Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
RELAÇÕES INTERPESSOAIS NAS ORGANIZAÇÕES Introdução Este capítulo trará ideias básicas para o conhecimento dos processos individuais e coletivos no estabelecimento das relações interpessoais no contexto do trabalho. Você compreenderá com profundidade os alicerces teóricos que explicam três fatores determinantes do desenvolvimento humano e como eles explicam as relações estabelecidas pelas pessoas no trabalho. O primeiro, desenvolvido no subtítulo, desenvolvimento psicossocial, destaca como as relações psicológicas e sociais são as responsáveis pela capacidade futura do adulto de amar e se relacionar, na visão de Erik Erikson que estudou o desenvolvimento humano sob essas duas perspectivas e na superação de crises e desafios durante essa caminhada. Você conseguirá entender que a qualidade na resolução dessas crises poderá favorecer ou não a estrutura psíquica do ser humano e, que justamente o tipo de desfecho que ele obtém, poderá influenciar a forma como ele percebe e se coloca diante do mundo e das relações. O segundo, fundamentado no desenvolvimento moral dos seres humanos, auxiliará a compreender que cada indivíduo pode as pessoas possuem uma orientação moral diversa , de modo que isso pode fundamentar relacionamentos interpessoais alicerçados no respeito às normas, regras e as diferenças individuais ou potencializar tensões ou conflitos, intragrupais sempre e quando prevalece a falta da empatia, e a escuta orientada a entender as necessidades alheias. O terceiro, destaca a importância do homem em grupo. Cada adulto foi educado e cuidado por pessoas diferentes, viveram em meios diferentes e, essas diferenças individuais aparecem na convivência grupal. Estas diferenças somadas e integradas em um grupo onde as pessoas interagem com visões e percepções diferentes são um potencial para inovações e aprendizagens, através da troca e respeitos mútuos. Nas novas tendências em que se definem as “organizações que aprendem” estas diferenças servem na verdade de contraponto para surgir o novo. A valorização das diferenças nunca foi tão empregada como está sendo na atualidade. A interação social supre em primeiro lugar a necessidade de vinculação e identificação e os grupos de trabalho são um campo social em que a pessoa busca sua realização, com outras pessoas, pois agora está pronta para aumentar este campo em atividades profissionais e de produção, essenciais para a saúde mental além da sobrevivência básica. Por fim, este capítulo situa as raízes dos avanços dos trabalhos em relacionamento interpessoal nas organizações. Atividades inseridas nas organizações que objetivam buscar uma melhor interação dos indivíduos através de dinâmicas de grupo e vivências para que os grupos encontrem sua maturidade e consigam alcançar ou se aproximar da terceira necessidade. Você já está curioso para mergulhar nesse conteúdo? Então, vamos lá? Desejo que você tenha um ótimo aprendizado! Capítulo 3 Diferentes formas de sentir, ver e perceber o mundo, as situações e as pessoas à sua volta são as marcas da individualidade. Imagine duas pessoas muito amigas que conversam e trocam ideias sentadas na areia à beira mar. Uma pode olhar para essa imensidão de água e admirá-la como uma divina natureza, que acalma, tranquiliza, que suaviza as tensões e se motiva para adentrar até o fundo, como está acostumada a fazer e sentir as ondas batendo em seu corpo. Já a outra observa atentamente como ameaçador, perigoso, e traiçoeiro, gosta de estar ali, mas não se motiva para banhar-se. Nunca entra no mar e passa toda a parte do tempo do lado de fora. Porque as duas pessoas percebem o mar de formas tão contrárias? Experiências da infância e formação da personalidade, situações traumáticas da infância ou até da fase adulta, conhecimentos, ideias, uma série de variáveis vão desenhando a nossa individualidade ou “o nosso jeito de ser, ver e se relacionar”. Estas formas diferentes de ser, caracterizam os traços e comportamentos que as pessoas utilizam para interagir e atuar com o ambiente externo. E perceba que, mesmo com esta incrível diferença sobre o mesmo tema, mantêm um ótimo relacionamento entre elas. Essa situação cotidiana e simplória ilustra a realidade das conexões entre as pessoas através dos relacionamentos interpessoais. E mesmo que as pessoas sejam diferentes, a relação entre elas pode modificar determinadas percepções uma da outra para se adaptarem