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Práticas de ensino de escrita: ensino e avaliação APRESENTAÇÃO Historicamente, a avaliação é uma prática que deixa os professores e alunos de cabelo em pé. Isso porque, mesmo que calcada em critérios analíticos, temos ciência de que avaliar envolve subjetividades. Mesmo assim, há práticas que podem ser adotadas para que certas confusões se dissolvam. Nesta Unidade de Aprendizagem, você vai estudar o papel do texto na aula de Língua Portuguesa e a função da produção textual como atitude responsiva a outros textos trabalhados em sala de aula. Vamos discutir, também, o processo de avaliação formativa e diagnóstica, na qual as produções textuais servem, além do seu principal objetivo comunicativo, para diagnosticar as dificuldades enfrentadas pelos alunos e decidir sobre a necessidade de rever, reestruturar ou ampliar as tarefas para que a aprendizagem possa ocorrer. Bons estudos. Ao final desta Unidade de Aprendizagem, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Diferenciar a prática de ensino de Língua Portuguesa com foco no texto da prática de ensino com foco na Gramática Normativa. • Analisar a importância de se trabalhar o ensino da escrita na aula de Língua Portuguesa.• Reconhecer a forma mais adequada de avaliar dentro de uma perspectiva de educação linguística. • INFOGRÁFICO Neste infográfico, você vai conhecer os procedimentos importantes nas aulas de produção de textos. Esses procedimentos servem para o planejamento de propostas nas quais as produções de textos sejam realizadas por seu autor com vistas a interlocutores e sejam desdobradas num conjunto de tarefas. CONTEÚDO DO LIVRO O ensino da Língua Portuguesa já passou por diferentes fases. A noção de que ele não pode se resumir em classificação de palavras e frases soltas foi e continua sendo um dos maiores desafios para os professores. Com o desenvolvimento da linguística aplicada, percebeu-se que de nada adianta saber classificar uma palavra se o aluno não é capaz de escrever um bom texto. Neste capítulo, sendo assim, você, inicialmente, vai compreender que há práticas de ensino de Língua Portuguesa com foco no texto e há outras com foco na Gramática Normativa. Após, refletirá sobre a importância de se trabalhar a produção textual em sala de aula e, por fim, reconhecerá formas avaliativas textuais dentro de uma perspectiva de educação linguística dialógica. LINGUÍSTICA APLICADA AO ENSINO DO PORTUGUÊS Roberta Spessatto da Silva Práticas de ensino de escrita: ensino e avaliação Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Diferenciar a prática de ensino de língua portuguesa com foco no texto e na gramática normativa. Analisar a importância de se trabalhar o ensino da escrita na aula de língua portuguesa. Reconhecer a forma mais adequada de avaliar dentro de uma pers- pectiva de educação linguística. Introdução O desenvolvimento da linguística e a noção de que a escrita é impor- tante para a formação de indivíduos críticos e capazes de se posicionar socialmente foram fundamentais para as inúmeras transformações pelas quais o ensino da língua portuguesa já passou. Nesse contexto, o pro- fessor deve compreender que o seu papel não se resume a ensinar os alunos a classificar palavras: ele deve ensiná-los a utilizar a língua como ferramenta social. Neste capítulo, você vai conhecer a diferença entre ensinar língua portuguesa com foco no texto e com foco na gramática normativa. Em seguida, você vai verificar por que é importante trabalhar o ensino da escrita na aula de língua portuguesa. Por fim, vai ver como avaliar textos na perspectiva da educação linguística dialógica. 1 O ensino normativo e o ensino textual da língua portuguesa Os processos de alfabetização e de letramento escolar têm como principal objetivo que os alunos saiam da escola sabendo ler e escrever bem. Essa é uma das principais justifi cativas para que o ensino de língua portuguesa faça parte do currículo de qualquer escola desde o 1º ano do ensino fundamental. No entanto, desde o surgimento do Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb), nos anos 1990, o sistema educacional brasileiro vem sofrendo muitas modifi cações. Afi nal, antes da criação dessa ferramenta, não existia nenhum exame avaliativo educacional no Brasil. O Saeb é um conjunto de avaliações externas em larga escala que permite ao Insti- tuto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) realizar