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GRATUITA Esta publicação não pode ser comercializada IDENTIFICAÇÃO E ENFRENTAMENTO DAS BARREIRAS FÍSICAS E CULTURAIS PARA ACESSIBILIDADE Regina Helena Tahim Souza Neiva Hélvio Felicianio Moreira 8 Todos os direitos desta edição reservados à: Fundação Demócrito Rocha Av. Aguanambi, 282/A - Joaquim Távora CEP: 60.055-402 - Fortaleza-Ceará Tel.: (85) 3255.6037 - 3255.6148 fdr.org.br | fundacao@fdr.org.br Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) de acordo com ISBD P967 Inclusão Social Através do Esporte / vários autores ; organizado por Ricardo Catunda ; ilustrado por Guabiras. - Fortaleza : Fundação Demócrito Rocha, 2021. 192 p. : il. ; 26cm x 30cm. – (Inclusão Social Através do Esporte ; 12v.) Inclui bibliografia e apêndice/anexo. ISBN: 978-85-7529-972-2 (Coleção) ISBN: 978-85-7529-980-7 (Fascículo 8) 1. Esporte. 2. Inclusão Social. 3. Políticas Públicas. 4. Educação Física. 5. Educação Inclusiva. 6. Esporte Inclusivo. 7. Estratégias Pedagógicas. 8. Acessibilidade. 9. Esporte Adaptado. I. Catunda, Ricardo. II. Guabiras. III. Título. IV. Série. CDD 796.0456 2021-3267CDU 796:364 Elaborado por Vagner Rodolfo da Silva - CRB-8/9410 Índice para catálogo sistemático: Esporte : Inclusão Social 796.0456 Esporte : Inclusão Social 796:364 Copyright © 2021 Fundação Demócrito Rocha FUNDAÇÃO DEMÓCRITO ROCHA (FDR) Presidência Luciana Dummar Direção Administrativo-Financeira André Avelino de Azevedo Gerência Geral Marcos Tardin Gerência Editorial e de Projetos Raymundo Netto Gerência Canal FDR Chico Marinho Gerência Marketing & Design Andrea Araujo Análise de Projetos Aurelino Freitas e Fabrícia Góis Edição de Mídias Isabel Vale UNIVERSIDADE ABERTA DO NORDESTE (UANE) Gerência Pedagógica Viviane Pereira Coordenação de Cursos Marisa Ferreira Design Educacional Joel Lima Front End Isabela Marques INCLUSÃO SOCIAL ATRAVÉS DO ESPORTE Concepção e Coordenação Geral Valéria Xavier Coordenação de Conteúdo Ricardo Catunda Coordenação Editorial e Revisão Daniela Nogueira Projeto Gráfico e Edição de Design Andrea Araujo Design Miqueias Mesquita Estagiária Design Kamilla Damasceno Ilustração Guabiras Analista de Projetos Juliana Montenegro Análise de Marketing Digital Fábio Júnior Braga Estratégia e Relacionamento Adryana Joca Apoio Secretaria do Esporte e Juventude do Ceará | Lei de Incentivo ao Esporte do Ceará | Conselhos Federal e Regionais de Educação Física | Universidade Estadual do Ceará Patrocínio Enel Realização Uane | FDR Este fascículo é parte integrante do projeto Inclusão Social Através do Esporte, viabilizado por meio da Lei Estadual de Incentivo ao Esporte, Lei nº 15.700 de 20 de novembro de 2014, CAP nº 25. Apresentação 1. Conceitos e terminologias 2. Marco legal da acessibilidade 3. Pessoas com deficiência e o acesso aos espaços 4. Possibilidades de práticas esportivas Conclusão Referências 116 117 119 122 124 126 127 Sumário Apresentação As discussões referentes às pessoas com deficiência foram impulsionadas no mundo após a Segunda Guerra Mun-dial. Dentre as diversas causas para que isso ocorresse, estava o significativo número de soldados lesionados e que tiveram sequelas motoras, sensoriais, psicológicas e afetivas. Foi daí também que surgiram as primeiras iniciativas de prática espor- tiva para esse público; ocorreram no Hospital de Stoke Mandeville, na Inglaterra. Daquela época até os dias atuais, o que de fato foi feito para viabilizar a participação das pessoas com deficiência no esporte? Em termos de acessibilidade e mobilidade, o que realmente avançou ou que ainda precisa ser pensado e mudado no sentido de viabilizar o ir e vir dessas pessoas no contexto social? Ao fim deste fascículo, você será capaz de compreender a defi- nição do termo pessoas com deficiência e identificar o significado de acessibilidade, mobilidade, inclusão, adaptação razoável, barreiras físicas, além de perceber a importância da acessibili- dade para que as pessoas com deficiência possam exercer o seu direito à prática esportiva. 