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Autor: Profa. Mercedes Toledo Grijalba Prof. Alexandre Bechara Prof. Alexandre Dermargos Oliveira Colaboradores: Prof. Juliano Rodrigo Guerreiro Profa. Laura Cristina da Cruz Dominciano Farmacologia Professores conteudistas: Mercedes Toledo Grijalba; Alexandre Bechara; Alexandre Dermargos Oliveira Mercedes Toledo Grijalba Formou-se em Farmácia e Bioquímica pela Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo (USP) em 1986. É mestra e doutora em ciências pelo Instituto de Química, Departamento de Bioquímica, da USP. Coordenadora do curso de Farmácia da Universidade Paulista (UNIP) desde 2009, professora na área da saúde, ministrando as disciplinas de Farmacologia, Bioquímica, Microbiologia, Imunologia, Físico-química na UNIP desde 2006. Alexandre Bechara Farmacêutico graduado em 2008 pela Universidade do Sagrado Coração em Bauru-SP. Possui mestrado (2011) e doutorado (2016) em ciências (área de concentração, farmacologia) pelo Departamento de Farmacologia da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Atuou na área de pesquisa de novos compostos com atividade antitumoral, realizando a triagem de compostos e buscando identificar os mecanismos de ação pelos quais novas moléculas desencadeavam a morte de células tumorais. Já como docente, atuou na supervisão de alunos nas práticas farmacêuticas no Sistema Único de Saúde (SUS), com foco no desenvolvimento de competências para a prática da atenção e da assistência farmacêutica. Entre os anos de 2018 e 2019, coordenou a comissão técnica e o Comitê Jovem da Seccional de Bauru do Conselho Regional de Farmácia do Estado de São Paulo (CRF-SP). Atualmente, é docente do curso de Farmácia da Universidade Paulista (UNIP) nos campi da cidade de São Paulo. Alexandre Dermargos Oliveira Graduado em Farmácia e Bioquímica pela Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo (USP) em 2000 e em Tecnologia Mecânica, modalidade projetos, pela Faculdade de Tecnologia de São Paulo em 1993. Doutorado em ciências (bioquímica) pelo Instituto de Química da USP (2007) e pós-doutorado em bioquímica e biotecnologia pelo Instituto de Química da USP e pelo Instituto Butantã, respectivamente (2013). Tem experiência em biologia molecular, estruturas de proteínas e bioinformática com ênfase nas palavras-chaves: câncer, FGF (fibroblast growth fator) e ciclo celular. Atualmente é professor titular na UNIP e colaborador do Instituto de Ciências da Atividade Física e Esportes (Icafe-Universidade Cruzeiro do Sul). © Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma e/ou quaisquer meios (eletrônico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em qualquer sistema ou banco de dados sem permissão escrita da Universidade Paulista. Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) G849f Grijalba, Mercedes Toledo. Farmacologia / Mercedes Toledo Grijalba, Alexandre Bechara, Alexandre Dermargos Oliveira. – São Paulo: Editora Sol, 2020. 296 p., il. Nota: este volume está publicado nos Cadernos de Estudos e Pesquisas da UNIP, Série Didática, ISSN 1517-9230. 1. Tratamento. 2. Terapia. 3. Inibidores. I. Grijalba, Mercedes Toledo. II. Bechara, Alexandre. III. Oliveira, Alexandre Dermargos. IV. Título. CDU 615 U508.63 – 20 Prof. Dr. João Carlos Di Genio Reitor Prof. Fábio Romeu de Carvalho Vice-Reitor de Planejamento, Administração e Finanças Profa. Melânia Dalla Torre Vice-Reitora de Unidades Universitárias Profa. Dra. Marília Ancona-Lopez Vice-Reitora de Pós-Graduação e Pesquisa Profa. Dra. Marília Ancona-Lopez Vice-Reitora de Graduação Unip Interativa – EaD Profa. Elisabete Brihy Prof. Marcello Vannini Prof. Dr. Luiz Felipe Scabar Prof. Ivan Daliberto Frugoli Material Didático – EaD Comissão editorial: Dra. Angélica L. Carlini (UNIP) Dr. Ivan Dias da Motta (CESUMAR) Dra. Kátia Mosorov Alonso (UFMT) Apoio: Profa. Cláudia Regina Baptista – EaD Profa. Deise Alcantara Carreiro – Comissão de Qualificação e Avaliação de Cursos Projeto gráfico: Prof. Alexandre Ponzetto Revisão: Aline Ricciardi Vera Saad Sumário Farmacologia APRESENTAÇÃO ......................................................................................................................................................9 INTRODUÇÃO ...........................................................................................................................................................9 Unidade I 1 TRATAMENTO DE CONDIÇÕES CEREBRAIS E CARDIOVASCULARES ........................................... 13 1.1 Hipertensão............................................................................................................................................. 13 1.1.1 Diuréticos ................................................................................................................................................... 18 1.1.2 Inibidores de enzima conversora de angiotensina (IECA) ...................................................... 25 1.1.3 Bloqueadores de receptor AT1 de angiotensina II (BRA) ........................................................ 27 1.1.4 Bloqueadores de canais de cálcio (BCC) ........................................................................................ 29 1.1.5 Agentes de ação central....................................................................................................................... 34 1.1.6 Beta-bloquedores ................................................................................................................................... 36 1.1.7 Alfa-bloqueadores .................................................................................................................................. 39 1.1.8 Vasodilatadores diretos ........................................................................................................................ 40 1.1.9 Inibidores de renina ............................................................................................................................... 42 1.1.10 Associações de medicamentos anti-hipertensivos ................................................................. 42 1.1.11 Interações medicamentosas importantes envolvendo anti-hipertensivos ................... 44 1.2 Dislipidemia ........................................................................................................................................... 45 1.2.1 Estatinas ..................................................................................................................................................... 48 1.2.2 Resinas ligadoras de ácidos biliares ................................................................................................ 51 1.2.3 Ezetimiba .................................................................................................................................................... 53 1.2.4 Fibratos ........................................................................................................................................................ 53 1.2.5 Niacina ou ácido nicotínico ................................................................................................................ 55 1.2.6 Suplementação com ácidos graxos ômega 3 .............................................................................. 56 1.2.7 Inibidores de PCSK-9 ............................................................................................................................. 57 1.3 Tromboembolismo arterial e venoso ............................................................................................ 59 1.3.1 Antiagregantes plaquetários .............................................................................................................. 61 1.3.2 Anticoagulantes ......................................................................................................................................64 1.3.3 Fibrinolíticos .............................................................................................................................................. 71 1.4 Doença arterial coronariana (DAC) ............................................................................................... 72 1.5 Insuficiência cardíaca ......................................................................................................................... 75 2 TRATAMENTO DE DIABETES MELLITUS (DM) ........................................................................................ 81 2.1 Fisiopatologia da diabetes mellitus (DM) ................................................................................... 81 2.2 Tratamento não farmacológico de DM ....................................................................................... 85 2.3 Tratamento farmacológico de DM II ............................................................................................ 86 2.3.1 Anti-hiperglicemiantes ......................................................................................................................... 86 2.3.2 Medicamentos que induzem glicosúria ......................................................................................... 88 2.3.3 Hipoglicemiantes indutores de liberação de insulina pelas células beta-pancreáticas de forma dependente da glicose ........................................................................... 89 2.3.4 Hipoglicemiantes que intensificam a produção e liberação de insulina pelas células beta-pancreáticas ............................................................................................................................... 90 2.3.5 Escolha dos medicamentos................................................................................................................. 92 2.4 Tratamento farmacológico de DM I .............................................................................................. 