um diagnóstico da educação básica brasileira. Após a implantação do Saeb, os resultados obtidos por meio das avaliações não foram nada satisfatórios. A maior parte dos brasileiros, embora soubesse ler e escrever, era incapaz de refletir criticamente sobre o que lia ou escrevia. Assim, surgiram críticas em relação ao ensino descontextualizado, centrado na norma e na gramática. Isso resultou, em 1998, na oficialização de um novo currículo escolar nacional, denominado Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN). A partir daí, novos métodos e reflexões passaram a permear o ensino básico brasileiro. O conceito de letramento foi instaurado, e o de alfabetização, questionado. Os PCN estruturaram o ensino de língua portuguesa em dois eixos: o uso da língua oral e escrita; e a reflexão sobre a língua e a linguagem (BRASIL, 1998). Todavia, mesmo com a criação dos PCN, a noção de que aprender português representa o domínio da gramática normativa é um legado histórico até hoje. Na óptica de Azeredo (2007, p. 32), no geral, o ensino de língua portuguesa ainda se limita a “1) Falar e escrever corretamente a língua (conhecimento da língua) e 2) identificar, mediante a nomenclatura gramatical seus aspectos estruturais (conhecimentos sobre a língua)”. Veja também o que afirmam Lima, Paiva e Lima (2012, p. 3): O ensino está voltado para o entendimento das regras, da nomenclatura, que na maioria das vezes, tende apenas a identificar as formas “corretas” de falar ou escrever. Isso nos leva a pensar que há formas erradas, o foco, nesse caso, funda-se no entendimento de se buscar a forma correta, levando-nos a compreender que o errado não é permitido. O ensino de Língua Portuguesa centra-se no ensino da forma correta da língua. Práticas de ensino de escrita: ensino e avaliação2 Portanto, mesmo que a linguística esteja cada vez mais presente no ensino escolar, o ensino da língua como reflexo do “certo” e do “errado” apresentados na gramática tradicional continua presente. Antunes (2003) discorre sobre o funcionamento de atividades em torno da gramática. Para a autora, é possível constatar que esse tipo de ensino, puramente normativo e gramatical, põe em cena uma aprendizagem descontextualizada da língua como potencialidade. Isso ocorre pelos seguintes motivos: a gramática normativa é um estudo sobre a língua que, infelizmente, desvincula a norma dos usos reais na fala e na escrita; os exercícios nas aulas de língua portuguesa no viés da gramática normativa organizam o ensino de maneira fragmentada e artificial, com frases inventadas, sem sujeitos interlocutores, sem contexto, sem função — ou seja, as frases são feitas somente para servir de lição, para virar exercício; um ensino gramatical prescritivo se baseia apenas em regras e casos particulares, que, apesar de estarem nos compêndios de gramática, estão fora dos contextos mais previsíveis de uso da língua; embora o ensino gramatical seja muito superior à classificação de partes da oração, o ensino da gramática normativa direciona-se para a nomenclatura e para a classificação das unidades; mesmo que os estudos linguísticos estejam cada vez mais inseridos na sociedade, disseminando a noção de que a língua é mutável e hetero- gênea, a gramática normativa é inflexível e apresenta a língua como um objeto de estudo supostamente uniforme e inalterável; a preocupação apenas com o “certo” e o “errado” ignora a riqueza dos outros tantos aspectos linguísticosrelevantes para o domínio da língua portuguesa. Como você viu, o ensino da gramática normativa não se apoia em mani- festações textuais da comunicação, ou seja, em textos reais, relevantes para a aprendizagem da língua portuguesa. Por isso, os PCN propuseram um ensino de leitura e escrita no qual o uso da linguagem represente o ponto de partida e o de chegada, criando o eixo uso–reflexão–uso. Essa tríplice (uso–reflexão–uso) entende que se parte da reflexão sobre o uso da linguagem para a construção de novas capacidades, que possibilitam um uso cada vez mais complexo de diferentes padrões das linguagens. Isto é, ela pressupõe que a produção de discursos é tanto o ponto de partida como a finalidade do ensino de língua portuguesa. Cabe ressaltar que o eixo “uso” 3Práticas de ensino de escrita: ensino e avaliação compreende a língua oral e escrita, e o eixo “reflexão” envolve a língua e a linguagem. Portanto, ao professor de língua portuguesa não cabe mais o papel de “defensor” da