116 | FUNDAÇÃO DEMÓCRITO ROCHA - UNIVERSIDADE ABERTA DO NORDESTE Conceitos e terminologias A Convenção da Organização das Nações Unidas - ONU sobre os Direitos das Pessoas com Defi-ciência foi assinada em Nova York em 30/3/97 e ratificada em 9/7/2008 pelo Brasil – já que o país é signatário, e, portanto, ela se incorpora à nossa Constitui- ção. Conforme a Convenção, a forma correta de se referir a uma pessoa com deficiência seria de acordo com a deficiência que ela apresenta: pessoa com deficiência motora ou física, em vez de cadeirante; pessoa com deficiência sensorial, em vez de cego ou surdo; pessoa com deficiência múltipla, quando associa mais de uma deficiência; pessoas com deficiência intelectual ou men- tal e deficiência orgânica. Foram abolidas expressões como portador de necessidades especiais, portador de deficiência, pessoa especial e – pasmem – inválidos, aqueles que não têm valor para a sociedade, dentre outras denominações. 1 O conceito de pessoa com deficiência, segundo a Convenção, é a pessoa que apre- senta, em caráter permanente ou tempo- rário, perdas ou reduções de sua estrutura ou função fisiológica, anatômica, mental ou sensorial, que gerem incapacidade para certas atividades, conforme padrões de comportamento e valores culturais. A Convenção da Pessoa com Deficiência completou 15 anos em 2009, comemorado com uma Conferência Mundial em Educa- ção Inclusiva, em Salamanca, na Espanha. Na ocasião, ao comparar o Brasil com os outros países, não estávamos tão atrasados assim na execução de políticas públicas de inclusão dessas pessoas na sociedade. No entanto, hoje, olhando para nós mesmos, 12 anos depois, o avanço se dá de forma muito lenta, tanto na aceitação da socie- dade quanto na aceitação das empresas, no sentido do acolhimento escolar, social, laboral e de apoio às atividades esportivas. São poucas e burocráticas as formas de conseguir as bolsas para os paratletas, e são insuficientes as investidas do corpo peda- gógico em inseri-los nas escolas, bem como do oferecimento de vagas pelas empresas, dentro do conceito de trabalho decente e/ ou de emprego apoiado. Mas o que significa mesmo trabalho decente (Fonte: http://www.ipea.gov.br, 2006)? É o trabalho adequadamente remu- nerado, exercido em liberdade, equidade e segurança, capaz de garantir vida digna. O emprego apoiado é uma metodologia que visa à inclusão no mercado competitivo de trabalho de pessoas em situação de deficiên- cia mais significativa. Compreende ações de assessoria, orientação, acompanhamento personalizado, dentro e fora do local de tra- balho, realizada por profissionais laborais e profissionais especializados. A modalidade respeita e reconhece suas escolhas, interes- ses, pontos fortes e necessidades de apoio. A Lei Brasileira de Inclusão (LBI), em seu Art. 53, Lei nº 13.146, aprovada em 6/7/2015, ratifica o conceito de desenho universal no que se refere à concepção e à implementação de projetos arquitetônicos e urbanísticos que não atendam somente as pessoas com deficiência, mas também as que têm mobi- lidade reduzida, de forma autônoma, segura e confortável. A construção, a reforma ou a ampliação de edificações de uso público ou coletivo devem, necessariamente, ser execu- tadas de modo a viabilizar a acessibilidade das pessoas com mobilidade reduzida, que são aquelas que, temporária ou permanen- temente, têm limitada sua capacidade de relacionar-se com o meio e de utilizá-lo. São elas: gestantes, obesos, pessoa com deficiên- cia visual com cão-guia, pessoa usando ben- gala, pessoa conduzindo carrinho de bebê, pessoa em cadeira de rodas, pessoa usando um andador e pessoas usando muletas. INCLUSÃO SOCIAL ATRAVÉS DO ESPORTE | 117 E o que seriam as barreiras arquite- tônicas? É qualquer entrave ou obstáculo existente no entorno ou no interior das edificações de uso público e coletivo e no entorno e nas áreas internasde uso comum nas edificações de uso privado multifamiliar que impede ou dificulta o acesso e/ou a circulação das pessoas. Em contraponto à acessibilidade, vai além dos espaços físicos e engloba também o acesso e o entendimento de serviços de informação, documentação e comunicação, por parte da pessoa com deficiência ou com mobilidade reduzida. Como as cidades não nasceram pensa- das para esse olhar inclusivo, existe também o que chamamos de adaptação razoável, que é uma modificação e um ajuste neces- sário e adequado que não acarretam ônus desproporcional ou indevido, quando reque- ridos em cada caso, a fim de assegurar