94 3 TRATAMENTO DE OBESIDADE E SOBREPESO, DOENÇAS DA TIREOIDE, OSTEOPOROSE E MENOPAUSA ...................................................................................................................... 99 3.1 Obesidade ................................................................................................................................................ 99 3.1.1 Orlistate ....................................................................................................................................................100 3.1.2 Sibutramina .............................................................................................................................................102 3.1.3 Agonistas de receptores de GLP-1 ...............................................................................................103 3.1.4 Anfetaminas – anfepramona, femproporex e mazindol .......................................................104 3.2 Tireoide ...................................................................................................................................................106 3.2.1 Hipertireoidismo ....................................................................................................................................106 3.2.2 Hipotireoidismo .....................................................................................................................................107 3.3 Osteoporose ..........................................................................................................................................108 3.4 Menopausa ...........................................................................................................................................114 4 ANTICONCEPÇÃO, DISFUNÇÃO ERÉTIL E HIPERPLASIA PROSTÁTICA BENIGNA, ANEMIAS E DOENÇA FALCIFORME .............................................................................................................117 4.1 Anticoncepcionais ..............................................................................................................................117 4.1.1 Contraceptivos combinados (associações de estrógeno-progestágeno) ...................... 120 4.1.2 Contracepção apenas com progestágenos ............................................................................... 123 4.1.3 Contracepção de emergência (pílula do dia seguinte) ......................................................... 124 4.2 Tratamento de disfunção erétil ....................................................................................................125 4.3 Tratamento de hiperplasia prostática benigna ......................................................................127 4.4 Tratamento de anemias ...................................................................................................................129 Unidade II 5 AGENTES ANTIMICROBIANOS .................................................................................................................148 5.1 História dos antimicrobianos .........................................................................................................148 5.2 Princípios farmacológicos da terapia medicamentosa das infecções ..........................150 5.2.1 Aspectos farmacodinâmicos dos agentes antimicrobianos ................................................151 5.2.2 Aspectos farmacocinéticos da terapia antimicrobiana ........................................................ 174 5.3 Resistência aos agentes antimicrobianos .................................................................................175 5.3.1 Mecanismos celulares de resistência aos agentes antimicrobianos ............................... 176 5.3.2 Estratégias gerais para evitar e reverter o surgimento da resistência aos agentes antimicrobianos.............................................................................................................................. 180 5.3.3 Testes para a identificaçâo de resistência ...................................................................................181 6 TERAPIA ANTIMICROBIANA ......................................................................................................................183 6.1 Antimicrobianos para profilaxia ...................................................................................................183 6.2 Uso de antimicrobianos na gestação e lactação ...................................................................185 6.3 Infecções de trato respiratório......................................................................................................186 6.4 Tratamento da tuberculose ............................................................................................................188 6.5 Tratamento de infecções de trato urinário (ITU) ...................................................................189 6.6 Tratamento de infecções bacterianas gastrintestinais .......................................................192 6.7 Tratamento das infecções no SNC ..............................................................................................193 6.8 Prevenção e tratamento de endocardites ................................................................................194 6.9 Tratamento das infecções bacterianas de pele e dos tecidos moles .............................195 6.10 Tratamento das infecções fúngicas superficiais ..................................................................197 6.11 Tratamento das infecções fúngicas invasivas .......................................................................198 6.12 Tratamento da malária ..................................................................................................................199 6.13 Terapia medicamentosa da leishmaniose ..............................................................................201 6.14 Terapia medicamentosa da toxoplasmose .............................................................................2026.15 Terapia medicamentosa na doença de Chagas ...................................................................203 6.16 Terapia das parasitoses intestinais ............................................................................................204 6.16.1 Terapia medicamentosa da amebíase ....................................................................................... 205 6.16.2 Terapia medicamentosa da giardíase ........................................................................................ 206 6.16.3 Terapia medicamentosa da ascaridíase .....................................................................................207 6.16.4 Terapia medicamentosa da teníase e cisticercose ............................................................... 209 6.17 Terapia medicamentosa da esquistossomose ......................................................................210 Unidade III 7 FÁRMACOS ANTIVIRAIS ..............................................................................................................................221 7.1 Vírus da influenza .............................................................................................................................224 7.1.1 Inibidores da neuraminidase ........................................................................................................... 225 7.1.2 Derivados de adamantano ............................................................................................................... 226 7.1.3 Ribavirina ................................................................................................................................................ 227 7.2 Herpes-vírus .........................................................................................................................................227 7.2.1 Análogos nucleosídeos e nucleotídeos anti-herpes-vírus .................................................. 228 7.3 Citomegalovírus (HCMV) .................................................................................................................230 7.3.1 Inibidores nucleosídeos de DNA polimerase ..............................................................................231 7.3.2 Inibidores não nucleosídeos da DNA polimerase .................................................................... 232 7.4 Vírus da imunodeficiência humana (HIV) .................................................................................232 7.4.1 Inibidores da transcriptase reversa (agentes nucleosídicos) – ITRNs ............................. 235 7.4.2 Inibidores da transcriptase reversa (agentes não nucleosídicos) ..................................... 237 7.4.3 Inibidores da protease do HIV ......................................................................................................... 238 7.4.4 Inibidores de fusão ...............................................................................................................................241 7.5 Hepatites ................................................................................................................................................242 8 FÁRMACOS ANTINEOPLÁSICOS ...............................................................................................................247 8.1 Tipos e finalidades da quimioterapia .........................................................................................249 8.2 Toxicidade dos fármacos antineoplásicos ................................................................................251 8.3 Fármacos antineoplásicos ...............................................................................................................252 8.3.1 Fármacos antimetabólitos usados no tratamento da neoplasia ...................................... 