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O Espelho 126 -

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O ESPELHO.
NUM. 136.	SEXTA FEIRA 7 DE MARÇO DE 1823.	 80 RÉIS.
IMPÉRIO DO BRASIL.
Imperium terris, animos acquabit Olympo.
VIRG. L. VI. V. 782.
BAHIA.
(Extrato de uma Carta do General Labatut de 9 de Fevereiro).
	Recebi a Carta de V. S., trazida pelo meu Ajudante de Ordens Mr. Parisi, que muito me alegrou por saber novas de V. S., e ter notícias do bom procedimento destes Oficiais, e do quanto propugnaram pela minha reputação, satirizada por Filósofos de esquinas e cafés. Grande tem sido, meu bom Amigo, o trabalho que tenho tido já em reconciliar vontades inteiramente destacadas do verdadeiro centro de gravidade para onde todos devemos propender, já procurando por meios brandos e vigorosos atrair ânimos diferentes e embuidos em máximas alheias da nossa causa adotada; mas, meu Amigo, que pode haver neste mundo que com jeito se não consiga¹ Hoje formo um Conselho Militar dos Chefes das Brigadas e Comandantes de Corpos a fim de atacarmos de uma vez a Cidade, visto, apesar de não termos o bloqueio ser este o único meio que temos para evitar nova reunião de mais de 5& homens que, com uma regência, vem de Portugal à Cidade da Bahia. O Deus Protetor da justiça e dos exércitos secunde os nossos esforços e decida por nós a vitória, etc.
Labatut, General.
	Quartel General no Engenho Novo no Recôncavo da Bahia, 9 de Fevereiro de 1823.
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	Foram-nos apresentadas outras Cartas que dizem quase literalmente a mesma coisa. Outras porém mais modernas referem que para o mencionado Conselho Militar fora chamado da Cachoeira (onde então se achava) o Coronel Almeida, Governador das Armas da Província de Pernambuco, que naturalmente será um dos libertadores daquela Província. Todos os momentos esperamos ansiosos o resultado desta determinação. O estulto Semanário Cívico achará então se com justiça chamamos Fabio ao General, que ele impudentemente ridiculariza, e oxalá que os seus insultantes sarcasmos achem o prêmio que merecem!
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	Depois de composto o que fica acima, chegaram notícias mais modernas. Consta que no dia 15 houve um renhido combate a peito descoberto, em que os Madeira tiveram grande perda, inclusos 7 Oficiais mortos e um prisioneiro que conseguiu escapar por morte do Sargento que o conduzia. Não sabemos mais detalhes porque não vimos carta, o que esperamos conseguir. É provável que chegasse muito oportunamente o batalhão Imperial, e todos os dias esperamos notícia da liberdade daquela infeliz Cidade.
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Proclamação aos Itaparicanos
	Soldados Brasileiros que denodadamente defendeis Itaparica, Eu vos agradeço em nome da Nação e do nosso Augusto Imperador, a bravura e bizarria com que debaixo da conduta do benemérito Lima, vosso digno Comandante, repelistes dessas Praias a cáfila de Vândalos que em mais de trinta e nove lanchas e canhoneiras intentaram desembarcar e profanar o ameno solo de uma Ilha, cujos defensores tantas vezes os têm morto e enxovalhado. Míseros! Assim é que sois e vos intitulais conquistadores de Badajós! Vencedores dos Vencedores da Europa! Lançai vossas vistas a Itaparica e nesta Ilha Majestosa reconhecereis o ludíbrio do vosso valor decantado. Soldados, esses vis escravos das periféricas Cortes Lisbonenses se desenganaram. O dia 7, 8 e 9 do corrente vos colocou com justiça na série dos Camarões, Negreiros e de outros Heróis Brasileiros. No porvir vossos Filhos cheios de um nobre e bem entendido orgulho, indigitando Itaparica, dirão: - Ali meu Avô, o Bravo Lima, derrotou a Esquadrilha dos Vândalos Portugueses que oprimiam nossa Pátria; acolá meu Pai, digno Brasileiro Galvão, perdeu uma mão. Quanto é bom e honroso deixar à nossa posteridade riqueza deste cunho, que o tempo não gasta e a traça não consome? Aceitai portanto, bravos Itaparicanos, os agradecimentos do Vossos General, que de longe com outros guerreiros tanto vigiava a conduta dos nossos inimigos, esperando o momento feliz de os carregar. Ele se congratula convosco, e vos oferece essa Proclamação do Imperador, na qual conhecereis quais são os briosos sentimentos deste Monarca. Digno dos nossos sacrifícios e do nosso amor. Recebei também, valentes defensores do Itaparica, essa Bandeira Nacional do Independente Brasil; Certo fico de que até aqui os vossos feitos têm sido espantosos; ah! Como serão, encarando vós esta insígnia, que lembra a liberdade civil e a Independência de uma Nação, que há de vir a ser a primeira do Globo! Eia, Itaparicanos, continuai a mostrar aos nossos inimigos que tendes por divisa, e é vosso timbre – Independência ou morte.- Quartel General do Engenho novo, 12 de Janeiro de 1823.
Labatut, Ganeral.
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MARANHÃO.
(Extrato de uma Carta de Pernambuco de 10 de Fevereiro).
	“Corre aqui a notícias achar-se Maranhão fazendo causa com o resto do Brasil, e dizem fora ali morto o Bispo e outro figurão, inimigos da união, assim como que vários membros do mesmo Governo Provisório tinham fugido para Portugal. Esta mudança foi devida em parte a Piauí, Aldeias Altas, Paraíba, etc., que marcharam contra Maranhão e a tropa da Cidade (Brasileira) que não esperava senão pela ocasião, mostrou não ser de sentimentos opostos aos seus irmãos do Sul do Brasil. Visto isto, parece-me que aos Lusos lhes acontecerá na nova conquista do Brasil, o mesmo que outrora lhes aconteceu em Mazagão, Celta, Tanger, etc.”
	O conteúdo no parágrafo acima é confirmado por outras cartas e notícias verídicas. Os inimigos do Brasil mordem-se de raiva, vendo verificar-se o que já havíamos predito, a união de todas as Províncias. Resta-lhes o Pará que não subsistindo sem o auxílio do Maranhão, seguirá a sorte desta. O seu indigno Bispo (que subiu ao Sólio pela mais abominável hipocrisia) continue embora a ser satélite ridículo da facção desorganizadora, se a ausência lhe poupar a sorte do seu manhoso companheiro, ao menos na sua confusão será atassalhado dos remorsos devoradores que o seu refalsado procedimento tem desafiado. Quantas serpentes têm nutrido o Brasil!!!
	Quanto será agradável esta notícia aos energúmenos do Congresso de Lisboa! Pareceu-nos ouvir já os Mouras, Carneiros, e desprezíveis Patos…Roam-se de raiva.
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NOTÍCIAS ESTRANGEIRAS.
	Obsequiosamente nos foram confiadas modernas Gazetas, das quais extraímos os artigos mais interessantes.
Extratos dos Correios de Londres de 31 de Dezembro e 3 de Janeiro.
Paris, 24 de Dezembro.
	Por via extraordinária se receberam notícias de Lisboa de 8 de Dezembro. O Sr. Correia de Lacerda apresentou às Cortes um projeto para aumentar o exército, completar os regimentos quais eram antes de 1814, e recompensar os Oficiais e Soldados que tiveram mais parte na regeneração política operada por eles a 24 de Agosto e 15 de Setembro de 1820. Foi admitido à discussão e guardado para segunda leitura.
	O Rei de Prússia partiu para Nápoles a 6; mas voltou por não poder passar o Carigliano que havia transbordado.
Paris, 26 de Dezembro.
	Os Embaixadores da Rússia, Áustria e Prússia mandaram correios extraordinários a Madri, que levam as resoluções do Congresso relativamente à Espanha.
Dito, 28 de Dezembro.
	A pasta dos negócios estrangeiros foi confiada a M. de Villele, e ele comunicou ao público as instruções dadas ao nosso Embaixador em Madri. (Declaremos no N.º seguinte).
	Se as proposições da Santa Aliança não forem aceitas pela Espanha, os Embaixadores da Rússia, de Áustria e de França têm ordem de sair de Madri.
Dito, 29 de Dezembro.
	S. Excelência o Visconde de Chateaubriand deu juramento nas mãos de S. M., em qualidade de Ministro dos Negócios Estrangeiros.
Dito, 3 de Janeiro.
	O Monitor de 31 de Dezembro contém uma ordenação do Rei, datada de 30, pela qual “A Câmara dos Pares e a dos Deputados são convocadas para Terça Feira, 28 de Janeiro de 1823.”
	Receberam-se ontem os Diários de Madri de 24 de Dezembro. O Universal anuncia a chegada àquela Capital de Jacob Frederico Torlade, Embaixador de Portugal e acrescenta:-
	“O Coronel Freire de Andrade, que este novo ministro veio render, voltará brevemente à Lisboa, porque esta cumprido o grande objetivo de sua missão,a saber a aliança entre as ditas nações. O tratado concluído pelos negociadores está agora sujeito ao Conselho de Estado, cujo dever é examiná-lo, conforme o artigo 235 da Constituição.”
	
Madri, 21 de Dezembro.
	Os homens honrados de Madri e de toda a Espanha estão na mais terrível incerteza sobre os acontecimentos que vão seguir-se. Oprimidos por uma minoridade despótica e sanguinária, temem dela ser vítimas. O espaço a percorrer até a chegada das tropas libertadoras está semeado de escolhos: o furor dos revolucionários poderá levá-los a vinganças e a excessos de todo o gênero, eis aqui a felicidade com que nos embalaram estes sonhadores de quimeras!
(Extratos do Star de Guernaey, de 7 de Janeiro).
	Esta manhã nos chegaram Gazetas de Lisboa até 14 de Dezembro. Ocupam-se principalmente com o processo das Cortes. Na Sessão de 6 lê-se um projeto de decreto, declarando necessário levar a juízo o Presidente de Pernambuco, por vários atos tendentes a estabelecer a independência do Brasil e equivalentes a absoluta rebelião.
	Leu-se outro projeto de decreto para pôr o exército em estado mais eficaz, em consequência da posição ameaçadora do exército Francês, de observação nas fronteiras da Espanha e das bem conhecidas disposições despóticas dos Soberanos Aliados em Verona. Propôs-se que o exército se pusesse no mesmo pé em que estava antes das reduções de 1814. Também se tomou em consideração o estado da Marinha, e um projeto para o código criminal.
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VARIEDADES.
