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2 MÓDULO XVII DIREITO CIVIL Direito de Família 3 1. INOVAÇÕES LEGAIS E CONSTITUCIONAIS NO DIREITO DE FAMÍLIA 1.1 Conceito de família Família é o conjunto de pessoas formado pelo parentesco consanguíneo, civil ou por afinidade, oriundo do casamento, da união estável ou de relação monoparental (composta por qualquer um dos pais e seus descendentes). Este conceito, no entanto, vem sendo relativizado diante da ampla aceitação jurisprudencial do conceito de “família eudemonista”, em que a família passa a ser um elemento da felicidade individual e da emancipação de seus integrantes, e não mais um fim em si mesma. 1.2 União estável Prevista no art. 226, § 3.º, da Constituição Federal de 1988, era regulada pelas Leis 8.971/1994 e 9.278/1996. Ambas as leis foram revogadas pelo Código Civil (CC) de 2002, vigorando as disposições da união estável esparsamente estabelecidas nos Livros de Direito de Família e Sucessões. Consiste na união duradoura, pública e contínua, com o fim de constituir família. 1.3 Ampliação e facilitação do divórcio (art. 226, § 6.º, da CF/1988) O divórcio chegou ao Brasil com a Emenda Constitucional (EC) 9/1977 e com a Lei 6.515/1977, hoje derrogada pelo atual Código Civil. Antes da Constituição Federal de 1988, porém, o divórcio era restrito às seguintes hipóteses: • só havia divórcio por conversão oriunda de separação judicial; • a conversão em divórcio só poderia ser feita após três anos de separação judicial; • só era possível apenas um pedido de divórcio. Com a Constituição Federal de 1988, as hipóteses de divórcio ampliaram-se, podendo ocorrer nas seguintes situações: • poderá haver divórcio independentemente de separação judicial anterior, denominado divórcio direto, desde que marido e mulher estejam separados de fato a, no mínimo, dois anos; • a conversão da separação judicial em divórcio pode ser feita após 1 ano do trânsito em julgado da sentença que decretou aquela; 4 • os pedidos de divórcio não sofrerão qualquer limitação subjetiva, podendo ser tantos quantos forem os casamentos a serem terminados. 1.4 Igualdade (isonomia) De acordo com os arts. 3.º, IV, 5.º, caput e inciso I, e 226, § 5.º, todos da Constituição Federal de 1988, estabeleceu-se a igualdade de direitos entre homem e mulher no que concerne à sociedade conjugal, de modo que os direitos e deveres dela oriundos serão exercidos por ambos. 1.5 Igualdade entre filhos Não é mais permitida a discriminação entre filhos havidos ou não do casamento, sendo vedada a sua distinção entre legítimos, ilegítimos, legitimados ou adotados (art. 227, § 6.º, da CF/1988), cujos termos ainda são utilizados apenas para fins didáticos. 2. DO CASAMENTO 2.1 Conceito De acordo com o art. 1.565, caput, pelo casamento, homem e mulher assumem mutuamente a condição de consortes, companheiros e responsáveis pelos encargos da família. Assim, até o julgamento do Recurso Especial 1.183.378-RS, poder-se-ia definir o casamento como a união entre homem e mulher, na forma da lei, com o fim de constituir família e estabelecer auxílio mútuo, material e espiritual. Porém, conforme ementa daquele emblemático julgado: “Inaugura-se com a Constituição Federal de 1988, uma nova fase do direito de família e, consequentemente, do casamento, baseada na adoção de um explícito poliformismo familiar em que arranjos multifacetados são igualmente aptos a constituir esse núcleo doméstico chamado "família", recebendo todos eles a "especial proteção do Estado". Assim, é bem de ver que, em 1988, não houve uma recepção constitucional do conceito histórico de casamento, sempre considerado como via única para a constituição de família e, por vezes, um ambiente de subversão dos ora consagrados princípios da igualdade e da dignidade da pessoa humana. Agora, a concepção constitucional do casamento ― diferentemente do que ocorria com os diplomas superados ―deve ser necessariamente plural, porque plurais também são as famílias e, ademais, não é ele, o casamento, o destinatário final da proteção do Estado, mas apenas o intermediário de um propósito maior, que é a proteção da pessoa humana em sua inalienável dignidade”. Após essa decisão consagrou-se o entendimento de que os arts. 1.514, 1.521, 1.523, 1.535 e 1.565, todos do Código Civil de 2002, não vedam expressamente o casamento entre pessoas do mesmo sexo, não havendo como extrair, de forma implícita, uma vedação ao casamento homoafetivo, vez que tal entendimento afrontaria os princípios 5 constitucionais, como o da igualdade, o da não discriminação, o da dignidade da pessoa humana e os do pluralismo e livre planejamento familiar. Para confirmar esse entendimento, o Conselho Nacional de Justiça, em 14.05.2013, editou a Resolução 175, que veda às autoridades competentes a recusa de habilitação, celebração de casamento civil ou de conversão de união estável em casamento entre pessoas de mesmo sexo. Estabelecendo, ainda, que a recusa implicará a imediata comunicação ao respectivo juiz corregedor para as providências cabíveis. A Resolução do CNJ e o entendimento adotado pelo C. STJ materializam um Direito de Família contemporâneo, fortemente influenciado por princípios constitucionais e confirmam a tendência de constitucionalização do Direito Civil. Aliás, antes mesmo do julgamento do Recurso Especial 1.183.378-RS, a questão relativa ao emprego das expressões "homem" e "mulher", previstas art. 1.723 do Código Civil foi afastada pelo Supremo Tribunal Federal para permitir a caracterização de união estável entre pessoas do mesmo sexo, denominada "união homoafetiva" no julgamento conjunto da ADPF 132⁄RJ e da ADI 4.277⁄DF, atribuindo, ao dispositivo legal, uma interpretação conforme à Constituição para dele afastar qualquer significado que impeça o reconhecimento da união contínua, pública e duradoura entre pessoas do mesmo sexo como "entidade familiar". A propósito do tema, colha-se trecho da decisão da lavra do então Min. Ayres Brito: [...] que essa referência à dualidade básica homem⁄mulher tem uma lógica inicial: dar imediata sequência àquela vertente constitucional de incentivo ao casamento como forma de reverência à tradição sócio-cultural-religiosa do mundo ocidental de que o Brasil faz parte (§ 1.º do art. 226 da CF), sabido que o casamento civil brasileiro tem sido protagonizado por pessoas de sexos diferentes, até hoje. Casamento civil, aliás, regrado pela Constituição Federal sem a menor referência aos substantivos "homem" e "mulher". 