252 8.3.2 Análogos da pirimidina ..................................................................................................................... 255 8.3.3 Antimicrobianos antitumorais ........................................................................................................ 257 8.3.4 Inibidores da polimerização dos microtúbulos ....................................................................... 259 8.3.5 Compostos de platina: cisplatina e carboplatina ....................................................................261 8.3.6 Hormônios na terapia antineoplásica ......................................................................................... 262 8.3.7 Enzimas (L-asparaginase) ................................................................................................................. 263 8.3.8 Anticorpos monoclonais ................................................................................................................... 264 8.3.9 Inibidores da angiogênese ............................................................................................................... 266 8.3.10 Inibidores de EGFR: gefitinibe e erlotinibe .............................................................................. 268 8.3.11 Inibidores de mTOR: rapamicina (sirolimo) ............................................................................. 269 8.3.12 Inibidores do proteassomo: bortezomibe ................................................................................ 269 8.3.13 Inibidores da via de Ras/MAPK .....................................................................................................270 8.3.14 Inibidores da topoisomerase ..........................................................................................................270 8.4 Perspectivas futuras: vacinas e terapia gênica.......................................................................271 9 APRESENTAÇÃO Propiciamos neste livro-texto ferramentas para a compreensão de como agem os fármacos no organismo, tanto no ponto de vista cinético como dinâmico, permitindo, assim, a utilização adequada de medicamentos na prática clínica. Todo e qualquer medicamento apresenta benefícios e desvantagens na sua utilização, sendo que o aluno deverá, ao final do curso, estar apto a avaliar todos os aspectos relacionados ao tratamento medicamentoso e, dessa forma, auxiliar pacientes orientando-os de maneira fundamentada e baseada em evidências científicas. A compreensão dos diversos processos que envolvem a interação fármaco-organismo é fundamental para o aluno desenvolver a capacidade de analisar criticamente a proposta farmacológica prescrita pelo médico. Assim, estará apto a verificar incongruências, problemas com potencial de comprometer o sucesso farmacológico, situações que podem causar efeitos adversos severos e até mesmo toxicidade, prever interações medicamentosas, auxiliando assim o prescritor na melhor escolha possível para um dado paciente em uma situação específica. Dessa forma, o futuro profissional poderá orientar pacientes sob todos os aspectos do tratamento farmacológico, garantindo uma terapêutica adequada e até mesmo a adesão necessária, evitando a utilização equivocada e/ou o uso abusivo de medicamentos, dirimindo dúvidas e temores. Sempre que necessário, o profissional deverá contatar o prescritor para corrigir eventuais equívocos, orientar sobre interações e problemas possíveis no tratamento. A interação com os demais profissionais da saúde, prescritores ou não, é de grande valia para garantir uma prescrição correta e a condução adequada para as características e necessidades de cada paciente, garantindo o melhor tratamento possível. INTRODUÇÃO A farmacologia é básica e essencial para os profissionais, sejam prescritores ou não, já que eles devem estar habilitados a identificar problemas associados ao uso de medicamentos e, assim, orientar o paciente sobre as condutas adequadas. A utilização adequada e plena de medicamentos passa, necessariamente, pelo amplo conhecimento de suas ações no organismo, no ponto de vista molecular, sempre que possível. O domínio desse conhecimento permite assegurarcondutas terapêuticas adequadas, com o mínimo de efeitos adversos e sem toxicidade. As patologias crônicas são as mais preocupantes na atualidade, sendo causa importante de complicações que levam a sequelas importantes, afastamento do trabalho, aposentadoria por invalidez e morte. Destaque para as condições cerebrais e cardiovasculares, que serão inicialmente abordadas. A aterosclerose, processo inflamatório crônico decorrente de maus hábitos alimentares e de vida, está fortemente associada à hipertensão e a complicações cerebrais e cardiovasculares. A presença de placa aterosclerótica aumenta sensivelmente o risco de formação de trombos, sendo uma das principais causas de infarto do miocárdio. A associação desses eventos patológicos torna importante a discussão em conjunto das normas terapêuticas. Dessa forma, além de medicamentos para o tratamento de 10 hipertensão, doença arterial coronariana e insuficiência cardíaca, discutem-se também os medicamentos que alteram a homeostasia sanguínea, especialmente, os antiagregantes plaquetários e anticoagulantes, além dos medicamentos que auxiliam no bloqueio do desenvolvimento da placa aterosclerótica, bem como do processo inflamatório que a sua presença conduz. Outra patologia crônica importante é a diabetes (ou diabetes mellitus), em que uma condição hiperglicêmica persistente pode desencadear processos inflamatórios sistêmicos, especialmente, no leito vascular. Como decorrência, desenvolvem-se lesões que comprometem inúmeras funções, propiciando ainda um aumento importante no risco cérebro e cardiovascular. Por essa razão, é discutida em associação com patologias cérebro e cardiovasculares. O tratamento de obesidade e sobrepeso foi propositadamente mencionado após a hipertensão, doença arterial coronariana e diabetes, em vista da correlação importante existente entre eles. Indivíduos obesos frequentemente desenvolvem problemas cardiovasculares e tornam-se diabéticos, notadamente, com resistência insulínica. Alguns medicamentos desenvolvidos para diabetes mostraram-se importantes também para auxiliar na redução de peso e, claro, estão amplamente comentados no texto. Adicionaram-se medicamentos que atuam no sistema nervoso central (SNC), reduzindo a sensação de fome, a despeito de estarem proibidos na maior parte do mundo. Entretanto, no Brasil, foram liberados novamente, em contraposição às recomendações da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Patologias envolvendo a tireoide não são incomuns, especialmente, o hipotireoidismo, felizmente, de fácil controle. Assim, os principais medicamentos disponíveis estão amplamente discutidos. A osteoporose é uma condição cada vez mais importante, principalmente em função do gradativo aumento percentual na população idosa, a mais frequentemente atingida. Os medicamentos disponíveis, especialmente pelo Sistema Único de Saúde (SUS), são discutidos, bem como medicamentos de alto custo a serem empregados em situações de maior gravidade. A menopausa é uma condição que, apesar de normal, traz uma série de problemas e desconfortos que podem ser minimizados com medicamentos específicos. Proporcionar conforto durante o climatério é tarefa cada vez mais importante em função do próprio crescimento no percentual de mulheres que atingem essa marca e que seguem no mercado de trabalho. O planejamento familiar é ponto crucial para a maioria dos casais, sendo a análise de métodos anticoncepcionais um de seus principais pilares. Nessa linha, discutem-se os principais medicamentos disponíveis para as mulheres em idade fértil, bem como suas variações e efeitos adversos. Na linha de saúde masculina, discutem-se medicamentos disponíveis para tratamento de disfunção erétil e hiperplasia prostática, sempre com ênfase nos mecanismos de ação, efeitos adversos importantes e cuidados farmacoterapêuticos. Discutem-se também medicamentos empregados para a cura e/ou controle de anemias nas variadas formas em que se apresentam. Entre elas, a anemia falciforme, de origem genética, que é condição grave importante na população brasileira, especialmente de descendência africana. 11 Considerando os avanços na medicina moderna, pode ser observado que o grande salto na expectativa de vida da população foi ocasionado pela inserção das drogas antimicrobianas na prática clínica. Vamos abordar o contexto histórico da evolução dos agentes antimicrobianos, seguindo desde a identificação da penicilina e sua implementação na prática clínica até os processos de resistência dos microrganismos aos agentes antimicrobianos, que causam hoje uma das maiores preocupações entre cientistas do mundo todo. Vão ser verificados os mecanismos de ação dos principais fármacos e classes de fármacos antimicrobianos, assim como as estratégias terapêuticas e alguns regimes posológicos dos tratamentos de diversas infecções comuns entre os seres humanos, analisando as relações de interação com outros animais e os fatores ambientais em geral. Não menos importante, o objetivo é fornecer as devidas bases para aplicar esses conceitos na rotina profissional, sabendo avaliar desde os contextos socioeconômicos associados ao surgimento das infecções e barreiras existente para os tratamentos, até os aspectos de toxicidade e resistência aos antimicrobianos, que podem trazer problemas para o uso racional desses medicamentos. Abordaremos os fármacos antivirais, que, por definição, são utilizados no combate às infecções causadas por vírus. Mas, antes, recordaremos o conceito de vírus e ciclo de vida viral para, por fim, analisarmos o tratamento de viroses tratáveis. Abordaremos a farmacologia antineoplásica, popularmente designada de quimioterapia. Embora o termo quimioterapia marque qualquer substância química (quimioterápico) utilizada no tratamento de doenças causadas por um agente biológico, essa palavra é mais empregada para antineoplásicos. Antes de apontar os medicamentos utilizados no combate ao câncer e a farmacologia propriamente dita, vamos abordar conceitos importantes como a epidemiologia, carcinogênese e genes e proteínas envolvidos na manutenção do equilíbrio das populações celulares. Leia, releia e formule questionamentos sobre o conteúdo desse material. Pesquise as bibliografias sugeridas e tente traçar relações com experiências vividas anteriormente. Seguindo esses passos, o aprofundamento nesse conteúdo será ainda maior, permitindo a ampliação de sua compreensão. 