que as pessoas com deficiência ou com mobi- lidade reduzida possam gozar ou exercer, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas, todos os direitos humanos e liberdades fundamentais. As barreiras atitudinais são todo com- portamento ou atitude frente a uma pessoa com deficiência que impeça ou prejudique a participação social dessa pessoa em igual- dade de condições e oportunidades com as demais. Dentro do que são essas barreiras, o uso de rótulos e termos pejorativos já foram e continuam sendo usados, dentro de uma escala menor. O capacitismo é isso, um preconceito exacerbado com as pessoas com deficiência achando que elas não são capazes de trabalhar e de cuidar da própria vida. Saiba mais Não devemos usar certas expressões ao depararmos com pessoas com deficiência: “Nossa! É tão bonito, nem parece que tem problema”, “Quando penso em reclamar, me lembro de você”, “Você tem um filho especial porque você é especial”, “Ora baixinho no ouvido dele que Deus cura”, “Uau, que inteligente”. 118 | FUNDAÇÃO DEMÓCRITO ROCHA - UNIVERSIDADE ABERTA DO NORDESTE Marco legal da acessibilidade 2 Você já parou para observar a arquitetura de sua moradia? Já observou altura, tamanho e largura das portas da sala, dos quartos, dos banheiros e demais lugares? E a altura e a largura dos degraus? Você já deparou com o uso dos diferentes espaços de sua moradia em decorrência de alguma lesão de pernas ou braços ou mesmo de algum problema momentâneo de saúde? E as observações na cidade em que habita? Já reparou nas calçadas e nos obstáculos presentes nas fachadas dos edifícios, no interior dos meios de transporte, nas portas dos bancos, nas praças públicas? Perceber esses detalhes é importante para compreender a relação entre a prática esportiva e a vida em sociedade e o direito de ir e vir das pessoas com deficiência. O contexto histórico e social dessas pes- soas foi marcado por fases distintas ao longo dos anos. O primeiro cenário foi o da segre- gação, em que elas eram privadas do acesso aos bens socialmente construídos e ficavam isoladas do mundo exterior. De acordo com relatos históricos, ficavam isolados dentro do ambiente familiar, como ainda hoje vemos em algumas residências pelo Brasil. No contexto de evolução da sociedade, surge o segundo momento, que é o pro- cesso de integração, caracterizado pela necessidade de convívio das pessoas com deficiência com a sociedade. Em tese, nada se muda; o que se altera é a aceitação dessas pessoas para o acesso do jeito que o cenário social impõe. O terceiro cenário aparece como divisor de águas e que muda completamente as relações entre as pessoas com deficiência e a sociedade. Estamos nos referindo ao processo de inclusão em que a sociedade é que tem a obrigatoriedade de mudar e de favorecer o acesso às pessoas com defi- ciência aos bens socialmente construídos. Neste cenário surgem as rotas acessíveis, o rebaixamento de calçadas, o piso tátil, os banheiros adaptados, as rampas de acesso, o intérprete de língua brasileira de sinais, o descritor de imagens, as legendas audiovisu- ais, a adaptação da prática de determinadas modalidades esportivas, entre outros avan- ços em infraestrutura e tecnologia. Mas esses três contextos citados acima ainda estão presentes no cotidiano das pessoas com deficiência? Num exercício de reflexão, você acredita que a sua cidade está preparada para assegurar às pessoas com deficiência a oferta e o acesso aos mais variados locais? Para compreender esse contexto, refletiremos sobre o marco legal que norteia as políticas públicas de atenção às pessoas com deficiência. INCLUSÃO SOCIAL ATRAVÉS DO ESPORTE | 119 Saiba mais Rotas acessíveis são definida pela NBR 9050:2020 como trajeto contínuo, desobstruído e sinalizado, que conecta os ambientes externos e internos de espaços e edificações, que possa ser utilizado de forma segura e autônoma por todas as pessoas, incluindo-se as com deficiência ou mobilidade reduzida. Perceber a deficiência como resultado da ausência ou carência de políticas públicas contribui para minimizar ou atenuar distorções a respeito das potencialidades das pessoas com deficiência. Equidade e oportunidade são pontos chave para alcançar que direitos sejam efetivados a esse público. FONTE: http://www.planalto. gov.br/ccivil_03/_ato2015- 