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1 A NEUROCIÊNCIA E A EDUCAÇÃO 1 Sumário A neurociência e a educação .......................................................................... 2 Cérebro e aprendizagem ............................................................................. 7 Aprendizagem e Educação ........................................................................ 12 Neurociência cognitiva e educação ............................................................ 13 Relação entre neurociência e educação .................................................... 14 Neurociência, pedagogia e psicopedagogia .............................................. 17 REFERÊNCIAS ............................................................................................. 21 2 A neurociência e a educação Quando falamos de educação, também estamos falando especificamente da aprendizagem, que na neurociência é conhecido como os processos neurais, redes que se estabelecem, neurônios que se ligam e fazem novas sinapses. Os processos neurais são redes que se estabelecem, neurônios que se ligam e fazem novas sinapses. Aprendizagem é o processo pelo qual o cérebro reage aos estímulos do ambiente, ativa essas sinapses (ligações entre os neurônios por onde passam os estímulos), tornando-as mais "intensas". A cada estímulo novo, a cada repetição de um comportamento que queremos que seja consolidado temos circuitos que processam as informações, que deverão ser então consolidadas. A neurociência se constitui assim em atual e uma grande aliada do professor para poder identificar o individuo como ser único, pensante, atuante, que aprende de uma maneira toda sua, única e especial. Desvendando os mistérios que envolvem o cérebro na hora da aprendizagem, a neurociência disponibiliza, ao moderno professor (neuroeducador), impressionantes e sólidos conhecimentos sobre como se processam a linguagem, a memória, o esquecimento, o humor, o sono, a atenção, o medo, como incorporamos o conhecimento, o desenvolvimento infantil, as nuances do desenvolvimento cerebral desta infância e os processos que estão envolvidos na aprendizagem acadêmica. Logo, um vasto campo de preciosas informações relacionadas ao aluno e ao processo de absorção da aprendizagem a ele proporcionada. Tomarmos posse desses novos e fascinantes conhecimentos é imprescindível e de fundamental importância para uma pedagogia moderna, ativa, contemporânea, que se mostre atuante e voltada às exigências do aprendizado em nosso mundo globalizado, veloz, complexo e cada vez mais exigente. As neurociências descrevem a estrutura e funcionamento do sistema nervoso, enquanto a educação cria condições que promovem o desenvolvimento de competências. Os professores atuam como agentes nas mudanças cerebrais que levam à aprendizagem. As estratégias pedagógicas utilizadas por professores 3 durante o processo ensino-aprendizagem são estímulos que produzem a reorganização do sistema nervoso em desenvolvimento, resultando em mudanças comportamentais. As funções intelectuais como a memória, linguagem, atenção, emoções, assim como ensinar e aprender, são produzidas pela atividade dos neurônios no nosso encéfalo. O encéfalo é o órgão da aprendizagem. O encéfalo humano é composto por aproximadamente 86 bilhões de neurônios, as células nervosas, que interagem entre si e com outras células formando redes neurais para que possamos aprender o que é significativo e relevante para a vida. Os neurônios são células altamente excitáveis que se comunicam entre si ou com outras células por meio de uma linguagem eletroquímica. O nosso comportamento depende do número de neurônios envolvidos nesta rede de comunicação neural e dos seus neurotransmissores, que são substâncias químicas que modulam a atividade celular, acentuando ou inibindo a comunicação entre os neurônios. A maioria dos neurônios possui três regiões responsáveis por funções especializadas: corpo celular, dendritos e axônio. Figura: Desenho esquemático de um neurônio. Observe o corpo celular que contém o núcleo celular, os prolongamentos chamados dendritos e o axônio. Fonte: http://www.sogab.com.br/anatomia/sistemanervosojonas.htm. As sinapses, ou seja, as conexões entre as células nervosas que compõe as diversas redes neurais vão se tornando mais bem estabelecidas e mais complexas, à medida que o aprendiz interage com o meio ambiente interno e externo. Desta forma, é verdadeiro que crianças pouco ou não estimuladas durante a infância podem apresentar dificuldade de aprendizagem. Nestes casos ao encéfalo delas não foi dada a oportunidade de se desenvolver plenamente, alcançando toda a sua 4 potencialidade. Estas crianças, para alcançar os objetivos de desenvolvimento e competência, precisarão de