2.2 Finalidade (art. 1.566 do CC/2002) • Vida em comum: decorrente do dever de coabitação, que obriga os cônjuges a viverem sob o mesmo teto e a manterem uma comunhão de vidas. • Fidelidade: decorrente do caráter monogâmico do casamento, a determinar que ambos os cônjuges se abstenham de manter relações sexuais com terceiros. • Assistência mútua: obriga os cônjuges a prestarem cuidado recíproco em todos os níveis, incluindo a prestação de auxílio material (dever de sustento) ou moral (dever de companheirismo). • Sustento e criação dos filhos: decorrente do poder familiar, consiste na obrigação de ambos os cônjuges de prover o sustento dos filhos menores, 6 fornecendo-lhes orientação moral e educacional. Na verdade, dito dever revela- se impróprio, por dizer respeito à obrigação dos pais para com os filhos, ‘independentemente da existência de vínculo matrimonial”. • Respeito e consideração mútuos: os quais representam, a bem dizer, a síntese de todos os demais direitos e deveres, pois o casamento, ao estabelecer a comunhão plena de vida entre os cônjuges, exige que ambos adotem posturas compatíveis com o estado de casado, quer entre si, quer em relação aos seus filhos. 2.3 Natureza jurídica Quantoà natureza jurídic,a surgem três correntes: 1) Teoria Institucionalista – o casamento é instituição com forte carga moral e religiosa (essa corrente está superada); 2) Teoria Contratualista – o casamento é um contrato especial de Direito de Família. Teoria encabeçada por Silvio Rodrigues. Essa corrente não pode prevalecer pelo conceito clássico de contrato: “negócio jurídico bilateral ou plurilateral que visa à criação, a modificação ou a extinção de direitos e deveres com conteúdo patrimonial. (art. 1321 do CC Italiano). 3) Teoria Mista ou Eclética – o casamento é uma instituição quanto ao conteúdo e um contrato na formação, com regras especiais. Portanto o casamento é um negócio jurídico especial. Não obstante a divergência existente entre os doutrinadores, a maioria da doutrina adota a terceira corrente que considera o casamento um misto de contrato e instituição, sendo tratado como uma relação jurídica sui generis, pois, ao mesmo tempo em que os nubentes têm liberdade em convencionar sobre os aspectos patrimoniais do casamento (aspecto contratual), este se sujeita a normas de ordem pública que impõem uma série de deveres e direitos recíprocos, além de buscar sempre a sua conservação e manutenção (aspecto institucional), por representar, a família, a base da sociedade. 2.4 Princípios Segundo a doutrina, três são os princípios que regem o casamento: a) Monogamia ou união exclusiva. b) Liberdade de união ou da livre escolha (autonomia privada). c) Comunhão de vida ou Comunhão Indivisa – pois os nubentes comungam os mesmos ideais – função social da família. 2.5 Características essenciais 7 2.5.1 Consentimento Para que o casamento tenha existência, deverá haver a manifestação livre e consciente dos nubentes no momento da sua celebração, daí decorrendo a necessidade do seu consentimento pleno. Ausente o consentimento pleno, inexistente será o casamento. Se houver a manifestação de consentimento defeituoso (por exemplo, mediante coação), no entanto, o casamento tornar-se-á anulável. 2.5.2 Solenidade O casamento é um ato eminentemente solene, devendo ser celebrado mediante uma cerimônia a ser realizada em dia, hora e local marcados pelos interessados. A autoridade que deverá celebrar o casamento é denominada Juiz de Casamentos (ou Juiz de Paz), agente estatal nomeado pelo Poder Executivo para desempenhar essa função. A celebração do casamento, ainda que se apresente como formalidade essencial, poderá ser dispensada em alguns casos: • na conversão de união estável em casamento; • no casamento nuncupativo (ou in extremis): casamento realizado quando um dos cônjuges correr risco de morte, devendo o consentimento dos cônjuges ser comprovado por seis testemunhas, que deverão comparecer perante o Juiz mais próximo em 10 dias (art. 1.541, caput, do CC/2002). Nos casos nos quais a celebração for feita por autoridade incompetente, o casamento será anulável (art. 1.550, VI, do CC); a anulabilidade, no entanto, deverá ser decretada em dois anos, caso contrário, o casamento passará a ter validade plena (art. 1560, II, do CC). 2.5.3 Justiça de Paz Integrante da estrutura do Poder Judiciário, deve ser temporária e remunerada, pois o Juiz de Paz será eleito para cumprir um mandato de quatro anos e receberá remuneração. A Justiça de Paz está prevista na Constituição Federal, mas ainda não foi regulamentada por lei no Estado de São Paulo, de modo que é o Juiz de Casamentos quem ainda faz a celebração. 2.6. Espécies 2.6.1 Casamento civil É aquele celebrado pelos interessados em cerimônia realizada perante o Juiz de Casamentos, do qual emanam todos os efeitos jurídicos. Surgiu, no Brasil, com a República, e foi regulamentado por lei em 1926. 2.6.2 Casamento religioso com efeitos civis 8 Muito embora o casamento civil seja o meio previsto em lei para que os interessados adquiram o estado de casados, formando o que se denominou família legítima, a sociedade brasileira, em sua maioria, entende ser indispensável a celebração do casamento também perante uma autoridade religiosa pertencente à crença de um ou ambos os noivos. Em vista disso, o legislador disciplinou o denominado casamento religioso com efeitos civis, a fim de que à celebração do casamento realizado apenas perante uma autoridade religiosa possam ser atribuídos os mesmos efeitos daquele realizado pelo Juiz de Casamentos. Para que o casamento religioso tenha validade, a comprovação da cerimônia religiosa deverá ser levada a registro perante o Oficial do Registro Civil. Nesses casos, o casamento religioso poderá ter sido precedido de habilitação (arts. 71 da Lei 6.015/1973 e 1.516, § 1.º, do CC). O nosso Código Civil, visando a incentivar os casamentos civis, vindo a formar a família legítima, estabelece ainda outras formas ou espécies de casamento: a) conversão de união estável em casamento; b) celebrado por procuração; c) celebrado perante autoridade consular; d) casamento putativo; e) casamento nuncupativo. a) Conversão da união estável em casamento Prevista no art. 226, § 3.º, da CF/88, na Lei 9.278/1996, ora revogada, e no Código Civil, a união estável consiste na união duradoura, pública e contínua entre pessoas de sexos diferentes e que não se encontram impedidas de celebrar casamento, com o fim de constituir família. A fim de favorecer sua legitimação por meio do casamento civil, a lei permite aos conviventes requerer a conversão da união estável em casamento perante o Cartório de Registro Civil. É um requerimento de cunho administrativo, cujo procedimento foi regulamentado pelo Provimento n. 10 da Corregedoria-Geral de Justiça de São Paulo, nestes termos: • requerimento de ambos os companheiros; • habilitação (edital de proclamas, manifestação do Ministério Público – MP); • verificando-se não haver impedimentos, dispensa-se a celebração. O casamento se consuma na data da conversão, não retroagindo à data do início da convivência. b) Casamento por procuração Embora imprescindível a presença de ambos os interessados na data, no horário e no local onde será celebrado o casamento, permite, o Código Civil, que, ante a impossibilidade dos interessados em comparecer pessoalmente à cerimônia, se façam representar por procuradores, cuja eficácia da procuração não poderá ultrapassar 90 dias (art. 1.542, § 3.