	Tendo-se feito menção em todos os papéis públicos da seita dos carbonários, seus sinistros fins e os meios violentos que têm empregado, pareceu-nos que seria muito grato aos nossos Leitores que lhes apresentássemos a mais circunstanciada relação que a este respeito havemos visto, coligida cuidadosamente por M. Machangy, e recitada em 29 de Agosto na causa da conspiração da Rochelle, que era o mais terminante manejo daqueles Sectários. O Imperador da Rússia agradeceu como Soberano os nobres esforços do Sábio Jurisconsulto por uma Carta do próprio punho. Daquela extensíssima oração (que durou 5 horas) extrairemos somente o que diz respeito ao objeto proposto, para não sermos taxados de falsidade ou exagero.
	Esta seita, rival da franc-maçonaria, tirava suas alusões e seus símbolos do ofício dos carvoeiros. Há longo tempo ocupada com um plano favorito de revolução, catequizava secretamente a Itália. Em 1819 conseguiu introduzir-se em nossos Departamentos de Córsica. Um chamado Guerlni foi ali demandado juridicamente por haver tentado assassinar um indivíduo encarregado pela Autoridade de espreitar as sociedades dos carbonários, que se multiplicavam tanto mais quanto o Governo se iludia então acerca de suas tensões e de seu número. Resulta de uma correspondência oficial que o ministério de então não julgou importante trazê-los perante os tribunais, porque, dizia ele, estes processos manifestariam medo que semelhantes sociedades não podem inspirar sob uma forma de Governo em que os direitos do povo são reconhecidos e segurados.
	Este motivo cheio de candura tocou tão pouco os facciosos que depressa a carbonaria engrossou sobre um teatro mais vasto e invadiu quase todas as nossas províncias. Com efeito, quando as insurreições Napolitanas e Piemontesas fizeram conhecer os carbonários, estes, que deviam a base dos seus princípios aos revolucionários Franceses, não puderam negar-lhes as formas e os estatutos de sua associação; logo se entenderam e os emissários dos carbonários de Itália vieram tributar à conspiração permanente segredos da sua organização.
	Segundo os seus estatutos adotados em Paris, os carbonários se dividem em pequenas reuniões chamadas vendas. Tem vendas particulares, vendas centrais, vendas altas, e uma venda suprema confundida em uma misteriosa profundidade com uma espécie de Junta constituída em governo provisório. As vendas particulares são o primeiro grau da associação; não se pode ser ali recebido, senão sendo apresentado por um certo número de carbonários que respondem sobre a sua honra, dos bons sentimentos do candidato. De mais é necessário que este candidato, a não ser militar a meio soldo ou reformado, justifique o seu ódio ao governo legítimo. Da mesma sorte que se exigia em 93 daquele que reclamava uma certidão de civismo que houvesse cooperado para os dias de 14 de Julho e 10 de Agosto, assim se pergunta àqueles que querem entrar na carbonaria, onde estão os seus folhetos sediciosos, e de que ajuntamentos têm feito parte.
	Os candidatos que, não satisfazendo as condições impostas, merecer todavia ser animados e todos aqueles que não estão assas experimentados são adiados e classificados como aprendizes e noviços em Sociedades, que se podem considerar como as avenidas da carbonaria, e que se chamam sociedades dos amigos da liberdade. Estas sociedades preparatórias são, em sentido inverso, espécies de lazaretos em que os neófitos se curam de seus escrúpulos e de um resto de inocência. Passado o tempo da prova, são iniciados nas vendas particulares. Cada uma destas vendas se compõem de um número menor de vinte membros, ou bons primos. Ela tem um presidente, um censor e um deputado. Logo que ela chega do número convencionado, forma-se outra. Os Deputados de 10 vendas particulares compõem uma venda central, e cada venda central tem um deputado que comunica com a venda alta; de maneira que as vendas particulares não tocam nas vendas centrais, e estas nas venda alta, senão por um intermediário. Portanto os membros das diferentes vendas são estranhos uns aos outros, e não podem corresponder-se salvo por meio de deputados, únicos iniciados nas relações uma venda a outra.
	Os Carbonários têm procurado outras garantias da discrição daqueles de quem confiam o segredo. O adepto jura não procurar conhecer os membros da venda suprema, e de não revelar sob pena de morte os segredos que lhe foram confiados. Quando um membro falta a este último ponto do seu juramento, é julgado pela venda alta e dos bons primos é designado para lhe dar o golpe. Para desempenhar esta comissão sanguinária, ou executar qualquer outro atentado ordenado pela venda alta, se distribuem gratuitamente punhais aos carbonários. Não esquecerá que a origem de sua instituição não é Francesa. Para engrossar aina mais as sombras que os cobrem, os carbonários nada escrevem, transmitem tudo vocalmente, quer entre eles, quer de província a província, por via de uma chusma de bons primos que, sob título aparente de agentes viajante, se transportam à custa da sociedade a todos os pontos a que os chamam as ordens da Junta Diretória. Estes agentes vagabundos, para se fazerem conhecer dos chefes das vendas junto das quais são enviados, têm uma metade de carta despedaçada extravagantemente, e que se deve ajustar a outra metade enviada pela Junta Diretória àqueles presidentes de província. Os carbonários têm demais senhas, contrassenhas, palavras sagradas; têm saudações e sinais de reconhecimento particulares; têm toques misteriosos, já indicando o coração o indez como sinal interrogatório, já pegando na mão de maneira que forme um C, já um N dobrado, emblema do pai e do filho. A palavra esperança e fé, atiradas como por acaso em uma conversação; a palavra caridade articulada depois por sílabas separadas que se reparte os interlocutores, proferindo-as alternadamente, são também os preâmbulos de qualquer comunicação entre os bons primos. Cada venda abre um livro negro, no qual estão traçados os nomes proscritos. Mais tarde ele poderá servir à ação de uma nova lei de suspeitos.
	As obrigações e o fito dos carbonários são primeiramente obedecer cegamente às ordens soberanas, intimadas pela venda alta, ou segundo a expressão vulgar, pela Junta Diretória, da qual é lícito penetrar o santuário, e escrupulosamente empreender tudo para conquistas a liberdade à mão armada, isto é, para derrubar o governo existente. Assim por uma contradição assas estranha, os amigos da liberdade se obrigam a cumprir sem exame as ordens de sangue que lhes quiserem dar; de sorte que em nome da liberdadese fazem desertores das leis e das virtudes, sob o império das quias eram verdadeiramente livres, para se fazerem escravos do crime e instrumentos supersticiosos de uma ambição mascarada. Para aspirar a este vergonhosos aviltamento eles devem. Segundo seus estatutos, preferir seus irmãos adotivos a seus próprios irmãos, e munir-se de seus dinheiros, de uma espingarda e de 25 cartuchos. Além disto, dão 5 francos na entrada e 1 franco por mês. Estas somas, que ver a ser consideráveis, porque relações que (como logo veremos) estão longe de ser exageradas, levam o número de carbonários a mais de 60,000 em França; estas somas são depositadas nas vendas centrais, que dão conta às caixas da venda suprema, donde vão frutificar nas operações do banco, ou da praça, com o produto das esmolas, das subscrições, dos donativos voluntários, e com os fundos secretos, de que não nos pertence aqui averiguar a origem.
	Viu-se outrora no Oriente um príncipe nutrir em roda de si um enxame de moços fanáticos prontos ao menor aceno de seu amo a se darem à morte, ou dá-la aos outros. Por mais horrível que fosse a sua profissão, todavia se compreendia; porque em seu pio erro criam merecer o Céu. Aqui ao contrário os déspotas da venda suprema, os conservadores da revolução, só prometem o nada aos seus adeptos. O ateísmo é uma das páginas do seu código; guerra á Religião é um dos seus preceitos.
	Cumpre repeti-lo, com indignação e assombro si, eis aqui o pacto que foi proclamado em França e que foi aprovado por uma multidão de entes alucinados.
	O contágio foi tão rápido que no ano de 1821, trinta e cinco prefeitos denunciaram ao mesmo tempo sociedades de carbonários organizas em muitos pontos de seus departamentos. Paris contava muitas centenas de vendas que tinham diversas dominações, como a Victoriosa, a Sincera, a Bom Êxito, a Belizário, a Westerman, os Amigos da verdade, etc., etc. Todas estas vendas dependiam da venda superior, que logo quis fazer um ensaio de suas forças. As desordens de Junho e as conspiração de 19 de Agosto de 1820 devem efetivamente considerar-se como as primeiras campanhas regulares dos carbonários Franceses. Nestas duas épocas espalhou-se o ouro com profusão. Sabe-se que ele ganhou a maior parte dos indivíduos condenados na ação de 19 de Agosto; e a cita levou o seu desvelo até segurar-lhes soldo em todo o tempo da sua prisão. Quanto aos tumultos do mês de Junho precedente, eles deviam igualmente induzir a Junta Suprema a despesas excessivas; porque é notório que naqueles ajuntamentos sediciosos havia, além dos carbonários e voluntários, algumas tropas assalariadas que se pagavam, não só à boca do cofre, mas ainda em pleno ar, e mesmo em chusma, onde simples curiosos se arriscaram a receber um salário que se envergonhariam de merecer. 
(Continuar-se-á).
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Preços correntes dos gêneros de exportação.
Aguardente de cana							30:000 pipa
	 de cachaça						28:000
Algodão de Minas novas						4:500 a 4:600 @
	 Gerais						3:800 a 4:000
		 em fio						7:680 a 8:320
Açúcar redondo							1:950 a 2:000 @
	meio redondo							1:850 a 1:900
	Batido								1:750 a 1:800
	meio batido							1:650 a 1:700
	Mascavo							1:000
	de Santos Fino						1:600
	Redondo							1:200
	Mascavo							850 a 900
Café da 1.ª qualidade							5:250 a 5:300
 da 2.ª								4:600 a 4:700
 Ordinário							3:200 a 4:000
Carne Seca do Rio Grande						1:200 a 1:280
Chifres									6:900 a 7:000 cem
Couros do Rio da Prata						165 a 170 lb
	do Rio Grande							150 a 170
	de Cavalo							700 a 750 um
Farinha de mandioca							1:200 a 1:280 saco
Ipicacuanha								1350 lb
Melaço								12:000 a 13:000 pipa
Sebo do Rio da Prata							2:200 a 2:400 @
	 Rio Grande							1:500 a 1:600
Tabaco Mappendim							4:800 @
	Piedade							2:240
Tatagiba								160 a 240
Tapioca								4:100 a 4:200
Câmbio sobre Londres						49 a 60 dias vista
Pesos Espanhóis							995
J. Mitchell, Corretor.
NA IMPRENSA NACIONAL DO RIO DE JANEIRO.
O ESPELHO.
NUM. 137.	TERÇA FEIRA 11 DE MARÇO DE 1823.	 80 RÉIS.
IMPÉRIO DO BRASIL.
Imperium terris, animos acquabit Olympo.
VIRG. L. VI. V. 782.