estímulos bem direcionados e de estratégias alternativas de aprendizagem para poderem ter chances de desenvolver as habilidades não desenvolvidas. Além dos neurônios, o sistema nervoso é composto por células da glia, que possuem funções importantes e distintas, como suporte, defesa, auxílio na transmissão do impulso nervoso, produção de líquor, entre outras. No sistema nervoso central, além dos 86 bilhões de neurônios, existem 85 bilhões de células da glia, que são os astrócitos, oligodendrócitos, micróglia e células ependimárias. Estas células possuem funções variadas e primordiais. Resumidamente, os astrócitos captam o excesso de neurotransmissores e dão suporte para o estabelecimento dos neurônios em seus devidos lugares durante o desenvolvimento. Os oligodendrócitos produzem bainha de mielina, uma substância isolante lipoproteica que reveste os axônios, facilitando e acelerando a transmissão do impulso nervoso nos neurônios. A micróglia atua como célula de defesa, enquanto as células ependimárias produzem o líquor ou líquido encéfalo-espinhal, que reveste todo nosso sistema nervoso, funcionando como uma barreira mecânica contra impactos. Figura: Neurônios e células da glia. Fonte: http://www.portalsaofrancisco.com.br/alfa/celulas-da- glia/celulas-da-glia.php, 5 Todas estas células, sejam elas neurônios ou células da glia compõem o tecido nervoso, que é a base de construção do encéfalo. O encéfalo humano é um órgão único, nobre, que juntamente ao cerebelo e tronco encefálico formam o encéfalo. O encéfalo é todo o conjunto de estruturas localizadas no interior do crânio. O cérebro é responsável pelas emoções, raciocínio, aprendizagem, é a sede das sensações e movimentos voluntários. Ele possui áreas responsáveis por funções específicas e globais. Figura : Funções específicas e globais do cérebro humano. Fonte: Lent, 2010. O cérebro humano possui cinco divisões anatômicas, os lobos cerebrais existem cinco lobos: frontal, parietal, occipital, temporal e insular. O lobo frontal é responsável pela tomada de decisão, julgamento, memória recente, crítica, raciocínio. O lobo parietal está relacionado às sensações e a interpretação das sensações, pelo senso de localização do corpo e do meio ambiente. O lobo occipital ocupa-se basicamente com a visão, enquanto o temporal, com a audição. O lobo insular está relacionado a processos emocionais fortemente influenciados pelos órgãos dos sentidos. Além desta divisão anatômica, podemos notar que a superfície do cérebro do homem apresenta depressões denominadas sulcos, que delimitam os giros cerebrais. A existência dos sulcos permite considerável aumento de superfície 6 sem grande aumento do volume cerebral e sabe-se que cerca de dois terços da área ocupada pelo córtex cerebral estão "escondidos" nos sulcos. Figura: Lobos cerebrais. Fonte: Netter, 2007. Conceitos como neurônios, sinapses, sistemas a tencionais, (que viabilizam ogerenciamento da aprendizagem), mecanismos mnemônicos (fundamentais para o entendimento da consolidação das memórias), neurônios espelho, que possibilitam a espécie humana progressos na comunicação, compreensão e no aprendizado e plasticidade cerebral, ou seja, o conhecimento de que o cérebro continua a desenvolver-se, a aprender e a mudar não mais estarão sendo discutidos apenas por neurocientistas, como até então imaginávamos. Estarão agora, na verdade, em sala de aula, no dia a dia do educador, pois uma nova visão de aprendizagem está a se delinear. O fracasso e insucesso escolar têm hoje um novo olhar, já que uma nova e fascinante gama de informações e conhecimentos está á disposição do educador moderno. 7 Graças à neurociência da aprendizagem, os transtornos comportamentais e da aprendizagem passaram a ser mais facilmente compreendidos pelos educadores, que aliados a neurociência tem subsídios para a elaboração de estratégias mais adequadas a cada caso. Um professor qualificado e capacitado, um método de ensino adequado e uma família facilitadora dessa aprendizagem são fatores fundamentais para que todo esse conhecimento que a neurociências nos viabiliza seja efetivo, interagindo com as características do cérebro de nosso aluno. Esta nova base de conhecimentos habilita o educador a ampliar ainda mais as suas atividades educacionais, abrindo uma nova estrada no campo do aprendizado e da transmissão do saber. Cérebro e aprendizagem O homem percebe o mundo por meio de seu aparelho perceptual, num processo interpretativo dos fenômenos que envolve seus sentidos e sua memória. Memória é a aquisição, a formação, a conservação e a evocação de informação. A aquisição é também chamada de aprendizagem: só se ‘grava’ aquilo que foi aprendido. A evocação é também chamada de recordação, lembrança, recuperação. Só lembramos