º, do CC), desde que esta seja outorgada por instrumento público e atribua poderes especiais para que o procurador receba em matrimônio o outro nubente, em lugar e em nome do mandante, conforme dispõe o art. 1.542, caput e parágrafos, do Código Civil. 9 Nesses casos, poderá ser celebrado o casamento mesmo se um ou os dois noivos estiverem ausentes, mas representados por procuração. c) Casamento consular É aquele celebrado pelas autoridades diplomáticas ou consulares do país de ambos os nubentes, segundo dispõe o art. 7.º, § 2.º, da Lei de Introdução às normas de Direito Brasileiro (LINDB), podendo ser realizado no próprio consulado ou fora dele. Os brasileiros que residem no exterior e quiserem casar-se sob o regime legal brasileiro poderão celebrar o casamento perante a autoridade consular brasileira, de acordo com o art. 18, caput, da LINDB. Nesse último caso, se um ou ambos os cônjuges retornarem ao Brasil, deverão registrar o casamento, em até 180 dias do retorno, perante o cartório do respectivo domicílio ou, na sua falta, no 1.º Ofício da Capital do Estado em que passarem a residir, a fim de se permitir a publicidade do ato. d) Casamento putativo (imaginário – art. 1.561, caput, do CC/2002) Casamento putativo é aquele que, embora nulo ou anulável, foi contraído de boa-fé. Boa-fé, no caso, significa que um ou ambos os cônjuges desconheciam a existência de impedimentos dirimentes à sua realização. Na sentença em que o Juiz decretar a invalidade do casamento, por exemplo, o Juiz reconhecerá a putatividade da união, a fim de que os efeitos decorrentes doreconhecimento dessa situação sejam produzidos até a data da constituição do casamento em benefício do cônjuge de boa-fé. Nesses casos, os efeitos da desconstituição do casamento serão projetados para o futuro, respeitados os direitos até então adquiridos. Em relação à pessoa dos cônjuges, incidirão todos os efeitos do casamento válido, os quais cessarão na data em que transitar em julgado a sentença que tiver decretado a anulação do casamento, especialmente os deveres matrimoniais impostos no art. 1.566 do CC/2002. Não obstante, todas as situações ou o estado de caráter irreversível não serão afetados pela anulação (por exemplo, a emancipação do cônjuge inocente). Se ambos os cônjuges estiverem de boa-fé, os bens comuns serão partilhados da mesma forma que o seriam em caso de separação judicial; se apenas um dos cônjuges estiver de boa-fé, porém, adquirirá a meação dos bens levados ao casamento pelo outro. Neste caso, quando o casamento for anulado por culpa de um dos cônjuges, incidirão as sanções previstas no art. 1.564 do CC. Em relação à obrigação de prestar alimentos, duas são as correntes jurisprudenciais: • uma que entende não serem devidos alimentos a partir da anulação, na medida em que os interessados não serão mais cônjuges; • a outra, que tem prevalecido, segundo a qual o cônjuge culpado não poderá furtar-se ao pagamento de alimentos se acaso o cônjuge inocente deles necessitar. 10 e) Casamento nuncupativo ou in extremis Casamento nuncupativo, segundo os arts. 76 e ss. da Lei de Registros Públicos, é aquele celebrado em iminente risco de morte, em que a urgência do caso e a falta de tempo impedem o cumprimento de todas as formalidades estabelecidas nos arts. 1.533 e ss. do CC/2002. O casamento é realizado na presença de seis testemunhas para que presenciem a expressão da vontade matrimonial e, ocorrendo superveniente falecimento de um dos contraentes, será procedida, posteriormente, a ratificação daquele ato, o qual se leva a registro, para que surta todos os efeitos jurídicos. É também chamado de casamento in articulo mortis ou in extremis vitae momentis. 2.6.3 Esponsais Denomina-se esponsais o compromisso matrimonial contraído entre homem e mulher. É o compromisso solene de casamento. Hoje, não há, no Brasil, regulamentação em lei nem atribuição de efeitos legais aos esponsais. O exemplo de esponsais é o noivado. Em alguns casos, tais como o do rompimento injustificado de noivado, dos esponsais poderão decorrer consequências jurídicas, acarretando a responsabilidade civil do(a) noivo(a) culpado(a) a indenizar os danos materiais e morais causados ao inocente. 2.7 Habilitação A habilitação tem por finalidade atestar a identidade dos nubentes e a inexistência de qualquer impedimento para a realização do casamento. É um procedimento administrativo efetuado perante o Oficial do Registro de Pessoas Naturais do domicílio de um dos nubentes para verificar se há ou não algum impedimento à celebração do casamento. Em regra, a habilitação deverá ser prévia, no entanto, a lei permite a habilitação posterior ao casamento, nos casos em que forem celebrados casamentos religioso com efeitos civis e nuncupativo. A habilitação é um requerimento conjunto dos noivos, afirmando que querem se casar e não possuem impedimentos, devendo estar acompanhada das declarações de duas testemunhas, as quais atestem conhecer os noivos e declarem a inexistência de impedimentos. Devem-se juntar, a esse requerimento, os documentos que comprovem a idade e o estado civil dos noivos. Em alguns casos, deverão ser respeitadas outras formalidades: a) Casamento de relativamente incapazes A incapacidade para o casamento não se confunde com os impedimentos, pois a incapacidade veda que a pessoa se case com qualquer um que seja, enquanto que os impedimentos atingem determinadas pessoas em casos específicos (legitimação, capacidade especial). 11 No que toca aos relativamente incapazes, é necessário o consentimento de ambos os pais (art. 1.517, caput, do Código Civil). Se houver divergência entre ambos (caso um dos pais não tenha dado o consentimento), necessário será que se proceda ao suprimento do consentimento dos responsáveis pelo Juiz, de acordo com o procedimento previsto nos arts. art. 719 e ss. do CPC. b) Casamento de pessoas abaixo da idade núbil Homem e mulher menores de 16 anos estão abaixo da idade núbil e não possuem capacidade matrimonial, conforme dispõe o art. 1.517 do CC/2002. Ainda, consoante a nova redação do art. 1.520 do CC, dada pela Lei n. 13.811/2019, em nenhuma hipótese será permitido o casamento do menor de 16 anos. Anteriormente, o dispositivo permitia o casamento de quem não houvesse atingido a idade núbil para evitar imposição ou cumprimento de pena criminal ou em caso de gravidez. Agora, com a nova redação, o casamento realizar-se-á apenas a partir dos 16 anos, respeitados ainda os limites legais, quais sejam o consentimento dos pais ou o suprimento de idade pelo Juiz. Em qualquer caso de casamento