13 FARMACOLOGIA Unidade I 1 TRATAMENTO DE CONDIÇÕES CEREBRAIS E CARDIOVASCULARES Com o avanço da ciência, da medicina e da tecnologia a partir da metade do século XX, a população tem alcançado idades mais longevas, ao mesmo tempo que as medidas de saneamento básico têm reduzido as mortes por infecções. Associam-se a esse quadro mudanças nos hábitos de vida e alimentares, e compreende-se o crescimento de taxas de complicações cardiovasculares e morte decorrente destas. Doenças crônicas como hipertensão e diabetes atingem mais de 80% de idosos homens e mulheres, aumentando o risco de complicações cerebrais e cardiovasculares. Dessa forma, a prevenção e detecção precoces são importantes em termos de saúde pública. 1.1 Hipertensão Define-se a hipertensão arterial sistêmica como uma situação na qual a pressão sistólica apresenta-se ≥ 140 mmHg e/ou pressão diastólica ≥ 90 mmHg, de forma persistente. Estima-se que no Brasil cerca de 35% da população adulta apresente níveis pressóricos acima do normal, com predominância na população idosa. Em relação à etiologia, mais de 95% dos pacientes apresentam hipertensão essencial ou idiopática de causas multifatoriais. Os demais apresentam hipertensão secundária, resultante de algum distúrbio, por exemplo, endócrino e/ou neurológico, de forma que a questão sendo resolvida ou controlada, o estado hipertenso tende a ser corrigido. São muitos os fatores associados à hipertensão, desde a predisposição genética (histórico familiar), passando pelos hábitos alimentares(ingestão exagerada de sais de sódio e/ou de alimentos ultraprocessados), estresse emocional (distúrbios de ansiedade), obesidade (e até o sobrepeso), níveis aumentados de cortisol, sedentarismo, tabagismo, alcoolismo, e mesmo o uso crônico de medicamentos como anti-inflamatórios esteroidais e não esteroidais. Outros fatores incluem a idade, já que o próprio envelhecimento leva a um aumento da pressão arterial, e, ainda, há uma maior prevalência em homens adultos e indivíduos negros. Mas quando mulheres entram na menopausa, os riscos de hipertensão e problemas cardiovasculares são similares aos dos homens na mesma faixa etária. A reposição hormonal pode até minimizá-los, porém, na prática clínica, não é essa a justificativa para o procedimento, já que os riscos envolvidos na reposição são muito sérios, eventualmente superiores aos benefícios promovidos. Pode-se afirmar que a hipertensão é uma condição silenciosa, pois é comum os indivíduos não apresentarem sintomas nem sinais importantes, como dor ou qualquer outro tipo de desconforto, quando os níveis pressóricos não estão muito elevados. Assim, se a situação não for detectada precocemente, a pressão aumentada segue promovendo gradativamente danos 14 Unidade I variados no organismo, sem que se perceba. Quando sintomas importantes começam a aparecer, já se detectam alterações estruturais e/ou funcionais irreversíveis, por exemplo, em coração, aorta, rins, sistema vascular. Condições outras como acúmulo de gordura visceral (obesidade abdominal), resistência insulínica, diabetes (especialmente do tipo II), presença de placa aterosclerótica associada à dislipidemia (triglicerídeos > 150 mg/dL; LDL-col > 100 mg/dL; HDL-col < 40 mg/dL) tornam o estado hipertenso muito mais perigoso. O que significa que há um incremento no risco de desenvolvimento de insuficiência cardíaca, de infarto agudo do miocárdio, acidente vascular encefálico, retinopatia hipertensiva, doença arterial periférica e doença renal crônica, caracterizada pela insuficiência renal. O diagnóstico requer medidas da pressão arterial em vários momentos (para a confirmação do quadro), sendo que a obtenção da variação da pressão ao longo de 24 horas (monitorização ambulatorial da pressão arterial – Mapa) é a forma mais adequada. Adicionalmente, exames bioquímicos indicativos das funções renal e cardíaca, principalmente, detecção da eventual presença de pré-diabetes e suas complicações. A gravidade do estado hipertenso também precisa ser avaliada (tabela a seguir), de tal forma que, dependendo do estágio da hipertensão, um conjunto de medicamentos, em geral, de maneira associada, está previsto, além de condutas específicas não farmacológicas. Tabela 1 – Classificação do estado hipertenso de acordo com os valores de pressão arterial sistólica (PAS) e pressão arterial diastólica (PAD) Classificação PAS (mm Hg) PAD (mm Hg) Normal ≤ 120 ≤ 80 Pré-hipertensão 121-139 81-89 Hipertensão estágio 1 140 – 159 90 – 99 Hipertensão estágio 2 160 – 179 100 - 109 Hipertensão estágio 3 ≥ 180 ≥ 110 Adaptada de: Sociedade Brasileira de Cardiologia (2016, p. 11). Deve-se também levar em conta a presença de condições cardiovasculares, avaliar quão preservada está a função renal, e não apenas o estágio da pressão arterial, para decidir a terapêutica mais adequada. Em vista das causas mais comuns, situações de risco e agravantes para o desenvolvimento da hipertensão, o tratamento não medicamentoso é um excelente adjuvante, sendo tão importante quanto o medicamentoso, e deve implementar o estilo de vida do paciente hipertenso. Tais medidas envolvem basicamente os hábitos de vida e alimentares (quadro a seguir). 15 FARMACOLOGIA Quadro 1 – Hábitos nutricionais e estilo de vida Aspectos Características Peso corporal Diminuição do peso, pois sobrepeso, obesidade e gordura abdominal são fatores de risco para o desenvolvimento da hipertensão Aspectos nutricionais Redução nos fatores de risco e até redução de níveis pressóricos podem ser obtidas pela redução na ingesta de sódio e de bebidas alcoólicas, aumento no consumo de frutas, aumento no consumo de ácidos graxos insaturados e diminuição do consumo de trans. Aumento no consumo de oleaginosas, alho, laticínios e vitamina D, fibras, café e chá verde (ambos em excesso podem prejudicar e até aumentar a pressão arterial), chocolate amargo Atividade física regular A prática regular de exercícios, especialmente aeróbicos, auxilia na redução do estado hipertenso Tabagismo A interrupção é importante para diminuir o risco de comorbidades associadas à hipertensão Controle do estresse, manter respiração lenta, tratamento para apneia no sono É bem conhecido o efeito prejudicial do cortisol e adrenalina liberados em situação de estresse no organismo, especialmente quando há risco de desenvolvimento de hipertensão. Excesso de catecolaminas e/ou hormônios glicocorticoides induzem ou mesmo agravam a condição de hipertensão As medidas são importantes, elas envolvem hábitos nutricionais e estilo de vida que impactam o organismo sob o ponto de vista da regulação da pressão arterial sistêmica, sendo assim, constituem-se em estratégias não farmacológicas auxiliares ao controle de um estado hipertenso. Serão discutidos, nesse ponto, quais são os importantes fatores que auxiliam na regulação da pressão arterial, de forma a poder compreender as estratégias farmacológicas disponíveis através de diferentes classes de medicamentos, no sentido de corrigir desvios da normalidade. O controle fisiológico da pressão arterial passa necessariamente pelo sistema renina-angiotensina-aldosterona (figura a seguir), pelo trabalho cardíaco e pela eliminação renal de sódio e água. Angiotensinogênio Receptores AT1 Músculo liso vascular Vasoconstrição Secreção de aldosterona ↑Na+/H2O Angiotensina I renina ECA Angiotensina II Efeitos SNC ↑ Efluxo simpático ↓ Sensibilidade baroreflexo ↑ Liberação de vasopressina ↑ Liberação de catecolamenas PA Figura 1 – Descrição do sistema renina-angiotensina-aldosterona, responsável pelo controle da pressão arterial (PA). O angiotensinogênio é uma proteína hepática sem atividade inerente, encontrada na circulação sanguínea. Sofre ação enzimática da renina, enzima produzida pelas células justaglomerulares renais, sendo liberada no sangue em resposta a uma série de estímulos fisiológicos e patológicos. Como resultado dessa clivagem, surge o peptídeo chamado angiotensina I. Este, por sua vez, sofre ação da enzima conversora de angiotensina (ECA), produzida pelos vasos pulmonares, e o produto da reação é o octapeptídeo angiotensina II (AngII), um dos agentes vasoconstrictores endógenos mais poderoso. Adicionalmente, a AngII ativa o sistema simpático e aumenta a retenção hídrica e de sódio pela intensificação na ação da aldosterona 16 Unidade I Esse sistema participa da regulação da pressão arterial sistêmica, que é dada por: Pressão arterial sistêmica = DC x RVP (ou RPT) A pressão depende diretamente do débito cardíaco (DC), que, por sua vez, resulta da frequência cardíaca (FC) x volume de sangue ejetado (Vs). Um aumento na frequência cardíaca resulta em aumento na pressão arterial sistêmica, e, claro, a redução na FC resulta em diminuição da pressão arterial. E depende também da resistência vascular periférica (RVP), que traduz o grau de vasoconstricção ou vasodilatação do sistema vascular. De tal forma que uma intensificação na vasoconstricção resulta em RVP aumentada e, consequentemente, PA também aumentada. Ao contrário, se ocorre uma vasodilatação, a tendência é reduzir a RVP e, portanto, também a pressão arterial sistêmica. Com base nessas considerações, pode-se inferir que medicamentos que promovam diminuição da FC podem auxiliar na redução do estado hipertenso, além de minimizar a