aquilo que gravamos, aquilo que foi aprendido A percepção é a capacidade de associar as informações sensoriais à memória e à cognição, de modo a formar conceitos sobre o mundo, sobre nós mesmos e orientar nosso comportamento. De acordo com a neurociência cognitiva, cujo foco de atenção é a os astrócitos captam o excesso de neurotransmissores e dão suporte para o estabelecimento dos neurônios em seus devidos lugares durante o desenvolvimento. Os oligodendrócitos produzem bainha de mielina, uma substância isolante lipoproteica que reveste os axônios, facilitando e acelerando a transmissão do impulso nervoso nos neurônios. A micróglia atua como célula de defesa, enquanto As células ependimárias produzem o líquor ou líquido encéfalo-espinhal, que reveste todo nosso sistema nervoso, funcionando como uma barreira mecânica contra impactos. LEMBRE-SE A atividade mental estimula a reconstrução de conjuntos neurais, processando experiências vivenciais e/ou linguísticas, num fluxo e refluxo de informação. LEMBRE-SE 8 compreensão das atividades cerebrais e dos processos de cognição, a aprendizagem humana não decorre de um simples armazenamento de dados perceptuais, e sim do processamento e elaboração das informações oriundas das percepções no cérebro. O indivíduo, permanentemente em busca de respostas para as suas percepções, pensamentos e ações, tem suas conexões neurais em constante reorganização e seus padrões conectivos alterados a todo momento, mediante processos de fortalecimento ou enfraquecimento de sinapses. No cérebro, há neurônios prontos para a estimulação. A atividade mental estimula a reconstrução de conjuntos neurais, processando experiências vivenciais e/ou linguísticas, num fluxo e refluxo de informação. As informações, captadas pelos sentidos e transformadas em estímulos elétricos que percorrem os neurônios, são catalogadas e arquivadas na memória. É essa capacidade de agregar dados novos a informações já armazenadas na memória, estabelecendo relações entre o novo e o já conhecido e reconstruindo aquilo que já foi aprendido, num reprocessamento constante das interpretações advindas da percepção, que caracteriza a plasticidade. A aprendizagem, portanto, é o processo em virtude do qual se associam coisas ou eventos no mundo, graças à qual adquirimos novos conhecimentos. Denominamos memória o processo pelo qual conservamos esses conhecimentos ao longo do tempo. Os processos de aprendizagem e memória modificam o cérebro e a conduta do ser vivo que os experimenta. Assim, o cérebro pode ser visto como um sistema dinâmico que tem sua complexidade funcional subsidiada pela sua interação com outros sistemas nele presentes, não podendo ser interpretado como depósito estático para o armazenamento de informação. Segundo Posner e Raichle (2001), os sistemas cognitivos são aqueles sistemas mentais que regem as atividades diárias do ser humano – como ler, escrever, conversar, planejar, reconhecer rostos. Alguns sistemas comportam outros sistemas, agregando complexidade na geração de um comportamento. O sistema cognitivo da linguagem, por exemplo, envolve falar, ler e escrever, ativando diferentes estruturas cerebrais. Esses diferentes sistemas cognitivos têm como base distintas operações mentais: uma dada tarefa mental como jogar xadrez, pode ativar diferentes operações mentais, as quais estão relacionadas a redes neurais de áreas cerebrais específicas. 9 Acrescenta-se a essas proposições a visão de Moraes (2004), para quem a aprendizagem progride mediante fluxos dinâmicos de trocas, análises e sínteses autor reguladoras cada vez mais complexas, ultrapassando o acúmulo de informações e sendo reconstruída, via transformação, por meio de mudanças estruturais advindas de ações e interações provocadas por perturbações a serem superadas. A memória é responsável pelo armazenamento de informações, bem como pela evocação daquilo que está armazenado. E a aprendizagem requer competências para lidar de forma organizada com as informações novas, ou com aquelas já armazenadas no cérebro, a fim de realizar novas ações. Aprender envolve, assim, a execução de planos já formulados, resultando de ações mentais bem pensadas, ensaiadas mentalmente e que influenciam o planejamento de atos futuros. O cérebro está preparado para funcionar com o feedback interno e externo, pois é autorreferente, isto é, o que é recebido em qualquer nível cerebral depende de tudo o mais que acontecer nesse nível, e o que é enviado para o nível seguinte depende do que já estiver acontecendo nesse nível. Apesar da proximidade entre os conceitos de aprendizagem e memória. O processo de aquisição de novas informações que vão ser retidas na memória é chamado aprendizagem. Através dele nos tornamos capazes de orientar o comportamento