de menores, o regime adotado será sempre o de separação de bens (art. 1.641, III, do CC/2002). Após essas providências, o cartório providenciará a publicação dos editais dos proclamas com prazo de 15 dias, chamando os interessados para impugnarem ou não a habilitação. Ainda que não haja impugnação, o MP verificará todas as habilitações para que se dê sequência ao processo. Somente quando houver impugnação por parte do oficial, do Ministério Público ou de terceiro, o Juiz se manifestará. Não havendo impugnação, será expedida, pelo cartório, uma Certidão de Habilitação válida por 90 dias. Vencido esse prazo, será necessária nova habilitação. Após a realização do casamento, será expedida, pelo cartório, a Certidão do Registro de Casamento, a qual será a prova de que foi celebrado o casamento (art. 1.543, caput, do CC/2002). Caso se percam todos os registros do casamento, este poderá ser demonstrado por outros meios em juízo (art. 1.543, parágrafo único, do CC/2002), a fim de que a existência do casamento seja reconhecida pelo Juiz. A lei também dispõe sobre a comprovação do casamento quando duas pessoas estiverem na posse do estado de casados (arts. 1.545 a 1.547 do CC/2002). É a situação de duas pessoas que viveram como casadas (more uxorio) e assim eram consideradas por todos. Tal situação não constituirá, em regra, meio de prova do casamento, a não ser, excepcionalmente, em benefício da prole comum (art. 1.545 do CC/2002) e nos casos em que o casamento for impugnado. Mostrando-se dúbia a prova, a posse do estado de casados funcionará como indício favorável à sua existência (art. 1.547 do CC/2002), aplicando-se o princípio in dubio pro matrimonio. 2.8. Impedimentos matrimoniais 12 Os requisitos essenciais do casamento, sem os quais ele não existe, são: consentimento e celebração na forma da lei. Ao lado dos requisitos essenciais, porém, a lei prevê outros que devem ser observados para a validade e regularidade do casamento. Diante da alteração da disciplina havida entre o revogado CC/1916 e o vigente, apresenta-se o seguinte quadro: CC/19 16 – art. 183 CC/2002 Impedimentos dirimentes absolutos (ordem pública) Impedimentos matrimoniais (art. 1521) Impedimentos dirimentes relativos (de ordem privada) Causas de anulabilidade (art. 1550) Impedimentos impedientes que geravam casamento irregular Causas suspensivas (art. 1523) Os impedimentos previstos no art. 1.521 do CC/2002 estão ligados à capacidade e legitimação para a prática do ato de casar, os quais, se acaso forem inobservados, acarretarão a nulidade do casamento. São impedimentos matrimoniais certos fatos ou circunstâncias previstos em lei que impedem o casamento de algumas pessoas. Se essas circunstâncias impeditivas se concretizarem, terão como consequência, dependendo do caso, a nulidade do casamento ou a aplicação de certas sanções aos contraentes. Osimpedimentos têm graduações, podendo ser mais ou menos graves. Os arts. 1.521 e 1.523 do CC/2002 dispõem sobre os impedimentos, que se apresentam em número de 16 e estão divididos em dois grupos, de acordo com o grau de sua gravidade. São eles: a) impedimentos dirimentes absolutos (art. 1.521, I a VII, do CC) São considerados os mais graves e, por esse motivo, são de natureza cogente. Não admitem convalidação, tornando o casamento absolutamente nulo, pois têm por finalidade preservar a moral familiar e a monogamia, obstando, por exemplo, a realização de casamento entre parentes consanguíneos ou entre pessoas já casadas. b) impedimentos suspensivos (art. 1.523, I a IV, do CC) São determinadas circunstâncias capazes de suspender a realização do casamento, não os tornando nulos ou anuláveis. São considerados impedimentos de natureza patrimonial e têm como consequências apenas a suspensão do casamento até a regularização da situação, a adoção do regime da separação de bens (art. 1.641, I), podendo ser afastadas, por determinação judicial, as punições em alguns casos (incisos I, III e IV), provando-se que do casamento não decorrerão prejuízos patrimoniais às pessoas indicadas no art. 1.523, parágrafo único, do CC/2002. Têm por finalidade proteger os interesses de terceiros, por exemplo, em geral, dos filhos do casamento anterior e do ex-cônjuge. 13 2.8.1 Impedimentos dirimentes absolutos Sempre que houver os impedimentos previstos nos incisos I a VII do art. 1.521 do CC, ocorrerá a nulidade do casamento, podendo ser opostos por qualquer pessoa capaz (art. 1.522, caput, do CC/2002). Por envolverem ordem pública, podem ser conhecidos de ofício pelo juiz ou pelo oficial de registro civil (art. 1.522, parágrafo único, do CC/2002). a) Art. 1.521, I Não podem se casar parentes em linha reta, seja o parentesco natural ou civil (avós, pais e filhos). Esse casamento é chamado incestuoso. Não obstante o impedimento que gera a nulidade do casamento, caso sejam gerados filhos, terão todos os mesmos direitos atribuídos aos outrora chamados “filhos legítimos” (oriundos do casamento legítimo). Vedação que se funda em razões morais (para impedir núpcias incestuosas e a concupiscência no ambiente familiar) e biológicas ou eugênicas (para preservar a prole de taras fisiológicas, malformações somáticas e defeitos psíquicos). b) Art. 1.521, II Não podem se casar os afins em linha reta. São as sogras, os sogros, o genro, a nora, o padrasto, a madrasta, o enteado e a enteada. Esse vínculo de afinidade existirá tanto no casamento quanto na união estável, lembrando que a união estável também gera parentesco (art. 1.595, caput, do CC/2002). Não existem impedimentos na linha colateral, como o casamento entre cunhados. Este impedimento atinge os irmãos bilaterais, tio e sobrinha, tia e sobrinho, conforme o enunciado 98 CJF/STJ, continua em vigor o Dec.-lei 3.200/1941, que autoriza o casamento entre colaterais de 3º grau, se uma junta médica apontar que não há risco à prole. Obs: os primos são colaterais de 4º grau e, portanto, podem se casar livremente. c) Art. 1.521, III Não podem se casar filho adotivo com o cônjuge do adotante e o adotante com o cônjuge do filho adotivo, a fim de preservar a legitimidade das relações familiares e a moral do lar. Não obstante, não há mais necessidade dessa regra especial, tendo em vista que, hoje, o filho adotivo será enquadrado na regra do inciso I. Portanto, aos impedimentos decorrentes da ação apresenta-se o esquema a seguir: 14 Adotado com esposa do adotante (há impedimento) Adotado com filha do adotante (há impedimento) Adotado com mãe do adotante (há impedimento) Adotado com irmã do adotante (não há impedimento) Obs: o adotado pode se casar com a irmã do adotante, pois é como se fosse uma tia e aqui não há risco à prole. Ademais, a lei não prevê este impedimento e norma restritiva não admite interpretação extensiva. d) Art. 1.521, IV Não podem se casar os irmãos, unilaterais ou bilaterais, e demais colaterais até o 3.