
experiências cotidianas. Sabemos que o argumento de que o conhecimento 
matemático é necessário para ser utilizadona vida (daí seu aspecto cotidiano) tem 
predominado não apenas nos documentos oficiais, mas também no cenário escolar, 
seja da Educação Infantil, seja no Ensino Médio. 
Um discurso comum repousa na interrogação: para que serve a matemática 
que aprendemos na escola? E, com isso, reforça-se a ideia do caráter utilitarista do 
 
16 
 
conhecimento. Nessa lógica, os conteúdos que deveríamos ensinar na escola 
estariam justificados pela sua utilização no dia a dia, pela sua natureza empírica. 
A marca da perspectiva empírica de organização do ensino passa pelo 
pensamento classificante e empírico (Davidov, 1982). Um exemplo desse tipo de 
pensamento, pautado na observação das aparências dos objetos, é descrito por Rosa, 
Moraes e Cedro (2010) ao apresentarem o modo como normalmente se trabalha com 
formação do conceito de número: 
Como é bem conhecido, para fazer as crianças se familiarizarem com essa 
noção, são mostrados a elas conjuntos de objetos (tais como conjuntos de 
palitos, bolas, carrinhos, etc.). As crianças observam esses conjuntos, os 
comparam, abstraem os atributos característicos desses conjuntos, extraem 
as características numéricas idênticas ou comuns, e os nomeiam com signos 
numéricos ou com palavras numerais. Como resultado disso, temos um 
conjunto que pode ser como o signo numérico ou palavra numérica zero 
(conjunto vazio), outro conjunto, um, outro dois, e assim por diante. (Rosa et 
al., 2010, p.138-139). 
A crítica a esse tipo de ensino reside no fato de que tal atividade não possibilita 
que a criança supere o conhecimento empírico. A esse respeito, Davidov (1982) 
salienta a necessidade de ultrapassarmos o nível das representações sobre os 
objetos reais circundantes, pois essa prática impossibilita que a criança tenha acesso 
à formação de conceitos genuinamente matemáticos. 
Poderíamos, então, nos perguntar: “Mas isso também vale para a Educação 
Infantil?”. E nossa resposta é afirmativa. É afirmativa porque consideramos que, desde 
que a criança nasce, está imersa em um mundo que utiliza a matemática como 
ferramenta simbólica que a humanidade construiu. Ainda que na Educação Infantil ela 
não complete a aquisição dessas ferramentas, é nela que teve ter início. Ou seja, 
desde a Educação Infantil a criança tem o direito de apropriar-se da experiência social 
da humanidade, tem o direito de tornar sua a conquista que a humanidade alcançou 
em forma de conhecimento. 
Mesmo que o conteúdo dessa conquista signifique apenas uma pequena 
parcela de todo conhecimento acumulado, trata-se da primeira de muitas outras 
conquistas. 
Nesse sentido, o documento menciona o valor posicional como uma conquista 
da humanidade, mas não apresenta, de fato, o que significou esse avanço. Ao tratar 
 
17 
 
o sistema de numeração decimal (SND) apenas no seu aspecto de notação, o 
documento não discute nem apresenta as principais características que o compõem. 
Essa questão não revela apenas um descuido, mas demonstra o entendimento 
de que a criança aprende o SND pelo uso e de que cabe ao professor proporcionar 
situações nas quais seu uso se faça necessário. Nesse sentido, a notação numérica 
é compreendida apenas como uma marcação para diferenciar objetos ou localizar 
dados, subtraindo a questão fundamental, que é a compreensão do número em 
relação ao sistema de numeração. A esse respeito, Moura comenta: 
Mesmo antes de entrar para a escola, as crianças estão acostumadas a 
observar e utilizar os números em seu cotidiano, e muitas vezes sabem “ler” 
e escrever a seqüência numérica até determinada quantidade. Entretanto, na 
maior parte das vezes, os numerais aparecem na realidade em contextos de 
indicação para especificar determinados elementos. Por exemplo: números 
de casa, telefone, ônibus, canal de tv, relógio, placa, dinheiro, entre outros. O 
numeral indo-arábico é a abstração de todos os conceitos presentes nos 
outros numerais, pois os signos não fazem nenhuma referência explicita às 
quantidades representadas. Estão presentes em sua estrutura de 
funcionamento: ordenação e seqüência; agrupamento e propriedade aditiva; 
base e valor posicional; valor operacional do zero (Moura, 1996, p. 119). 
Desse modo, a apropriação do sistema de numeração decimal solicita que se 
compreendam as regras que o compõem, particularmente a relacionada com o valor 
posicional do número. Este não é um processo que possa ser realizado pelas crianças 
apenas com a matemática cotidiana ou por meio de descobertas das regularidades. 
Por ser de natureza abstrata, é preciso que alguém ensine à criança; para isso 
existe o professor, e, embora na Educação Infantil a compreensão dessas regras não 
se complete, reafirmamos, tal compreensão deve ter seu início nessa primeira etapa 
do ensino fundamental. 
A forma como o documento inicia a discussão sobre operações remete para a 
contagem por agrupamento. Os conteúdos de operações apresentados no RCNEI são 
novamente fundamentados na experiência das crianças, e as atividades propostas 
não enfatizam a mediação do professor, que é fundamental no processo de 
aprendizagem de um conteúdo matemático completamente operatório, como as 
operações: 
 