BAHIA.
Artigo de uma carta escrita da Bahia em 12 de Fevereiro.
	No dia 11 do corrente houve muito fogo no sírio do Cabrito para as barcas canhoneiras, que ali estão bloqueando, e nessa mesma noite houve igual acontecimento nos pontos de Joaquim José de Oliveira e Soledade, e apesar de ser um ataque forte, não sei ainda o resultado, pois os Constitucionais escondem quanto podem o prejuízo que sofrem. Este ataque principiou às 8 horas da noite, parou às 11, continuou à meia-noite, e acabou pela manhã. No dia 10 à noite entrou a Fragata Constituição, que pela primeira vez mostrou seu patriotismo, apresando uma Sumaca de farinha, que se dirigia a outro porto, e assim mais uma galera com escravos, que dirigindo-se ao Rio, levantaram-se os negros, mataram o Capitão e toda a equipagem, deixando apenas o Piloto, e dizem dois marinheiros. Desta sorte perde o Rio de Janeiro os direitos desta carregação; e até depois de aqui chegar tudo perderá seu dono!! Quando me escrever seja em nome de… e não em meu nome, pois os Constitucionais costumam tirar as cartas, que vem dessas, e estimaram achar alguma sua, pois o tem muito em lembrança.
	
Dito de 16 de Fevereiro.
	O dia 9 foi o em que os Brasileiros principiaram seus ataques diários, que até agora tem continuado. O do dia 15 foi bastante forte, porém o resultado foi pouco decisivo. Os Brasileiros chegaram a avançar até a Soledade, mas depois recuaram, sofrendo naturalmente algum prejuízo.
	Dos Lusitanos morreram o Major Dordaz, 3 Oficiais, 1 Porta-bandeira e muitos Soldados, e houveram entre o grande número de feridos 1 Major, 1 Capitão, e 2 Oficiais. Os Soldados Brasileiros se comportaram com tanta coragem, que avançaram até as bocas das peças, e por isso talvez sofressem maior prejuízo. Desertaram para a Cidade dois Soldados Pernambucanos, que dizem aqueles ataques continuam até o dia 19, em que as tropas de fora pretendem entrar na Cidade. Por hora não há mais notícia da expedição de porém os Constitucionais a esperam todos os dias. Tem havido alguns boatos de ela estar fora da Barra, o que tem alvoroçado muito os Constitucionais, fazendo tanto desaforo, como nas expedições antecedentes.
	
Dita de 16 de Fevereiro.
	No dia 16 houve um grande ataque, que principiou de madrugada, e acabou de tarde, para o que foram obrigados a comparecer todos os Milicianos sem exceção de pessoa. Não sei ainda o verdadeiro resultado; mas posso asseverar-lhe que quantas cadeiras haviam na Cidade eram poucas para carregar os feridos. Houve também muitos mortos, de que ainda não sei o número, entre eles um Major e alguns Oficiais. Foi prisioneiro o Tenente de Caçadores Taborda, por um Sargento Brasileiro; porém como o diabo sempre protege os seus, apareceu um descarado mulato, que fugindo para os Lusitanos deu um tiro no Sargento, e salvou por isso o tal prisioneiro, que depois acompanhou; mas apesar desta boa ação, os Constitucionais dizem que ele fugiu por estar lá fora morrendo de fome, e por isso se valeu daquela ocasião etc. Ora o que merecia aquele descarado mulato, sendo gente, que os Lusitanos mais mal tratam e mais injuriam? No ataque, que acima menciono, tomaram as Tropas de fora uma Trincheira que esbandalharam, levando consigo a peça que a guarnecia.
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	Vimos ultimamente cartas até 26 de Fevereiro, e Gazetas até 25. As primeiras noticiam o próspero desembarque das tropas e munições enviadas desta Corte, na Torre, e que Labatut se preparava a empregar o seu valor. Depois do dia 15 não houve mais ação; porém a fome tinha crescido a ponto de desesperação. Os preços dos gêneros equivalem à absoluta falta dos mesmos. Ainda dos estrangeiros havia grande míngua; porque a barrica de farinha subiu de pancada 8 D réis a 16. A da terra escasseou depois que S. Matheus e Caravellas, abrindo os olhos aos seus verdadeiros interesses, deram de mão a um tráfico indecoroso. Dizem mais que mandando Madeira sair João Felix com a sua esquadra,este exigira que aquele respondesse pela segurança da Cidade; o que ele recusou, e deste modo a nossa esquadra continuou sem a menor oposição nos bem combinados planos, de que brevemente veremos felizes resultados.
	As Gazetas, rebaixando a perda dos Vândalos, confessam todavia a morte do Tenente José Maria, e ferimento do Major Dordaz; dizem que o comando pertencera ao valente Serrão, que tanta ligeireza mostrara no Cabrito, e falando do resultado daquela vergonhosa contenda, já o supõem duvidoso, acrescentando seja qual for. Os Europeus estão descorçoados com a ausência do esperado socorro, que para enganar os estúpidos dizem que está à burra, mas não explicam qual. Entretanto os Escritores daquela maldita facção, aparam as penas para cantar os seus triunfos, provando-as em dictérios e insultos contra o Espelho, que excitam o riso, e não merecem resposta.
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NOTÍCIAS ESTRANGEIRAS.
Correio de Londres de 31 de Dezembro.
	Apressamo-nos a dar ao Público o primeiro documento autêntico, que foi possível comunicar depois da abertura do Congresso.
	Tantos interesses estão ligados às determinações dos diferentes gabinetes nesta grande ocasião, que é importante fazê-las conhecer, logo que estão definitivamente adotadas.
O Presidente do Conselho dos Ministros, encarregado interinamente da repartição dos negócios estrangeiros, ao Conde de La Garde, Ministro de S. M. em Madri.
	Senhor Conde. - Como vossa situação política pode mudar em consequência das resoluções adotadas em Verona, a sinceridade Francesa requer que sejais encarregado de fazer conhecer as vistas do governo de S. M. Cristianíssima ao governo de S. M. Católica.
	Desde a revolução, que se efetuou na Espanha no mês de Abril de 1820, a França, sem embargo dos perigos, que lhes apresentava esta resolução , fez os seus esforços para apertar os laços que unem os dois Reis, e para conservar as relações que existem entre as duas Nações.
	Mas a influência sob a qual introduzidas estas mudanças na Monarquia Espanhola, se tornou mais poderosa, pelos mesmos resultados daquelas mudanças, como era fácil de prever.
	Uma Constituição, que o Rei Fernando, quando retomou a coroa, nem reconheceu, nem aceitou, lhe foi imposta por uma insurreição militar. A consequência natural foi que cada Espanhol descontente se crê autorizado a tentar estabelecer pela mesma via uma ordem de coisas mais conforme a suas opiniões, e a seus princípios. O emprego da força criou o direito da força.
	Daí vieram os movimentos da guarda em Madri, e a aparição de corpos armados em diferentes partes da Espanha. As províncias vizinhas da França tem sido o principal teatro da guerra civil. Assim foi necessário à França garantir-se desse estado de desordem da Península. Os acontecimentos, que sobrevieram depois da formação de um exército de observação ao pé dos Pirineus, tem assas justificado a previdência do governo do Rei.
	Entretanto, se ajuntou em Verona o congresso do qual se havia esperado desde o ano passado uma decisão sobre os negócios da Itália.
	Como parte integrante deste Congresso, a França era obrigada a explicar-se sobre os armamentos, a que fora obrigada a recorrer, e sobre o emprego, que deles poderia fazer, quando cumprisse.
	As precauções da França pareceram justas aos seus aliados, e as potências continentais tomaram a resolução de se unirem a ela, para ajudá-la (se fosse necessário) a manter a sua dignidade e tranquilidade.
	A França se contentaria com uma resolução ao mesmo tempo tão benévola, e tão honrosa a seu respeito, mas a Áustria, a Prússia e a Rússia julgaram necessário acrescentar a este ato particular de aliança um manifesto dos seus sentimentos. A este fim, estas três Potências dirigiram notas diplomáticas a seus ministros respectivos em Madri, que as comunicaram ao governo Espanhol, e em seu procedimento ulterior se conformaram às ordens, que houverem recebido de suas Cortes.
	Vós, Sr. Conde, dando estas explicações a Corte de Madri, lhe declareis que o Governo de S. M. está intimamente unido com os seus aliados na firma resolução de repelir por todos os meios os princípios e os movimentos revolucionários; que concorda igualmente com os seus aliados em desejar que a nobre Espanha ache um remédio a estes males – males que são capazes de inquietar todos os governos da Europa, e de exigir deles cautelas que devem sempre ser custosas.
	Tereis cuidado particularmente de fazer conhecer que o Povo da Península, restituído à tranquilidade, achará em seus vizinhos amigos fiéis e sinceros. Portanto dareis ao gabinete de Madri a segurança de que todos os socorros de que a França puder dispor a favor da Espanha, lhe serão sempre oferecidos para firmar sua felicidade, e aumentar sua prosperidade; mas declarareis ao mesmo tempo que a França não se afastará de maneira alguma das medidas de conservação, que tem tomado enquanto a Espanha continuar a ser despedaçada das facções. O governo de S. M. não hesitará mesmo a retirar-vos de Madri, e a procurar garantias em medidas mais eficazes, se os seus interesses essenciais continuarem a ser comprometidos, e se perder a esperança de um melhoramento que se apraz de esperar dos sentimentos, que por tanto tempo tem reunido os Espanhóis e os Franceses no amor aos seus Reis, e a uma assisada liberdade.
	Tais são, Sr. Conde, as instruções que o Rei me ordenou que vos transmitisse, no momento em que vão ser apresentadas ao gabinete de Madri notas dos gabinetes de Viana, de Berlim e de S. Petersburgo. Estas instruções vos farão conhecer as vistas e a resolução do governo Francês nesta grave ocasião.
	Estais autorizado a comunicar este despacho, e dar uma cópia, se vos for pedida.
	Paris, 25 de Dezembro de 1822.
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Continuação do Discurso de Mr. Marechangy, começado no N.º precedente.
	O resultado da acusação levada ao Tribunal dos Pares não foi tão desanimadora que devesse para sempre descorçoar os conspiradores; e como no intervalo haviam ainda estendido as ramificações de sua seita, se acharam tão numerosos, tão ricos, tão bem arregimentados, graças à organização aperfeiçoada dos carbonários, que a Junta Diretória se converteu em uma espécie de Governo oculto, precisamente na época, em que para distrair a atenção, favorecia a ideia de uma força oculta que, segundo diziam, existia entre os realistas.