º grau, inclusive. Vedação que se funda, assim como no inciso I, em razões morais e biológicas ou eugênicas. e) Art. 1.521, V Não podem se casar o adotado com o filho do adotante, uma vez que ambos são irmãos, preservando-se, assim, a moral familiar. “Art. 1.521, IV, do novo CC: o inc. IV do art. 1.521 do novo CC deve ser interpretado à luz do Decreto-Lei n. 3.200/1941 no que se refere à possibilidade de casamento entre colaterais de 3º grau” (Enunciado n. 98 da I Jornada do CJF). f) Art. 1.521, VI Não podem se casar pessoas casadas (tal impedimento deriva da proibição da bigamia, por ter a família base monogâmica). O segundo casamento não se convalida com a dissolução do primeiro casamento nem com a viuvez. A nulidade absoluta do primeiro casamento, no entanto, convalida o segundo casamento. Entretanto o Código Civil de 2002 admite que uma pessoa casada, desde que separada de fato, judicialmente ou extrajudicialmente, constitua união estável (art. 1.723 § 1.° CC/2002). g) Art. 1.521, VII Não podem se casar o cônjuge sobrevivente com o autor de homicídio ou tentativa contra seu consorte, por haver a presunção legal absoluta de que o crime teria provocado, entre o cônjuge sobrevivente e o criminoso que lhe destruiu o lar e as afeições que deveria sentir em relação ao seu cônjuge, uma repugnância invencível. Trata-se de impedimentum criminis. Segundo a doutrina, exige-se que o crime seja doloso e com trânsito em julgado da sentença. 15 A sentença penal condenatória superveniente não nulifica o casamento. Obs: o Código Civil de 2002 não prevê mais o impedimento entre o cônjuge adúltero e o seu corréu (art. 183, VII do CC/16). Não há mais o que se falar neste impedimento, pois adultério não é mais crime e, ainda, porque a culpa está sendo mitigada no Direito de Família. 2.8.2 Impedimentos suspensivos Esses impedimentos apenas suspendem a realização do casamento, não havendo qualquer sanção como ocorria no sistema anterior (Código Civil de 1916). Nas quatro hipóteses, o legislador procurou impedir a ocorrência de confusão patrimonial. Não obstante, o legislador do Código Civil de 2002 foi bastante flexível, pois autorizou que o Juiz permitisse a não aplicação de três hipóteses suspensivas quando verificasse que a proteção patrimonial seria desnecessária. “As causas suspensivas da celebração do casamento poderão ser arguidas inclusive pelos parentes em linha reta de um dos nubentes e pelos colaterais em segundo grau, por vínculo decorrente de parentesco civil” (Enunciado n. 330 da IV Jornada do CJF de D. Civil). Reitere-se que os impedimentos suspensivos não geram a nulidade absoluta ou relativa do casamento, mas apenas impõe sanções aos cônjuges, basicamente o regime da separação obrigatória de bens (art. 1.641, I), além disso, suspendem a celebração do casamento, podendo ser arguidas pelos parentes em linha reta ou colaterais de 2° grau de um dos nubentes, sejam consanguíneos ou afins. As causas suspensivas envolvem ordem privada, pois relativas a questões patrimoniais e por isso não podem ser conhecidas de ofício. a) Art. 1.523, I, do CC/2002 Não devem se casar viúva ou viúvo, se houver filhos do casamento anterior, antes de fazer o inventário. O caso desse inciso (casamento de viúvo(a) antes de ser feito o inventário) acarretará a perda do usufruto dos bens dos filhos. Para que incida a suspensão, portanto, é necessário que existam filhos do cônjuge falecido; que da morte do cônjuge não tenha sido feito inventário; que existam bens a serem partilhados. Aqui surge outra sanção, uma hipoteca legal a favor dos filhos sobre os bens imóveis dos pais (art. 1.489, II, do CC/2002). Havendo prova da ausência de prejuízo patrimonial, cessa a causa suspensiva (art. 1.523, parágrafo único, do CC/2002). b) Art. 1.523, II, do CC/2002 Não pode se casarmulher viúva, divorciada ou com o casamento anulado até 10 meses do começo da viuvez. Tal impedimento tem por finalidade evitar a existência de 16 dúvidas quanto a paternidade de eventual filho. A previsão visa a evitar confusões quanto à origem da prole (“Turbatio Sanguinis” ou “Confusio Sanguinis”) o que pode repercutir no campo patrimonial. A jurisprudência, no entanto, entende que, sendo comprovada a ausência de gravidez, o casamento poderá ser realizado antes desse prazo. Hoje, a despeito do entendimento da jurisprudência, o parágrafo único do art. 1.523 dá plenos poderes ao Juiz para suspender a incidência da hipótese suspensiva. c) Art. 1.523, III, do CC/2002 O divorciado, para se casar em novas núpcias, precisa partilhar seus bens com o cônjuge anterior. Isso porque a pessoa divorciada tem plena liberdade para manter o condomínio patrimonial existente com o cônjuge anterior, estabelecendo-se cotas ou partes ideais para ambos os divorciados no termo da separação ou mesmo no do divórcio. Para que possa se casar novamente, porém, terá que proceder à extinção desse condomínio, a fim de não gerar qualquer confusão patrimonial. Essa hipótese foi introduzida, pois o Código Civil de 2002 possibilita o divórcio sem prévia partilha de bens (art. 1.581 do CC/2002), inclusive extrajudicialmente sem partilha de bens (Lei 11.441/2007). Provada a ausência de prejuízo patrimonial, cessa a causa suspensiva (art. 1.523, parágrafo único, do CC/2002). d) Art. 1.523, IV, do CC/2002 Não podem se casar tutor ou curador e seus ascendentes, descendentes, irmãos, cunhados ou sobrinhos, com o tutelado ou o curatelado enquanto não cessarem a tutela e a curatela e não estiverem saldadas as respectivas contas. A causa suspensiva se justifica, pois a influência do tutor ou curador poderia induzir, a erro, o tutelado ou curatelado, influenciando na questão patrimonial. Havendo prova da ausência de prejuízo patrimonial para o tutelado ou curatelado, cessa a causa suspensiva (art. 1.523, parágrafo único). Obs: o Código Civil de 2002 não prevê mais o antigo impedimento impediente entre o juiz ou escrivão e seus parentes, em relação a órfão ou viúva da comarca. 