2018/2015/lei/l13146.htm Imagine as dificuldades das pessoas com deficiência em lidar com a arquitetura das casas, com as edificações urbanas, com os meios de transporte, com o transitar nas calçadas, com o acesso aos órgãos públicos e privados; em ter de enfrentar uma série de dificuldades cotidianas para poder estudar, praticar esportes, cuidar de sua saúde, de poder ir ao supermercado, à padaria, enfim, de resolver problemas de ordem pessoal, dentre outras situações. Desde o término da Segunda Guerra Mundial, diferentes áreas do conhecimento procuram soluções científicas e tecnoló- gicas com o objetivo de tornar a vida das pessoas com deficiência mais inclusiva, participativa e com maior interação social. Os progressos das áreas da medicina, da fisioterapia, dos esportes, da assistência social, da mobilidade urbana, dos trans- portes, da assistência social, da psicologia, da tecnologia assistiva estão contribuindo para a melhoria da qualidade de vida e promoção de saúde dessas pessoas. Com referência ao marco legal e à legisla- ção vigente, observa-se que avanços foram realizados no tocante ao direito de ir e vir das pessoas com deficiência. As legislações que regem as questões da acessibilidade repre- sentam avanços na concepção da inclusão, da igualdade e da oportunidade de as pes- soas com deficiência utilizarem espaços, equipamentos e ambientes construídos. Na medida em que barreiras físicas, ambientais, atitudinais e de comunicação são reduzidas, as pessoas com deficiên- cia tornam-se mais empoderadas quanto ao uso dos espaços sociais, facilitando a melhor interação com a sociedade que os cerca e o ambiente. Entretanto, a realidade nos mostra outro cenário. São percebidas diversas barreiras arquitetônicas no ambiente, dificuldades no campo da comunicação, nas práticas atitu- dinais das pessoas, dentre outros fatores. No contexto da prática esportiva, também são observadas barreiras físicas, culturais e atitudinais, como o baixo incentivo à prática do paradesporto e o número reduzido de centros de treinamento acessível. A legislação brasileira aponta para a adoção de medidas estruturantes a fim de assegurar que as pessoas com deficiência tenham acesso às instalações esportivas, recreativas e culturais. O art. 30 da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência da ONU preco- niza que os espaços devem ser acessíveis, sem barreiras e obstáculos que dificultam a livre circulação e o acesso das pessoas com deficiência ou mobilidade reduzida. As estruturas devem evitar que barreiras físicas e de comunicação dificultem o acesso e a permanência nos espaços esportivos. Os projetos estruturantes devem garantir condições suficientes de acessibilidade e mobilidade de forma a viabilizar a maior autonomia das pessoas com deficiência na utilização dos diferentes espaços de prática esportiva. Nos anos 2000, surge o Comitê de Acessibilidade da Associação Brasileira de Normas Técnicas/ABNT,quando ocorre a ampliação das discussões referentes à acessibilidade das pessoas com deficiência no contexto social. Outro importante documento foi o Decreto nº 5.296/2004, conhecido como a Lei da Acessibilidade. Esse decreto se destaca pelo fato de a acessibilidade ter sido colocada como ponto chave nas dis- cussões sobre a inclusão das pessoas com deficiência nos segmentos e nas atividades da sociedade. A deficiência não se resume apenas a características físicas da pessoa. Aspectos ambientais se somam às barreiras de ordem física e atitudinal que limitam o uso e o acesso das pessoas com deficiência e com mobilidade reduzida. 120 | FUNDAÇÃO DEMÓCRITO ROCHA - UNIVERSIDADE ABERTA DO NORDESTE Avanços na legislação propuseram estu- dos, pesquisas e documentos interessantes e que objetivam nortear a construção de estruturas físicas e urbanas compatíveis com a mobilidade. Qualquer elemento natural, instalado ou edificado, que impeça a transferência ou a circulação no espaço, mobiliário ou equipamento urbano, define barreiras arqui- tetônicas, urbanística ou ambiental (Fonte: Doc. CREA-MG, 2006). Os Símbolos Internacionais de Acesso (SAI) têm sua parcela de importância quando falamos em desenho universal. A colocação do SIA para indicação de acessibilidade deve ser utilizada para identificar