sobrecarga cardíaca. De forma similar, medicamentos que promovam vasodilatação também devem auxiliar no mesmo tipo de controle. Verifica-se que boa parte do arsenalanti-hipertensivo se baseia na premissa de reduzir o trabalho cardíaco (reduz-se ainda a sobrecarga cardíaca) e/ou reduzir a RVP e/ou aumentar a eliminação de sódio e água. Em vista da importante participação do sistema renina-angiotensina-aldosterona na regulação da pressão arterial, a sua atividade exacerbada pode causar um estado hipertenso. Dessa forma, interferir no sistema renina-angiotensina pode auxiliar na redução do quadro de hipertensão. De longa data, dispõe-se de medicamentos que interferem em etapas do sistema renina-angiotensina, como: • inibidores de enzima conversora de angiotensina (IECA), que tem o captopril como representante; • bloqueio de receptor AT1 de angiotensina II (BRA) por compostos como a losartana; • inibidores de renina, o alisquireno é o representante; • antagonistas de receptores de aldosterona, como a espironolactona, pouco efetiva na maioria das condições hipertensivas. Os medicamentos anteriores são os mais indicados para doença arterial coronariana, sendo empregados na hipertensão desde que haja cardiopatia justificável. Como uma decorrência do bloqueio de receptores beta-1 renais pelos beta-bloqueadores (BB), promove-se diminuição da liberação de renina, contribuindo, assim, mesmo que indiretamente, para uma melhora no quadro da vasoconstricção causada pela presença plasmática excessiva de angiotensina II. O bloqueio do receptor de aldosterona pela espironolactona não chega a causar um efeito terapêutico significativo na hipertensão primária, sendo usado ou em associação com outros agentes anti-hipertensivos ou nos casos de hipertensão secundária causada por aldosterismo, distúrbio endócrino incomum. O inibidor de renina, sendo que no Brasil dispõe-se do alisquireno, foi a última estratégia de intervenção no sistema lançada no mercado (figura a seguir). 17 FARMACOLOGIA Angiotensinogênio Receptores AT1 Músculo liso vascular vasodilatação Secreção de aldosterona Na+/H2O Angiotensina I Inibidor de renina alisquireno Inibidor de ECA captopril Antagonista de receptor de aldosterona espironolactona Antagonista de receptor de angiotensina II losartana renina ECA Angiotensina II Efeitos SNC Efluxo simpático Sensibilidade baroreflexo Liberação de vasopressina Liberação de catecolamenas PA Figura 2 – Descrição dos mecanismos de interferência de medicamentos anti-hipertensivos no sistema renina-angiotensina-aldosterona. Os IECA diminuem a produção de angiotensina II, reduzindo assim todas as atividades relacionadas à sua ação, promovendo diminuição de todos os efeitos no SNC, diminuição na liberação de aldosterona, contribuindo de forma marcante para a diminuição da pressão arterial. Os BRA não impedem a produção de angiotensina II, mas bloqueiam a sua ação através do antagonismo de receptores do tipo AT1, contribuindo também para a normalização do estado hipertenso. O alisquireno diminui a produção de angiotensina I, assim, também auxilia na redução de níveis pressóricos. O diurético espironolactona, por bloquear apenas a ação da aldosterona, apresenta impacto reduzido na maioria dos casos de hipertensão. A baixa eficácia torna essa medicação interessante em situações muito específicas (discutidas posteriormente) O tratamento da hipertensão objetiva pode reduzir a morbidade e a mortalidade, definindo como meta a manutenção da pressão arterial em níveis inferiores a 140/90 mmHg. No caso em que o paciente apresente doença renal crônica com albuminúria (eliminação de albumina na urina), a pressão arterial deve ser mantida inferior a 130/80 mmHg. Na presença de diabetes, os níveis devem ser inferiores a 140/80 mmHg. Saiba mais Para saber mais, consulte a publicação: SOCIEDADE BRASILEIRA DE CARDIOLOGIA. 7ª Diretriz Brasileira de Hipertensão Arterial. Arquivos Brasileiros de Cardiologia, São Paulo, v. 107, n. 3, supl. 3, p. 1-83. set. 2016. Disponível em: http://publicacoes.cardiol. br/2014/diretrizes/2016/05_HIPERTENSAO_ARTERIAL.pdf. Acesso em: 26 jun. 2020. A monoterapia com baixas doses de diuréticos constitui-se no tratamento medicamentoso de primeira escolha, já que comprovadamente reduzem a morbimortalidade decorrente da hipertensão e suas complicações. Pacientes cardiopatas, com dislipidemias e/ou hiperglicemia persistente, frequentemente utilizam associações com diuréticos. Na presença de angina (doença arterial coronariana), os beta-bloqueadores devem estar presentes. Seu uso só não é indicado para idosos acima de 65 anos em vista da baixa 18 Unidade I eficácia nessa faixa etária. Bloqueadores de canais de cálcio (BCC) também são adequados para quadros de angina, porém são absolutamente contraindicados em insuficiência cardíaca. Os inibidores de ECA e os antagonistas de receptores de angiotensina II são comprovadamente eficazes em preservar a função renal em pacientes já com doença renal crônica decorrente da hipertensão ou em nefropatia diabética, sendo ainda cardioprotetores, pois reduzem o risco de hipóxia miocárdica promovida por altos níveis de angiotensina II, em pacientes susceptíveis. A figura a seguir apresenta o fluxograma sugerido para a decisão de quais medicamentos, em associação ou não, serão usados no tratamento de hipertensão, dependendo da gravidade da patologia e das condições do paciente. Hipertensão Não atingiu metas ou efeitos colaterais intoloráveis Não atingiu metas Acrescentar outros anti-hipertensivos ↑ Dose ♦ associar 3º ♦ trocar combinação↑ Dose ♦ associar 2º ♦ trocar medicação - Estágio 1 + RCV alvo - Estágio 2 e 3Estágio 1 + RCV baixo e moderado TNM + Combinações Dois fármacos - classes diferentes em doses baixas TNM + Monoterapia DIU IECA BCC BRA BB (em casos específicos) Figura 3 – O fluxograma apresenta de forma esquemática no que se baseia o processo de decisão de quais medicamentos devem ser empregados na hipertensão, levando em conta a presença de cardiopatias e o estágio da hipertensão. RCV significa risco cardiovascular. TNM significa terapia não medicamentosa. DIU significa diuréticos. IECA quer dizer inibidores de enzima conversora de angiotensina. BCC quer dizer bloqueadores de canais de cálcio. BRA significa bloqueadores de receptores de angiotensina e BB quer dizer beta-bloqueadores 1.1.1 Diuréticos Diuréticos são medicamentos que atuam no sistema renal, predominantemente, promovendo aumento na excreção de sais (principalmente sódio) e água, conduzindo a uma diminuição no volume do fluido extracelular. Essa propriedade auxilia na redução da retenção hídrica e de sais, além da redução de processos edematosos diversos. Assim, se constituem em medicação básica para o tratamento de: 19 FARMACOLOGIA • insuficiência cardíaca congestiva: condição na qual edemas ocorrem e o sistema pulmonar é o que mais preocupa; • doenças renais: caracterizadas pela insuficiência renal, condição na qual o diurético entra para ajudar na eliminação de excretas, função comprometida por alguma patologia; • cirrose hepática: a falência hepática impede a produção adequada de albumina, de forma que a osmolaridade do sangue diminui, causando acúmulo de água em regiões diversas, especialmente na região abdominal, condição conhecida como ascite. Aqui os diuréticos também serão muito úteis; • hipertensão: em vista do papel importante do sódio na patologia, medicamentos que promovam efeitos natriuréticos (eliminação urinária de sódio e água) com consequente diminuição do volume extracelular serão eficientes na redução de níveis pressóricos aumentados. Os diuréticos são classificados segundo o mecanismo de ação em: • Osmóticos: o composto permanece na luz tubular e, por efeito osmótico, diminui a reabsorção de água, um exemplo é o manitol. Não é de uso comum na hipertensão, sendo de uso hospitalar e restrito às condições de falência renal, pressão intraocular muito aumentada e edema cerebral. • Inibidores de anidrase carbônica: a anidrase carbônica é uma enzima presente nas células dos túbulos contorcidos proximaise responsável pela produção de ácido carbônico a partir de CO2 e H2O e, consequentemente, em parte, pelo tamponamento local. Acetazolamida é um inibidor de anidrase carbônica que intensifica a eliminação de bicarbonato, sódio e água, mas com eficácia insuficiente para o uso na hipertensão. Utiliza-se mais frequentemente para o tratamento de glaucoma e na prevenção de edema em portadores de insuficiência cardíaca congestiva. As demais classes, tiazídicos, de alça e poupadores de potássio, são utilizadas em várias situações clínicas e especialmente importantes na hipertensão, dada sua eficácia comprovada, fácil manuseio, baixo custo e larga experiência por parte dos prescritores no mundo todo. É frequente o início do tratamento da hipertensão na forma de monoterapia com diuréticos, sendo os tiazídicos os de primeira escolha, mesmo não sendo os mais eficientes na atividade natriurética, iniciando-se preferencialmente com doses mais baixas. Observa-se redução efetiva, após algumas semanas do início do tratamento, da resistência vascular periférica, contribuindo para a obtenção e manutenção do estado normotenso. Nas condições de insuficiência renal significativa (creatinina > 2,0 mg/dl ou taxa de filtração glomerular, TFG, calculado < 30 mL/min/1,73m2) e/ou edemas devido à insuficiência cardíaca ou renal, os diuréticos de alça serão preferenciais em vista da ação mais intensa e rápida que promovem. Os poupadores de potássio são os que apresentam o efeito natriurético menos intenso, reservando-se o uso de forma associada a um tiazídico ou de alça, no sentido de minimizar hipocalemia (ou hipopotassemia), que é um efeito adverso comum, especialmente no caso dos tiazídicos. São muitos os estudos que confirmam a redução na morbimortalidade cardiovascular pelo uso contínuo de diuréticos. 