	Dizemos que a Junta Diretória se converteu em um Governo oculto, e esta expressão é verdadeira no sentido mais positivo, porque em todo o ano de 1821, e mesmo no corrente, desenvolveu os recursos, e tomou a atitude de uma potência que tem tesouros, embaixadores, súditos e exércitos. Para continuar a narração dos fatos, citaremos ao acaso algumas das suas atas, das suas ordens do dia, dos seus decretos supremos; alguns lances da sua política, da sua administração, da sua diplomacia. Assim, por exemplo, em Dezembro passado (1820), recebe um enviado dos revolucionários Espanhóis, e lhe promete muitos mil homens. Uma chusma de carbonários Franceses partiram com efeito naquela época, para socorrerem seus irmãos da Fontana de Ouro, para depois voltarem juntos sobre as fronteiras da França, desenrolando a bandeira tricolor, enriquecida de mais um flagelo, a peste e seus horrores. Na sua passagem esses auxiliares da Tragata infectaram o cordão sanitário com uma multidão de líbelos e canções injuriosas aos Bourbons. Passado a Pau, alguns pregaram furtivamente em uma árvore do passeio público um cartaz, onde no dia seguinte os habitantes lerão estas palavras: “Divisa dos Franceses Constituição nacional é um contrato entre o povo e o chefe do Estado; ela deve ser aprovada pelos dois partidos, a quem ela obriga, e não outorgada por algum deles. Deste princípio da Soberania das nações dimana esta consequência, que a origem de todos os poderes da organização social provém do povo, que os distribui em diferentes ramos na Constituição sujeita à sua aceitação; porque sem esta aceitação, não haverá constituição, mas sim usurpação sobre a soberania do povo. Assim para o dizer outra vez, a divisa dos Franceses é: constituição nacional aceita pelopovo; ou Honra e Pátria. Viva a nação Francesa!”
	Este belo manifesto redigido pelos secretários dos publicistas da venda alta, não foi compreendido dos fiéis Bearnezes, que depois de o lerem gritaram: Vivam os filhos de Henrique IV.!
	Mas continuemos o exame dos atos do governo oculto. Em Dezembro passado, se fez um trespasse de fundos do banco da Junta, que produziram ganho de muitos milhões. No 1.º de Março, ordem do dia, que recomenda aos carbonários que se exercitem no manejo das armas. A 6 de Março, decreto para formar uma junta de ação militar, composta de três carbonários, a qual junta será especialmente encarregada de procurar armas, e estabelecer depósitos. A 11 de Março, criação debaixo do nome de batalhão sagrado de um corpo de 500 membros carbonários de escolha para depois serem empregados como oficiais no caso de uma sublevação geral. A 13 de Março discursam a fim de introduzir a carbonaria em Vincennes, e ganhar uma companhia de artilharia da guarnição para tornar o castelo com 1800 carbonários. No mesmo dia, as vendas requerem pôr-se em ação temendo que lhes tome a dianteira o batalhão sagrado. A 15 de Março a Junta Diretória sabendo a descoberta de muitos conluios ao Oeste, reconheceu que seria supérfluo por agora prolongar o movimento insurrecional, que havia preparado por via dos missionários, e expede uma ordem do dia concebida nestes termos:
	“Proibimos aos nossos amados primos, excitar algum tumulto e resistir à força armada. Devendo uma ordenança de polícia prescrever o depósito das armas de guerras, mandamos que se escondam com todo o cuidado.”
	A 16 de Março, outra ordem do dia, que reza que o General Berton foi infeliz por demasiada precipitação, e pela fraqueza dos habitantes de Thonars; mas que a tropa está pronta, e que os carbonários devem esperar ordens para se moverem. Em Abril continuaram as precedentes disputas sobre a escolha do governo, que cumpriria substituir ao governo legítimo. Três sistemas diferentes se defenderam sucessivamente com calor, e assentou-se que deve começar-se por destruir o que existe, devendo depois o Governo Provisório consultar o povo sobre a escolha de seus novos senhores, etc.
	M. Marchangy, depois de produzir vitoriosamente as provas judiciárias, continua:
	Tendes visto como se malograram todos esses conluios preparados para o mês de Janeiro. Desanimará finalmente a Junta Diretória por este mau êxito? Não, Srs., vós ides ver conjurar de novo. E porque se havia ela de confessar vencida? Não tinha ela ainda recursos imensos na publicidade de seus princípios sediciosos, que exercendo sobre as gerações Europeias uma sorte de conscrição odiosa, faz passar cada ano, cada dia às fileiras da facção uma chusma de entes desgarrados? Por que se confessaria vencida? Não tinha ela por auxiliares a necessidade de engrandecer-se a todo custo, o desprezo dos deveres sociais, a abolição dos deveres humanos, a desconfiança e a insubordinação às autoridades paternais e protetoras, a presunção de uma mocidade prematura, rejeitando com escárnio insultante a experiência, que custa tão caro, e de que tão pouco se aproveita? Não tinha ela inteligências em nosso próprio campo? Não era ela servida em segredo pela indulgência indiscreta dos Cidadãos ainda mais fiéis, indulgência tão distante da verdadeira moderação, que não é mais que a ira da fraqueza, está longe da verdadeira força? Não tinha ela em seus interesses uma filantropia imprudente, e todas essas falsas virtudes do século que condenam a energia a par da exaltação e que aconselharia capitulação à mesma vitória? Não podia ela já contar com a inação dos bons, e com a atividade dos maus? Por que razão finalmente se confessaria ela vencida? Tinha perdido seus tesouros? Tinham-lhe tirado seus chefes? Era ela estreitamente espreitada, ou ainda a tinham reduzido por uma vantagem decisiva a resignar sua insolente soberania? Não; ela ainda era a potência do mal, como a legitimidade é a potência do bem, seus domínios ainda estavam inteiros, eram imensos, estendiam-se até os marcos da potência de um governo que mede, sem dúvida, sua moderação pelo nobre sentimento de seus direitos e pela consciência de sua duração.
	Portanto a Junta Diretória podia ainda conspirar e conspirou, ou antes a este respeito estava em permanência, havendo dado ordem aos seus filiados de aproveitar toda a ocasião de conspirar, visto que a França inteira estava preparada a uma explosão geral, que só esperava um sinal de insurreição para rebentar. Conforme estas instruções cada venda de carbonários espiava o instante favorável a seus projetos.
	(Não podemos seguir o Orador na exposição dos conluios de Strasbourg, Thouars e la Rochelle: terminaremos este extrato com um parágrafo da sua peroração). 
	Está esgotada a acusação, e entretanto, talvez, alguém pergunte se está desempenhado nosso dever quando a potência misteriosa e escondida, que, tantas vezes apontamos nestes debates como origem de todas as desordens, está ainda abrigada dos raios da justiça, e porventura trama novas conjurações. Perguntaram se esta completa quando somente vos chamamos a servir contra agentes subalternos que facilmente será substituído por outros adeptos não menos escuros, raça sempre renascente, sob o sopro corruptor, que a fez brotar?… Sim, está concluída a nossa tarefa, porque demos conta à lei dos únicos acusados, que ela nos havia entregue, e que demandar outros, sem missão a este respeito, fora sair de nossas funções, e cair do dever no arbitrário; basta-nos ter quebrado a pedra do antro, e feito penetrar a luz através das intrigas tenebrosas, e das filiações dos conspiradores; basta ter arrancado a máscara com que se cobriam, e indicado suas práticas, seus recursos, seus meios de corrupção. Fora sem dúvida um brilhante triunfo para a vindicta pública, se os chefes de uma Junta subornadora fossem judicialmente conhecidos e punidos; mas seria uma vitória ainda mais para desejar, porque seria mais decisiva, se podendo alcançar aqueles indivíduos, se cuidasse em destruir seus princípios que fazem seu crédito, sua força, sua audácia. Àquele, que suspende a tempestade, não se dirige às ondas, mas os ventos que as agitam, e restabelece-se a bonança: assim o legislador, que quer acabar com as revoluções, não se prende aos efeitos, mas ;á causa, porque trata-se menos das pessoas que das coisas. Se o estado de decadência política e moral em que definha a Europa inteira não mudasse, que importaria à salvação da pátria a desaparição de alguns perversos? O resto da geração não respiraria menos um ar contagioso. A justiça, que pode reprimir os extravios isolados e as ordens particulares, seria insuficiente se a desordem se tornasse geral. Se pelo contrário o segredo da vida social está achado, os perturbadores não esperaram a ação da justiça, e cedo voltaram à ordem, como há pouco os vimos passarem da anarquia ao despotismo.
Embarcações que deram entrada na Alfândega de 1 até 6 de Março.
	Dia 1.º de Março. - Rio de S. João, 5 LL. C. 32 caixas de açúcar, 8 dúzias de couçoeiras, 195 de madeira, 145 dita fina, 2 ½ de qualidade, 40 de ripas, 400 alqueires de farinha,, 200 de arroz, 60 de feijão, 4 sacos de café. - Cabo Frio, L. S. Francisco de Paula, C. 200 alqueires de milho, 200 de feijão, 100 de farinha, 20 sacos e 1 fecho de açúcar. - Benevente, L. N. S. da Vitória, lastro. - Ilha Grande, L. Bom Sucesso, C. 13 pipas de aguardente, 35 sacos de café, 2 fechos de açúcar. - Pernambuco, S. Triunfo, C. 1600 alqueires de sal, 5 pipas de óleo de linhaça.
	Dia 4. Porto Alegre, S. Nova Sociedade, C. 788 @ de carne, 120 de sebo, 3848 couros, 1464 chifres.
	Dia 5. Parati, L. Conceição, C. 42 pipas e 2 barris de aguardente, 118 sacos de café. - Porto Alegre, L. Concordia, C. 3180 @ de carno, 126 de sebo, 51 de graxa, 5600 chifres, 324 couros.
	Dia 6. Santos, B. N. S. dos Remédios, casca de mangue. - Campos, L. Santa Anna, C. 26 caixas e 6 barricas de açúcar, 4 pipas de mel. - Parati, L. N. S. do Monserrate, C. 37 pipas e 3 barris de aguardente, 27 sacos de café. - Guernesey, G.Ing. Reward, M. Jeffery, C. 15 quartolas de cidra, 18 toneladas de batatas, 26 caixas de cerveja, 190 sacos de bolacha. - Filadélfia, G. Amer. Cygnet, M. Charles, C. 80 barris de alcatrão, 110 de breu, 500 de farinha, 15 fardos de lona, 25 de velas.
Preços correntes dos gêneros de exportação.