e o pensamento. Memória, diferentemente, é o processo de arquivamento seletivo dessas informações, pelo qual podemos evocá-las sempre que desejarmos, consciente ou inconscientemente. De certo modo, a memória pode ser vista como o conjunto de processos neurobiológicos e neuropsicológicos que permitem a aprendizagem. Considerando a flexibilidade do cérebro para reagir às demandas do ambiente, explicada pela sinaptogênese – capacidade de formação de novas conexões, sinapses, entre as células cerebrais –, e o fato de que o conhecimento deve ser codificado nas ligações entre os neurônios, a aprendizagem, possibilitada pela plasticidade cerebral, modifica química, anatômica e fisiologicamente o cérebro, porque exige alterações nas redes neuronais, cada vez que as situações vivenciadas no ambiente inibem ou estimulam o surgimento de novas sinapses mediante a liberação de neurotransmissores. Oferecer situações de aprendizagem 10 fundamentadas em experiências ricas em estímulos e fomentar atividades intelectuais pode promover a ativação de novas sinapses. As informações do meio, uma vez selecionadas, não são apenas armazenadas na memória, masgeram e integram um novo sistema funcional, caracterizando com isso a complexificação da aprendizagem. Uma informação pode, pela desordem que gera, levar à evolução do conhecimento do indivíduo, pois ele precisará desenvolver estratégias cognitivas a fim de reorganizar e retomar o equilíbrio na construção do conhecimento. E isso é obtido por meio de um processo dinâmico e recursivo presente na reconstrução do próprio ato de conhecer. A aprendizagem, embora dependa de substratos físicos estruturados caracteriza-se pelo processo de contínua inovação, maleável por natureza, flexível e dinâmico. A aprendizagem surge de um acoplamento estrutural: as interações recíprocas entre o indivíduo e o meio fazem surgir mudanças estruturais na organização do ser vivo e do contexto em que está inserido; perante as informações, o organismo, num processo auto organizador, opera com propriedades emergentes, a fim de se adaptar às condições cambiantes presentes no processo de conhecer. Transferir para a educação, o entendimento da aprendizagem como acoplamento estrutural implica uma visão nova do aprender, a qual passa a estar fundamentada no fato de que experiências de aprendizagem em contextos pedagógicos geram alterações na estrutura do indivíduo. As experiências em sala de aula estimulam reflexões recursivas sobre os pensamentos, sentimentos e ações, permitindo que a aprendizagem seja concebida como processo reconstrutivo, envolvendo autor reorganização mental e emocional O cérebro pode ser visto como um sistema dinâmico que tem sua complexidade funcional subsidiada pela sua interação com outros sistemas nele presentes, não podendo ser interpretado como depósito estático para o armazenamento de informação. LEMBRE-SE O lobo frontal é responsável pela tomada de decisão, julgamento, memória recente, crítica, raciocínio. O lobo parietal está relacionado às sensações e a interpretação das sensações, pelo senso de localização do corpo e do meio ambiente. O lobo occipital ocupa-se basicamente com a visão, enquanto o temporal, com a audição. O lobo insular está relacionado a processos emocionais fortemente influenciados pelos órgãos dos sentidos. LEMBRE-SE 11 daqueles que interagem nesse contexto. Aprender não é somente reconhecer o que, virtualmente, já era conhecido; não é apenas transformar o desconhecido em conhecimento. É a conjunção do reconhecimento e da descoberta. Aprender comporta a união do conhecido e do desconhecido. A memória e a aprendizagem são fundamentais para a evolução do indivíduo como ser social, pois ultrapassam a simples apreensão das informações pelo sujeito aprendente, passando a fundamentar seu pensamento e suas ações. Pensar é, com efeito, um processo, uma função biológica desempenhada pelo cérebro. O processamento do pensamento é o ato de receber, perceber e compreender, armazenar, manipular, monitorar, controlar e responder ao fluxo constante de dados. A capacidade para ligar de forma competente as informações oriundas das áreas de associação motora, sensorial e mnemônica é decisiva para o processamento do pensamento e para a consideração e planejamento de futuras ações. Deve-se ressaltar também que as emoções desempenham um papel decisivo na aprendizagem. Posner e Raichle (2001), retomando os estudos de Friedrich e Preiss, lembram que o sistema límbico, formado por tálamo, amígdala, hipotálamo e hipocampo, avalia as informações, decidindo que estímulos devem ser mantidos ou descartados, dependendo a retenção da informação no cérebro da intensidade da impressão provocada nele. A consciência da experiência vivenciada é atingida quando, ao