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Icterícia: é um dos sinais mais frequentes no período neonatal e apresenta-se como a coloração amarelada da pele, esclera e membranas mucosas, indicando aumento da bilirrubina sérica com acúmulo de bilirrubina nos tecidos. Definições: - Hiperbilirrubinemia não conjugada/indireta (BI) na concentração igual ou superior a 2mg/dL - Hiperbilirrubinemia conjugada/direta (BD), quando for superior a 1 mg/dL - As manifestações clínicas da hiperbilirrubinemia se desenvolvem geralmente, quando o nível sérico é > 5 mg/dL. Principais causas de hiperbilirrubinemia indireta patológica: Sobrecarga ao hepatócito: - Doenças hemolíticas: Hereditárias: imunes, enzimáticas, membrana eritrocitária e hemoglobinopatias Adquiridas: infecções virais ou bacterianas - Coleção sanguínea: cefalohematoma, máscara equimótica, hemorragias - Policitemia: RN PIG, mãe com DM, clampeamento tardio de cordão, transfusão maternofetal ou fetofetal - Aumento da circulação enterro-hepática: jejum ou baixa oferta, icterícia do aleitamento materno, anomalias GI Deficiência da captação - Síndrome de Gilbert Deficiência ou inibição da conjugação - Síndrome de Down - Síndrome Crielger-Najjar tipo 1 e 2 - Hipotireoidismo congênito - Síndrome da icterícia pelo aleitamento materno Icterícia neonatal fisiológica (INF) – é a principal causa de icterícia neonatal, aparece sempre >24 horas de vida. É decorrente de limitações do metabolismo da bilirrubina, tanto pela sobrecarga de bilirrubina ao hepatócito e a menor capacidade de captação hepática, como também pela conjugação e excreção hepática deficientes. A sobrecarga de bilirrubina ao hepatócito sofre influência da produção e da circulação êntero-hepática aumentadas devido ao menor tempo de vida média das hemácias e à maior quantidade de hemoglobina do RN. A circulação êntero-hepática é determinada pela escassa flora intestinal e pela maior atividade da enzima betaglicorunidase na mucosa do intestino, com consequente aumento e absorção da bilirrubina não conjugada pela circulação êntero-hepática e sobrecarga de bilirrubina ao hepatócito. Outros fatores como a captação, a conjugação e a excreção hepáticas deficientes da bilirrubina, nas primeiras semanas de vida, corroboram para a manifestação clínica da icterícia fisiológica.Em RNT - Normalmente aparece com cerca de 2 a 3 dias de vida (DV), atingindo o pico entre o 3ª e 4ª DV (máximo de 12mg/dL BT), normalizando em até 7 DV. Em RN prematuro - A icterícia aparece entre o 3ª e 4ª DV, atingindo o pico do 4ª ao 7ª DV (máximo de 15mg/dL BT), normalizando em até 10 DV, pode perdurar até 30 dias. Exames complementares para diagnóstico de hiperbilirrubinemia indireta no RN que ocorrem antes de 24 h de vida: − Bilirrubina total e frações − Hemoglobina e hematócrito com morfologia de hemácias, reticulócitos e esferócitos − Tipo sanguíneo da mãe e recém-nascido para sistemas ABO e Rh (antígeno D) − Coombs direto no sangue de cordão ou do recém-nascido − Pesquisa de anticorpos anti-D (Coombs indireto) se mãe Rh (D) negativo − Pesquisa de anticorpos anti-A ou anti-B, se mãe tipo O (teste do eluato) − Pesquisa de anticorpos maternos para antígenos irregulares (anti-c, anti-e, anti-E, anti-Kell, outros) se mãe multigesta/ transfusão sanguínea anterior e RN com Coombs direto positivo − Dosagem sanguínea quantitativa de glicose6-fosfato desidrogenase (G-6-PD) − Dosagem sanguínea de hormônio tireoidiano e TSH (exame do pezinho) − Ultrassonografia cerebral em recém-nascido pré-termo Obs: Coombs direto (teste da antiglobulina humana direto): exame realizado no sangue do RECÉM-NASCIDO identifica as hemácias fetais cercadas por anticorpos antiantígenos produzidos pela mãe. Coombs indireto (teste da antiglobulina humana indireto): exame realizado no sangue da MÃE, buscando a sensibilização materna, ou seja, a presença de anticorpos anti-hemácias do RN. Teste do eluato: exame realizado no sangue do RECÉM-NASCIDO, permite a identificação dos anticorpos ligados as hemácias fetais mesmo nos casos em que o Coombs indireto é negativo. Diagnóstico de INF: evolução característica, estar atento a fatores de risco para hiperbilirrubinemia significativa