língua padrão ou da norma culta; seu papel passa a ser o de mediador responsável por levar o aluno a compreender a linguagem, refletir sobre as suas estruturas e sobre os seus usos. Promover a reflexão sobre a língua como objeto vivo e mutável não significa ignorar o ensino gramatical. Ao contrário, é fundamental que exista uma reflexão sobre a relevância do ensino gramatical. É o que afirma Vygotsky (1999, p. 23): A gramática é um assunto que parece ter pouca utilidade prática. Ao contrário de outras matérias escolares, não ensina novas habilidades à criança, pois esta já conjuga e declina antes de entrar na escola. Já se chegou até mesmo a dizer que o ensino de gramática na escola poderia ser abolido. Podemos replicar que a nossa análise demonstrou claramente que o estudo da gramática é de grande importância para o desenvolvimento mental da criança... Ela pode não adquirir novas formas gramaticais ou sintáticas na escola, mas, graças ao aprendizado da gramática e da escrita, realmente torna-se consciente do que está fazendo e aprende a usar suas habilidades conscientemente. Dessa maneira, é possível visualizar que o ensino da língua materna não deve ignorar os conhecimentos gramaticais. Ele deve encontrar um intermédio adequado em um texto que não esteja isolado, mas que faça parte da esfera comunicativa humana com sentido e intencionalidade. Por isso, o ensino de língua portuguesa deve refletir sobre as relações entre a oralidade e a escrita, a variação linguística, os aspectos de coesão textual (como os sinais de pontu- ação e nexos) e de normatividade (como algumas regularidades ortográficas). Usar o texto para o ensino da língua portuguesa não significa, necessa- riamente, não seguir a gramática prescritiva. Inclusive, o ensino com foco normativo pode usar o texto; no entanto, de acordo com Geraldi (1997), nesses contextos educacionais, o texto é utilizado somente como pretexto para a identificação e a classificação dos conteúdos gramaticais, criando uma falsa ideia de que o ensino se apoia em uma gramática contextualizada. Na verdade, o texto precisa ser encarado e estudado como unidade de significação. Isso é fundamental para que o aluno desenvolva suas habilidades discursivas a fim de se tornar um indivíduo crítico, não apenas reprodutor do que lhe é apresentado. Veja o que afirma Perfeito ([201-?], documento on-line): O texto passa a ser concebido como unidade de significação e de ensino, elemento integrador das práticas de leitura, de análise linguística e de pro- dução/refação textuais. Consequentemente, o gênero, como objeto de ensino Práticas de ensino de escrita: ensino e avaliação4 e eixo de articulação/progressão curricular, visa a proporcionar ao aluno a ampliação do horizonte discursivo, por abordar propósitos diferentes, com socio-histórias diversas. Um ensino linguístico com resultado positivo tem como foco o texto, pois busca dar sentido para a língua portuguesa. O professor não deve ignorar a gramática normativa, e o foco da sua aula não devem ser nomenclaturas e regras gramaticais. O docente deve ter como foco o texto, e a partir dele desenvolver os aspectos normativos. A ideia é que o aluno aprenda a normatividade, mas saiba por que e como usá-la. Desenvolver habilidades relacionadas à língua portuguesa na aprendizagem não é tarefa fácil. Em função disso, os PCN ressaltam a relevância do papel do professor como mediador da aprendizagem. Nesse processo, cabe ao professor apresentar ao aluno a importância da reflexão sobre as diferentes manifestações linguísticas, com a finalidade de construir um pensamento crítico. O ensino e a aprendizagem de língua portuguesa resultam da articulação de três variáveis: o aluno, o conhecimento e a prática educacional. Veja: o aluno representa o sujeito da ação de aprender, aquele que age com e sobre o objeto de conhecimento; os conhecimentos com os quais se opera são os conhecimentos discursivo-textuais e linguísticos implicados nas práticas sociais de linguagem; a prática educacional do professor e da escola organiza a mediação entre sujeito e objeto do conhecimento. 