passar pelo córtex cerebral, compara-se a experiência com reflexões anteriores. Assim, quando conseguimos estabelecer uma ligação entre a informação nova e a memória preexistente, são liberadas substâncias neurotransmissoras – como a acetilcolina e a dopamina – que aumentam a concentração e geram satisfação. É dessa maneira que emoção e motivação influenciam a aprendizagem. Os sentimentos, intensificando a atividade das redes neuronais e fortalecendo suas conexões sinápticas, podem estimular a aquisição, a retenção, a evocação e a articulação das informações no cérebro. Diante desse quadro, os autores defendem a importância de contextos que ofereçam aos indivíduos os pré-requisitos necessários a qualquer tipo de aprendizado: interesse, alegria e motivação. A razão é fortemente relacionada com 12 a emoção. De um modo ou de outro, nossos atos e pensamentos são sempre influenciados pelas emoções. Dentro de uma perspectiva de aprendizagem sustentada nas relações entre os elementos constituintes da percepção – sentidos e memória – e no pensamento sistêmico, no qual essas relações acontecem inseridas na complexidade da reestruturação permanente do conhecimento no cérebro/mente, é imprescindível que o professor se reconheça como responsável pela configuração de um ambiente que propicie a autor reorganização dos indivíduos. Ainda que a inteligência do indivíduo dependa, pela interação entre as células neuronais, do desenvolvimento biológico, somente as mediações que o indivíduo sofre em suas interações com o meio ambiente onde está inserido é que permitirão expandir essa inteligência em todo seu potencial. À luz desses argumentos, entender como o aluno aprende permite ao professor, assim, buscar uma forma mais adequada de ‘didatizar’ os conhecimentos científicos, pois compreender a forma de cognição do aluno melhora a organização do ensino. Aprendizagem e Educação O aprender e o lembrar do estudante ocorre no seu cérebro. Conhecer como o cérebro funciona não é a mesma coisa do que saber qual é a melhor maneira de ajudar os alunos a aprender. A aprendizagem e a educação estão intimamente ligados ao desenvolvimento do cérebro, o qual é moldável aos estímulos do ambiente. Os estímulos do ambiente levam os neurônios a formar novas sinapses. Assim, a aprendizagem é o processo pelo qual o cérebro reage aos estímulos do ambiente, ativando sinapses, tornando-as mais “intensas”. Como consequência estas constituem-se em circuitos que processam as informações, com capacidade de armazenamento molecular. O estudo da aprendizagem une a educação com a neurociência. A neurociência investiga o processo de como o cérebro aprende e lembra, desde o nível molecular e celular até as áreas corticais. A formação de padrões de atividade neural considera-se que correspondam a determinados “estados e representações O processamento do pensamento é o ato de receber, perceber e compreender, armazenar, manipular, monitorar, controlar e responder ao fluxo constante de dados. A capacidade para ligar de forma competente as informações oriundas das áreas de associação motora, sensorial e mnemônica é decisiva para o processamento do pensamento e para a consideração e planejamento de futuras ações. LEMBRE-SE 13 mentais”. O ensino bem sucedido provocando alteração na taxa de conexão sináptica, afeta a função cerebral. Por certo, isto também depende da natureza do currículo, da capacidade do professor, do método de ensino, do contexto da sala de aula e da família e comunidade. Todos estes fatores interagem com as características do cérebro dos indivíduos. A alimentação afeta o cérebro da criança em idade escolar. Se a dieta é de baixa qualidade, o aluno não responde adequadamente à excelência do ensino fornecido. Neurociência cognitiva e educação A neurociência cognitiva utiliza vários métodos de investigação (por ex. tempo de reação, eletroencefalograma, lesões em estruturas neurais em animais de laboratório, neuroimageamento) a fim de estabelecer relações cérebro e cognição em áreas relevantes para a educação. Está abordagem permitirá o diagnóstico precoce de transtornos de aprendizagem. Este fato exigirá métodos de educação especial, ao mesmotempo a identificação de estilos individuais de aprendizagem e a descoberta da melhor maneira de introduzir informação nova no contexto escolar. Investigações focalizadas no cérebro averiguando aspectos de atenção, memória, linguagem, leitura, matemática, sono e emoção e cognição, estão trazendo valiosas contribuições para a educação. Pesquisadores em educação têm uma postura otimista de que as descobertas em neurociências contribuam para a teoria e práticas educacionais. Destarte, exemplos incluem empreendimentos para desenvolver currículo sob medida, para atender fraqueza/excelência daqueles alunos que usam preferencialmente um dos hemisférios. A neurociência, psicologia e ciências cognitivas somadas à educação, trazem novo enquadramento e integração destas áreas do conhecimento. 