18 
 
[...] Quando as crianças contam de dois em dois ou de dez em dez, isto é, 
quando contam agregando uma quantidade de elementos a partir de outra, 
ou contam tirando uma quantidade de outra, ou ainda quando distribuem 
figuras, fichas ou balas, elas estão realizando ações de acrescentar, agregar, 
segregar e repartir relacionadas a operações aritméticas. O cálculo é, 
portanto, aprendido junto com a noção de número e a partir do seu uso em 
jogos e situações- problema (Brasil, 1998, p. 223). 
O entendimento de que o cálculo é aprendido junto com a noção do número é 
um aspecto que a perspectiva histórico-cultural defende, porém essa não é a única 
questão que deve ser considerada, quando do ensino das noções de operação. 
Primeiramente, há que compreender que “acrescentar, agregar, segregar e repartir” 
(Brasil, 1998, p. 223) foram formas que o homem criou para controlar o movimento 
das quantidades. E, nesse sentido, há que considerar as principais ideias presentes 
em cada uma das operações, questão não abordada pelo Referencial. 
Moura e Lanner de Moura (1992) discorrem a respeito das quatro operações, 
apresentando as principais ideias matemáticas presentes em cada uma delas. A 
adição representa um nível de abstração mais elevado que a contagem, pois envolve 
a compreensão de que um todo e outro todo formam um novo todo. 
A ideia principal é a do acréscimo. Na subtração há várias ideias: a comparativa 
procura perceber a diferença e está normalmente presente em questões que 
envolvem saber “quanto é mais que...?” ou “quanto é menos que...?”. Outra ideia 
presente é a subtrativa, que implica retirada, quando se quer saber “quanto fica?”. E, 
por fim, podemos ter na subtração a ideia aditiva, utilizada com frequência pelas 
crianças em resposta à pergunta “quanto falta para?”. 
Essa compreensão não está presente no RCNEI; pelo contrário, as operações 
são tratadas apenas na esfera do cotidiano e não fornecem para o professor a 
fundamentação teórica necessária para elaborar atividades de ensino. 
Com relação ao conteúdo grandezas e medidas, o documento não considera a 
questão fundamental para a aprendizagem das medidas: a criação de uma unidade 
padrão: 
As medidas estão presentes em grande parte das atividades cotidianas e as 
crianças, desde muito cedo, têm contato com certos aspectos das medidas. 
O fato de que as coisas têm tamanhos, pesos, volumes, temperaturas 
diferentes e que tais diferenças freqüentemente são assinaladas pelos outros 
 
