Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
M e c a n i s m o d e a g r e s s ã o e d e f e s a 1 Pedro Henrique Lustosa Soares Imunidade a Bactérias Intracelulares ~Uma característica das bactérias intracelulares facultativas é sua habilidade de sobreviver e até replicar dentro dos fagócitos. Como esses microrganismos conseguem encontrar um nicho onde se tornam inacessíveis aos anticorpos circulantes, sua eliminação requer os mecanismos de imunidade mediada por células. Em muitas infecções bacterianas intracelulares, a resposta do hospedeiro também causa lesão tecidual. 1. Imunidade Inata a Bactérias Intracelulares A resposta imune inata a bactérias intracelulares é mediada principalmente por fagócitos e células natural killer (NK). Os fagócitos — inicialmente neutrófilos e depois macrófagos — ingerem e tentam destruir esses microrganismos, porém as bactérias intracelulares patogênicas são resistentes à degradação no interior dos fagócitos. Os produtos dessas bactérias são reconhecidos por TLRs e proteínas citoplasmáticas da família de receptores do tipo NOD (NLR, do inglês, NOD-like receptor), resultando na ativação dos fagócitos. O DNA bacteriano no citosol estimula respostas de interferon do tipo I através da via STING. ~As bactérias intracelulares ativam células NK por meio da indução da expressão de ligantes ativadores de células NK nas células infectadas, e também estimulando a produção por células dendríticas e macrófagos de IL-12 e IL-15, pedro Realce pedro Realce pedro Realce pedro Realce pedro Realce pedro Realce M e c a n i s m o d e a g r e s s ã o e d e f e s a 2 Pedro Henrique Lustosa Soares que são citocinas ativadoras de células NK. As células NK produzem IFN-γ que, por sua vez, ativa macrófagos e promove o killing das bactérias fagocitadas. Sendo assim, as células NK conferem uma defesa inicial contra esses microrganismos antes do desenvolvimento da imunidade adaptativa. De fato, camundongos com imunodeficiência combinada grave, que não têm células T e B, são capazes de controlar transientemente a infecção causada pela bactéria intracelular Listeria monocytogenes, via produção de IFN-γ derivado de células NK. Entretanto, a imunidade inata geralmente falha em erradicar essas infecções, sendo que a erradicação exige imunidade adaptativa mediada por células. ~As ILCs do tipo I também defendem contra bactérias intracelulares. Essas células não citotóxicas que expressam T-bet respondem à IL-12, IL-15 e IL-18 produzida por outras células durante a resposta inata a bactérias e, então, secretam IFN-γ e TNF que ativam macrófagos e ajudam a eliminar os patógenos intracelulares. Como as ILCs residem nos tecidos, podem conferir a defesa inicial contra infecções nesses locais. 2. Imunidade Adaptativa a Bactérias Intracelulares ~A principal resposta imune protetora contra bactérias intracelulares é o recrutamento e ativação de fagócitos mediados pela célula T (imunidade celular). Indivíduos com imunidade celular deficiente, como pacientes com Aids, são extremamente suscetíveis a infecções com bactérias intracelulares (bem como por fungos e vírus intracelulares). Muitas características importantes da imunidade mediada por células foram estabelecidas na década de 1950, com base em estudos sobre respostas imunes à bactéria intracelular L. monocytogenes em camundongos. Essa forma de imunidade poderia ser adotivamente transferida para animais naive com células, mas não com o soro de animais infectados ou imunizados. ~As células T conferem defesa contra infecções por meio de dois tipos de reações: ativação de fagócitos pelas células T CD4+, por meio das ações do ligante de CD40 e do IFN-γ, resultando no killing de microrganismos ingeridos que sobrevivem dentro dos fagolisossomos dos fagócitos; destruição de células infectadas por linfócitos T citotóxicos (CTLs) CD8+, eliminando os microrganismos que escapam dos mecanismos de killing dos fagócitos. As células T CD4+ se diferenciam em efetores Th1 sob influência de IL-12, produzida por macrófagos e células dendríticas. As células T expressam ligante de CD40 e secretam IFN-γ, e esses dois estímulos ativam macrófagos para a produção de pedro Realce pedro Realce pedro Realce pedro Realce pedro Realce pedro Realce pedro Realce pedro Realce pedro Realce pedro Realce pedro Realce M e c a n i s m o d e a g r e s s ã o e d e f e s a 3 Pedro Henrique Lustosa Soares várias substâncias microbicidas, incluindo óxido nítrico, enzimas lisossômicas e espécies reativas do oxigênio. A importância da IL-12 e do IFN-γ na imunidade a bactérias intracelulares foi demonstrada em modelos experimentais e em imunodeficiências congênitas. Exemplificando, indivíduos com