Aguardente de cana							30:000 pipa
	 de cachaça						28:000
Algodão de Minas novas						4:550 a 4:600 @
	 Gerais						3:800 a 4:000
		 em fio						7:680 a 8:320
Arroz de Santos							5:200 a 5:400 saca
 da terra								4:200
Açúcar redondo							1:950 a 2:000 @
	meio redondo							1:850 a 1:900
	Batido								1:750 a 1:800
	meio batido							1:650 a 1:700
	Mascavo							1:000
	de Santos Fino						1:550 a 1:600
	Redondo							1:150 a 1:200
	Mascavo							900 a 950
Café da 1.ª qualidade							5:250 a 5:300
 da 2.ª								4:750 a 4:800
 Ordinário							3:150 a 3:200
Carne Seca do Rio Grande						1:200 a 1:280
Chifres									6:900 a 7:000 cem
Couros do Rio da Prata						165 a 170 lb
	do Rio Grande							150 a 170
	de Cavalo							700 a 750 um
Farinha de mandioca							1:200 a 1:280 saco
Ipicacuanha								1:850 lb
Melaço								12:000 a 13:000 pipa
Sebo do Rio da Prata							2:200 a 2:400 @
	 Rio Grande							1:500 a 1:600
Sola de Minas								1:900 a 2:000 meio
Tabaco Mappendim							3:840 a 4:000 @
	Piedade							2:880
Tatagiba								160 a 240
Tapioca								4:100 a 4:200 saco
Câmbio sobre Londres						49 a 60 dias vista
Pesos Espanhóis							990
J. Mitchell, Corretor.
NA IMPRENSA NACIONAL DO RIO DE JANEIRO.
O ESPELHO.
NUM. 138.	SEXTA FEIRA 14 DE MARÇO DE 1823.	 80 RÉIS.
NOTÍCIAS ESTRANGEIRAS.
S. Petersburgo, 29 de Outubro.
	Mr. Baiard, que conseguiu um privilégio por 10 anos para construir e empregar barcos de vapor, pretende na seguinte primavera estabelecer uma comunicação regular entre S. Petersburgo e Lubeck.
	Até 26 de Outubro, chegaram a Riga 663 embarcações e saíram 593.
Stocolmo, 5 de Novembro.
	O Major Krugen, que foi mandado em comissão ao Imperador de Marrocos, mandou participação de bom êxito, que havia encontrado. Todas as diferenças estão arranjadas; e ele tem recebido as atuais lisonjeiras demonstrações de disposições amigáveis para com o nosso Rei. O Major Krugen demorou-se tempo considerável em Mogador, por não poder ir ao Imperador pelo perigo da viagem. Por ordem do Imperador, os presentes da Suécia foram entregues ao Governador de Mogador, e dali levados a S. M. com uma escolta de 300 homens de cavalaria, mas o comboio foi atacado a curta distância de Mogador pelos vassalos rebeldes do Imperador, e grande parte do presente roubada. Sem embargo, o Imperador em uma carta muito atenciosa expressou sua completa satisfação dos presentes, que M. Krugen levou a bordo do navio Fredrickswarn. Dizem que ficará Cônsul em Tanger até a chegada de M. Ebrenhoff.
Copenhagem, 12 de Novembro.
	Cada vez se torna mais certo que se vai fazer um canal para ajuntar o Elbo com o Báltico, porque ultimamente muitos homens hábeis se aplicaram a examinar o objeto. O Chefe de Esquadra P. de Lavenora, e o Tenente Coronel V. Chistenser tem dirigido a proposta linha do canal, e M. Lehmann, Conselheiro de Estado, está agora examinando as vantagens e desvantagens daquele projeto, pelo que pertence ao comércio.
	Listas oficiais mostram que no ano de 1820 se exportaram 1,158,490 toneladas de trigo, e 883,000 libras de aveia moída; e em 1821, 1,776,000 toneladas de trigo, e 1,214,600 libras de aveia.
	Merece mencionar-se por curiosidade que na livraria do ex-professor Kall, que se há vender em leilão, há não menos de 60& teses de Candidatos ao grau de Doutor em Física.
Frankfurt, 10 de Novembro.
	O Allgemein Zeitung (Gazeta Universal) contém muito longos relatórios de Hydra, de 15 (27), 16 (28) de Setembro, acerca das operações da esquadra Turca, que foi perfeitamente frustrada em seus intentos de socorrer Napoli di Romania, e conquistar a ilha de Spezia. O valor dos Gregos desfez ambos os projetos; e ação naval, que teve lugar, um brulote Grego causou tal confusão entre os Turcos, que fugiram em todas as direções. Os Turcos tinham se aproximado ao brulote para tomá-lo, quando se fez a explosão. Dizem aquela Cartas que Napoli agora deve render-se, e dão também as mais favoráveis notícias das vantagens dos Gregos no Continente. Toda a Ática, Livadia, Etolia, Acarnania, assim como todo o Peloponeso estão em seu poder. Odisseus defende Termopilas, onde segunda vez derrotou Chourschid Pacha, que de novo se empenhou em forçar o passo com oito mil homens: Nicolas defende o Ístimo de Corinto: Maurocordato está em Acarnania, e Ypsilanti em Atenas. Recebeu-se notícia que se ajunta um corpo Turcos em Scola Nuova, para tentar um desembarque em Samos. Intimaram aos Samiotas que se sujeitassem, prometendo-lhes isenções de tributos por sete anos. Os Samiotas enjeitaram a proposta com desprezo, e estão resolvidos a arrostrar todos os ataques do inimigo.
Viena, 5 de Novembro.
	Jorge Ghika, novo Príncipe da Wallachia, começou seu governo sob os auspícios mais favoráveis. Imediatamente dirigiu seus primeiros esforços a destruir, com mão firme e coragem inabalável, os males, que tanto tempo tem afligido o país.
	Esta saudável severidade começa a produzir bons efeitos. Cresce a confiança no Governo, enquanto se vê todos os dias caravanas de famílias que haviam emigrado, voltando de Transilvânia. A maior parte das casas estão outra vez em estado de habitar-se, e no princípio do inverno Bucharest será outra vez tão populosa como era antes da insurreição.
	A ordem ultimamente expedida contra a extravagância nos vestidos têm excitado grande sensação em Constantinopla, e se teriam feito amargas queixas contra ela, se o povo não se lisonjeasse, que ela cairá em esquecimento, como outras muitas. Os principais objetos da proibição são – peles de muito custo, chalés da índia, ou chalés de fábrica Europeia feitos à imitação daqueles e vestidos e forrados de seda. Ninguém deve mais trazer estes últimos desde o Grão Vizir até o mais baixo do povo.
	A proibição dos chalés ao princípio causou não pequena consternação aos negociantes Ingleses, e nesta ocasião se mostrou que muito mais de metade dos chalés usados em Constantinopla eram supridos das fábricas Inglesas, e a preços muito baixos. A feitoria Inglesa fez urgentes representações à Porta, e deu a esta medida o nome de infração arbitrária das relações comerciais até ali existentes. Deu-se uma resposta muito satisfatória. Intimou-se à feitoria, que a proibição de sorte alguma se dirigia contra o comércio em certos artigos, que ficaram tão francos como antes; mas contra o extravagante uso dos mesmos; que além disto, ainda no último ponto, se estendia somente à capital, e que ainda restavam aos negociantes estrangeiros vias e meios suficientes para disporem dos seus gêneros. De fato, é muito provável que os efeitos daquela rigorosa lei serão somente visíveis nas ocasiões públicas, e não no particular da vida doméstica.
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VARIEDADES.
Projeto de uma nova parte jocosa, que deve ser inserida no Espelho, destinada a ridicularizar os sofismas espalhados pela seita dos Carbonários e demagogos.
Ista secta Tuberones et Savonios genuit, ut imperium evertant libertatem praeferunt, si perverserint, libertatem aggredientur.
TAGIT. ANN. 16.
Esta seita produziu os Tuberões e os Savonios, os quais para destruírem o Império, se erigem em campeões da liberdade, que eles mesmos hão de atacar, logo que consigam seus intentos.
	A abundância de artigos escritos em estilo grave e dirigidos a combater a seita dos demagogos, nem sempre produz o desejado fim; 1º. Porque nem todos agradam, ou não agradam a todos; 2º. Porque ainda quando agradem, do meio por diante enfastiam e cansam; 3º. Porque são suscetíveis de serem refutados, senão por argumentos sólidos, ao menos por brilhantes sofismas. Não acontece assim aos escritos jocosos, que sempre agradam, uma vez que não saiam dos limites da decência, e que tem a dobrada vantagem de mover o coração, e de comover o entendimento: ridiculum acrius meliussecat rem. Ainda agora se estaria, na Espanha, namorando por fé, sem esperança, e com prejuízo da caridade se o engraçado Cervantes não ridicularizasse os cavaleiros andantes na pessoa de D. Quixote. Correriam rios de sangue primeiro que se assentasse que um Rei legítimo podia, ainda que heterodoxo, e sem licença do Papa, ser elevado ao trono, a que fora chamado por aclamação da grande maioria da nação, se a sátira Menipea não desse um ar de ridículo à guerra e pretensões da liga. Tassoni debelou com a arma do ridículo os dois famosos partidos Guelfa e Guibelino, que destruíam a bela e infeliz Itália, com o seu Poema Herói-Cômico, intitulado La Secchia Rapita. Casti, seguindo as pisadas de Aretino, sem compatriota, conseguiu por meio do seu Poema Jocoso Il Tartaro desconceituar, e anular os planos políticos de uma grande nação Européia. Steele, Temple, Sterne, Addison e Pope, poliram a sua nação escarnecendo os vícios dominantes, que a enxovalhavam. Moliere reindo deitou por terra os beatos falsos, os pedantes verdadeiros, e todos os extravagantes originais do seu tempo. Boileau com dois versos Alexandrinos derrubou a mal merecida reputação de que gozava o Poeta Quinaut. Voltaire, que se demasiou, abusando da graça divina, com que a Natureza o dotou, corrigiu contudo por seus escritos jocosos, tanto em prosa, como em verso, um montão de superstições, e ridicularias de longo tempo respeitados. O Padre Isla com o seu Frei Gerundio deu o último golpe à Filosofia Aristotélica, que dominava exclusivamente nas escolas. O Abade Sertore acabou galantemente com o longo conclave, que precedeu a eleição de Pio VI., publicando o seu drama jocoso intitulado II Conclave. Montarroyo, que foi o primeiro Jornalista Português, que manejava com a mesma habilidade o estilo sério e o jocoso, dissipou com balas de sal os dois burlescos partidos do Alecrim e Manjerona , origens de grandes desordens. O nosso ilustre Patrício Franco de Mello Franco demoliu com a sua faceta produção poética a estupidez os restos do gótico edifício, que a proscrita Jacobeia tinha deixado na Atenas Portuguesa. Outro nosso Patrício igualmente respeitado lavou com uma só Hisapada as roliças cabeças do Reverendo Cabido de Elvas. Gregório de Mattos, Lobo, Abade Francisco Manoel, Bocage, Fr. Lucas de Santa Catarina, Pedro Gonçalves da Camara, Thomaz Pinto Brandão, e ultimamente Ferro (autor da Assembleia dos Vinagristas), e Macedo, bem conhecido por uma quantidade de produções facetas, castigaram os defeitos, maus costumes e desvarios dominantes nos diferentes tempos. 