19 
 
(está longe, está perto, é mais baixo, é mais alto, mais velho, mais novo, pesa 
meio quilo, mede dois metros, a velocidade é de oitenta quilômetros por hora 
etc.) permite que as crianças informalmente estabeleçam esse contato,fazendo comparações de tamanhos, estabelecendo relações, construindo 
algumas representações nesse campo, atribuindo significado e fazendo uso 
das expressões que costumam ouvir. Esses conhecimentos e experiências 
adquiridos no âmbito da convivência social favorecem a proposição de 
situações que despertem a curiosidade e interesse das crianças para 
continuar conhecendo sobre as medidas (Brasil, 1998, p. 225). 
Na teoria histórico-cultural, a noção de grandezas e medidas enfatiza a questão 
da comparação através de uma unidade padrão. Para medir, utiliza-se a comparação 
dos objetos. Mas isso não quer dizer que medir signifique apenas estabelecer que um 
seja maior que o outro. 
Nesse sentido, a atividade de ensino deve considerar, segundo Lanner de 
Moura, “três fases, três aspectos distintos: a escolha da unidade; a comparação com 
a unidade; a expressão numérica do resultado dessa comparação por um número” 
(Lanner de Moura, 1995, p. 51). 
Aspectos que não são explicitados pelo RCNEI, que continua dando ênfase ao 
conhecimento cotidiano, como se ele fosse suficiente para a criança apropriar-se 
desse conteúdo. 
Ainda de acordo com a perspectiva histórico-cultural, as noções de medida e 
espaço e forma — que podem ser representadas pela geometria — são 
historicamente interdependentes, como mostra Lanner de Moura: 
As primeiras considerações que o homem faz da geometria parecem ter sua 
origem em simples observações provenientes da capacidade humana de 
reconhecer configurações físicas, comparar formas e tamanhos. Inúmeras 
circunstâncias de vida devem ter levado o homem às primeiras elaborações 
geométricas como, por exemplo, a noção de distância, a necessidade de 
delimitar a terra, a construção de muros e moradias e outras. Podemos 
afirmar que na origem de problemas geométricos concretos com os quais o 
homem se envolve desde suas atividades práticas, está a necessidade de 
controlar as variações de dimensões com as quais se defronta ao delimitar 
seu espaço físico para morar e produzir (Lanner de Moura, 1995, p. 54). 
 
20 
 
O RCNEI novamente não destaca o percurso da humanidade em relação à 
“numeralização” do espaço e assume a posição de defesa da aprendizagem pela 
experiência. Nesse sentido, curiosamente, ele não faz menções ao fato de que, para 
a Educação Infantil, em relação à geometria, faz-se necessário considerar que a 
criança se apropria do espaço a partir de seu próprio corpo e de seus deslocamentos, 
construindo noções geométricas gradativamente mais complexas. 
O pensamento geométrico compreende as relações e representações 
espaciais que as crianças desenvolvem, desde muito pequenas, inicialmente, 
pela exploração sensorial dos objetos, das ações e deslocamentos que 
realizam no meio ambiente, da resolução de problemas. Nesse sentido, o 
trabalho na educação infantil deve colocar desafios que dizem respeito às 
relações habituais das crianças com o espaço, como construir, deslocar-se, 
desenhar etc., e à comunicação dessas ações. Assim, à educação infantil 
coloca-se a tarefa de apresentar situações significativas que dinamizem a 
estruturação do espaço que as crianças desenvolvem e para que adquiram 
um controle cada vez maior sobre suas ações e possam resolver problemas 
de natureza espacial e potencializar o desenvolvimento do seu pensamento 
geométrico. O trabalho com o espaço pode ser feito, também, a partir de 
situações que permitam o uso de figuras, desenhos, fotos e certos tipos de 
mapas para a descrição e representação de caminhos, itinerários, lugares, 
localizações etc. (Brasil, 1998, p. 229). 
Dessa forma, na teoria histórico-cultural, o trabalho envolvendo espaço e forma 
não deve limitar-se ao reconhecimento e à memorização de formas geométricas. Há 
que desenvolver propostas que considerem o espaço sob a perspectiva do esquema 
corporal, da percepção do espaço, além das noções geométricas propriamente ditas. 
Segundo Lanner de Moura (1995), a evolução das noções geométricas como 
formas e medidas foi possível devido à capacidade e à necessidade do homem de 
transformar a natureza, em busca de aumentar o seu conforto, permitindo a realização 
de construções, primeiramente precárias, as quais ele procurava aperfeiçoar cada vez 
mais, acumulando sempre mais conhecimentos. 
Na evolução de seus conhecimentos, para o homem que ainda não produzia 
excedentes, ou seja, apenas coletava da natureza o que precisava para sobreviver, o 
ponto de referência da organização do espaço era o próprio corpo, pois ele não 
construía relações entre os objetos. 
 
21 
 
Estas, porém, desenvolveram-se à medida que o homem passou a produzir o 
seu alimento, possibilitando dar formas aos objetos, visando a sua utilidade e 
praticidade. Assim, ele recria os objetos encontrados na natureza, aperfeiçoando-os 
sempre de acordo com sua necessidade, superando os limites da própria natureza. 
Diante dessa perspectiva, a autora afirma que este seria o princípio norteador para o 
ensino de geometria. 
2 BIBLIOGRAFIA 
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Médicas, 1995.

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