ao meio externo mais adequadamente. Como exemplo, poderíamos, ainda de maneira simples, imaginar que estas duas pessoas ao falar sobre o mar trocassem percepções pessoais uma da outra como um feedback e sobre a visão do mar de cada uma. Aquela que via só aspectos positivos do mar sairia desta conversa vendo também os perigos que ele tem. Portanto, passaria a se cuidar um pouco mais quando fosse ao fundo nadar. E a outra passaria a perceber melhor a beleza e o benefício de pelo menos molhar os pés ou entrar só na parte rasa do mar, sem medo. Existem, na essência humana, um conjunto de fatores que são determinantes para que se estabeleçam relações interpessoais saudáveis e efetivas no contexto organizacional e que se encontram diretamente entrelaçados ao desenvolvimento psicológico, moral e social das pessoas. O desenvolvimento psicossocial A necessidade de estar com o “outro” inicia-se já na fase fetal e ao longo do desenvolvimento e as influências que recebe vai desenhando a maneira de ver e sentir além de outras coisas, a necessidade de se relacionar, de não estar só. O capítulo I apresentou brevemente, sob a dimensão intrapsíquica e social a relação dos momentos do ciclo vital que estruturam os indivíduos a constituírem no mundo adulto relações interpessoais saudáveis ou não. Sabemos que os momentos de vida iniciais da infância são cruciais para isso e que de uma dependência bem vivida a criança tende a ser um adulto independente com limites. Se a criança estiver devidamente protegida tende a ser um adulto seguro e com valores. Mas se for criada com intolerância e desamor provavelmente será um adulto inseguro com auto- imagem e auto- estima negativas e introjetado valores distorcidos. Criança emocionalmente abandonada será um adulto sem visão com sentimento de inadequação e culpa. Erik Erikson, importante expoente da psicologia, compreendeu o desenvolvimento humano como um processo psicológico e social, daí ser denominado de psicossocial e ocorrendo em oito momentos ocorrendo de forma dinâmica e contínua, do nascimento à morte e dependerá fundamentalmente da cultura e do contexto social no qual o indivíduo está inserido. Em cada estágio manifesta-se uma crise ou conflito que será vivido em função do momento do ciclo vital que o indivíduo se encontra, A crise consiste num conflito ou dilema que deve ser resolvido, sendo que existem duas possibilidades: um desfecho positivo e um negativo para cada um deles. Em cada uma delas o ser humano tem que passar por um conflito ou uma crise e que a maneira como cada um resolve esses conflitos, o prepara com mais efetividade para viver o momento de vida posterior ou vai fragilizando sua estrutura, quando o desfecho não é favorável. Se o conflito é resolvido de maneira satisfatória, a qualidade positiva é construída no ego e o desenvolvimento é sadio. Se o conflito é resolvido de maneira insatisfatória, a qualidade negativa se incorpora ao ego e o desenvolvimento é prejudicado. As crises psicológicas que permitem ao indivíduo adquirir sentimentos, como confiança em si próprio, autonomia, iniciativa, ou, ao invés, falta de confiança, sentimentos de inferioridade e culpabilidade, surgem ao longo da vida, distribuídas por 8 idades, em cada uma das quais aparecem virtudes específicas. Abaixo, você encontrará uma síntese desses 8 estágios com suas respectivas crises/desafios e as consequências da crise na vertente positiva e negativa. Momento do ciclo vital (aproximação) Crise Desfecho Positivo Desfecho Negativo (0 - 18 meses) ConfiançaX Desconfiança sentimento de confiança relativamente aos outros e ao meio suspeita, medo, insegurança relativamente aos outros e ao meio. (18 meses – 3 anos) Autonomia x Dúvida e Vergonha sentimento de autossuficiência, auto eficácia, crença em suas habilidades, autonomia falta de independência, medo de tentar, receio de errar (3 - 6 anos) Iniciativa X Culpa capacidade para iniciar ações. sentimento de culpabilização pelo que faz e pelo que pensa. (6 - 12 anos) Diligência vs. Sentimento de inferioridade. A Reforço ao sentido da competência. Falta do sentido da competência, sentimento de inferioridade. (12 aos 18/20anos) Difusão/Confusão formação de uma identidade pessoal, reconhecimento de papéis a seguir. incapacidade de definir papéis a seguir, indecisão, confusão de papéis. (18/20 – faixa dos 30 anos Intimidade versus Isolamento desenvolvimento das relações de intimidade (relações amorosas e de