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Radiologia - Aula 9 - Emergência proctológica - TC de pelve

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Beatriz Machado de Almeida 
Radiologia – Aula 9 
CASO CLÍNICO 
Queixa principal: Paciente do sexo masculino de 45 
anos, chega ao consultório médico referindo dor anal 
contínua progressiva há 10 dias, sem melhora com 
medicação analgésica. 
É importante caracterizar a dor desse paciente, 
fatores precipitantes e sintomas associados. 
ANAMNESE 
• Descrição da dor: tipo da dor, fatores de piora 
ou melhora. O paciente relata dor contínua, sem 
fatores de melhora, que piora com a evacuação. 
• Sintomas associados: Retenção urinária, 
constipação (última evacuação há 3 dias). Nega 
sangramento. 
• HI (hábito intestinal) antes da sintomatologia: 
diário. 
• Antecedentes médicos: comorbidades, 
medicações em uso, alergia medicamentosa. HAS 
em uso de Benicar (Olmesartana Medoxornila), 
nega alergias. 
• Antecedentes obstétricos (mulheres). 
• Antecedentes cirúrgicos: nenhum. 
• Antecedentes familiares: nega câncer. 
EXAME FÍSICO 
 Dados vitais: 
• Frequência cardíaca: 80 bpm. 
• Temperatura: 36,8ºC. 
• Exame de abdome: abdome globoso às custas de 
panículo adiposo, sem dor a palpação, RHA 
presentes. 
• Exame proctológico: 
❖ Inspeção: sem alterações: sem abaulamento, 
hiperemia, endurado ou flutuação. 
❖ Toque retal: doloroso com abaulamento em reto 
em quadrante LE (toda parede do reto estava 
abaulada ao lado esquerdo). 
❖ Anuscopia: não realizada devido a dor do 
paciente. 
Esse paciente deve ser encaminhado a TC, 
lembrando que 90% dos pacientes com dor anal são 
diagnosticados ao exame físico. 
 
A trombose hemorroidária pode ser complicada ou 
não. Flutuação é quando temos essa característica 
“molinha” como no cisto pilonidal (doença que ocorre 
na região Interglútea; cisto pode gerar abcesso). 
Sabe-se que o paciente não tem complicação por 
trombose hemorroidária, fasceíte necrotizante, 
cisto pilonidal, fissura anal e hidradenite 
supurativa. Então, a suspeita diagnóstica é abcesso 
anorretal alto. 
ABCESSO ANORRETAL ALTO 
• É a suspeita diagnóstica. 
• Diagnóstico é clínico. 
Os mais altos podem não ter repercussão clínica 
externa. 
ESPAÇOS ANORRETAIS 
 
Acima observa-se os espaços anorretais. Ao redor 
do reto tem-se o peritônio (roxo), que cobre 
normalmente até o reto superior (que é 
intraperitoneal); o reto médio e inferior são 
extraperitoneais, pois estão abaixo do peritônio. 
Abaixo do peritônio, tem-se os espaços anorretais, 
que são preenchidos por gordura, e o que separa 
esses espaços uns dos outros são os músculos pelve-
perineais. Acima do músculo elevador do ânus, tem-
se o espaço supra-elevador bilateralmente (azul), e 
Emergência Proctológica – TC de pelve 
 
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Radiologia – Aula 9 
abaixo do músculo elevador do ânus tem-se a fossa 
isquioanal (bilateralmente - verde), e entre o 
esfíncter interno e externo do ânus tem-se o 
espaço interesfincteriano, e bem colado na pele e 
na mucosa perianal, abaixo da musculatura 
esfincteriana, tem-se o espaço perianal (vermelho). 
Esses espaços se comunicam anteriormente e 
posteriormente. Posteriormente, tem-se o espaço 
supraelevador, que está em cima do elevador do 
reto (laranja); tem-se o espaço pós anal profundo 
(rosa), e tem-se também o espaço pós anal 
superficial (verde). 
Quando se fala que é um abcesso anorretal alto, 
significa que ele pode ser ou supra elevador, ou 
isquioanal alto; vai haver pus neste local (já que o 
abcesso é uma coleção de pus), mas como ele não 
teve um deslocamento crânio-caudal, ele não está 
dando alteração superficial. O abcesso anorretal é 
uma patologia cirúrgica de urgência, pois deve-se 
fazer a drenagem, então não adianta fazer ATB, 
porque ele não chega em abcesso. Então o 
tratamento é drenar o mais rápido possível porque 
esse pus que está aí pode deslocar para baixo, mas 
também pode ir para cima, causando muita 
destruição tecidual (é necessário evacuar esse pus, 
controlando a destruição tecidual locorregional). 
O diagnóstico de abcesso anorretal é clínico, não 
precisa de tomografia. Então quando chega um 
paciente com dor anal, com hiperemia, abaulamento, 
aumento de temperatura, é abcesso anorretal e a 
conduta é cirúrgica. Deve-se solicitar a avaliação de 
um cirurgião, mas se você for o cirurgião já pode 
colocar na sala e drenar o abcesso. Isso é uma 
patologia de cirurgião geral, não sendo necessário 
coloproctologista. 
Não precisa de tomografia pra fazer diagnóstico 
de abcesso anorretal! 
Caso seja necessário um exame de imagem e não 
tem ele disponível, faz o chamado exame 
proctológico sob sedação, no qual o paciente é 
colocado no CC, anestesia, examina-o, e se não for 
encontrado nada em pele que se possa drenar, 
drena-se o abaulamento em reto identificado. 
 