20 Unidade I Os mecanismos de ação envolvem basicamente inibir cotransportadores iônicos, responsáveis pela reabsorção de íons, especialmente sódio. Os cotransportadores estão distribuídos ao longo do néfron, sendo que diferentes classes inibem diferentes cotransportadores presentes em áreas específicas como o túbulo contorcido distal (figura a seguir). Dessa forma, limita-se a reabsorção iônica, forçando uma eliminação urinária do íon e moléculas de água de hidratação que seguem conjuntamente. Glomérulo TCP TCP DCC DCME DCMI RDDRAD RAEM RAEC JG 1 4 3 2 Arteríola aferente Arteríola eferente Diuréticos tiazídicos Diuréticos de alçaDiuréticos de alça Diuréticos poupadores de potássio 1 4 3 2 Figura 4 – Características estruturais do néfron e apresentação dos sítios de ação dos diuréticos tiazídicos, de alça e poupadores de potássio. TCP siginifca túbulo contorcido proximal. TCD quer dizer túbulo contorcido distal. RDD quer dizer ramo descendente delgado. RAD significa ramo ascendente delgado. RAEC quer dizer ramo ascendente espesso cortical. RAEM significa ramo ascendente espesso medular. DCC quer dizer ducto coletor cortical Os tiazídicos são, sem dúvida alguma, os diuréticos mais empregados, dada a eficácia comprovada, o rápido efeito, são baratos e muito acessíveis à população em geral. Agem inibindo de forma reversível o cotransportador Na+/Cl- na membrana apical da célula componente do túbulo contorcido distal (figura anterior). Promovem assim uma eliminação modesta de sódio, entre 5 e 10%, levando a um aumento concomitante na reabsorção de Ca2+ (tendência à hipercalcemia) e também promovem aumento na excreção de K+ (hipocalemia ou hipopotassemia) (figura a seguir). 21 FARMACOLOGIA Lúmen do túbulo contorcido distal (filtrado) Interstício (sangue) Ca+2 Ca +2 Ca+2 CI- CI- CI- Na+ CI- Na+ Na + Na+ Na+ K+ K+K+ ATP Figura 5 – Descrição do processo de reabsorção de sódio na célula do túbulo contorcido distal e a ação de diuréticos tiazídicos diminuindo essa reabsorção pelo bloqueio do cotransportador. Adicione-se como consequências, além do efeito natriurético, a perda de potássio e o aumento na reabsorção de cálcio Os diuréticos de alça inibem o cotransportador de Na+/K+/Cl- (figura a seguir) presente na membrana da célula luminal da região espessa da alça de Henle ascendente (figura 4). Diminuem de 15 a 20% a reabsorção de sódio a partir do filtrado, que os coloca como os diuréticos mais potentes, o que não significa, necessariamente, que serão sempre de primeira escolha, especialmente por conta dos efeitos adversos. Como efeitos adicionais, observam-se a venodilatação (o que contribui para o controle da pressão arterial) e o aumento no fluxo renal, tornando-os especialmente importantes para pacientes com insuficiência renal grave. Como resultado da inibição do cotransportador, observa-se também aumento da excreção de K+, Ca2+ e Mg2+ (figura a seguir). Lúmen do ramo ascendente espesso medular (filtrado) Interstício (sangue) CI- CI- 2CI- K+ Na+ CI- Na+ Na+ 3Na+ 2K+ K+K+ K+K+ Mg+2 Ca+2 ATP Figura 6 – Apresentação da célula do ramo ascendente espesso medular e a ação de diuréticos de alça bloqueando a atividade do cotransportador de Na+/K+/2Cl-, o que conduz, além do efeito natriurético, à perda de K+, Ca2+ e Mg2+ Os poupadores de potássio, como amilorida e triantereno, bloqueiam canais de Na+ presentes nas células do ducto coletor cortical, enquanto a espironolactona opera como antagonista de receptor de 22 Unidade I aldosterona, sendo que todos levam à inibição da reabsorção de Na+ (figura a seguir). São os menos eficientes e raramente usados na forma de monoterapia, sendo mais comum o uso associado com os diuréticos tiazídicos ou os de alça, no sentido de minimizar a perda de potássio causada pelos últimos. A espironolactona é mais utilizada para os casos de aldosterismo primário, condição rara causada por adenoma, hiperplasia e até mesmo câncer da glândula adrenal. Túbulo coletor aldosterona (+) Na+ Na+-K+ ATPase Figura 7 – Descrição do mecanismo de ação de diuréticos poupadores de potássio que agem por bloquear o transportador seletivo para sódio, como amilorida; e a espironolactona, que é um antagonista de receptor de aldosterona, o principal hormônio mineralocorticoide. Esse hormônio promove aumento na reabsorção de sódio e água, implicando que o bloqueio do receptor de aldosterona diminuirá esse evento, causando menos retenção hídrica e um leve efeito diurético De forma geral, os principais efeitos adversos de todos os diuréticos, independentemente da classe, são hipotensão, cãibras (devido à perda de potássio), fraqueza e, dada a eliminação maior de urina, existe o risco de hipovolemia, especialmente na primeira semana de uso. Essa condição é especialmente preocupante, em vista do risco de choque hipovolêmico, potencialmente fatal. A hipovolemia promoverá um aumento compensatório da produção de renina, pelo menos, até que o volume plasmático retorne à normalidade, o que ocorre após duas a três semanas do início do tratamento. A disfunção erétil também está presente em percentual significativo da população masculina. Procura-se sempre utilizar doses mais baixas no início do tratamento para evitar a severidade desses efeitos adversos (já que são dose-dependentes) e propiciar um ajuste do organismo às condições diferentes impostas pelo diurético. Se necessário, aumenta-se a dose gradativamente e/ou associam-se diuréticos a outros agentes anti-hipertensivos, o que é uma tendência, já que as associações, quando adequadas, promovem sinergia de efeitos terapêuticos com minimização dos efeitos adversos. Outro efeito adverso comum à maioria dos diuréticos é o aumento do nível plasmático de ácido úrico, o que pode desencadear crises de gota, especialmente em pacientes com predisposição. Em vista da facilidade no uso de diuréticos para tratar a hipertensão, às vezes, relega-se a segundo plano a hiperuricemia, que, na presença do diurético, pode evoluir para uma crise de gota. O manejo da gota aguda e crônica associada à hipertensão não é incomum, havendoa necessidade de se tomar cuidado com alimentação e com medicamentos utilizados. 23 FARMACOLOGIA Saiba mais Para saber mais, consulte a obra a seguir: AZEVEDO, V. F. et al. Revisão crítica do tratamento medicamentoso da gota no Brasil. Revista Brasileira de Reumatologia, São Paulo, v. 57, n. 4, p. 346-355, 2017. Disponível em: https://www.scielo.br/pdf/rbr/v57n4/ pt_0482-5004-rbr-57-04-0346.pdf. Acesso em: 28 jun. 2020. A posologia, as principais características, contraindicações e efeitos adversos dos diuréticos tiazídicos, de alça e poupadores de potássio estão resumidos no quadro a seguir. Quadro 2 – Posologia, principais características, contraindicações e efeitos adversos das três principais classes de diuréticos empregadas no Brasil: tiazídicos, de alça e poupadores de potássio Diuréticos Posologia (mg) Características e efeitos adversos Contraindicações mín máx Tiazídicos Clortalidona Hidroclorotiazida* Indapamida Indapamida SR 12,5 25 12,5 25 2,5 1,5 5 5 São ineficazes quando a TFG < 30 mL/min Efeitos adverso: hiperuricemia, aumento do risco de gota, hiperglicemia, aumento do risco de desenvolvimento de DM II, dislipidemia, hipotensão, fotossensibilidade (aumento de risco de câncer de pele não melanoma)*, alcalose metabólica IH e/ou IR grave, hiperuricemia sintomática, gestação, hipocalemia hiponatremia, hipercalcemia, anúria Alça Bumetamida Furosemida Piretanida 0,5 20 6 12 São os diuréticos mais potentes, sendo de primeira escolha quando a TFG < 30 mL/min Efeitos adverso: hiperuricemia, hipovolemia, hipocalemia, náuseas, reações alérgicas, ototoxicidade (agravada pela associação com aminoglicosídeosa) Anúria, hiponatremia, hipovolemia, cuidado com pacientes cardiopatas, pois a hipocalemia aumenta o risco de arritmias cardíacas Poupadores de potássio Amilorida Espironolactona Triantereno 2,5 25 50 10 100 100 Náusea vômito, hipotensão postural, fraqueza, desconforto gastrintestinal, sede, dor de cabeça, parestesia, hipercalemia, principalmente em pacientes com insuficiência renal. Espironolactona pode causar ginecomastia, impotência, hirsutismo Anúria, IR moderada a grave, hipercalemia. Usar com cuidado em pacientes diabéticos (com risco de desenvolver acidose) e hepatopatas *O uso contínuo de hidroclorotiazida tem sido relacionado ao aumento do risco de câncer de pele não melanoma. aEfeito importante com o ácido etacrínico, mas este foi retirado do mercado. Com a furosemida esse risco é mínimo. No quadro anterior, DM II quer dizer diabetes mellitus tipo II. IH significa insuficiência hepática. IR quer dizer insuficiência renal. TFG significa taxa de filtração glomerular. 24 Unidade I Observação Em vista do baixo custo e da ampla disponibilidade de diuréticos na rede pública, são os medicamentos mais empregados para o tratamento de hipertensão. Paralelamente são erroneamente empregados pela população geral, inclusive de forma abusiva. O acompanhamento farmacoterapêutico do paciente hipertenso torna-se muito importante, mesmo para medicações consideradas “banais” pela população. Saiba mais Consulte a publicação a seguir: ANVISA: hidroclorotiazida está associada ao aumento do risco de câncer de pele não melanoma. News.med.br, 13 dez. 2018. Disponível em: https:// www.news.med.br/p/saude/1329918/anvisa+hidroclorotiazida+esta+a ssociada+ao+aumento+do+risco+de+cancer+de+pele+nao+melano ma.htm. Acesso em: 30 jun. 2020. Encontram-se comercialmente disponíveis algumas associações de diuréticos, mas sempre com a seguinte composição: um poupador de potássio com um tiazídico ou um poupador de potássio com um de alça. Não se recomenda a utilização de diuréticos tiazídicos com os de alça, em vista do perigo de hipopotassemia e hipovolemia. A associação com poupadores de potássio visa exatamente minimizar e/ou corrigir a hipocalemia que pode ocorrer com o uso contínuo de tiazídicos e de alça. Apresentam-se no quadro a seguir exemplos dessas associações. Quadro 3 – Exemplos de associações entre diuréticos comercialmente disponíveis e as posologias Associações diurético + diurético Posologia (mg) Clortalidona + amilorida 25 + 5 Espironolactona + hidroclorotiazida 50 + 50 Furosemida + amilorida 40 + 10 Furosemina + espironolactona 20 + 100 Hidroclorotiazida + amilorida 25 + 2,550 + 5 Hidroclorotiazida + triantereno 50 + 50 Adaptado de: Sociedade Brasileira de Cardiologia (2010, p. 24-25). Outra possibilidade de corrigir a concentração plasmática de potássio é o uso de KCl oral, existindo muitas formas, inclusive algumas de liberação controlada, permitindo que a concentração de potássio eleve-se gradativamente. 