2.9 Invalidade do casamento A doutrina aponta três hipóteses relacionadas à invalidade: a) Casamento inexistente; b) Casamento nulo; c) Casamento anulável 17 Quanto ao casamento inexistente, a teoria da inexistência não é unanimidade doutrinária pela ausência de hipóteses legais, uma vez que o art. 104 do CC/2002 trata diretamente da validade do negócio jurídico. a) Inexistência É o vício decorrente da ausência de algum dos requisitos essenciais do casamento. É aquele ato que tem a aparência de casamento, mas nem chega a existir como tal no plano jurídico. Com efeito, a relativa capacidade para consentir gera a anulabilidade. O louco pode se casar, dependendo do grau de loucura. A coação é causa de anulabilidade, porém, se esta for absoluta, então será caso de inexistência, ante a ausência total de consentimento válido. O casamento por procuração exige que o procurador possua poderes especiais para consentir. Se o procurador, portanto, não tiver poderes especiais para consentir, o casamento será considerado inexistente. Pela Constituição Federal de 1988, a autoridade celebrante do casamento no Brasil é o juiz de paz, entretanto, muitos estados não regulamentaram a justiça de paz, caso de São Paulo que a autoridade é o juiz de casamento. São exemplos de incompetência absoluta da autoridade: - Casamento celebrado por juiz de direito havendo justiça de paz; por promotor de justiça; delegado de polícia; por autoridade local (Coronel). O art. 1.554 prevê que o ato pode ser convalidado se a autoridade exercer publicamente o ato, ocorrendo o registro posterior. Surge polêmica em relação ao dispositivo: Para uma 1ª corrente, o dispositivo somente se aplica à incompetência relativa em relação ao local, ou seja, ratione loci, porque o ato inexistente não pode ser convalidado. Já para uma 2ª corrente o art. 1.554 tem sentido amplo, também se aplicando à incompetência absoluta. Não há necessidade de ação para reconhecer a inexistência do casamento (posição majoritária). Se o casamento, porém, apesar do vício de origem, foi celebrado e registrado, haverá necessidade de ação judicial para o reconhecimento da inexistência do ato e cancelamento do registro, no caso, ação declaratória de inexistência de relação jurídica. b) Nulidade Prevista em duas hipóteses: 18 • Quando o casamento for celebrado com violação de impedimentos absolutos (art. 1.521, I a VII, do CC/2002). • Quando o casamento tiver como um dos cônjuges pessoa enferma mental sem o necessário discernimento para os atos da vida civil. Regras e procedimentos da ação declaratória de nulidade de casamento 1) A ação é imprescritível, pretensão não sujeita a prescrição ou decadência, primeiro porque a nulidade não convalesce com o decurso do tempo (art. 169 do CC/2002), segundo, porque a ação envolve estado de pessoas e ordem pública e terceiro, porque é essencialmente declaratória. Vale lembrar que o Código Civil de 2002, quanto à prescrição e decadência, adotou os critérios de Agnelo Amorim Filho (1ª Publicação RT 300 pág. 7 e 744 pág. 725). A ação declaratória (nulidade) é imprescritível. A ação condenatória (cobrança e reparação de danos) o prazo correspondente é de prescrição. A ação constitutiva, positiva ou negativa (anulatória), o prazo é de decadência. 2) A ação declaratória de nulidade pode ser proposta por qualquer interessado ou pelo MP, por envolver ordem pública (art. 1.549 do CC/2002). 3) Segundo a doutrina, a nulidade do casamento não pode ser reconhecida de ofício pelo juiz, mas apenas o impedimento matrimonial (VENOSA). 4) Não há mais necessidade de atuação do curador do vínculo ou guardião do casamento como previa o art. 222 do CC/1916, entretanto, segundo a doutrina, o MP deve atuar como fiscal da lei, pois a ação é de Estado (VENOSA). 5) A ação de nulidade de casamento, assim como a ação de anulabilidade, podem ser precedidas por medida cautelar de separação de corpos (art. 1.562 CC/2002). 6) O casamento nulo, assim como o anulável, geram efeitos para os filhos e também para o cônjuge de boa fé, sendo denominado casamento putativo (art. 1.561, caput, do CC/2002). 7) A sentença declaratória de nulidade tem efeitos retroativos à data da celebração do casamento, ou seja, efeitos ex tunc (art. 1.563 CC/2002), entretanto essa 19 sentença não pode prejudicar os direitos adquiridos onerosamente e de boa-fé ou coisa julgada, isso porque a boa fé objetiva (conduta de lealdade) como preceito de ordem pública que é, vence a nulidade do casamento. c) Anulação Prevista em seis hipóteses: • De quem não completou a idade mínima para casar. Segundo o art. 1.551, não se anulará o casamento por motivo de idade se dele resultou gravidez (convalidação). Além disso, o próprio menor pode confirmar o casamento depois de completar a idade núbil com a autorização de seus representantes (se necessário) ou com suprimento judicial (art. 1.553 CC). O prazo decadencial para ação anulatória é de 180 dias, havendo variação quanto ao início do prazo. • Do menor de idade núbil, quando não autorizado por seu representante legal. Conforme art. 1.555, § 2.°, do CC/2002, não se anulará esse casamento quando à sua celebração houverem assistido os representantes legais do incapaz ou tiverem por qualquer modo manifestado sua aprovação (convalidação do casamento). O dispositivo está inspirado na máxima que veda o comportamento contraditório relacionada à boa fé objetiva: venire contra factum proprium non potest. • Por vício da vontade (arts. 1.556 a 1.558 do CC/2002) Segundo o art. 1.558 CC, essa coação é fundada em temor de mal considerável e iminente paraa vida, a saúde e a honra do cônjuge ou de seus familiares. O art. 1.559 do CC/2002 prevê que a ação só cabe ao cônjuge que sofreu a coação, mas a coabitação, havendo ciência do vício, convalida o ato. O dispositivo está inspirado na máxima venire contra factum próprio non potest. O prazo para a ação anulatória é decadencial de quatro anos contados da celebração do casamento. • Do incapaz de consentir ou manifestar, de modo inequívoco, o consentimento. A previsão engloba os ébrios habituais e os toxicômanos (art. 4º, II, do CC/2002), bem como que, por causa transitória ou permanente, não puderem exprimir sua vontade 20 (art. 4°, III), segundo o entendimento majoritário da doutrina. Entretanto, há quem entenda que nessa última hipótese o casamento pode ser nulo ou inexistente. Quanto aos pródigos esses podem se casar livremente, pois a interdição é relativa para os atos de alienação direta. (art. 1.782 do CC/2002). • Se o pródigo se casa sem pacto antenupcial, o seu regime será o da comunhão parcial de bens (art. 1.640, caput, do CC/2002). O prazo decadencial no caso do incapaz de consentir é de 180 dias a contar do casamento. • Realizado pelo mandatário, sem que ele ou o outro contraente soubesse da revogação do mandato, e não sobrevindo coabitação entre cônjuges. O Código Civil de 2002 admite o casamento por procuração, desde que o mandato seja por escritura pública e com poderes especiais. Admite-se o duplo mandato, desde que os mandatários sejam distintos (Pontes de Miranda). Havendo revogação do mandato e ocorrência do casamento, este será anulável, mesmo efeito presente nos casos de invalidade judicial do mandato (art. 1550, parágrafo único, do CC/2002) ― hipótese de coligação negocial. A coabitação convalida o ato e a ação anulatória somente cabe ao mandante. O prazo da ação anulatória: decadencial de 180 dias, a contar do conhecimento, pelo mandante, da realização do casamento. • Por incompetência da autoridade celebrante. É o caso do juiz de paz de uma localidade que celebra o casamento em outra localidade, aplicando-se o art. 1.554 do CC/2002 que admite a convalidação havendo publicidade e registro posterior. O prazo decadencial da ação anulatória é de dois anos, também a contar do casamento. EFEITOS E PROCEDIMENTOS DA ACAO ANULATÓRIA DE CASAMENTO 1) A ação anulatória de casamento é constitutiva negativa, o que justifica os prazos decadenciais. 