todos os locais que têm condições de acesso por pessoas com deficiência e com mobilidade reduzida, tais como: sinalização nas portas indicando um banheiro mais espaçoso e que possa ter um giro de uma cadeira de rodas, SIA para deficientes visuais, SIA para deficientes auditivos e sinalização tátil no piso, para orientação de deficientes visuais, com indi- cações de piso tátil de alerta e direcional etc. Mesmo com os avanços na legislação, observa-se que as instalações esportivas são insuficientes e não atendem às neces- sidades de acessibilidade e mobilidade para as pessoas com deficiência, já que são complementares ao direito de ir e vir dessas pessoas, e a ausência ou carência de alguma delas afeta a presença ativa das pessoas com deficiência no contexto social. A acessibilidade arquitetônica é condição imprescindível para que a pessoa ocupe os espaços de forma segura e autônoma e sua carência afeta a presença ativa das pessoas com deficiência em ambientes sociais. No Brasil, a Lei Brasileira de Inclusão (LBI) foi sancionada em 2015 e traz um novo conceito de deficiência como o resultado da interação da carência de serviços públicos associado às barreiras impostas pelo meio social, mostrando que a deficiência está no meio, e não no indivíduo. A LBI destaca que as cidades devem elaborar planos de rotas acessíveis de forma a garantir a acessibilidade das pessoas com deficiência aos diferentes serviços, incluindo os de esporte e de cultura. INCLUSÃO SOCIAL ATRAVÉS DO ESPORTE | 121 3 Segundo o Mobilize Brasil, portal que produz conteúdos sobre a mobilidade urbana sustentável, Fortaleza estava, em 2019, na posição de 2ª capital com pior acessibili- dade, perdendo somente para Belém (PA). Acredita-se que essa situação melhorou um pouco depois da intervenção em algumas avenidas que dividem sua circulação entre pessoas e transportes motorizados. Assim como fizemos com o modal cicloviário, devemos nos preocupar com a acessibili- dade das vias públicas. A legislação é clara sobre a acessibi- lidade das calçadas. No entanto, ainda há desconhecimento da população sobre regras e responsabilidades, pouca fisca- lização e pouca vontade política de fazer valer a lei. As calçadas foram pensadas para os pedestres, mas deparamos constante- mente com carros usando as calçadas para estacionamento e os pedestres tendo de usar a rua para se locomover. Pessoas com deficiência e o acesso aos espaços Os elementos de composição das calça- das são: faixa livre e faixa de serviço. A lar- gura de faixa livre deve ter no mínimo 1,50m e, quando a calçada tiver menos de 2,10m, será permitida a largura mínima de 1,20m e na vertical 2,00m de altura para placas de sinalização e 2,10m desimpedidos, sem obstáculos, inclusive de galhos que possam interferir o trânsito dos pedestres. A faixa de serviços se destina a mobiliário urbano, serviços, sinalização vertical, vegetação, áreas gramadas, ajardinadas ou destinadas à arborização, rebaixo das guias para acesso de veículos, posteamentos, semáforos, caixas de luz e força, telefones, hidrantes, paraciclos ou similares para a travessia do pedestre. Deve ter largura mínima de 0,80m, contados a partir da borda do meio-fio. 122 | FUNDAÇÃO DEMÓCRITO ROCHA - UNIVERSIDADE ABERTA DO NORDESTE Saiba mais As bengalas vermelhas usadas pelos deficientes visuais indicam que eles, além dessa deficiência, têm deficiência auditiva. As bengalas verdes são mais indicadas pelos que têm baixa visão. A acessibilidade em teatros, cinemas e praças passa inicialmente pelas calçadas do entorno. Quanto aos cinemas e teatros, além de deixar espaços livres na primeira fila, devemos nos preocupar com cadeiras para obesos, rampas de acesso com a inclinação correta e o uso de corrimãos para auxiliar as pessoas com mobilidade reduzida e uso de bengalas ou muletas. O art. 215 da Constituição Federal dispõe sobre as garantias às pessoas com defici- ência: “O Estado garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes de cultura nacional, e apoiará e incentivará a valorização e a difusão das manifestações culturais”. Dessa forma, sig- nifica permitir que pessoas com deficiência participem de atividades, que incluem o uso de produtos, serviços e informações. Portanto, fica notória a obrigatoriedade de ter nos