mutações hereditárias em receptores para IFN-γ ou IL-12 são altamente suscetíveis a infecções com micobactérias atípicas. ~Numerosas citocinas, em adição ao IFN-γ, exercem papéis importantes na defesa contra bactérias intracelulares, como Mycobacterium tuberculosis. O TNF, produzido por macrófagos ativados e outras células, recrutam e ativam fagócitos mononucleares para combater as micobactérias; é por isso que pacientes com artrite reumatoide e outras doenças imunes tratados com antagonistas de TNF se tornam suscetíveis a infecções por micobactérias. ~As bactérias fagocitadas estimulam respostas de células T CD8+ se antígenos bacterianos forem transportados dos fagossomos para o citosol ou se as bactérias escaparem dos fagossomos e entrarem no citoplasma de células infectadas. No citosol, os microrganismos deixam de ser suscetíveis aos mecanismos microbicidas e, para a erradicação da infecção, as células infectadas devem ser eliminadas pelos CTLs. Assim, os efetores da imunidade mediada por células, a saber as células T CD4+ que ativam macrófagos e os CTLs CD8+, atuam de modo cooperativo na defesa contra bactérias intracelulares. pedro Realce pedro Realce M e c a n i s m o d e a g r e s s ã o e d e f e s a 4 Pedro Henrique Lustosa Soares ~A ativação de macrófagos que ocorre em resposta aos microrganismos intracelulares é capaz de causar lesão tecidual. Essa lesão pode resultar de reações de hipersensibilidade tardia (DTH, do inglês, delayed-type hypersensitivity) a antígenos proteicos microbianos. Como evoluíram para resistir ao killing no interior dos fagócitos, as bactérias intracelulares frequentemente persistem por longos períodos e causam ativação crônica das células T e dos macrófagos, e isso pode resultar na formação de granulomas circundando os microrganismos. A marca histológica da infecção com alguma bactéria intracelular é a inflamação granulomatosa. Esse tipo de reação inflamatória pode servir para localizar e prevenir a disseminação dos microrganismos, mas também está associado a graves comprometimentos funcionais causados por necrose e fibrose tecidual. De fato, os granulomas necrotizantes e a fibrose (formação de cicatriz) que acompanham a inflamação granulomatosa são causas importantes de lesão tecidual e doença clínica na tuberculose. Indivíduos previamente infectados com M. tuberculosis mostram reações de DTH ao desafio cutâneo com uma preparação de antígeno bacteriano (PPD, do inglês, purified protein derivative). Essa é a base de um teste cutâneo comumente usado para detectar infecção prévia. ~As diferenças entre os indivíduos quanto aos padrões de respostas de células T a microrganismos intracelulares são determinantes importantes da progressão da doença e do desfecho clínico. A lepra, causada por Mycobacterium leprae, é considerada um exemplo da relação entre o tipo de resposta de célula T e o desfecho da doença em seres humanos. Existem duas formas polares de lepra — as formas lepromatosa e tuberculoide — embora muitos pacientes sejam classificados em grupos intermediários menos definidos. Na lepra lepromatosa, os pacientes exibem altostítulos de anticorpo específico, porém respostas celulares fracas aos antígenos de M. leprae. As micobactérias proliferam nos macrófagos e são detectáveis em grandes números. O crescimento bacteriano e a ativação persistente (porém inadequada) dos macrófagos resultam em lesões destrutivas na pele e no tecido subjacente. Em contraste, pacientes com lepra tuberculoide têm imunidade celular forte, porém níveis baixos de anticorpos. Esse padrão de imunidade é refletido nos granulomas que se formam ao redor dos nervos e produzem defeitos em nervos sensoriais periféricos, bem como lesões cutâneas traumáticas secundárias, todavia com menos destruição tecidual e escassez de bactérias nas lesões. Uma possível razão para as diferenças entre essas duas formas da doença causadas pelo mesmo organismo pode ser a existência de diferentes padrões de diferenciação de célula T e produção de citocina nos indivíduos. Alguns estudos indicam que pacientes com a pedro Realce pedro Realce pedro Realce M e c a n i s m o d e a g r e s s ã o e d e f e s a 5 Pedro Henrique Lustosa Soares forma tuberculoide da doença produzem IFN-γ e IL-2 nas lesões (indicativo de ativação de célula Th1), enquanto pacientes com lepra lepromatosa produzem menos IFN-γ e podem exibir imunidade celular fraca e falha em controlar a disseminação bacteriana. O papel das citocinas derivadas de Th1 e de Th2 na determinação do desfecho da infecção foi mais claramente demonstrado na infecção pelo parasita protozoário Leishmania major em diferentes linhagens de camundongos consanguíneos.
Compartilhar