21 4 anos - coação 3 anos - erro O art. 1.557 do CC/2002 dispõe os motivos da anulação do casamento por erro essencial sobre a pessoa do outro cônjuge, os quais estão tipificados em um rol taxativo: c.1. Inciso I Erro quanto à identidade do outro cônjuge (física ou moral). O erro quanto à identidade física poderá ocorrer, por exemplo, no casamento por procuração, quando o procurador não conhece a pessoa do outro cônjuge, vindo a celebrar o casamento com a pessoa errada. A identidade moral da pessoa diz respeito à honra, à boa fama do outro cônjuge e ao seu comportamento. c.2. Inciso II Ignorância de crime praticado pelo cônjuge antes do casamento, em condenação definitiva (trânsito em julgado), que torne insuportável a vida em comum. A condenação poderá se dar depois do casamento, mas o crime deverá ter sido cometido antes. Caso o crime seja praticado depois do casamento, não ensejará pedido de anulação, mas separação culposa. c.3. Inciso III Ignorância quanto a defeito físico irremediável, que não caracterize deficiência, ou doença grave e transmissível, anterior ao casamento, capaz de pôr em risco a saúde do outro cônjuge ou a sua descendência. O defeito físico deve ser um obstáculo para a consumação do casamento. Exemplo: impotência sexual. A impotência sexual nem sempre permitirá a anulação do casamento, o que somente ocorrerá se vier a impedir a consumação de relações sexuais. Para se auferir a gravidade da impotência, deve-se distinguir sua natureza e grau, se absoluta ou relativa, utilizando-se de perícia médica, a qual avaliará caso a caso. • Impotência sexual de caráter instrumental, para a prática da conjunção carnal – acipiendi (mulher com defeito de formação): sendo o sexo impossível, considera-se que não há coabitação, assistência, nem mesmo débito conjugal, o que possibilita a anulação do casamento; • Impotência quanto à capacidade de ter filhos – infertilidade: não pode ser anulado o casamento, pois a procriação não é da essência do casamento, mas, sim, os deveres de criar e educar os filhos porventura havidos. Em havendo grave moléstia de saúde transmissível, capaz de pôr em risco o outro cônjuge ou a sua descendência, esta deverá ter sido contraída anteriormente ao casamento e independerá da existência ou não de culpa do cônjuge doente. 22 Em relação à AIDS, tendo o cônjuge não doente conhecimento de que o outro cônjuge lhe é portador, não se poderá anular o casamento; se for adquirida após o casamento, também não se anulará, pois não terá havido erro quando do casamento, podendo ser decretada a separação do casal; se a doença advier de má conduta anterior ao casamento, como uma vida promíscua, será anulável, com fulcro no inciso I, por configurar hipótese de erro quanto à identidade do outro cônjuge; se não decorrer de má conduta e a doença for posterior, não se anula o casamento. c.4. Inciso IV A Lei 13.146 de 2015 Estatuto da Pessoa com Deficiência, dentre as mudanças implementadas, revogou o inciso IV do art. 1.557, que considerava erro essencial quanto à pessoa do outro cônjuge a “a ignorância, anterior ao casamento, de doença mental grave que, por sua natureza, torne insuportável a vida em comum ao cônjuge enganado.” É bom notar que a “doença mental ou distúrbio mental” a que fazia menção a regra originalmente insculpida pelo legislador de 2002 eram de caráter psicológico (uma esquizofrenia, por exemplo), não interferindo na questão do discernimento para os atos da vida civil. Isso significa que a pessoa não possuía uma “imbecilidade ou idiotia”, pois, se o tivesse, sob a égide da redação original do Código Civil, seria caso de nulidade do casamento. Ainda assim, a regra foi revogada pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência. Para invalidar um casamento (anulação ou nulidade), é necessário que seja proposta uma ação ordinária (art. 1.562 do CC). No caso de anulação, a lei dispõe quais serão os seus titulares, sendo que o Juiz não poderá agir de ofício. Essa ação tem algumas peculiaridades: • Juiz competente é aquele da Vara de Família, quando houver. • Trata-se de uma ação de estado, versando sobre direito indisponível, de modo que não se admite acordo nem confissão. • O MP funciona, necessariamente, como custos legis. No caso da ação de nulidade, poderá, inclusive, ser o autor da ação. • Não há mais necessidade de observância do reexame necessário em face da sentença que anular o casamento, ante as modificações da Lei 10.352/2001, que restringiu as hipóteses dessa condição de eficácia da sentença de primeiro grau. 23 24 Todos os direitos reservados. É terminantemente proibida a reprodução total ou parcial deste material didático, por qualquer meio ou processo. A violação dos direitos autorais caracteriza crime descrito na legislação em vigor, sem prejuízo das sanções civis cabíveis. EXERCÍCIOS 1) Com relação ao Direito de Família e inovações constitucionais é INCORRETO afirmar: a) Estabeleceu-se a igualdade de direitos entre homem e mulher no que concerne à sociedade conjugal, de modo que os direitos e deveres dela oriundos serão exercidos por ambos. b) O texto constitucional inaugura o pluralismo das relações familiares, criando um piso mínimo constitucional. c) Reconheceu como unidade familiar, ao lado do casamento, a união estável e família monoparental. d) Confirmou o instituto do casamentocomo o modelo familiar paradigmático. 2) De acordo com a Constituição Federal, a família: a) É base da sociedade, tem especial proteção do Estado. b) É o vínculo jurídico existente apenas entre um homem e uma mulher visando à comunhão plena de vida baseada na afetividade. c) Tem como princípio a patriarcalização. d) É aquela instituída pelo casamento. 3) A família constituída por apenas duas irmãs, nesta hipótese podemos dizer que se trata de: a) Família monoparental. b) Família anaparental; c) Família isosexual; D) Família mosaico. 4) Assinale abaixo a união característica de uma família mosaico: a) quando um homem e uma mulher passam a viver em união estável. b) quando um homem com quatro filhos de três relacionamentos distintos passa a viver em união estável com uma mulher que tem cinco filhos de três relacionamentos distintos. 25 c) quando duas mulheres passam a viver em união estável. d) quando duas irmãs e três irmãos frutos do mesmo casamento passam a viver no mesmo imóvel. 