 
A figura mostra os 
abcessos baseados nos 
espaços citados 
anteriormente. Pode-se 
ter os abcessos: 
supraelevador, 
interesfincteriano (alto ou baixo), isquioanal, 
perianal. 
INSPEÇÃO 
 
90% dos abcessos vão se apresentar com 
abaulamento, sinais flogísticos (ex. hiperemia). 
Portanto, ao chegar um paciente com esse quadro, 
deixa-o de jejum para fazer drenagem na sala de 
cirurgia sob anestesia (ideal). Lembrar que a 
drenagem desses abcessos na sala de emergência, 
com anestesia local, pode não ser suficiente, pois 
pode-se estar drenando apenas superficialmente, e 
deixar a coleção profunda lá dentro. 
CONDUTA 
• Paciente encaminhado para emergência. 
• Solicitados exames laboratoriais. 
• Solicitado TC de pelve. 
• Analgesia EV (dipirona, anti-inflamatório, 
opióide). 
Normalmente para abcesso só drenar resolve, não 
sendo necessário passar ATB para todo mundo; em 
casos que tem muita reação locorregional 
(hiperemia, edema) ou uma resposta sistêmica, pode 
fazer ATB. Em pacientes diabéticos, 
imunossupressos pode-se pensar em fazer ATB. Em 
resumo, em algumas situações pensa-se em fazer 
ATB, mas nunca somente ele, ou seja, em algumas 
situações, além da drenagem, faz antibiótico. 
 
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Beatriz Machado de Almeida 
Radiologia – Aula 9 
EXAMES DE ADMISSÃO 
Hb: 12, Leuco: 26000, B: 4%, VHS: 81, PCR: 258, Lact: 
19, Cr: 1,1, Ur: 63, Na: 140, K: 3,9. 
 
A realização da tomografia (o laudo demora) não 
pode atrasar a conduta (drenagem) desse abcesso. 
Na tomografia, foi observada uma coleção líquida, de 
contornos irregulares, com gás no interior, 
localizada no escavado pélvico, à esquerda, de 
natureza inflamatória infecciosa, medido 7x6x5, 
com volume de 130ml, que comprimia e deslocava 
para a direita o reto e a próstata (o que era sentido 
no toque retal era essa coleção), além de manter 
íntimo contato com a musculatura obturadora 
interna, associada à adensamento dos planos 
adiposos adjacentes, e provável comunicação dessa 
coleção com uma outra coleção alongada, situada na 
fossa isquiorretal, que media 6x4x7, com volume de 
99ml. 
A partir desse laudo, entende-se que 
que esse abcesso era alto (já sabia, 
pois está ao nível da próstata, que é 
reto médio), e que se comunicava com 
outro espaço (como desenhado 
acima). 
TOMOGRAFIA: 
Em verde, observa-se a bexiga. Essas imagens são 
axiais, e o corte é craniocaudal. Na primeira imagem, 
observa-se ar no reto (seta rosa), e isso é bem 
normal, e ao redor observa-se a gordura perianal, e 
os pontinhos provavelmente são linfonodos (normal). 
Ao baixar mais um pouco, começa-se a perceber, em 
amarelo, algo mais denso do que no outro lado, que 
vai aumentando, conforme vai baixando a imagem; 
esse espessamento é chamado de borramento da 
gordura, só que nesse caso, o borramento vira uma 
coleção com nível hidroaéreo (roxo), no qual esse 
“pretinho” é ar que sobe acima do líquido. Então 
isso são várias bolhinhas de ar em cima do líquido, 
denominado nível hidroaéreo. Nesse caso, o reto (em 
laranja) está sendo comprimido por toda a coleção 
que consegue ser maior do que o próprio reto. 
 