25 FARMACOLOGIA Saiba mais Sugestão de leitura: MOREIRA, G. C.; CIPULLO, J. P.; VILELA-MARTIN, J. F. Existem diferenças entre os diversos diuréticos? Revista Brasileira de Hipertensão, Rio de Janeiro, v. 20, n. 2, p. 55-62, 2013. Disponível em: http://docs.bvsalud.org/ biblioref/2018/03/881677/rbh_v20n2_55-62.pdf. Acesso em: 28 jun. 2020. 1.1.2 Inibidores de enzima conversora de angiotensina (IECA) São compostos usados isoladamente ou em associação com outros anti-hipertensivos (especialmente diuréticos), seja no tratamento inicial de hipertensão, seja na redução da progressão de perda renal, na redução da progressão de remodelamento cardíaco pós-infarto, na prevenção de infarto e ainda são básicos na insuficiência cardíaca e suas complicações. Descrevem-se também atividades anti-ateroscleróticas não completamente compreendidas. Ao impedir a ação da ECA sobre a angiotensina I, reduz-se a produção do peptídeo angiotensina II, que é um dos mais potentes agentes vasoconstrictores, e ainda se reduz a liberação de aldosterona, que causa retenção hídrica e de sódio, promovendo aumento da volemia. Como a bradicinina é metabolizada pela ECA, com a inibição da enzima, aumenta-se a concentração desse autacoide que tem potente ação vasodilatadora, e ainda aumenta a produção de prostaglandinas igualmente vasodilatadores (figura a seguir). Angiotensinogênio (secretado pelo fígado) Angiotensina I Renina (secretada pelo rim) Enzima conversora de angiotensina (expressa no endotélio pulmonar) Angiotensina II Hipotálamo (sede; aumento da secreção de HAD) Córtex adrenal (zona glomerulosa) A aldosterona (aumento da reabsorção de NaCI) atua em: 1. Ramo ascendente espesso medular da alça de Henle 2. Túbulo distal 3. Ducto coletor Túbulo proximal renal (absorção aumentada de Na+) Arteríolas eferentes renais (vasoconstrição; mantêm a TFG) Figura 8 – Descrição do sistema renina-angiotensina-aldosterona, com os principais efeitos fisiológicos desencadeados 26 Unidade I Os IECA são medicamentos muito bem tolerados, de forma geral, sendo que sintomas de vias aéreas, especialmente a tosse seca, são o efeito adverso mais marcante e podem ocorrer em até 20% dos pacientes. Pode desaparecer com o uso, mas, se não ocorrer, há necessidade de substituição por um antagonista de receptor de angiotensina II (para o qual esse efeito adverso é menos marcante) ou outra classe de medicamentos. Erupções cutâneas e inchaço indolor sob a pele (angioedema) são eventos adversos raros, sendo o último potencialmente fatal. Dispõe-se hoje em dia de muitos exemplares de IECA, para os quais o mecanismo de ação é o mesmo, variando em aspectos farmacocinéticos, se o composto é um pró-fármaco (por exemplo, o enalapril) ou não (exemplo, captopril), e também variam quanto à potência. No quadro a seguir, apresentam-se exemplares de IECA com as posologias, características, efeitos adversos e contraindicações importantes. Quadro 4 – Descrição da posologia recomendada e principais características, contraindicações e efeitos adversos dos IECA disponíveis no Brasil IECA Posologia (mg) Características e efeitos adversos Contraindicações mín máx Benazepril 5 20 Tosse seca, hipotensão postural, náusea, tontura, fadiga, dor de cabeça, hipovolemia, sonolência. A hiperpotassemiae aumento de creatinina sérica são eventos que devem ser monitorados continuamente, e a medicação, descontinuada, se ocorrerem no início do tratamento. Há necessidade de monitoramento frequente da função renal e eletrólitos. Uso cauteloso em mulheres em idade fértil, devido ao risco do uso de IECA na gestação Gravidez, risco de complicações fetais pela hiperpotassemia eventual, presença de angioedema, estenose bilateral de artéria renal Não devem ser usados em associação com diuréticos poupadores de potássio e antagonistas de receptores de angiotensina II Captopril 25 150 Cilazapril 2,5 5 Delapril 15 30 Enalapril 5 40 Fosinopril 10 20 Lisinopril 5 20 Perindopril 4 8 Quinapril 10 20 Ranipril 2,5 10 Trandolapril 2 4 Adaptado de: Sociedade Brasileira de Cardiologia (2010, p. 24). Não se observam diferenças clinicamente significativas nos efeitos hipotensores dos distintos IECA. De forma geral, pode-se afirmar que a redução na pressão arterial é pequena, mesmo que significativa, sendo que de 60 a 70% da redução é obtida nas menores doses recomendadas. Assim, admite-se que o uso de IECA mais baratos e em doses reduzidas, além de economicamente interessante, reduz o risco dos efeitos adversos que também são dose-dependentes. A associação entre IECA e diurético tiazídico é clinicamente vantajosa, pois permite uma sinergia de efeitos terapêuticos com minimização de eventos adversos. A tendência à hipercalemia promovida pelos IECA pode ser compensada pela tendência à hipocalemia causada pelos diuréticos tiazídicos. Não se associa IECA com diuréticos poupadores de potássio pelo risco aumentado de hipercalemia. A hidroclorotiazida é o diurético preferencial para o uso associado, no quadro a seguir, apresentam-se exemplos dessas associações. 27 FARMACOLOGIA Quadro 5– Exemplos de associações entre IECA e diuréticos comercialmente disponíveis e as posologias recomendadas Associações IECA + diurético Posologia (mg) Benazepril + hidroclorotiazida 5 + 6,2510 + 12,5 Captopril + hidroclorotiazida 50 + 25 Cilazapril + hidroclorotiazida 50 + 12,5 Enalapril + hidroclorotiazida 10 + 25 20 + 12,5 50 + 25 Fosinopril + hidroclorotiazida 10 + 12,5 Lisinopril + hidroclorotiazida 10 + 12,520 + 12,5 Perindopril + indapamida 4 + 1,25 Ramipril + hidroclorotiazida 5 + 12,55 + 25 Adaptado de: Sociedade Brasileira de Cardiologia (2010, p. 24). Saiba mais Para saber mais, leia o artigo: SAVIOLI NETO, F. et al. Inibidor da ECA e concentrações do peptídeo natriurético do tipo B, em idosos com insuficiência cardíaca. Arquivos Brasileiros de Cardiologia, São Paulo, v. 92, n. 5, p. 349-356, maio 2009. Disponível em: https:// www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0066-782X2009 000500003. Acesso em: 28 jun. 2020. 1.1.3 Bloqueadores de receptor AT1 de angiotensina II (BRA) A despeito de serem prescritos, em geral, para pacientes intolerantes aos IECA, se constituem em medicação de primeira linha para o tratamento de hipertensão, nefropatia diabética, insuficiência cardíaca, infarto do miocárdio e ainda apresentam efeitos interessantes na prevenção de acidente vascular encefálico. Comprovadamente, o uso contínuo de BRA diminui o risco cardiovascular em pacientes hipertensos com ou sem comprometimento renal e diabetes. Os BRA não impedem a produção de angiotensina II, mas antagonizam ou bloqueiam os receptores do tipo AT1, que são exatamente os principais receptores responsáveis pela ação da angiotensina II como vasoconstrictora, liberadora de aldosterona e proliferativa. Assim, o bloqueio promoverá, de certa forma, as mesmas ações que os IECA, diminuindo a pressão arterial por diminuir a resistência vascular periférica e diminuir a reabsorção de sódio e água (próxima figura). 28 Unidade I A ação antiproliferativa pelo bloqueio dos receptores de angiotensina II é muito interessante para se evitar a hipertrofia cardíaca que, no caso de ser decorrente de hipertensão e/ou infarto do miocárdio, é considerada patológica. Tal hipertrofia envolve o aumento no tamanho de miócitos, especialmente os ventriculares, envolvendo ainda aumento da presença de colágeno e fibronectina, proteínas da matriz extracelular. A interação da angiotensina II com receptores AT1 contribuem fortemente para esse remodelamento, o qual desempenha papel crucial na fisiopatologia da perda de função cardíaca com a redução da performance. Assim, bloquear a sinalização desses receptores contribui para evitar o remodelamento, consequentemente, a hipertrofia, diminuindo o risco de desenvolvimento de insuficiência cardíaca, condição clínicamente grave e que reduz substancialmente a qualidade de vida do portador. Na figura a seguir, exemplificam-se os efeitos causados pela ligação da angiotensina II aos recetores AT1 e a principal consequência final, a elevação da pressão arterial. Angiotensina II Vasoconstrição (mediada por receptores AT1) Aumento da resistência vascular periférica Secreção de aldosterona (mediada por receptores AT1) Aumento da reabsorção de Na+ e H2O Elevação da pressão arterial Antagonistas do receptor AT1 Figura 9 – Descrição dos principais efeitos promovidos pela ligação da angiotensina II aos receptores AT1, levando a uma elevação da pressão arterial. O antagonismo desses receptores, promovido pelos BRA, promoverá redução da secreção de aldosterona e consequente redução da reabsorção de sódio e água. Adicionalmente, reduz-se a vasoconstricção, com tendência à vasodilatação e diminuição da resistência vascular periférica. Tais eventos contribuem para a redução da pressão arterial sistêmica e redução de risco de hipertrofia caradíaca No quadro a seguir, apresenta-se um resumo das principais características dessa classe medicamentosa. Quadro 6 – Descrição dos principais BRA empregados com posologia, características, contraindicações e efeitos adversos importantes BRA Posologia (mg) Características e efeitos adversos Contraindicações mín máx Candesartana 8 32 São ainda mais bem tolerados que os IECA, mas podem causar hipotensão, diarreia, fadiga, tontura, fraqueza muscular. Raramente pode causar erupção cutânea por todo o corpo, angioedema, rabdomiólise e trombocitopenia. Hiperpotassemia e aumento de creatinina sérica são raros, mas, se acontecer, deve-se suspender a medicação. Cuidados no uso por mulheres em idade fértil (mesmas razões que os IECA) Gravidez (pelas mesmas razões que os IECA), estenose bilateral da artéria renal Irbesartana 150 300 Losartana 25 100 Olmesartana 20 40 Telmisartana 40 160 Valsartana 80 320 Adaptado de: Sociedade Brasileira de Cardiologia (2010, p. 24). 