5) Com relação ao consentimento dos nubentes para casar, é INCORRETO afirmar: a) Para que o casamento tenha existência, deverá haver a manifestação livre e consciente dos nubentes no momento da sua celebração, daí decorrendo a necessidade do seu consentimento pleno. b) Ausente totalmente o consentimento pleno, o casamento será inexistente. c) Se houver a manifestação de consentimento defeituoso (por exemplo, mediante coação), o casamento tornar-se-á anulável. d) Havendo coação no consentimento o casamento será nulo. 6) Assinale a alternativa INCORRETA: a) O rol constante do artigo 226 da Constituição Federal encerra rol taxativo, não se admitindo outras manifestações familiares. b) Família pluriparental também é denominada família mosaico. c) Relações familiares estabelecidas entre ascendentes e descendentes são denominadas famílias monoparentais. d) É defeso a qualquer pessoa, de direito público ou privado, interferir na comunhão de vida instituída pela família. 7) É CORRETO afirmar: a) O casamento se realiza no momento em que o homem e a mulher manifestam, perante o juiz, a sua vontade de estabelecer vínculo conjugal, e o juiz os declara casados. b) A habilitação para o casamento, o registro e a primeira certidão serão sempre isentos de selos, emolumentos e custas. c) O casamento religioso, que atender às exigências da lei para a validade do casamento civil, equipara-se a este, desde que registrado no registro próprio, produzindo efeitos a partir da data do seu registro. d) É defeso a qualquer pessoa interferir na comunhão de vida instituída pela família, salvo as pessoas de direito público, em razão de interesse manifesto coletivo. 8) Assinale a alternativa CORRETA: a) O casamento religioso, que atender às exigências da lei para a validade do casamento civil, equipara-se a este, desde que registrado no registro próprio, produzindo efeitos a partir da data de seu registro. b) O casamento religioso, que atender às exigências da lei para a validade do casamento civil, equipara-se a este, desde que registrado no registro próprio, produzindo efeitos a partir da data de sua celebração. 26 c) O casamento civil, que atender às exigências da lei para a validade do casamento religioso, equipara-se a este, desde que celebrado por autoridade religiosa, produzindo efeitos a partir da data de sua celebração. d) O casamento religioso, que atender às exigências da lei para a validade do casamento civil, equipara-se a este, ainda que não registrado em registro próprio, uma vez que passa a produzir seus efeitos a partir da data de sua celebração. 9) De acordo com o entendimento do Supremo Tribunal Federal: a) É vedado o reconhecimento de união estável entre pessoas do mesmo sexo. b) O reconhecimento da união afetiva entre pessoas do mesmo sexo contraria aos preceitos constitucionais da instituição da família. c) Os mesmos direitos e deveres dos companheiros nas uniões estáveis estendem-se aos companheiros nas uniões entre pessoas do mesmo sexo. d) Silêncio normativo da Carta Magna a respeito da união estável entre pessoas do mesmo sexo como saque da kelseniana "norma geral negativa", segundo a qual "o que não estiver juridicamente permitido, está proibido”, impede o reconhecimento desse direito. 10) Assinale a alternativa INCORRETA: a) O casamento se realiza no momento em que o homem e a mulher manifestam, perante o juiz, a sua vontade de estabelecer vínculo conjugal, e o juiz os declara casados. b) O casamento religioso, que atender às exigências da lei para a validade do casamento civil, equipara-se a este, desde que registrado no registro próprio, produzindo efeitos a partir da data de sua celebração. c) O registro do casamento religioso submete-se aos mesmos requisitos exigidos para o casamento civil. d) O casamento estabelece comunhão plena de vida, com base na igualdade de direitos e deveres dos cônjuges, em razão do pátrio poder. 11. (Ano: 2018 Banca: MPE-BA Órgão: MPE-BA Prova: MPE-BA - 2018 - MPE-BA - Promotor de Justiça Substituto) Quanto à disciplina jurídica do direito matrimonial, é correto afirmar que a) não podem casar o adotante com quem foi cônjuge do adotado e o adotado com quem o foi do adotante. b) as causas suspensivas da celebração do casamento podem ser arguidas por qualquer interessado. c) o homem ou a mulher com dezesseis anos de idade, em virtude da evolução natural dos costumes, pode casar independentemente de autorização dos pais. 27 d) para a teoria institucionalista, o casamento é instituição quanto ao conteúdo, mas se admite tratar de um contrato quanto à forma. e) o requerimento e a habilitação do casamento serão firmados pelos nubentes de próprio punho, não se admitindo a presença de procurador. 12. (Ano: 2018 Banca: CONSULPLAN Órgão: TJ-MG Prova: CONSULPLAN - 2018 - TJ-MG - Titular de Serviços de Notas e de Registros – Provimento) São impedidos de casar a) os parentes colaterais até o quarto grau. b) os afins em linha reta e em linha colateral. c) o adotante com quem foi cônjuge do adotado e o adotado com quem o foi do adotante. d) o divorciado, enquanto não houver sido homologada ou decidida a partilha dos bens do casal. 13. (Ano: 2018 Banca: FCC Órgão: MPE-PB Prova: FCC - 2018 - MPE-PB - Promotor de Justiça Substituto) O Ministério Público pode, mediante ação direta, promover a decretação de nulidade de casamento a) por incompetência da autoridade celebrante. b) realizado entre madrasta, que novamente viuvar-se, e seu enteado. c) realizado entre primos. d) do incapaz de consentir ou manifestar de modo inequívoco o consentimento. e) de quem não completou a idade mínima para casar. 14. (Ano: 2018 Banca: FCC Órgão: DPE-AM Prova: FCC - 2018 - DPE-AM - Defensor Público – ReaplicaçEo) Considerando-se os princípios atuais aplicáveis à família, inclusive sob o prisma constitucional, 28 a) o casamento homoafetivo é possível, estabelecendo relações obrigacionais mútuas, mas por falta de previsão legal não estabelece relações sucessórias, devendo os cônjuges homoafetivos beneficiarem-se por meio de testamento. b) à união estável aplicam-se somente as normas do direito civil obrigacional, acrescidas daquelas que amparam a mulher previdenciariamente e no reconhecimento da constituição de patrimônio comum. c) nada obstante a igualdade jurídica entre homem e mulher, permanece o patriarcalismo, residualmente, na administração do patrimônio material do núcleo familiar. d) os filhos possuem direitos iguais, independentemente de sua origem, salvo aqueles adotados após a maioridade, em relação a restrições sucessórias, somente. e) a paternidade socioafetiva, declarada ou não em registro público, não impede o reconhecimento do vínculo de filiação concomitante baseado na origem biológica, com todas as suas consequências patrimoniais e extrapatrimoniais.29 GABARITO Exercícios Objetivos Direito Civil 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 A A B B D A A B C D B C B E MÓDULO XVII DIREITO CIVIL Direito de Família EFEITOS E PROCEDIMENTOS DA ACAO ANULATÓRIA DE CASAMENTO
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