espetáculos, cinemas e mostras cul- turais as janelas para intérpretes de libras, ou que se faça ao vivo, com audiodescrição, legendagens e legendagens descritivas. Quanto aos ginásios e estádios para a prática esportiva, quando se fala em local para assistir a algum jogo ou exibição de outro esporte, nos vêm sempre à cabeça as arquibancadas. Fica sempre a dúvida de como acessá-las. Mas cada caso é único e existem estádios mais modernos que se preocuparam com essa questão destinando espaços e disponibilizando elevadores. É notória a necessidade de uma ampla campanha publicitária de cunho educativo para conscientizar a população da impor- tância da acessibilidade nas calçadas e a responsabilidade dos proprietários de imóveis com suas próprias calçadas, como divulgar no boleto do IPTU, um banner no site no caso de emissão de boleto eletrônico, dentre outras ações. INCLUSÃO SOCIAL ATRAVÉS DO ESPORTE | 123 Saiba mais As deficiências físicas, intelectuais e visuais são reconhecidas pelo comitê paralímpico internacional e fazem parte dos jogos paralímpicos. A deficiência auditiva tem estrutura organizacional própria, não fazendo parte, portanto, dos Jogos Paralímpicos. Possibilidades de práticas esportivas 4 Imagine uma pessoa saudável, proativa e com uma vida social tranquila e que, de repente, se vê impossibilitada de continuar fazendo sua rotina de vida por ter sofrido um acidente ou moléstia grave? Da rotina habitual para a recuperação hospitalar, do correr para uma cadeira de rodas, do enxergar para uma bengala, da autoestima para a depressão, das alegrias para as incertezas, do dinamismo à apatia, do entusiasmo ao desânimo. Ficam as perguntas: e agora, o que fazer? Desistir ou procurar formas de reequilibrar perdas? Em que medida a prática esportiva pode contribuir para a ressocialização das pessoas com deficiência? Qual é o papel da família neste contexto? E qual seria o papel das políticas públicas? A prática esportiva para as pessoas com deficiência são atividades essenciais na medida em que promovem qualidade de vida e promoção de saúde. A equiparação de oportunidades de prática pressupõe a adoção de instalações, equipamentos e acesso aos diferentes espaços sem barreiras físicas, sem obstáculos e com segurançaa ginásios, quadras poliesportivas, pista de atletismo, arenas esportivas etc. Então, ficam as perguntas: a prática esportiva para as pessoas com deficiência pode favorecer a melhoria da qualidade de vida e a promoção de saúde? A pes- soa com deficiência, ao se envolver na prática esportiva, faria a transição do “incapaz” para o “apto” ou do “doente” para o “saudável”? 124 | FUNDAÇÃO DEMÓCRITO ROCHA - UNIVERSIDADE ABERTA DO NORDESTE A prática esportiva não seria uma pana- ceia e, sim, uma ferramenta importante de inclusão social. Deve ser incluída nos pro- gramas de reabilitação, deve fazer parte dos grupos intersetoriais das políticas públicas e deve ser valorizada quanto aos aspectos da reabilitação médica, psicológica e social. A possibilidade da prática esportiva pode ser entendida como um processo de emancipação, autonomia e independência. Na prática esportiva, o indivíduo é o pro- tagonista de suas ações; contudo, para se tornar realidade, esse processo demanda acessibilidade e mobilidade de maneira a facilitar que a inclusão de fato aconteça. É importante e necessário destacar a necessidade de espaços de prática espor- tiva com rampas de acesso, com banheiros acessíveis, com piso tátil, com portas dentro Saiba mais As deficiências físicas, intelectuais e visuais são reconhecidas pelo comitê paralímpico internacional e fazem parte dos jogos paralímpicos. A deficiência auditiva tem estrutura organizacional própria, não fazendo parte, portanto, dos Jogos Paralímpicos. da legislação de forma a facilitar a entrada dessas pessoas nos espaços, com elevador, com bebedouros acessíveis etc. Você já observou nos locais de prática esportiva a presença de acessibilidade e mobilidade nos espaços? Ou, ao contrário, observou barreiras físicas, tais como objetos postos no caminho, portas de banheiros com largura pequena, degraus em vez de rampas? A peculiar característica geográfica do Brasil, a topografia, as suas diferentes regiões, os variados climas, relevos etc. impedem ou dificultam a consolidação