29 FARMACOLOGIA Os BRA somente serão utilizados em associação com IECA no caso de insuficiência cardíaca grave. Mas a associação com diuréticos é comum e apresenta basicamente os mesmos benefícios que os observado no caso de IECA. Não se associa BRA com diuréticos poupadores de potássio, de forma similar aos IECA, devido ao perigo aumentado de hipercalemia. O quadro a seguir contém informações sobre as principais associações. Quadro 7 – Exemplos de associações entre BRA e diuréticos comercialmente disponíveis Associações BRA + diurético Posologia (mg) Candesartana + hidroclorotiazida 8 + 12,516 + 12,5 Irbesartana + hidroclorotiazida 150 + 12,5 300 + 12,5 300 + 25 Losartana + hidroclorotiazida 50 + 12,5 50 + 25 100 + 25 Olmesartana + hidroclorotiazida 20 + 12,5 40 + 12,5 40 + 25 Telmisartana + hidroclorotiazida 40 + 12,5 80 + 12,5 80 + 25 Adaptado de: Sociedade Brasileira de Cardiologia (2010, p. 24). Saiba mais Para saber mais, leia o artigo: OCHIAI, M. E. et al. Adição de bloqueador do receptor de angiotensina II na insuficiência cardíaca descompensada. Arquivos Brasileiros de Cardiologia, São Paulo, v. 94, n. 2, p. 235-238, fev. 2010. Disponível em: https://www. scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0066-782X20100002000 15&lng=pt&nrm=iso&tlng=pt. Acesso em: 28 jun. 2020. 1.1.4 Bloqueadores de canais de cálcio(BCC) Antagonistas ou bloqueadores de canais de cálcio (BCC) dependentes de voltagem agem por diminuir a entrada de cálcio nas células musculares lisas associadas ao leito vascular e, dependendo do medicamento, podem agir também diminuindo a entrada de cálcio em miócito (célula muscular cardíaca). 30 Unidade I A limitação na entrada de cálcio diminui a capacidade contrátil e, consequentemente, causa uma tendência ao relaxamento vascular, o que contribui para a redução na resistência vascular periférica. A diminuição da entrada de cálcio em miócito promove uma redução na frequência cardíaca, contribuindo assim para a diminuição da pressão arterial sistêmica, além de reduzir a sobrecarga cardíaca. Mas isso também leva à diminuição na contratilidade cardíaca, o que deve ser levado em conta no caso de se usar em pacientes com predisposição à insuficiência cardíaca. São duas as classes principais de BCC, estão descritas a seguir. Di-hidropiridínicos Bloqueiam predominantemente os canais do tipo L presentes nas células musculares lisas do leito vascular arteriolar, assim, praticamente não promovem efeitos no leito venoso. Por não interferirem, de forma apreciável, na entrada de cálcio em miócito, não comprometem a função cardíaca, não promovem alteração de pressão sistólica e tampouco frequência cardíaca, sendo assim empregados basicamente para o tratamento de hipertensão. A vasodilatação arteriolar pode causar taquicardia reflexa, efeito que deve ser monitorado, avaliado e manejado pela associação com outros medicamentos, se necessário. Tais fármacos podem, através da vasodilatação das artérias coronárias, aumentar o suprimento de O2 no miocárdio, melhorando a oxigenação do músculo. Minimiza-se dessa forma a hipóxia que aparece com o ataque de angina, tornando-os úteis no tratamento de doença arterial coronariana (DAC) (próxima figura). Aliás, são medicamentos de primeira escolha para tratamento de DAC em pacientes para os quais existe contraindicação ao uso de beta-bloqueadores. E ainda podem ser usados em associação a estes, no caso de angina refratária. Exemplos dessa classe: anlodipino, nifedipino, felodipino, nitrendipino, manidipino, lercanidipino, levanlodipino, lacidipino, isradipino, nisoldipino, nimodipino. Fenilalquilaminas Tendo o verapamil como representante, e as benzotiazepinas, exemplo de fármaco é o diltiazem. Apresentam maior afinidade pelos canais de cálcio do músculo cardíaco, e não no leito vascular. Praticamente não têm efeito vasodilatador, mas têm importante efeito na redução da sobrecarga cardíaca através da redução da frequência cardíaca (efeito cronotrópico negativo) e contratilidade (efeito inotrópico negativo) (próxima figura). Assim, operam como antiarrítmicos, o que significa que podem promover bradicardia, diminuição da função sistólica cardíaca, o que exige cuidado na utilização, evitando seu uso em pacientes com insuficiência cardíaca severa e comprometimento importante de função sistólica. Na figura a seguir, descrevem-se os principais efeitos do bloqueio da entrada de cálcio em artérias e/ou miócitos. 31 FARMACOLOGIA Nó SA Nó AV Miócitos cardíacos Artérias coronárias Veia periféricas Arteríolas periféricas Coração (bomba) ArtériasVeias BCC cardio-específico BCC artério-específico ↓ Automaticidade ↓ Condução ↓ Pós-carga ↓ Demanda de O2 do miocárdio ↑ Vasodilatação ↑ Suprimento de O2 do miocárdio Venodilatação mínima ↑ Vasodilatação ↓ Pós-carga ↓ Demanda de O2 do miocárdio Figura 10 – Descrição do mecanismo de ação de BCC artério-específicos e cárdio-específicos e as consequências na alteração da fisiologia cardiovascular. BCC cárdio-específicos promovem aumento do suprimento de oxigênio ao músculo cardíaco minimizando angina e processos isquêmicos, ao mesmo tempo que reduz frequência cardíaca e contratilidade, diminuindo risco de arritmias. Os BCC artério-específicos praticamente não alteram a circulação venosa, mas promovem ampla vasodilatação arteriolar, diminuindo a pressão arterial e diminuindo a pressão pós-carga, além da demanda de oxigênio pelo miocárdio No sentido de evitar variações inconvenientes na frequência cardíaca e mesmo na pressão arterial, dá-se preferência à utilização de BCC de ação prolongada. São muitos os estudos que comprovam a eficácia, segurança e boa tolerabilidade desses agentes anti-hipertensivos na redução da morbidade e mortalidade cardiovascular. No quadro a seguir, apresenta-se um resumo das principais características dessa classe medicamentosa. 32 Unidade I Quadro 8 – Principais BCC disponíveis com descrição da posologia, características, contraindicações e principais efeitos adversos BCC Posologia (mg) Características e efeitos adversos Contraindicações mín máx Diltiazem* 180 480 Diminuição da contratilidade cardíaca, dor de cabeça, rubor fácil, hipotensão, tontura, edema de tornozelo, constipação, lentidão anormal nos movimentos voluntários, hiperplasia gengival Hipotensão arterial, insuficiência cardíaca descompensada, choque cardiogênico, bloqueio atrioventricular Verapamil*a 120 480 Didropiridinas Nifedipino Oros*b 30 60 Edema de membros inferiores (especialmente tornozelo) é o efeito mais marcante. Rubor facial, dor de cabeça latejante, tontura, hipotensão, constipação, palpitações, taquicardia reflexa, hipertrofia gengival. O edema em membros inferiores pode causar uma inflamação cutânea com espessamento da pele e descoloração chamada dermatite ocre. Todos os efeitos adversos são dose-dependentes. Hipersensibilidade aos componentes da fórmula Nifedipino Retard* 20 60 Anlodipino # 2,5 10 Felodipino 5 20 Isradipina 2,5 20 Lacidipina 2 8 Lercarnidipino 10 30 Manidipino 10 20 Nisoldipino 5 40 Nitrendipino 10 40 *Vários medicamentos apresentam formulações de liberação prolongada ou controlada, o que implica melhor biodisponibilidade, posologia mais confortável e minimização de efeitos adversos com manutenção da eficácia farmacológica. aEm pacientes com miocardiopatia hipertrófica, é usado em associação com beta-bloqueadores. bDá-se preferência ao nifedipino de liberação controlada por via oral, já que a formulação comum de liberação imediata apresenta um início de ação muito rápido, podendo causar hipotensão acentuada e taquicardia reflexa grave. #É o representante mais novo da classe, mais específico e para o qual se observa menor risco de aumento da liberação de catecolaminas e também menor risco de taquicardia reflexa. Adaptado de: Sociedade Brasileira de Cardiologia (2010, p. 24). Em vista das características das condições do paciente, a associação de anti-hipertensivos torna-se mais interessante no ponto de vista de eficácia terapêutica e mesmo de minimização de riscos e efeitos adversos. Nessa linha, como já descrito anteriormente para outras classes, apresentamos no quadro a seguir informações sobre as principais associações com BCC. 33 FARMACOLOGIA Quadro 9 – Exemplos de associações entre BCC e diuréticos, IECA, BRA e BB comercialmente disponíveis com posologia Associações BCC + beta-bloqueador Posologia (mg) Nifedipino + atenolol 10 + 2520 + 50 Anlodipino + atenolol 5 + 255 + 50 Associações BCC + IECA Posologia (mg) Anlodipino + benazepril 2,5 + 10 5 + 10 5 + 20 Anlodipino + enalapril 2,5 + 10 5 + 10 5 + 20 Anlodipino + ramipril 2,5 + 5 5 + 5 5 + 10 10 + 10 Manidipino + delapril 10 + 30 Associações BCC + BRA Posologia (mg) Anlodipino + losartana 2,5 + 50 5 + 50 5 + 100 Anlodipino + olmesartana 5 + 20 5 + 40 10 + 40 Anlodipino + valsartana 5 + 80 5 + 160 5 + 320 10 + 160 10 + 320 Associações BCC + BRA + diurético Posologia (mg) Anlodipino + valsartana + hidroclorotiazida 5 + 160 + 12,5 5 + 160 + 25 10 + 160 + 12,5 10 + 160 + 25 Adaptado de: Sociedade Brasileira de Cardiologia (2010, p. 23-25). Estudos recentes indicam fortemente que o anlodipino é o anti-hipertensivo mais eficaz na população negra e em idosos, sendo que a associação com hidroclorotiazida não
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