e aos sinais de alerta para icterícia patológica: - Icterícia nas primeiras 24 horas de vida - Aumento da bilirrubina sérica em velocidade > 5mg/dL/dia - Bilirrubina sérica > 12mg/dL em RNT ou > 15mg/dL em RN prematuro - Icterícia que persiste após 10 a 14 DV - BD >1mg/dL se BT < 5mg/dL ou BD >20% da BT se BT >5mg/dL - Sinais clínicos como hepatomegalia, esplenomegalia, vômitos, letargia, recusa alimentar, bradicardia e apneia. Nível de BT (mg/dL) para indicação de fototerapia e EST em < 35 semanas e ----- RN ≥35 s de IG ao nascer Icterícia neonatal patológica – verificada quando os dados de aparecimento, duração ou padrão variam do que é esperado na INF. Icterícias neonatais mais comuns: Icterícia associada ao aleitamento materno – 2 tipos: - Icterícia pelo aleitamento materno: decorre pelo aleitamento inadequado (dificuldade de sucção ou pouca oferta láctea). Manifestações de ingesta láctea insuficiente: perda de peso > 7%, em alguns casos pode cursar com desidratação e hipernatremia. Isso ocorre pelo aumento da circulação entero-hepática e consequente sobrecarga ao hepatócito – icterícia na primeira semana de vida. Tratamento: Correção da técnica de amamentação e retorno do ganho ponderal. - Síndrome da icterícia pelo leite materno: o leite materno atua como modificador ambiental que reduz a atividade glicuruniltransferase (UGT1A1), comprometendo a conjugação hepática, neste caso mantendo a icterícia além da 1ª semana de vida, podendo atingir concentrações de BT entre 10 e 30mg/dL, entre 2 e 3 semanas de vida. Principal diferença do quadro de icterícia pelo aleitamento materno é o bom ganho ponderoestatural do RN. Em caso de dúvida, pode-se fazer o teste terapêutico, onde se retira o AM por 24 a 48 horas, havendo grande redução dos níveis de bilirrubina. No retorno a amamentação ocorre o retorno da icterícia (em menores níveis), se não interromper, ocorre diminuição gradualmente da icterícia, podendo persistir por até 10 semanas de vida. Doenças hemolíticas – causa imune, as mais significativas estão associadas ao antígeno D do grupo Rh (que define o Rh +) e aos antígenos associados ao sistema ABO. Causas hereditária: deficiência enzimática das hemácias (mais comum a deficiência da glicose-6-fosfato desidrogenase (G6PD), esferocitose (defeitos da membrana eritrocitária) e secundária a hemoglobinopatias (alfa-talassemia). Incompatibilidade RH: ocorre quando uma mãe antígeno D negativo (Rh -) tem um RN de antígeno D positivo (Rh +). O contato com o sangue com antígeno D positivo, ocorre produção de anticorpos maternos anti-D, que são do tipo IgM e não ultrapassam a barreira placentária. Em uma segunda gestação ocorre a produção de IgG que atravessa a barreira placentária, ligando-se as hemácias do RN, sendo identificados com teste de Coombs direto positivo, desencadeando hemólise intensa, originando anemia e reticulocitose. A doença hemolítica por esta incompatibilidade só ocorre quando a mãe foi previamente sensibilizada. Prevenção da sensibilização materna – CONDUTA: fazer o anti-D nas primeiras 72 horas do contato da mãe não sensibilizada) Coombs indireto NEGATIVO, com Rh POSITIVO - RN. Ex: pós-parto, pós-abortamento, gravidez ectópica ou mola, pós-amniocesntese, pós-sangramento durante a gestação e durante a gestação entre 28ª e 34ª semana se pai Rh POSITIVO. Incompatibilidade ABO: é a causa mais comum de doença hemolítica no RN. Para ocorrer à mãe deve ser do grupo sanguíneo O e o RN do grupo sanguíneo A ou B. Nesta situação pode ocorrer doença hemolítica na primeira gestação, pois naturalmente por fatores ambientais e microbianos, indivíduos do grupo O já produzem anticorpos anti-A e anti-B do tipo IgG. O Coombs direto pode ser positivo ou negativo, já o Coombs indireto e o teste do eluato em geral são positivos. OBS: Os testes de Coombs indireto, direto e eluato servem apenas para doenças hemolíticasIMUNES, sendo negativos para outras causas de hemólise. Deficiência enzimática da glicose-6-fosfato desidrogenase: é uma doença genética ligada ao cromossomo X. A G6PD é uma enzima responsável pela redução dos radicais livres de dentro das hemácias, na sua ausência ocorre hemólise aguda em situações de estresse