amizade) receio de estabelecimento de relações com os outros evitando compromissos e proximidade ( faixa dos 30 anos aos 60) Generatividade versus Estagnação Capacidade de produção, e de fazer algo pela sociedade. Voltado para si, próprio e desinteresse necessidades dos outros (após 65 anos) Integridade versus Desespero sentimento de realização e plenitude face ao passado. sentimento de que se perderam oportunidades importantes, não viveu de forma adequada a vida, arrependimentos. O conceito de crise é para Erikson fundamental para a construção da personalidade, pois de acordo com a forma como ela for resolvida, a pessoa se situará mais ou menos adequadamente nas relações interpessoais estabelecidas ao longo da vida e no trabalho. Um segundo ponto relevante para compreendermos as relações interpessoais estabelecidas pelas pessoas no mundo do trabalho, refere-se à fase do desenvolvimento moral individual. O desenvolvimento moral O desenvolvimento moral do ser humano se inicia na mais tenra idade: desde o momento em que nasce e inicia suas relações com o mundo externo. Essas relações são permeadas por valores, princípios e regras para o convívio coletivo. Kohlberg estudou o desenvolvimento moral propondo que ele ocorre em três níveis e seis estágios, sendo cada nível composto por dois estágios, como pode ser observado na síntese a seguir. O autor não se preocupou em relacionar o desenvolvimento moral a uma idade cronológica, mas a forma como ele ocorre: Nível pré-convencional: No estágio I, a moralidade de um ato é definida em termos de suas consequências físicas para o agente. Se a ação é punida, está moralmente errada; se não for punida, está moralmente correta. Já no estágio II. A ação moralmente correta é definida em termos de utilidade, prazer ou da satisfação das necessidades da pessoa (= egocentrismo na satisfação dos desejos). A igualdade e a reciprocidade emergem como "olho por olho, dente por dente". Nível convencional: No estágio III, o comportamento moralmente certo é o que ganha a aprovação de outros. Trata-se da moralidade de conformismo para ser bom moço, boa moça!. Já no estágio IV, a atitude moralmente correta é aquela orientada para a lei e a ordem social, há um grande respeito pelos valores vigentes na sociedade, pela autoridade, por regras fixas e pela manutenção da ordem social. A justiça tem a ver com a ordem social estabelecida e não é uma questão de escolha pessoal moral. Existem normas que promovem o bem estar social e elas devem ser respeitadas. Nível pós-convencional: No estágio V, sabe-se que existem normas sociais largamente aceitas. As leis não são mais consideradas válidas pelo mero fato de serem leis. O indivíduo admite que as leis ou costumes morais podem ser injustos e devem ser mudados. O indivíduo reflete acerca do “contrato social” e respeito às leis como fonte de justiça social. No estágio VI, o pensamento pós-convencional atinge seu nível mais alto. O indivíduo reconhece a existência de princípios morais universais, do direito à igualdade, respeito e dignidade humana e, nas suas práticas, adere a eles, com base nos seus princípios éticos, mesmo que os princípios morais não sejam socialmente respeitados (Ex. Direitos Humanos)= São adotados princípios éticos independentes deles fazerem parte dos valores sociais. O fato de sermos adultos nos coloca necessariamente no mais alto nível do desenvolvimento moral? Certamente que não. Então, como podemos relacionar o desenvolvimento moral das pessoas às relações interpessoais vigentes nas organizações do trabalho? De fato, as pessoas possuem uma orientação moral diversa e enquanto algumas podem ter atingido o máximo de amadurecimento moral, outras por estarem essencialmente voltadas para suas necessidades e desejos se relacionam de forma indiferente às necessidades dos outros. É provável que esta forma de relacionamento interpessoal possa potencializar conflitos, já que a dificuldade de se colocar no lugar do outro, em intensidade exacerbada, pode dificultar a escuta, a compreensão de outros pontos de vista que não o seu e, por isso criar muitos obstáculos ao trabalho em equipe. E, por falar em equipes, um terceiro ponto relevante para compreendermos as relações interpessoais estabelecidas pelas pessoas no mundo do trabalho, refere-se às interações em grupos. O desenvolvimento grupal Nos grupos a interação positiva, criativa e de aprendizagem constante é semelhante ao exemplo já descrito