14 Tabela - Princípios da neurociência com potencial aplicação no ambiente de sala de aula. Fonte: Bartoszeck, 2006. Relação entre neurociência e educação Os comportamentos que adquirimos ao longo de nossas vidas resultam do que chamamos de aprendizagem ou aprendizado. Aprender é uma característica intrínseca do ser humano, essencial para sua sobrevivência. A educação visa ao desenvolvimento de novos comportamentos num indivíduo, proporcionando-lhe recursos que lhe permitam transformar sua prática e o mundo em que vive. Educar é proporcionar oportunidades e orientação para aprendizagem, para aquisição de novos comportamentos. Aprendizagem, por sua vez, requer várias funções mentais O cérebro é responsável pelas emoções, raciocínio, aprendizagem, é a sede das sensações e movimentos voluntários. Ele possui áreas responsáveis por funções específicas e globais LEMBRE-SE 15 como atenção, memória, percepção, emoção, função executiva, entre outras. E, portanto, depende do cérebro. O Sistema Nervoso (SN), por meio de seu integrante mais complexo, o cérebro, recebe e processa os estímulos ambientais e elabora respostas adaptativas que garantem a sobrevivência do indivíduo e a preservação da espécie. A evolução nos garantiu um cérebro capaz de aprender, para garantir nosso bem- estar e sobrevivência e não para ter sucesso na escola. A menos que o bom desempenho escolar signifique esse bem-estar e sobrevivência do indivíduo. Na escola o aluno aprende o que é significativo e relevante para o contexto atual de sua vida. Se a “sobrevivência” é a nota, o cérebro do aprendiz selecionará estratégias que levem à obtenção da nota e não, necessariamente, à aquisição das novas competências. O comportamento humano resulta da atividade do SN, do conjunto de células nervosas, ou redes neurais, que o constituem. O comportamento depende do número de neurônios e de suas substâncias químicas, da atividade destas células, da forma como neurônios se Informação, para o neurônio, é a alteração das suas características eletroquímicas. Quando o indivíduo está em interação com o mundo, exibindo um comportamento, vários conjuntos de neurônios, em diferentes áreas do SN estão em funcionamento, ativados, trocando informações. As funções mentais são produzidas pela atividade do SN e resultam do cérebro em funcionamento. Funções relacionadas à cognição e às emoções, presentes no cotidiano e nas relações sociais, como sentir e perceber, gostar e rir, dormir e comer, falar e se movimentar, compreender e calcular, ter atenção, lembrar e esquecer, planejar, julgar e decidir, ajudar, pensar, imaginar, se emocionar, são comportamentos que dependem do funcionamento do cérebro. Educar e aprender também. Graças à neurociência da aprendizagem, os transtornos comportamentais e da aprendizagem passaram a ser mais facilmente compreendidos pelos educadores, que aliados a neurociência tem subsídios para a elaboração de estratégias mais adequadas a cada caso. LEMBRE-SE 16 As neurociências são ciências naturais, que descobrem os princípios da estrutura e do funcionamento neurais, proporcionando compreensão dos fenômenos observados. A. Educação tem outra natureza e sua finalidade é criar condições (estratégias pedagógicas, ambiente favorável, infraestrutura material e recursos humanos) que atendam a um objetivo específico, por exemplo, o desenvolvimento de competências pelo aprendiz, num contexto particular. A educação não é investigada e explicada da mesma forma que a neurotransmissão. Ela não é regulada apenas por leis físicas, mas também por aspectos humanos que incluem sala de aula, dinâmica do processo ensino aprendizagem, escola, família, comunidade, políticas públicas. Descobertas em neurociências não se aplicam direta e imediatamente na escola. O trabalho do educador pode ser mais significativo e eficiente se ele conhece o funcionamento cerebral, o que lhe possibilita desenvolvimento de estratégias pedagógicas mais adequadas. Aprender não depende só do cérebro. É importante esclarecer que as neurociências não propõem uma nova pedagogia e nem constituem uma panaceia para a solução das dificuldades da aprendizagem e dos problemas da educação. Elas fundamentam a prática pedagógica que já se realiza, demonstrando que, estratégias pedagógicas que respeitam a forma como o cérebro funciona, tendem a ser mais eficientes. A neurociência por si só não pode fornecer o conhecimento específico necessário para elaboração de ambientes de aprendizagem em áreas de conteúdo escolar específicas, particulares. Mas fornecendo “insights” sobre