oxidativo. Essa deficiência pode ocorrer após o uso de alguns medicamentos: dipirona, nitrofurantoína, sulfonamidas e sulfonas, glibenclamida, hidralazina, dentre outros. TRATAMENTO - Objetivo: impedir a neurotoxicidade associada a BI, pois esta é lipossolúvel e pode impregnar no SNC – Kernicterus. A BI circula ligada a albumina e situações que desloquem essa ligação como hipoalbuminemia, hipoglicemia e hipotermia aumentam as chances de impregnação central (maior quantidade de BI livre) Manejo terapêutico ditado por 4 fatores: dosagem de BT, IG e peso do nascimento, idade pós-natal e presença de fatores de risco para lesão bilirrubínica neuronal (IG ≤36 s, doença hemolítica, asfixia perinatal, sepse, acidose, albumina <3g/dL). Fototerapia: consiste na degradação da bilirrubina ao utilizar a energia luminosa absorvida pela epiderme e pelo tecido subcutâneo do RN. Mecanismo da ação da fototerapia: Sob a ação da luz, em especial no espectro de onda azul, a bilirrubina sofre reação fotoquímica com a formação de fotoisômeros configuracionais e estruturais, além de elementos foto-oxidantes, que são eliminados pela urina ou bile sem modificações metabólicas. Cuidados durante a aplicação da fototerapia: temperatura do RN (risco de hipo ou hipertermia), oferta hídrica (aumento das perdas insensíveis pela pele) e proteção dos olhos (cobertura radiopaca). Indicação e suspensão da fototerapia: leva-se em conta a dosagem periódica da BT, a idade gestacional e a idade pós-natal, além das condições agravantes da lesão bilirrubínica neuronal. Reavaliação dos níveis séricos de BT: a cada 4 – 8 horas. Avaliação clínica e a medida transcutânea não são recomendadas, pois a exposição a luz altera a coloração da pele do RN ictérico. A Bilirrubina sérica deve ser reavaliada em 12 – 24 horas após a suspensão para detecção de rebote. Uma vez que a bilirrubina eleva-se naturalmente nos primeiros cinco dias de vida e difere de acordo com a idade gestacional, sugerimos valores de BT (mg/dL) para suspensão da fototerapia: Até o quinto dia de vida: - RN ≥38 semanas, suspender se BT ≤11,5 mg/dL - RN entre 35 e 37 semanas, suspender se BT ≤ 9,5 mg/dL - RN <35 semanas, suspender se valor de BT 2mg/dL inferior ao nível de indicação de fototerapia A partir do 5º dia de vida: - RN ≥35 semanas, suspender se BT ≤ igual a 14 mg/dL - RN < 35 semanas, suspender se valor de BT 2mg/dL inferior ao nível de indicação de fototerapia para a IG corrigida O tempo de aplicação da fototerapia depende da etiologia da icterícia, da idade gestacional, da idade pós-natal e do equipamento utilizado. Em média um RN ≥35 semanas sem doença hemolítica permanece em fototerapia em torno de 24 a 36 horas. Principais efeitos adversos: distúrbios da temperatura, perda de líquido corporal e dano à retina. Imunoglobulina humana (gamaglobulina) – preparação que contém anticorpos específicos contra diversas infecções e pode ser utilizada em várias situações, tento na prevenção de infecções como para neutralizar a ação de toxinas e suprimir uma resposta inflamatória exagerada. É um tratamento complementar para a hiperbilirrubinemia causada por doença hemolítica imune. Mecanismo de ação: atua ligando-se aos receptores Fc do sistema reticuloendotelial para impedir o reconhecimento dos anticorpos ligados as hemácias fetais, reduzindo a hemólise. É indicada quando a BT apesar do uso de fototerapia intensiva ou quando a BT se aproxima 2 a 3 mg/dL do nível de indicação para exsanguineotransfusão. Exsanguineotransfusão - A principal indicação é por conta da doença hemolítica grave por incompatibilidade Rh (com o objetivo de reduzir a hiperbilirrubinemia, reduzir a intensidade da hemólise pela remoção dos anticorpos maternos e corrigir a anemia). Possui alta morbidade, devido a possíveis complicações metabólicas (principal hipocalcemia), hemodinâmicas, infecciosas, vasculares, hematológicas, reações pós-transfusionais e enxerto-hospedeiro. É pouco utilizado, devido ao uso de fototerapia. O procedimento necessita de um acesso calibroso exclusivo, preferencialmente central, que infunda e reflua bem. Quando o RN tem estabilidade hemodinâmica e a hemoglobina é > 10g/dL, são realizadas trocas com duas volemias (2 x 80mL/kg), sendo o volume de 2/3 de CH e 1/3 de PFC. Recomenda-se a utilização de concentrado de hemácias sob coleta inferior a sete dias, filtrado e irradiado. Complicações da hiperbilirrubinemia indireta A mais temida é a encefalopatia bilirrubínica, que decorre da lesão cerebral por concentrações elevadas de BI, acometendo principalmente os gânglios da base e os núcleos do tronco encefálico. Quanto maior o nível sérico de BI, maior a chance do RN evoluir para encefalopatia bilirrubínica aguda (não existe um período de corte, para ocorrer lesão cerebral, sendo variável de RN p/ RN), que se apresenta em RN de ≥35 semanas de IG, podendo dividir em fases: Fase 1 (primeiros 1-2 dias): hipotonia, com perda do reflexo de moro, sucção débil, convulsões Fase 2 (entre 4-5 dias): progressão para hipertonia dos músculos extensores, opistótono ou retroarqueamento do tronco, hipertermia, convulsões e choro agudo (estridente) - nessa fase, 70% dos RN podem evoluir para o óbito. Fase 3 (após 1 semana): Ocorre melhora dos sintomas, porém 2-3 meses depois aparece discreta hipertonia e aparecem as sequelas neurológicas: paralisia cerebral espástica, movimentos atetoides, distúrbios de deglutição e fonação, deficiência auditiva grave e mental leve a moderada. Após esta progressão, por volta do 3ª ano de vida geralmente ocorre o Kernicterus cujo é retrospectivo, com história de hiperbilirrubinemia neonatal e avaliação clínica criteriosa com achados característicos na ressonância magnética, descartando-se outras possíveis etiologias (hipersinal bilateral e simétrico no globo pálido). Alta taxa de mortalidade. Aos que sobrevivem geralmente possuem deficiência auditiva e sequelas neurológicas irreversíveis. Tétrade clínica: Paralisia cerebral atetoide grave, neuropatia auditiva, paresia vertical do olhar e displasia dentária. Já os RN com ≤ 32 semanas de IG, não desenvolvem sinais clássicos de encefalopatia bilirrubínica aguda devido à provável mielinização incompleta dos neurônios. Há relatos de aumento de episódios de apneia com bradicardia e maior necessidade de suporte respiratório e do uso de xantinas nas duas primeiras semanas de vida. Hiperbilirrubinemia direta no período neonatal Caracterizada por BD > 1mg/dL se BT < 5mg/dL ou BD >20% da BT se BT >5mg/dL. Geralmente estão elevadas nos casos de colestase neonatal, que possuem uma série de diagnósticos diferenciais de acordo com a localização anatômica da obstrução ao fluxo biliar – intra ou extra-hepáticas. A colestase pode estar presente ao nascimento ou desenvolver-se nos primeiros 2 meses de vida. Manifestações clínicas: Icterícia persistente – tom mais esverdeado, hipocolia ou acolia fecal, colúria. Pode ocorrer em lactentes sangramentos devido à deficiência de vitamina K ou outros fatores de coagulação. Achados neurológicos como letargia, irritabilidade, convulsões, má aceitação alimentar podem indicar sepse ou outras doenças metabólicas. Hepatomegalia é frequente. Avaliar todo RN com icterícia persistente após duas semanas de vida para colestase neonatal. Laboratório: BT e frações, AST, ALT, fosfatase alcalina, GGT, albumina e tempo de protrombina). Se confirmado colestase por elevação de BD, fazer avaliação complementar, visando causas que necessitem de intervenção precoce. A atresia de vias biliares é a causa mais comum: decorre de um processo inflamatório idiopático que resulta em obliteração progressiva dos ductos biliares. A estase provoca trombos biliares, iniciando um processo inflamatório com proliferaçãoductal, progredindo para fibrose periportal, o tecido fibrótico altera o fluxo intra-hepático, causando obstrução do fluxo portal e consequente hipertensão portal, além de necrose dos hepatócitos, cuja regeneração da inicio ao processo de cirrose biliar. A forma mais comum é a perinatal (70-85% dos casos), que cursa com atresia biliar isolada, sem causa conhecida, podendo ter como fator desencadeante infecções virais. Outra forma é a embrionária, que esta associada a malformações. Referências: DE ALMEIDA, Maria Fernanda Branco; DRAQUE, Cecilia Maria. SOCIEDADE BRASILEIRA DE PEDIATRIA DEPARTAMENTO DE NEONATOLOGIA.
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