	Não devem esquecer por estrangeiros os modernos e engraçados jornalistas, Peltier, autor do Ambigu, de Jony, Autor do Hermite de la Chaussé d’Antin, e colaborador da Minerve Française, e do Miroir, e M. Chateaubriand, colaborador da Assemblée des ignorants, e os colaboradores do Nain Jaune. Todos estes brilharam por sua aguda e delicada graça no gênero, em que pretendemos escrever.
	Conquanto sejam nossos talentos escassos, e nos falta o sal necessário para temperarmos a panela, que pomos ao fogo, supriremos, servindo uma diversidade de pratos sem profusão, mas apresentados com decência: singula quaeque locum teneant sortita decenter. Nós fazemos uma diferença muito grande dos erros, parvoices, crimes, asneiras, ignorâncias, loucuras, e dos erros parvos, criminosos, asnos, ignorantes e loucos. Assim declaramos que atacaremos quanto pudermos, e como soubermos, os primeiros, isto é, as coisas, e não buliremos, nem mexeremos com os segundos, isto é, com as pessoas. Segundo este sistema, se alguém se queixar, dir-lhe-emos simplesmente em resposta. - “Sr. Leitor constante ou inconstante, para que comprou a carapuça, e para que a pôs na cabeça com perigo de lhe servir, como diz que lhe aconteceu? Tenha paciência. O que está cortado, está cortado; o que pode fazer é descosê-la. Adeus.”
	Aceitamos todas as memórias ou cartas, que nos forem enviadas, contanto que sejam escritas em estilo jocoso, e que não tragam nomes de pessoas, nem ainda as letras inciais, e apresentaremos pela antiguidade se suas recepções com as competentes respostas no mesmo N.º
	Sendo o nosso intento combater os demagogos, inimigos declarados de todo e qualquer sistema que possa convir ao Brasil, marcamos como ponto fixo, do qual nunca nos desviaremos aquele que a razão e a experiência apontam, que é o meio entre os dois extremos ambos viciosos. Inter utrumque tene medium, tutissimus ibis, era o conselho que o Sol deu a seu filho, e nós não queremos ser mais luminosos que o astro do dia. Daremos em estilo jocoso notícia, e faremos a crítica das obras novas que forem aparecendo, escritos no sentido dos Demagogos. No mesmo estilo apresentaremos os extratos das Sessões das Cortes de Portugal e Espanha à medida que forem chegando, e responderemos nos jornais do partido inimigo da causa deste Império. E finalmente daremos a crítica do teatro e das modas.
	Pelas relações pessoais, que temos com dois dos Colaboradores de um jornal jocoso que se publica em França contra Carbonários e Demagogos, alcançaremos com a possível prontidão, e [ilegível] em língua vulgar a íntegra ou parte de seus N.ºs mais interessantes; e nos obrigamos a dar mais um artigo no Espelho em cada um dos dias da publicação deste jornal, aumentando o volume quando for necessário.
	Rio de Janeiro, 12 de Março de 1823.
		Menandro, Licinio, e Asdrubal.
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CORRESPONDÊNCIA.
Senhor Redator.
	Mestre Ignacio, Jesuíta, Galego por nascimento, e Ulissiponense por inclinação, ex-Taverneiro, ex-masmarro, Padre em hábitos de Leigo, Pregador Régio com cabeção de Cônego, e pagem afras com chapéu de galão de prata; cultor de Bacho, devoto de Vênus, conhecido por Mercúrio, Venerador de Marte Madeira, e Gazeteiro ao serviço de quem quer que governa na Bahia, não podendo despejar a sua bílis em um único alquidar, arranjou três gamelas, em que vomita poucas de pescada contra os Escritores do Rio, contra os carcundas do Brasil, e contra o Exército do Recôncavo. Segundo ele, os Escritores Fluminenses não tem comparação com os Lisbonenses, máxime com os famigerados Barões Moura, Borges Carneiro, Ferreira Borges, Fernandes Thomaz, e Castelo Branco, e nisso tem arqui-razão Mestre Ignacio: qual é entre nós o orador que gagueja como o Moura? Quem fez para bolas como o Borges? Quem há aqui que tenha um tiple como Ferreira Borges? Que vos de baixo temos nós cá como Fernandes Thomaz? Em que botica se venda um diurético tão eficaz como Castelo Branco, que em começando a falar, começavam os Deputados a levantarem-se, como quem queria fazer necessidades no corredor das mesmas? Diz mais Mestre Ignacio que todos os Jornalistas do Rio de Janeiro começam e acabam pelas mesmas palavras. Também tem carradas de razão. Todos começam por marcar o mesmo dia da mesma semana, e do mesmo ano. É forte sem-saboria! Não fazem assim os da Bahia. O Analisador, como Hebreu, tem uma data, o Semanário, como Grego, tem outra, a Idade de Ouro data da era de César, livrem-se eles que lá chegue o Astrônomo Labatut, com a correção, que lhes encaixe o Calendário Romano, que então hão de ser todos labli unius. Indignou-se Mestre Ignacio sobremaneira da ofensiva, indecorosa, insólita e atrevida publicação do enterro das Cortes! Por cá também houve quem sentisse a mesma cólera, e com sobeja razão. É o pago que se dá a quem esteve vinte meses sentado nas Necessidades a fazer o que era preciso para a Nação Portuguesa! Maldita ingratidão! Ilustres Manes dos incomparáveis Tutores da filha de Ulisses, se os vossos feitos foram Romanos, consolai-vos com Catão, que não teve estátua no Capitólio; e tu, oh filho desumano, que tivestes a ousadia de verter águas nas cinzas de vossa carinhosa Mãe, temei a cólera dos Deuses (aposto que Mestre Ignacio há de gostar desta exclamação oratória), e receai a cominação imposta pelo velho Horacio, na sua arte poética: si minxcrit in patrios cineres etc. Quanto à maldita praga dos carcundas, hoje tão espalhada pelo mundo, seria bom que Mestre Ignacio; qual outro eremita, levantasseuma cruzada contra estes hereges, e que até fosse a Roma a pé para ver se obtinha contra eles uma Bula, estabelecendo uma espécie de Inquisição. Chega a fazer aflição sair um empertigado e libérrimo Cidadão a dar o seu passeio pela fresca, e encontrar sobretudo antes do almoço, tanta gente com as respectivas merendeiras ou alforjes, salvo seja, por cima do osso sacro. Por isso vemos tantas desgraças. Uns esbarram nas esquinas, outros escorregam e torcem as pernas, outros vão de focinhos ao chão. O remédio que se conhece, é trazer cada um a sua figa, e em apontando carcunda apresentar-lha. Eu tenho feito isto, e dou-me bem. Finalmente o Exército do Recôncavo, em que tanto confiam os carcundas da Bahia, basta ser coisa do gosto dos carcundas para aborrecer aos Constitucionais Ulissenses. Mas não deve causar tanto medo. Deixe entrar a Pérola com a Regência, e verá o que vai. O Arcebispo para uma parte a excomungar; Luiz Antonio Rebello para outra a perorar da parte da saúde da defunta que morreu; Botelho, que sabe falar língua de preto, que aprendeu quando esteve para ir a Angola, fazendo falas aos pretos Minas e Ossás, vendo-se outra vez a cavalo e escarranchado em Madeira, acabam num instante com as forças do Recôncavo, sobretudo se seguirem o plano de campanha proposto pelo Deputado João Bernardo da Rocha. São estas as considerações, que se me oferecem, e desejaria que chegassem ao conhecimento de Mestre Ignacio, residente na Bahia, onde o Periódico de V. é tão aceito, como é no Rio ao Constante Leitor.
Menandro.
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Senhor Redator.
	Se um estrangeiro publica as suas reflexões tendentes ao bem do Brasil, só porque estabelecido aqui deseja ter parte na prosperidade geral; mais fortes razões tenho para fazer eu, que situado da mesma sorte, que aquele Inglês, olho para o Brasil, como para a cabeça, e parte principal da minha Nação; considero o Brasil como a boia única em que pode salvar-se o infeliz Portugal, minha Pátria, e as diversas porções do Império Português nas outras partes do mundo. - Quando pois, Sr. Redator, tiver algum vazio na sua estimável folha, rogo-lhe, o queira encher com as observações seguintes, e outras quaisquer que para o futuro eu lhe possa evitar, se lhe parecem dignas disso. - Principiaremos por aqui.
	Há quem quer que todas as vezes que se nomeia o Imperador, se ajunte sempre o epíteto Constitucional; o que me parece conter alguma malícia. Porquanto, qual é a Constituição, em virtude da qual S. M. é o Soberano do Brasil?… Poupemos tempo e papel. A verdade é que tendo sido o Senhor D. PEDRO reconhecido Herdeiro do Trono de Seu Augusto Pai, e por tal tido e havido por todas as Nações, o notório cativeiro daquele Monarca fazia devolver no Seu Régio Sucessor o direito do governo: nem os povos podiam deixar de se lhe submeter, sem se constituírem perjúrios e rebeldes. É público o que o Sábio Brasil fez a este respeito; mas devemos convir que fez o quem honra, em consciência, e por próprio interesse devia fazer.
	Que seria do Brasil, se não tivesse seguido tão acertado Conselho!… Depois este digno Príncipe ganhando, a cada dia, novos direitos ao amor, à estima, à admiração dos povos, estes no meio de um natural entusiasmo, na efusão da sua sensibilidade, por efeito do mais justo agradecimento, e com a convicção da própria utilidade, o aclamaram, e levantaram seu Imperador e Soberano Protetor; qualidades que Ele desempenha, como nem a mais negra calúnia pode negar. Eis aqui os títulos por que o Senhor D. PEDRO nos governa; títulos que de certo ninguém jamais teve melhores, nem mais autênticos. - É certo que, sabendo da vontade do grande número, quis S. M. I., e declarou que haveria no Império uma Constituição, ou Lei fundamental, feita por uma Assembleia autorizada pela Nação, a qual Lei marcaria os deveres, e razoável extensão do poder Imperial, seus direitos, suas prerrogativas. Esta Constituição porém, não está ainda feita por causa da demora dos tantas vezes convocados Representantes. Do que formalmente se segue que o Imperador neste momento, e entretanto, está obrigado a governar somente segunda as Leis existentes. E se Ele tem já adotado as formas Constitucionais, se modifica quanto é possível as Leis antigas a favor da justa liberdade do povo, e em benefício público, encaremos tudo isto como uma expressão da sua natural Generosidade, e do prazer que tem de Reinar sobre um povo livre, agradecido, e naturalmente bom: olhemos a doçura, a atividade, a sabedoria, que preside aos seus Conselhos, e caracteriza o seu governo, como outros tantos resultados das virtudes sublimes, que formam um Príncipe, dádiva preciosa do Céu em espinhosas circunstâncias; virtudes sustentadas por um Ministro ilustrado e prudentíssimo, e que todo aplicado ao seu dever, tem votado todos os seus pensamentos, todos os seus instantes à glória e eterna fama do seu e nosso amável Imperador, à grandeza e prosperidade do Brasil, deste privilegiado país, objeto de inveja para todas as Nações.