2 O ensino da escrita A linguagem fundamenta-se no uso da língua para a comunicação e a interação social. Da mesma maneira que a linguagem pode ser oral ou escrita, a leitura ultrapassa o universo da escrita. Para Koch e Elias (2017), todo e qualquer texto simboliza um ato de comunicação dentro de um processo interacional, que pode ser tanto escrito quanto falado. É possível fazer a leitura tanto de um artigo de opinião quanto de um debate político. Ou seja, ler não signifi ca apenas decodifi car uma sequência de palavras escritas. É por meio da leitura que os indivíduos se tornam capazes de analisar e de refl etir sobre os diferentes contextos em que estão inseridos. Além disso, somente com ela a produção 5Práticas de ensino de escrita: ensino e avaliação de textos passa a fazer sentido, pois a escrita em sala de aula é um trabalho de organização mental. Na esfera escolar, os alunos têm a oportunidade de viver experiências planejadas, usar a linguagem e refletir sobre as suas práticas. Inclusive, o trabalho com a produção textual, nas aulas de língua portuguesa, inicia-se desde o processo de alfabetização e letramento. No ciclo de alfabetização, por exemplo, o ensino de português organiza-se em torno de quatro grandes eixos: 1. leitura de textos; 2. produção de textos; 3. oralidade; 4. conhecimentos linguísticos. Ou seja, não há nenhuma possibilidade de o professor conseguir desenvolver as habilidades do aluno com a língua portuguesa sem trabalhar a escrita em sala de aula. No texto escrito, a elaboração da mensagem é definida de acordo com a intencionalidade do emissor em relação ao seu receptor. Ademais, não há obrigatoriamente a participação direta de quem recebe a mensagem. Nesse sentido, para Koch e Elias (2017), o diálogo fundamenta-se numa relação em que o emissor (nesse caso, escritor) dialoga com a perspectiva de que o receptor (nesse caso, leitor) possa compreender a sua intencionalidade. Um princípio pedagógico do ensino da língua portuguesa, segundo os PCN, é o fato de que a linguagem é o lugar da diversidade e da heterogeneidade de práticas culturais. Por esse motivo, as práticas escolares precisam ser sensíveis às diferenças culturais e linguísticas. Assim, deve-se utilizá-las a favor da formação cidadã e de uma aprendizagem significativa da língua materna. Na visão de Cassany (1995), escrever significa muito mais do que conhecer o alfabeto, saber como “juntar letras” ou assinar o documento de identidade. Significa expressar uma informação de maneira coerente e correta para que outras pessoas a entendam. Além disso, é importante que os alunos tenham acesso a textos autênticos para que desenvolvam o seu senso crítico textual e a sua escrita. Embora os textos dos alunos possam ser usados como materiais de leitura autêntica em aula, eles não são os únicos textos autênticosdisponíveis. Os textos autênticos não são criados especificamente para fins de sala de aula. Apresentam autor e contexto histórico. São textos que circulam em diferentes esferas e são utilizados para discussão em sala de aula. Eles não são modificados. O trabalho com textos autênticos tem por objetivo expor os alunos a textos que realmente circulam por outras esferas de letramento. O foco não é no ensino de estruturas gramaticais, embora a reflexão linguística seja Práticas de ensino de escrita: ensino e avaliação6 uma parte importante no estudo do texto. Na óptica de Koch e Elias (2017), o ato da escrita representa uma atividade que necessita tanto do código quanto da intenção do autor, somados a muitas estratégias. O processo de construção textual — tanto no quesito de produção quanto no de compreensão —, segundo Koch (2018), deve ser uma atividade de caráter não só linguístico, mas também sociocognitivo. Afinal, o texto é uma forma de materialização discursiva verbal que se constitui por elementos linguísticos de diversas ordens, que não se formam apenas por conhecimento estrutural, mas também por conhecimento cognitivo e sociocultural. De acordo com Cassany (1995), para que o indivíduo escreva bem, ele precisa ter aptidões, habilidades e atitudes; o conhecimento de gramática é importante, mas não é exclusivo. O principal objeto de ensino e de aprendizagem da língua portuguesa nos PCN é o conhecimento linguístico e discursivo com o qual o sujeito opera ao participar das práticas sociais mediadas pela linguagem. Organizar situações de aprendizado, nessa perspectiva, implica: planejar situações de interação nas quais esses conhecimentos sejam construídos e/ou tematizados; organizar atividades que procurem recriar na sala de aula situações enunciativas de outros espaços que não o escolar; saber que a escola é um espaço de interação onde práticas sociais de linguagem acontecem e se circunstanciam, assumindo características