do paradigma inclu- sivo e acessível às pessoas com deficiência. Por outro lado, o marco legal brasileiro aponta para que, de fato, sejam feitas cons- truções sob o prisma do desenho universal e, na sua impossibilidade, da implementação da adaptação razoável. INCLUSÃO SOCIAL ATRAVÉS DO ESPORTE | 125 Conclusão Pensar em inclusão de pessoas com deficiência é investir em tecnologias, em pesquisas, em formação profissional, em infraestrutura, em logística e em produtos e serviços que atendam as peculiaridades, especificidades e necessidades dessas pes- soas bem como trabalhar para a equidade de oportunidades para todos os cidadãos. Sabe-se que investir em acessibilidade, em desenho universal e em mobilidade potencializa a autonomia e a independência das pessoas com deficiência e com mobi- lidade reduzida. Na prática esportiva os investimentos se traduzem na melhoria da qualidade de vida e na promoção de saúde. É preciso estar vigilante e atento a todas as práticas que reforçam as barreiras e os obstáculos à inclusão social dessas pessoas e consolidar todas as experiências de sucesso que se traduzem em ganhos nos aspectos pessoais, familiares, profissionais e social. O papel dos conselhos estaduais e muni- cipais é também estar vigilante para este aspecto, sempre na defesa dos direitos das pessoas com deficiência, cobrando dos órgãos públicos o cumprimento da Con- venção, da LBI e da Lei da Acessibilidade para dar a todos as mesmas oportunidades e experiências de vida. No Brasil é o Comitê Paralímpico Brasileiro (CPB) a entidade responsável pela gestão do desporto paralímpico. São, atualmente, 24 modalidades oferecidas às pessoas com deficiência. As modalidades do atletismo e da natação são gerenciadas pelo CPB enquanto as demais modalidades são desenvolvidas pelas respectivas confederações nacionais. Em termos quantitativos, o atletismo e a natação são as modalidades que têm o maior número de praticantes no país. No Ceará existe um projeto que é pio- neiro nas regiões Norte e Nordeste, que é o Centro de Profissionalização Inclusiva para Pessoas com Deficiência (Cepid). Oferece um espaço de quase 3.000m² com todos esses itens de acessibilidade. Foi construído em 2013, dentro do desenho universal, e é direcionado para capacitação e inserção de pessoas com deficiência no mercado de tra- balho e para o esporte de alto rendimento. Trata-se de um equipamento custeado pelo Governo do Estado, por meio da Secreta- ria de Proteção Social, Justiça, Cidadania, Mulheres e Direitos Humanos (SPS), tendo suas ações totalmente gratuitas. Assim como o Cepid, o Comitê Para- límpico Brasileiro foi projetado dentro do conceito de desenho universal e oferece aos atletas paralímpicos condições de acesso e permanência no espaço. O que existe de concreto nos dias atuais é que a prática esportiva para as pessoas com deficiência contribui para ganhos nos aspectos da autoestima, das melhorias fisiológicas e metabólicas, do prazer, da disposição para a vida em sociedade, para a inserção no mercado de trabalho e geração de renda e, sobretudo, para a autonomia e a independência. O Brasil conquistou 19 medalhas nas Olímpiadas do Rio em 2016, sendo 7 de ouro, 6 de prata e 6 de bronze. Nas Para- limpíadas, o Brasil conseguiu 72 meda- lhas, sendo 14 de ouro, 29 de prata e 29 de bronze. São mais de 24 modalidades espor- tivas paralímpicas e existem regras para todas as modalidades. O treino é realizado para as pessoas com as mesmas deficiên- cias ou deficiências similares, divididas por categorias. Será que é mais fácil? Será que não tem a ver com treino e determinação? Reflita Existem esportes que são praticados exclusivamente por certos tipos de deficiência, como é o goalball, para deficientes visuais. Para saber mais, acesse: www.cpb.org.br 126 | FUNDAÇÃO DEMÓCRITO ROCHA - UNIVERSIDADE ABERTA DO NORDESTE Referências ABNT. Associação Brasileira de Normas Técnicas. Acessibilidade a edificações, mobiliário, espaços e equipamentos urbanos. NBR 9050:2020. 4ª edição. 