	Vão por ora estas linhas, Sr. Redator, que serviram de princípios, dos quais tiraremos, se for preciso, as consequências, sem medo que algum descontentadiço me desminta, nem me acuse de comprimento; pois que nem aspiro a subir de posto, nem tenho entrada com o Monarca, nem com o seu respeitável e digno Ministro. O elogio é a mais justa recompensa, é uma dívida à aquele que nos faz o bem.
	Quero acabar a minha carreira em paz, quero ver o Brasil marchar livremente e com dignidade para os altos e gloriosos destinos, a que a Providência o destinou; quero ver a minha Nação ainda uma vez grande e feliz: por isso e só por isso, penso assim. - Em 11 de Março de 1823. - Sou etc.
Um Lusitano Brasileiro.
Preços correntes dos gêneros de exportação.
Aguardente de cana							30:000 pipa
	 de cachaça						28:000
Algodão de Minas novas						4:600 @
	 Gerais						4:000
		 em fio						7:680 a 8:320
Arroz de Santos							5:000 a 5:400 saca
 da terra								4:200 a 4:600
Açúcar redondo							1:900 a 2:050 @
	meio redondo							1:800 a 1:950
	Batido								1:700 a 1:850
	meio batido							1:600 a 1:750
	Mascavo							1:000 a 1:100
	de Santos Fino						1:600 a 1:650
	Redondo							1:200 a 1:250
	Mascavo							800 a 900
Café da 1.ª qualidade							5:200 a 5:250
 da 2.ª								4:700 a 4:800
 Ordinário							3:800
Carne Seca do Rio Grande						1:200 
Chifres									6:400 a 7:000 cem
Couros do Rio da Prata						165 a 175 lb
	do Rio Grande							150 a 175
	de Cavalo							800 a 900 um
Farinha de mandioca							1:200 a 1:400 saco
Ipicacuanha								1:350 lb
Melaço								12:000 a 13:000 pipa
Sebo do Rio da Prata							2:200 a 2:400 @
	 Rio Grande							1:600 a 1:800
Sola de Minas								1:900 a 2:000 meio
Tabaco Mappendim							4:000 a 4:800 @
	Piedade							2:400 a 3:200
Tatagiba								160 a 240
Tapioca								4:200 saco
Câmbio sobre Londres						49 a 49 ½, 60 dias vista
Doblões Espanhóis							15.200 um
Pesos ditos								995
J. Mitchell, Corretor.
NA IMPRENSA NACIONAL DO RIO DE JANEIRO.
O ESPELHO.
NUM. 139.	TERÇA FEIRA 18 DE MARÇO DE 1823.	 80 RÉIS.
IMPÉRIO DO BRASIL.
Imperium terris, animos acquabit Olympo.
VIRG. L. VI. V. 782.
Extrato do Diário do Governo de 15 de Março.
Pela Mesa do Desembargo do Paço.
	DOM PEDRO, pela Graça de Deus e unânime Aclamação dos Povos, Imperador Constitucional e Defensor Perpétuo do Império do Brasil. Faço sabe: Que sendo-Me presente em Consulta da Mesa do Desembargo do Paço, que de não datarem os Juízes de Vara branca os seus Despachos, principalmente os interlocutórios, ou avulsos, se seguiam muitas vezes contra a boa administração da Justiça, e regularidade do expediente dos Negócios das Partes, abusos, confusão e transtornos que muito convinha remover; E Conformando-me por minha imediata Resolução de vinte e um do mês próximo passado com o Parecer da mencionada Consulta, em que foi ouvido o Desembargador Procurador da Coroa, Soberania e Fazenda Nacional: Hei por bem Ordenar, de agora em diante não só os Juízes de Vara Branca, mas geralmente todos e quaisquer Magistrados de qualquerOrdem, classe ou graduação que sejam, e ainda os mesmos Fiscais, datem todos os seus Despachos; por ser este um meio conducente à boa ordem do Processo em suas diferentes épocas e saudável providência para pôr em termo as antedatas dos Despachos, e aqueles outros abusos de que subiu queixa à Minha Imperial Presença. Pelo que, em observância da Lei, Mando a todos os Ministros, Justiças, e quaisquer outras pessoas a quem o conhecimento desta Minha Imperial Determinação haja de pertencer, a cumpram e guardem, e façam cumprir e guardar, como nela se contém. O Imperador Constitucional e Defensor Perpétuo do Império do Brasil o Mandou por Seu Especial Mandado pelos Ministros abaixo-assinados do Seu Conselho e Seus Desembargadores do Paço. Manoel Correa Fernandes a fez escrever no Rio de Janeiro em vinte e cinco de Fevereiro de mil oitocentos e vinte e três; segundo da Independência e do Império. José Caetano de Andrade Pinto a fez escrever. - Bernardo José da Cunha Gusmão e Vasconcellos. - Monsenhor Miranda. - Por imediata Resolução de S. M. I. de vinte e um de Janeiro de mil oitocentos e vinte e três, tomada em Consulta da Mesa do Desembarque do Paço de treze do mesmo mês e ano, e Despacho da referida Mesa de seis de Fevereiro do dito ano. - José Caetano de Andrade Pinto.
____
BAHIA.
Vila de Massaió.
	No Diário do Governo de 15 do corrente lemos com a maior satisfação um Ofício em que se descreve o entusiasmo com que os moradores da Província das Alagoas receberam o Batalho do Imperador, que se dirigia a coadjuvar as tropas Brasileiras, contra o bárbaro Madeira e seus sectários, que tanto tem amofinado a malfadada Bahia, e ao mesmo passo o denodo a prontidão com que correram às armas para arrosnar os que supunham ser dos Lusitanos assanhados inimigos da nossa Santa Causa. Como um extrato não retrataria fielmente estes sentimentos, com júbilo transcrevemos a íntegra do mesmo Ofício.
____
Ofício de José Joaquim de Lima e Silva, Coronel do Batalhão do Imperador.
	Ilustríssimo e Excelentíssimo Sr. - Havendo a Expedição do meu Comando saído desse Porto no dia 28 do mês próximo passado: fora da Barra o Comandante da Esquadra abriu o Prego que levava; e como nele se deixava a arbítrio a escolha do Porto, em que a expedição devia desembarcar: assentou o mesmo Comandante em formar Conselho; o qual foi composto, dele, de mim e de todos os Comandantes das Embarcações, com os seus respectivos Práticos da Costa: e de comum acordo foi assentado, que o Porto mais conveniente para o desembarque era o de Alagoas. Portanto, havendo-se dirigido o rumo da Esquadra para este Porto, aqui fundamos no dia 22 do corrente. Ao avistar-se de terra a Esquadra, supondo-se na Vila de Massaió ser Lusitana, desenvolveu-se no povo o mais admirável entusiasmo: todos correram às armas; e não só os homens moços, porém os velhos, e as crianças, que mal podiam com o peso das espingardas, todos se armaram e guarneceram as Prais e Fortes: porém nada é tão notável como o Patriotismo das Mulheres, que saindo armadas para as ruas, corriam às casas umas das outras, convidando-se reciprocamente para a defesa da Pátria, e qual delas de esforçava em chegar mais depressa aos pontos em que se achavam os seus Esposos, seus Pais, os seus filhos para os auxiliarem no combate.
	Fundeando a Esquadra, firmou com um tiro de peça a Bandeira Imperial, e imediatamente foi mandado à terra um Oficial de Marinha por parte do Comandante da Esquadra, e eu enviei da minha parte o meu Major, o Ajudante, o Capelão, e um Tenente, que aproximando-se à terra iam dando Vivas ao Imperador, e a Nação Brasileira.
	A Tropa e o Povo, que até então estavam desconfiados da Esquadra, e se achavam dispostos a fazer-lhe fogo, e sobre todos os que pretendessem desembarcar, não obstante verem tremular a Bandeira verde, que eles supunham arvorada por malícia; vendo a gente que ia no Escaler, e reconhecendo serem Brasileiros; cheios de alegria entraram a dar muitos Vivas: e o seu entusiasmo os levou ao ponto de se meterem pelo mar dentro com água pelos peitos, tirarem os Oficiais para fora do Escaler, carregá-los aos ombros dando continuados Vivas e descargas de alegria.
	O Major de Milícias desta Vila, Bernardino Gomes Ribeiro, Comandante militar deste Distrito tão zeloso e enérgico havia sido em pôr este Porto em defesa contra nós, supondo-nos inimigos, como depois reconhecendo-nos amigos e irmãos, foi ativo em providenciar sobre o desembarque da Tropa, seus cômodos e manutenção em terra; dando todas as provas do seu patriotismo e da Nobreza dos seus sentimentos.
	O Tenente Coronel Joaquim Mariano de Oliveira Belo, Comandante das Armas de toda esta Província, e Oficial, cuja bravura e probidade é conhecida, e que merece aqui o maior conceito destes Povos, sabendo na Vila das Alagoas da aproximação da Esquadra, pôs ali tudo em Armas, deu todas as providências para a defesa da Província, e imediatamente avançou sobre Massaió com um Corpo de 300 homens, em companhia de um dos Membros do Governo, e Secretário Laurentino Antonio Pereira de Carvalho.
	Ao Governo dirigi de bordo o Ofício constante da Cópia N. 1, remetendo-lhe alguns Exemplares da Proclamação N. 2: o Governo respondeu-me com o Ofício N. 3; e à vista das minhas requisições tem sido incansável em providenciar sobre o transporte da Tropa, todos os socorros tem prestado à Expedição, e nada nos resta a desejar.
	O bom Povo cheio do maior entusiasmo tem recebido a Tropa da Expedição com os braços abertos; suas casas, suas bolsas, e seus serviços tudo tem franqueado como a Irmãos.
	Hoje espero que desembarque o resto da Bagagem, e Trem Militar, e imediatamente estejam os transportes arranjados, seguirei a minha marcha para a Bahia.
	Rogo pois a V. Excelência se digne levar à Augusta Presença de S. M. I. o que acima fica exposto.
	Deus Guarde a V. Excelência, Vila de Massaió, 23 de Fevereiro de 1823.