bastante específicas em função de sua finalidade, o ensino. Desenvolver a escrita em sala de aula mobiliza diferentes aspectos rela- cionados ao conhecimento cognitivo, textual e sociointeracional. Na visão de Koch (2018), esses três aspectos possibilitam três estratégias para o trabalho da escrita: estratégia cognitiva, estratégia textual e estratégia sociointeracional. A estratégia cognitiva consiste na execução do cálculo mental por parte dos interlocutores, como as deduções fundamentadas no contexto. O cálculo mental colabora com o processo da escrita. Além do mais, essa estratégia se compõe pelos esquemas que os sujeitos organizam por meio do processamento cognitivo. Por sua vez, a estratégia sociointeracional determina as escolhas que o autor do texto realiza com a finalidade de apresentar sentidos específicos ao leitor, pois procura evitar o fracasso da interação entre o texto do aluno e os seus receptores. A estratégia textual, por fim, retrata a distribuição do material linguístico presente no texto, como a organização da informação, a formulação, a referenciação e o jogo entre o explícito e o implícito. 7Práticas de ensino de escrita: ensino e avaliação Sabe-se que o gênero textual representa a finalidade do texto. Dessa forma, o ensino da língua portuguesa não deve considerar o ensino da prática de produção de textos um treinamento, mas um processo de trabalho com textos em construção. Além disso, deve objetivar que os alunos escrevam diferentes gêneros textuais, não se limitando às redações escolares. O trabalho com a escrita não deve ignorar os conhecimentos gramaticais, e sim apresentar a mediação adequada a um texto que não está isolado, que pertence a algum gênero e se encontra inserido em um contexto. Dessa ma- neira, é possível formar alunos capazes de produzir textos de modo seguro e autoral não apenas em situações cotidianas da esfera privada, como também em esferas públicas de atuação. Cabe salientar que a revisão gramatical é uma das etapas de revisão do texto, mas não a mais importante, pois o foco está no sentido, não na forma. Na visão de Koch e Elias (2017), o processo da produção textual em sala de aula acontece em função dos conhecimentos armazenados na memória dos alunos, os quais inter-relacionam a linguagem com o mundo e com as práticas sociais. Dessa forma, as autoras apresentam quatro tipos de conhecimentos prévios fundamentais para o processo da escrita: o conhecimento linguístico, o conhecimento enciclopédico, o conhecimento de textos e os conhecimentos interacionais. Após o processo de escrita em sala de aula, é muito importante que os alunos se vejam como autores. Para que isso aconteça, é interessante que o professor procure meios para a publicação dos textos produzidos pelos seus alunos, pois assim eles se reconhecerão como autores reais. Esse reconheci- mento é essencial para que os estudantes encarem a língua como ferramenta de participação em contextos sociais fora da esfera escolar, dando mais sentido, portanto, à produção textual. 3 O dialogismo no processo da escrita Ao elaborar uma grade de avaliação, você deve atentar ao caráter dialógico do texto. Os alunos precisam escrever seus textos pensando no contexto de interlocução, adequando-se à situação de uso da linguagem. Pode-se afi rmar que uma grade que considera a interlocução está alinhada com a pedagogia discutida aqui: o objetivo é formar alunos que sejam capazes de usar a língua para atuar, por meio de textos, em contextos mais amplos. Práticas de ensino de escrita: ensino e avaliação8 O dialogismo representa o princípio constitutivo da linguagem. De acordo com essa perspectiva, nenhum dizer é novo, nem individual, pois se caracteriza por carregar inúmeras outras vozes que constituem o sujeito. As relações dialógicas são contínuas e se estabelecem a partir do ponto de vista do sujeito. Qualquer relação dialógica pressupõe um contexto imediato de interação verbal, um contexto mais amplo que permeia a enunciação e elementos extraverbais que incidem diretamente sobre o evento enunciativo. A avaliação é entendida em uma perspectiva formativa como atividade processual, contínua, que possibilita diagnosticar as dificuldades enfrentadas pelos alunos. Para Menegassi e Gasparotto (2019), o desenvolvimento da escrita em sala de aula compreende o dialogismo, e a interação comunicativa possibilita refletir sobre a escrita como um processo: No ensino da produção textual