as capacidades e limitações do cérebro durante o processo de aprendizagem, a neurociência pode ajudar a explicar porque alguns ambientes de aprendizagem funcionam e outros não. Descobertas em neurociências não se aplicam direta e imediatamente na escola. A aplicação desse conhecimento no contexto educacional tem limitações. As neurociências podem informar a educação, mas não explicá-la ou fornecer prescrições, receitas que garantam resultados. Teorias psicológicas baseadas nos mecanismos cerebrais envolvidos na aprendizagem podem inspirar objetivos e estratégias educacionais. A inclusão dos fundamentos neurobiológicos do processo ensino- aprendizagem na formação inicial do educador proporcionará nova e diferente perspectiva da educação e de suas estratégias pedagógicas, influenciando também 17 a compreensão dos aspectos sociais, psicológicos, culturais e antropológicos tradicionalmente estudados pelos pedagogos. Neurociência, pedagogia e psicopedagogia A neuropsicologia é o campo das neurociências em que ocorre a intersecção das ciências cognitivas com as ciências do comportamento, e ela engloba ambas. A neuropsicologia tem ramificações que alcançam muitas outras facetas do conhecimento como a psiquiatria. Os psiquiatras se preocupam em saber como, onde e em quais circuitos cerebrais ocorre a ação medicamentosa. Esquizofrenia, depressão, ansiedade, transtornos obsessivo-compulsivos e outras manifestações psiquiátricas são hoje estudadas à luz de seu substrato biológico cerebral. Nesse contexto, o neuropsicólogo participa da avaliação das funções cognitivas e da terapia cognitivo-comportamental. A tarefa da ciência neural hoje é a de fornecer explicações do comportamento em termos da atividade cerebral, de explicar como milhões de células neurais individuais, no cérebro, atuam para produzir o comportamento e como, elas são influenciadas pelo ambiente. Existem alguns questionamentos da parte de alguns pesquisadores acerca da análise da função cerebral que a neurociências se ocupa, isto, questiona-se se estas são suficientemente refinadas para verdadeiramente esclarecer sobre a relação entre comportamento humano e função cerebral. (BARROS, et al., 2004). No entanto, encontramos respostas esclarecedoras a esses questionamentos. O desenvolvimento da neurociência cognitiva conduz a uma epistemologia não-reducionista, que trabalha com distintos, mas inter-relacionadosníveis de análise. Diferentes metodologias são usadas para a observação de Processamento do pensamento é o ato de receber, perceber e compreender, armazenar, manipular, monitorar, controlar e responder ao fluxo constante de dados. A capacidade para ligar de forma competente as informações oriundas das áreas de associação motora, sensorial e mnemônica é decisiva para o processamento do pensamento e para a consideração e planejamento de futuras ações. LEMBRE-SE 18 diferentes níveis de organização da estrutura e funções cerebrais, obtendo-se entendimento detalhado de mecanismos cognitivos no cérebro animal. Modelos mais amplos procuram integrar esse conhecimento empírico e descobrir os princípios fundamentais das funções cognitivas de cérebro. (JÚNIOR, 2001). A neuropsicologia, um dos campos de estudo da neurociência é uma área de conhecimento que trata da relação entre cognição e comportamento e a atividade do sistema nervoso em condições normais e patológicas. A neuropsicologia cognitiva está preocupada com os padrões de desempenho cognitivo intacto e deficiente apresentados pelos pacientes com lesão cerebral, pois para os neuropsicólogos cognitivos, o estudo de pacientes com lesão cerebral pode revelar muito sobre a cognição humana normal. (EYSENCK; KEANE, 2007; COSENZA; FUENTES; MALLOY-DINIZ, 2008). Este campo compreende o estudo da relação entre as funções neurais e psicológicas e o estudo do comportamento ou mudanças cognitivas que acompanham lesões em partes específicas do cérebro sendo que estudos experimentais com indivíduos normais também são comuns. Assim, se um indivíduo com lesão em determinada área cerebral mostra um déficit cognitivo específico, então essa área poderá estar envolvida na função cognitiva afetada. O estudo aprofundado de indivíduos com lesão permite compreender o funcionamento cognitivo normal. A pedagogia também tem utilizado dos conhecimentos dos mecanismos cerebrais envolvidos na aprendizagem. À medida que ocorre maturação e a especialização das redes neuronais ao longo do desenvolvimento infantil e a A aprendizagem, é o processo em virtude do qual se associam coisas ou eventos no mundo, graças à qual adquirimos novos conhecimentos. Denominamos memória o processo pelo qual conservamos esses conhecimentos ao longo do tempo. Os processos de aprendizagem e memória modificam o cérebro e a