147 páginas. ISBN 978-65-5659-371-3. Acesibilidad en la practica deportiva de las personas con discapacidad: diagnostico. Comité Espanol de Representantes de Personas con Discapacidad. Ediciones Cinca. Primera Edición: Diciembre, 2018. BRASIL. Decreto nº 5.296 de 02 de dezembro de 2004. Presidência da República. Secretaria Geral. Subchefia para Assuntos Jurídicos. www. planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2004/Decreto/D5296.htm BRASIL. Lei nº 13.146 de 06 de julho de 2015. Institui a Lei Brasileira de Inclusão. Presidência da República. Secretaria Geral. Subchefia para Assuntos Jurídicos. www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015- 2018/2015/lei/l13146.htm CREA-MG. Guia de Acessibilidade em Edificações: fácil acesso para todos. Belo Horizonte, MG. 2006. 2ª ed. 64p. DOS SANTOS, I. Acessibilidade projetada e acessibilidade real {manuscrito}: avaliação com base no retorno de experiência de pessoas com deficiência. Dissertação de mestrado. Universidade Federal de Minas Gerais – Escola de Arquitetura. 132 fls, 2018. MONTENEGRO, N. G.S. D.; SANTIAGO, Z. M. P.; SOUSA, V. C. de. Guia de Acessibilidade: Espaço Público e Edificações. Fortaleza: SEINFRA, 2009. OLIVEIRA, D. S.. Acessibilidade e interação social {manuscrito}: comportamento social em face de problemas de mobilidade no Parque Ecológico da Pampulha. Dissertação de mestrado – Universidade Federal de Minas Gerais, Escola de Arquitetura, 192f, 2013. PICCELI, A. F. B.. O gerenciamento para a acessibilidade ambiental de pessoas com mobilidade reduzida: institucionalizando a inclusão em uma escola universitária. Dissertação de mestrado. Escola de Arquitetura da UFMG: Belo Horizonte, 365 pág, 2009. PORTO, B. G. G. F. & Colab. Inclusão – saberes, reflexões e possibilidades de uma prática em construção. Fortaleza: Editora UECE, 2015. Secretaria Municipal de Urbanismo e Meio Ambiente– SEUMA/PMF. Plano Municipal de Caminhabilidade de Fortaleza: As calçadas que queremos. Fortaleza, 2020. INCLUSÃO SOCIAL ATRAVÉS DO ESPORTE | 127 Autores Regina Helena Tahim Souza Neiva É administradora de empresas formada pela Universidade de Fortaleza (Unifor), mestra em Ciências Jurídicas pela Universidade Americana e especialista em Comércio Internacional (Unifor). É servidora pública estadual do Ceará, integrante do quadro da Secretaria de Proteção Social, Justiça, Cidadania, Mulheres e Direitos Humanos (SPS), coordenadora do Centro de Profissionalização Inclusiva para Pessoas com Deficiência (Cepid) desde sua implantação. Já exerceu diversas funções públicas, dentre as quais: coordenadora da área de Mercado, no Sebrae-CE, promovendo feiras e eventos; membro da Secretaria do Trabalho e Desenvolvimento Social (STDS); coordenadora do Sine-CE; coordenadora do Programa Ceará Empreendedor; coordenadora da Central Fácil do Estado do Ceará, na Secretaria de Planejamento e Gestão do Estado do Ceará (Seplag); instrutora do Programa Integrado de Management (Prima-CE), no Gabinete do Governador do Estado do Ceará; gerente da Célula de Articulação da Coordenadoria Especial de Políticas Públicas para os Idosos e Pessoas com Deficiência. Também já foi presidente do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos das Pessoas com Deficiência (Cedef-CE) e conselheira do Conselho Nacional de Defesa dos Direitos das Pessoas com Deficiência (Conade). PATROCÍNIO REALIZAÇÃOAPOIO Ilustrador Guabiras Carlos Henrique Santos da Costa é cartunista e jornalista por formação. Trabalhou no O POVO (Fortaleza/CE) de 1998 a 2019. Colaborou para a revista MAD (SP) de 2003 a 2016. Publicou em 2003 uma história em quadrinhos no jornal Extra, de Nova York (EUA). Ganhou em 2015, junto com a equipe de arte do O POVO, o prêmio Esso de Jornalismo na categoria Criação Gráfica. Em 2016, o Prêmio Ângelo Agostini de “Melhor Cartunista” e dois Troféus HQ MIX em parcerias. Participou de projetos como Tarja Preta (RJ), Escape (SP), Gibi Quântico (SP) e Marcatti 40 (SP). Hélvio Felicianio Moreira É graduado em Educação Física pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e especialista em Esportes Adaptados pela Universidade Federal de Uberlândia/UFU. É professor da Rede de Ensino da Prefeitura de Belo Horizonte/PBH. É técnico de atletismo Nível I pelo Comitê Paralímpico Brasileiro/CPB, técnico de atletismo pelas equipes da Associação dos Deficientes Visuais de Belo Horizonte (Adevibel) e técnico de atletismo pela Associação Paralímpica e Esportiva de Belo Horizonte (APEBH).
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