	Ilustríssimo e Excelentíssimo Sr. João Vieira de Carvalho. - José Joaquim de Lima e Silva, Coronel do Batalhão do Imperador.
____
VARIEDADES.
Etimologia das palavras Demagogo e Carbonário.
	Andei de aquém para além,
	Terra vi, e vi lugares,
	Tudo seus avessos têm;
	O que não examinar-se
	Não cuideis que sabes bem
		Francisco de Sá e Miranda.
	“Depois que Erostrato, querendo (como muita gente limpa), fazer-se célebre à custa das desgraças dos outros, lançou fogo ao maravilhoso templo de Diana, em Efeso, que consumiu numa só noite, que o nascimento de Alexandre fez duplicadamente famosa dois milhões e novecentos e cinquenta e cinco mil, novecentos e sessenta e três volumes in folio máximo, que continha a grande e bem escolhida Biblioteca daquele convento de Freiras, onde se encerravam todos os conhecimentos humanos, sendo que de muitíssimas obras só alui se achavam os exemplares que existiam, ficou este mundo totalmente às escuras, a ponto de se ignorar até como se havia de satisfazer às três mais fortes precisões em que nos pôs a Natureza. Vieram com o andar dos tempos aparecendo sábios, e com eles muitos pedantes, na razão de um sábio por cada setecentos e cinquenta e seis mil pedantes, segundo o cálculo que fez um profundo matemático, cujo nome agora me não lembra, o qual morreu de desgosto quarenta e oito horas depois de ter excedido o prazo da existência que ele se tinha calculado, deixando uma interessantíssima e raríssima produção sua, que tem por título – Cálculos das asneiras, que anualmente se fazem e dizem no Mundo, repartidas por todos os seus habitantes – Por este cálculo exatíssimo, cabem a cada homem dois bilhões e novecentas e noventa e nove mil e seiscentas e quarenta e sete asneiras e um terço. Ora está bem visto que nem todos gastam a porção que lhes pertence por falta de ocasião, portanto o excedente acresce aos outros. Fica evidente quanto o gênero humano havia de perder pela galantaria de Erostrato, mas de todos os ramos nenhum sofreu tanto, e para nenhum foi esta perda irreparável, como para a ciência das origens e etimologias antigas. Já o velho Horácio disse que no seu tempo andavam os Gramáticos àsgadelhas uns com os outros por causa das diferentes opiniões sobre quem tinha sido o inventos dos versos elegíacos, e de então para cá pode dizer-se que a ciência das etimologias e origens foi uma ciência de peta. Ver entrar as belas palavras Gregas tão belas, tão harmoniosas, tão bonitas para casa de um desses mais famigerados Gramaticões, e vê-las sair, depois de feita a anatomia, tão tristes e tão macilentas, como quem vem do martírio, umas coxas, outras maetas, outras torcidas, e no fim de tudo o Gramaticão prega um carapetão, e levanta um falso testemunho, já é impostura! Mas é tão geral a curiosidade de saber origens que, estando eu em Londres, vi dois Ingleses desafiados ao seco por causa da verdadeira etimologia da palavra – Spleen , e em Itália presenciei em uma casa de pasto uma aposta de um salsichão contra um prato de ravióli sobre a questão de quem tinha sido o descobridor da operação tendente a conservar as vozes finas; um pretendia que fora um General Napolitano, Ascendente do Inclito General Pepe, pensionário do Tesouro de Portugal por Decreto das Cortes, e o outro sustentava que fora um Condestável Romano, posterior ao Império. Eu ardo com a facilidade e certeza com que os pedantes se atrevem a decidir questões tão delicadas, quando os homens inteligentes andam, por assim dizer, às apalpadelas, e com muito medo: e suposto que os vastos conhecimentos que tenho adquirido na Filologia me tenham constituído o maior Filólogo do Rio de Janeiro, por isso mesmo, e como não sou impostor, não quiser arriscar a reputação de que gozo, fazendo para determinar a verdadeira significação de uma palavra, uma operação, de que posso sair mal. Se V. M., Sr. Monaudro, se contenta com a etimologia de – Carbonários – estou prontíssimo, vamos a eles; aqui estão canivetes tortos e direitos, quantos aos – Demagogos – declaro que tenho medo deles, que me pelo.” Assim falava Mathanusius Acaios, eruditíssimo antiquário e fortíssimo Gramaticão Grego e Latino, geralmente respeitado e bem conhecido por suas memórias que escreveu, uma sobre – Batuques – e outra – sobre a altura dos Centuriões – quando eu ontem o procurei em sua casa (que é uma trapeira por cima de um quarto andar na rua da Quitanda) para o consultar sobre a etimologia das duas palavras, de que pretendia tratar neste primeiro artigo. O respeito que a gente naturalmente tem a um velho e sábio, aumentado pelas venerandas exterioridades que o adornam, tais como uma figura corpulenta, uma carranca cheia de verrugas, óculos fixos no nariz, roupão de chamalote, e barrete de folhos na cabeça, sentado em cadeira poltrona, e mesa diante sobre a qual estavam coisa de duas dúzias de Dicionários, uma caixa de esturro, uma ampulheta, e duas palmatórias com que abana as moscas a meia dúzia de rapazes que estão há dois anos em linguagens, pedindo a Deus que dê um estupor ao velho, sem o que não chegariam estes três anos a sintaxe: tudo isto me fez tornar a fala ao corpo por alguns momentos. Vendo, porém, que o meu Gramaticão, sempre com o mesmo ar crespo, me dizia “Então Sr. Monandro que resolve?”, lhe tornei: Eu, Sr. Mathanusius, estou “comprometido a dar a etimologia das duas palavras no próximo futuro o número do Espelho do próximo futuro dia de amanhã; se a dou, terei só contra mim os Demagogos, mas se falto, tenho tudo contra mim, carcundas, pés de chumbo, Demagogos, carbonários e Jardineiros, e até terei contra mim o Redator do Espelho, que com o mau tempo, que não deixa entrar navios que tragam novidades, não tem com que encher o seu Periódico. O Sr. Mathanusius pensa com muita delicadeza e permita-me que lhe diga que teria carradas de razão se a etimologia que peço houvesse de ser autorizada pelo seu respeitabilíssimo nome, mas como tudo vai por minha conta, e não digo nada a ninguém, faça-me o favor de me dar uma etimologia provável, assim como muito grandes Genealogias fazem árvores de costado prováveis, e quando Deus quer algumas, que não tem a menor probabilidade, e passam sem que o crédito do inventor sofra o menor detrimento. Pois bem, Sr. Monandro, condoendo-me do estado e aperto em que se acha, e persuadindo-me de V. m. é incapaz de me comprometer, eu passo a fazer a dissecção da palavra Demagogos, estenda-se aí nessa mesa, enquanto eu preparo os instrumentos.” E dito isto começou a gritar – Homero! Píndaro! Aristófanes! Eu cuidei que o homem tem endoidecido, mas vendo depois de algum tempo chegar três pretos dizendo – Aqui estame missiou, indaguei e soube que em casa do Gramaticão, pretos, cães e gatos tudo tem nome de patente. Os três poetas Gregos foram por ordem de Mathanusius, e com uma docilidade pouco vista em poetas, acarretar da estante para cima da mesa uma ruma de livros gordos, que o etimologista foi abrindo e em que marcando cada página, que corria com uma dedada de tabaco e pingo do nariz, que em breve farão ininteligível o texto. Mathanusius tendo procurado, achado e lido o que convinha, deitou-se para trás da cadeira, de braços encruzados, e com os olhos fechados esteve por mais de duas horas em meditação, e saindo deste estado um pouco enfadado, desagastando-se com duas ´pitadas e meia que tomou, rompeu por estas palavras “ Sr. Monandro, eu antes queria que V. m. me fizesse c…. do que me fizesse passar por tão grande apuro, mas já que prometi, lá vai: A palavra Demagogos compõem-se dos dois vocábulos gregos Dèmos, que quer dizer, Démos, Demônios, Diabos, e Gogos, que quer dizer gulosos, comedores, chupistas: as duas palavras juntas vem poia s significar Diabos Gulosos. Tenho achado as raízes. Vamos acabar com a etimologia, Em Astracan, Capital da Pérsia, apareceu, pouco mais ou menos, mil e quinhentos anos antes da vinda de Cristo, bandos de Diabos, conhecidos pelo nome de Demônios Meridianos, ou como vulgarmente se diz duendes, os quais transformando-se em homens, e parecendo muito liberais, furtavam, inculcando-se por Constitucionais eram naturalmente Despóticos, fingindo-se muito amigos do povo, preparavam-lhe as maiores tiranias, e mostrando-se grandes apaixonados do Monarca em público, escondidamente o traíam. Faziam intrigas, armavam Clubes, fomentavam descontentamentos, tudo em ordem a promover a revolução por meio da guerra civil, preparando as fisgas, armando os anzóis, e atando a isca para pescarem nas águas turvas, e entre tempestades, o que em tempo de bonança não poderiam apanhar.” O flagelo da peste, que sofreu uma grande parte do Império, fez recorrer aos Deuses, e consultar o Oráculo, que respondeu: - Lançai fora os Démos gulosos, e salvar-vos-eis. O Povo queria tomar a si a extirpação destes hereges, mas uma providente disposição do governo preveniu a tempo, e por um modo regular, a perigosa e arriscada medida da justiça feita por muitos. Espancaram-se os Démos gulosos, e espalharam-se pelo universo, como os ciganos. Os progressos que tem feito esta seita, não pertencem à parte etimologia, que prometi dar, e se podem ver na história da Seita dos Demagogos em vinte e três volumes, composta e publicada pro Expertus no ano passado.
	Quanto à palavra Carbonário, ela é traduzida do Italiano Carbonari, Carvoeiros. Para subir à etimologia, é preciso saber que no calcanhar da bota que forma a Itália, existe o Reino de Nápoles, de que é Patrono S. Januário, Bispo e Mártir, cujo sangue se conserva [ilegível] dentro de uma redoma de vidro, guardado ao dia do Santo a supersticiosa e grosseira seita estrela dos Lazzaroni a saudar e descompor devotamente o Santo, até que faça o milagre da descoagulação do sangue, e feito isto [ilegível] tudo de [ilegível].ç Aconteceu, porém, há anos aqui atrás que, indo um Francês a Nápoles, e achando-se na Catedral na ocasião em que se celebrava o milagre, dez a descortesia de dizer ao Padre “Eu, Sr. Reverendo, não vejo coisa alguma” ao que o Padres ingenuamente lhe respondeu: “Não se admires, que também eu, que estou mostrando o sangue há perto de vinte anos, ainda não vi nada”. Esta indiscreta conversação, passada à vista de muita gente, desacreditou o Santo, e fez duvidar do milagre. Os

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