conduta do ser vivo que os experimenta LEMBRE-SE 19 participação das diferentes áreas cerebrais na aprendizagem, o material aprendido, por exemplo, a alfabetização, influencia a organização cerebral. (MENDONÇA; AZAMBUJA; SCHLECHT, 2008). Há uma relação direta entre as neurociências e a educação, se considerarmos a significância do cérebro no processo de aprendizagem do indivíduo, assim como o contrário. O estudo da aprendizagem une de modo inevitável a educação e a neurociência. Esta última incide o seu estudo na relação entre o funcionamento neurológico e a atividade psicológica, dando ênfase à analise do comportamento, como a manifestação última da atividade do sistema nervoso. (POSNER; ROTHBART, 2005). A aprendizagem depende da neuroplasticidade e pode ser entendida como um processo pelo qual o sistema nervoso reestrutura funcionalmente suas vias de processamento e representação da informação. A neuroplasticidade é a capacidade que o encéfalo possui em se reorganizar ou readaptar frente a novos estímulos, sejam eles positivos ou negativos. As sinapses ou conexões entre os neurônios se modificam durante o processo de aprendizagem, quando há evocação da memória, quando adquirimos novas habilidades. Ao analisar os neurônios após um processo de aprendizagem, pode-se observar várias modificações estruturais que ocorreram, tais como o brotamento de espículas dendríticas, brotamento axonal colateral e desmascaramento de sinapses silentes. A neuroplasticidade possibilita a reorganização da estrutura do encéfalo e constitui a fundamentação neurocientífica do processo de aprendizagem. As estratégias pedagógicas devem utilizar recursos que sejam multissensoriais, para ativação de múltiplas redes neurais que estabelecerão associação entre si. Se as informações/experiências forem repetidas, a atividade mais frequente dos neurônios relacionados a elas, resultará em neuroplasticidade e produzirá sinapses mais consolidadas. A sociedade criou expectativas em relação ao que as neurociências podem trazer à educação, sendo algumas dessas crenças falsas. A procura de respostas não deve incidir na questão de como a ciência do cérebro é aplicada à prática educativa, mas sim naquilo que os educadores precisam saber e como podem ser informados pela investigação neurocientífica. O ponto de partida para o entendimento mútuo passa pela utilização de um vocabulário que seja igualmente entendido por neurocientistas e educadores. Os próprios problemas de investigação 20 devem responder a questões elaboradas pelo trabalho conjunto de modo a ir de encontro aos reais problemas que ocorrem nos contextos educativos. Quanto maior for o diálogo, menos espaço haverá para interpretações erradas, sendo mais esclarecedor por todas as partes. O desenvolvimento da neurociência é verdadeiramente fascinante e gera grandes esperanças de que, em breve, novos tratamentos estarão disponíveis para uma grande gama de transtornos e distúrbios do sistema nervoso que debilitam e incapacitam milhões de pessoas anualmente. Concluindo, não há como separar o comportamento de sua base biológica. Entretanto é importante ressaltar que o sistema nervoso é apenas condição necessária para que o comportamento, os pensamentos e sentimentos ocorram. Nunca foi e nunca será pretensão da neurociência afirmar que o sistema nervoso seja condição suficiente para a emergência de tais processos. Não cabe à neurociência discutir construtos como a consciência e nem tampouco tentar solucionar dilemas metafísicos, tais como a possível dualidade mente/cérebro, a questão dos qualia ou a causação psicofísica. A despeito do que dizem os críticos da neurociência, esta tem somente um único objetivo: tentar compreender o sistema nervoso, e nada mais! O máximo que podemos afirmar é que os nossos pensamentos e sentimentos são produtos de estímulos que delineiam e modelam o encéfalo, sendo que o ambiente social, atuando sobre um substrato genético, é uma poderosa força moduladora para este processo. 21 REFERÊNCIAS BARROS, C. E., et al. O organismo como referência fundamental para a compreensão do desenvolvimento cognitivo. Revista Neurociências, São Paulo, n.12, v.4, p.21-216, 2004. BARTOSZECK, Amauri Betini. Neurociência na educação. Revista Eletrônica Faculdades Integradas Espírita, v. 1, p. 1-6, 2006. COSENZA, R. M.; FUENTES, D.; MALLOY-DINIZ, L. A evolução das idéias sobre a relação entre cérebro, comportamento e cognição. In: ______. Neuropsicologia: teoria e prática. Porto Alegre: Artmed, 2008. p.15-19. DE CARVALHO, Fernanda Antoniolo Hammes. Neurociências e educação: uma articulação necessária na formação docente. Trabalho, Educação e Saúde, v. 8, n. 3, p. 537-550, 2010. EYSENCK, M. W.; KEANE, M. T. 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