sobre a forma como o mar é percebido, ou seja, é preciso respeitar as diferenças e fazer delas um crescimento e uma experiência que enriquece. Em um grupo cada elemento carrega as suas percepções e suas fantasias. O grupo é o espaço onde a soma de todas estas características devem se somar para satisfazer as necessidades de formação de laços, e de cada um que vão dar uma identidade para o grupo. A convivência entre as pessoas é um fato marcante em termos do destino da vida de cada um. O sucesso ou insucesso na formação de vínculos interpessoais é inegavelmente fonte de alegria ou sofrimento e pode, consequentemente, ser um poderoso determinante dos níveis dos sentimentos de auto-estima de cada um. Para compreender melhor as interações sociais, vamos tomar emprestado as contribuições de Lewin, estudioso das dinâmicas de grupo nas organizações. Ele elaborou quatro pressupostos conforme o desenvolvimento da sua Teoria de Campo, onde o campo social é a gênese, a estrutura e a dinâmica de um grupo são determinadas as posições relativas dos diferentes elementos que o constituem. Os pressupostos são: 1. O grupo deve ser considerado como o terreno dentro do qual o indivíduo se mantém - sua integração num grupo depende, portanto, da clara definição de sua participação nos seu espaço vital, ou da caracterização da sua liberdade típica de movimento no interior do grupo. 2. O indivíduo, conscientemente ou não, utiliza-se do grupo e das relações sociais que mantém, com vista a satisfazer necessidades próprias, bem como suas aspirações sociais. 3. Mesmo que o indivíduo se sinta ignorado, isolado ou rejeitado pelo grupo, ele não deixa de ser um dado da realidade da qual ele faz parte; portanto, valores, necessidades e expectativas pessoais são por ele gratificados ou frustrados. Nenhum membro deixa de sofrer o impacto do grupo e não escapa a sua totalidade. 4. O grupo é considerado como um dos elementos do espaço vital do indivíduo, ou melhor, é um setor desse espaço vital. Para a adaptação social, o indivíduo deve concluir esta superação em atualizar suas aspirações e suas atitudes, em atingir seus objetivos pessoais, sempre mantendo seus laços com as outras pessoas do grupo sem rompê-los ou forçá-los e mantendo-se também vinculado com a realidade coletiva. A realidade coletiva ou campo social que é onde este indivíduo está inserido, o fundamento de sua existência. A interação social é então a continuidade do desejo mais primário de ligação, de vinculação. É nos grupos das organizações que as pessoas também vão suprir suas necessidadesde interação, mesmo que racionalmente seja um grupo de tarefa. É através do grupo ao qual cada indivíduo pertence que ele consegue satisfazer suas importantes necessidades sociais também conhecidas como de afiliação, de pertencimento a um grupo, assim como o de pertencer a uma família ou núcleo familiar, de pertencer e ser importante para alguém, para um grupo. É através do grupo que cada um estabelece seu próprio autoconceito, a sua identidade. O relacionamento com os demais se constitui em importante fonte de informação sobre cada um em si mesmo. Neste sentido voltamos à questão do feedback que não existe na fase inicial do relacionamento humano. Pois é através desta troca que nos afirmamos naquilo que somos e crescemos naquilo que mais podemos ser potencialmente, conforme o exemplo também das duas pessoas diante do mar. É dentro do grupo que se pode conseguir auxílio e apoio, tendo em vista a consecução não somente dos objetivos individuais como também organizacionais. Mais uma vez a troca, que protege, ajuda, faz crescer e crescer também o próprio grupo ou organização. Somente dentro dos grupos é que se pode compartilhar e auxiliar em atividades que tenham objetivos comuns, como por exemplo, fabricar objetos e produtos, participar de atividades que visam ao divertimento, prestação de auxílio e muitos outros. REFERÊNCIAS BEE, Helen. A criança em desenvolvimento. 12. ed. Porto Alegre: GrupoA, 2011. BERGAMINI, Cecília Whitaker. Psicologia aplicada à administração de empresas: psicologia do comportamento organizacional. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2015. BOWLBY, John. Cuidados maternos e saúde mental. São Paulo: Martins Fontes, 1981. ERIKSON, Erik. Infância e sociedade. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1976. PAPALIA, Diane; FELDMAN, Ruth. Desenvolvimento Humano. 12. ed. Porto Alegre: GrupoA, 2013.
Compartilhar