escrita, a compreensão do dialogismo e da interação que permeia todo evento enunciativo permite pensar a escrita em seu processo, não mais como produto final para avaliação, o que amplia as reflexões sobre a revisão e a reescrita textual (MENEGASSI; GASPAROTTO, 2019, documento on-line). A avaliação é essencial para o processo de escrita, já que ela apresenta pos- sibilidades de transformação do texto. Dessa maneira, segundo Pazini (1998, p. 1): o aluno percebe “[...] a produção de texto como atividade, como processo, um fazer e um refazer o texto e um contínuo refazer-se do produtor, elaborando seu conhecimento de mundo, da língua e de si mesmo”. Desse modo, o desenvolvi- mento de produções textuais se caracteriza por ser baseado nas relações dialógicas entre o professor e o aluno. Inclusive, é nesse processo de ensino e aprendizagem que os alunos se tornam sujeitos de sua prática linguística e social. Veja: Na produção escrita, o texto sempre é dirigido a alguém. Temos o outro, por exemplo, na figura do professor, do destinatário do texto e das normas que regem aquele evento enunciativo. Para produzir um texto que atenda ao objetivo comunicativo proposto, o aluno conta com a mediação docente, que ocorre por meio da interação. É na interação que se constrói a zona de desenvolvimento proximal e que se avança para a zona de desenvolvimento real (MENEGASSI; GASPAROTTO, 2019, documento on-line). 9Práticas de ensino de escrita: ensino e avaliação Numa perspectiva linguística, é fundamental que o processoavaliativo considere que não há texto real sem a presença de interlocutores. Ou seja, o aluno precisa se sentir autor de um pensamento organizado sobre determinada proposta que foi escrito para um leitor específico (no caso da sala de aula, pode ser o professor ou os colegas). Logo, a enunciação ocorre por meio da interação entre eu e o outro. Sempre que o sujeito fala, escreve ou apenas pensa algo, o faz dirigindo-se a alguém, ainda que seja para o outro de si mesmo. É o outro que o constitui como sujeito, visto que ele é a motivação para qualquer enunciação. E essa comunicação com o outro acontece por meio da interação (MENEGASSI; GASPAROTTO, 2019, documento on-line). O processo de avaliação deve ser coerente com a abordagem de ensino. Nesse caso, a avaliação serve como diagnóstico para professor e alunos re- pensarem suas práticas e melhorarem os processos de ensino e aprendizagem. Na visão de Kramer (2006, documento on-line), “[...] a leitura crítica; a escrita com objetivo e leitor definidos; a compreensão e a interpretação; a reflexão sobre a linguagem” são fundamentais para a construção de um texto dialógico. Portanto, o método avaliativo deve contemplar principalmente o conteúdo, pois a forma é lapidada de acordo com a reescrita. A questão de uma avaliação processual, o foco no texto e o ensino de uma gramática contextualizada e funcional são desafios constantes para os professores de língua portuguesa, pois ensinar a escrever é reflexo de ensinar a pensar. Portanto, por meio de produções textuais, é possível perceber como os alunos se posicionam na sociedade em que estão inseridos. O trabalho de revisão do professor faz parte do processo avaliativo, pois a avaliação deve ser uma motivação para o desenvolvimento e o aperfeiçoa- mento da escrita e do pensamento crítico dos indivíduos. Portanto, em uma avaliação dialógica, segundo Menegassi e Gasparotto (2019), o professor deve principalmente: conhecer todos os aspectos que envolvem o processo de produção textual e explicitá-los aos alunos sempre que possível; promover, avaliar e avançar nos níveis de interação; colocar-se como interlocutor e/ou colaborador virtual do projeto comu- nicativo, com o objetivo de atingir o interlocutor real; desenvolver a revisão dialógica, dando voz ao aluno; revisar promovendo alteridade, mediando, negociando sentidos, evi- denciando o caráter responsivo da interação; Práticas de ensino de escrita: ensino e avaliação10 acompanhar o desenvolvimento de habilidades de escrita do aluno e avançar nas abordagens de revisão, objetivando promover a autonomia discursiva. A avaliação dialógica é imprescindível para a evolução da escrita do aluno. Com ela, é possível tanto estimular a autonomia do estudante como autor de seu discurso quanto refletir acerca da mensagem que o sujeito desenvolve. Portanto, a avaliação textual é uma tarefa que faz parte do processo de apro- priação da escrita, independentemente do nível de ensino em que ela ocorre. ANTUNES, I. Aula de português: encontro & interação. São Paulo: Parábola Editorial, 2003. AZEREDO, J. C. Ensino de português: fundamentos, percursos e objetos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2007. BRASIL. Ministério da Educação. Parâmetros curriculares nacionais: terceiro e quarto ciclos do ensino fundamental: língua portuguesa. Brasília: MEC, 1998. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/portugues.pdf. Acesso em: 5 mar. 2020. CASSANY, D. La cocina de la escritura. Barcelona: Anagrama, 1995. GERALDI, J. W. Portos de passagem. 4. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1997. KOCH, I. G. V. O texto e as construções dos sentidos. 10. ed. São Paulo: Contexto, 2018. KOCH, I. G. V.; ELIAS, V. M. Estratégias de produção textual. 2. ed. São Paulo: Contexto, 2017. KRAMER, M. A. D. Ensino gramatical de língua materna: uma arena de conflitos. Revista Letra Magna, v. 3, n. 4. set. 2006. Disponível em: http://www.letramagna.com/arena. pdf. Acesso em: 5 mar. 2020. LIMA, S. J. B.; PAIVA, J. L.; LIMA, E. P. Os PCNs e a análise linguística como objeto de ensino na educação básica. Campina Grande: Realize, 2012. MENEGASSI, R. J.; GASPAROTTO, D. M. Revisão dialógica: princípios teórico-metodoló- gicos. Linguagem em (Dis)curso, v. 19, n. 1, jan. 2019. Disponível em: http://www.scielo. br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1518-76322019000100107&lng=en&nrm=iso. Acesso em: 5 mar. 2020. PAZINI, M. C. B. Oficina de texto: teoria e prática. Proleitura, v. 5, n. 19, abr. 1998. PERFEITO, A. Concepções de linguagem e análise linguística: diagnósticos para proposta de intervenção. Londrina: [S. n., 201-?]. Disponível em: http://files.obeduc.webnode. com/200000056-0693508863/74_Alba_Maria_Perfeito.pdf. Acesso em: 5 mar. 2020. VYGOTSKY, L. Pensamento e linguagem. São Paulo: Martins Fontes, 1999. 11Práticas de ensino de escrita: ensino e avaliação Os links para sites da web fornecidos neste capítulo foram todos testados, e seu fun- cionamento foi comprovado no momento da publicação do material. No entanto, a rede é extremamente dinâmica; suas páginas estão constantemente mudando de local e conteúdo. Assim, os editores declaram não ter qualquer responsabilidade sobre qualidade, precisão ou integralidade das informações referidas em tais links. Práticas de ensino de escrita: ensino e avaliação12 DICA DO PROFESSOR Nesta dica do professor, você vai entrar em contato com as pesquisas de Lívia Suassuna, pesquisadora brasileira na área de avaliação, e descobrir com ela quais são, historicamente, os desafios que precisamos superar para que tenhamos uma prática de produção e avaliação de textos dialógica. Boa aula! Conteúdo interativo disponível na plataforma de ensino! NA PRÁTICA Sabemos que é papel da escola acolher as experiências que os alunos vivem fora dela. É, sim, dever do professor acercar-se das vivências dos seus estudantes e da identidade do lugar onde eles moram, dos seus familiares, de sua comunidade, afim de elaborar projetos que possam atender as demandas e auxiliar na resolução de problemas importantes para a dinâmica local. Segundo Rojo (2009), “cabe à escola potencializar o diálogo multicultural, trazendo para dentro de seus muros não somente a cultura valorizada, dominante, canônica, mas também as culturas locais e populares e a cultura de massa, para torná-la vozes de um diálogo, objetos de estudo e de crítica.” Abaixo, você vai analisar dois projetos elaborados por professores que, sensíveis e abertos às demandas do contexto social dos seus alunos, pensaram em intervenções para auxiliar a comunidade. Conheça como esses dois projetos conseguiram conectar os letramentos e agir por meio da escrita a partir de demandas locais. Conteúdo interativo disponível na plataforma de ensino! SAIBA MAIS Para ampliar o seu conhecimento a respeito desse assunto, veja abaixo as sugestões do professor: Seminário 2015 - Palestra com a professora doutora Luciene J. Simões. Conteúdo interativo disponível na plataforma de ensino! O que ensinar em Língua Portuguesa. Conteúdo interativo disponível na plataforma de ensino! Como usar os gêneros para ensinar leitura e produção de textos. Conteúdo interativo disponível na plataforma de ensino! Relato de prática: um texto à espera de sua autoria. Conteúdo interativo disponível na plataforma de ensino!
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