Nesse caso, observa-se que há nívelhidroaéreo, com 
coleção mais baixa, e mais abaixo, observa-se 
borramento de nádega. Conduta – drenagem. 
 
TRATAMENTO 
• Cirúrgico de urgência. 
• Incisão e drenagem sob anestesia. 
• Exame proctológico sob anestesia: vai ser feito 
quando há alguma dúvida sobre o diagnóstico. 
Então leva o paciente para o CC, anestesia, faz 
o exame proctológico, e nesse mesmo momento, 
se for identificado um abcesso, pode drenar no 
 
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Beatriz Machado de Almeida 
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centro cirúrgico (não faz no consultório porque 
com anestesia local dificilmente vai ser possível 
conseguir uma drenagem adequada). 90% dos 
abcessos vai ser feita uma drenagem pela pele, 
de preferência na área de flutuação, que é 
aquela área que palpa e observa-se uma 
entrada. 
Paciente chegou e não tem flutuação, tem só 
vermelhidão. Não esperar flutuar, é indicação 
imediata de cirurgia porque essa infecção pode 
deslocar tanto de forma craniocaudal quanto 
caudal cranialmente, só destruindo o tecido. Então 
ao ter hiperemia, empastamento, vermelhidão, dor 
e aumento de temperatura, coloca no centro 
cirúrgico e se você não souber exatamente aonde 
drenar, punciona para tentar identificar a coleção. 
Identificou a coleção, drena o local. 
Apenas 3% dos casos vai precisar de drenagem pelo 
reto, é muito raro. Na dúvida, pode drenar pela 
perna. O importante é saber que o tratamento é 
cirúrgico e de urgência. Encaminha o paciente para o 
cirurgião, pede regulação para o cirurgião ou você 
mesmo coloca na sala e drena. 
 
EVOLUÇÃO DO CASO CLÍNICO 
O paciente do caso teve indicação cirúrgica sob 
anestesia, a qual foi realizada no mesmo dia em que 
ele deu entrada na emergência. 
• Antibioticoterapia: 
❖ Ciprofloxacina EV, 400mg 12/12h. 
❖ Metronidazol EV, 500mg 8/8h. 
❖ Antibioticoterapia para flora colorretal é de 
amplo espectro. É antibioticoterapia que cubra 
gram +, gram - e anaeróbicos. Mas o 
tratamento não é o antibiótico, é a drenagem! 
• Drenagem cirúrgica sob anestesia (08/07/2019) 
 
• Exames (09/07/2019): 
❖ Hb 12, leuco 25990, B 5%. 
❖ PCR 300, Lact 26 (pioraram). 
❖ Cr 0,6, Ur 29 (melhoraram, mas por estar 
internado e hidratando, melhora mesmo a função 
renal). 
❖ Na 140, K 3,3. 
❖ Paciente não melhorou, foi indicada outra 
drenagem (conduta abaixo). 
Evolução (10/07/2019): Foi feita uma ultrassom 
transoperatória e uma punção guiada por ultrassom 
com jelco calibroso aspirando. Quando identificada 
a coleção, abriu em cima da punção. Saída de muito 
pus, lavagem, aspiração, encaminhamento para quarto. 
Conduta (10/07/2019): Nova drenagem cirúrgica 
sob anestesia. 
No dia seguintes, os exames do paciente deram: 
• Exames (11/07/2019): 
❖ Hb 11,9, leuco 14.400, B3%. 
A dor já tinha melhorado, e o paciente recebeu alta 
no dia seguinte. 
• Alta hospitalar (12/07/2019): 
❖ Antibioticoterapia para casa: 
 Ciprofloxacino 500mg VO de 12/12h. 
 Metronidazol 400 mg VO de 8/8h. 
Mais ou menos metade dos abcessos, drenados 
cirurgicamente ou não, podem evoluir para fístula 
anorretal, que não é uma emergência proctológica, 
é uma doença de tratamento eletivo. 
PRESCRIÇÃO NO PRÉ-OPERATÓRIO 
 
 
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Beatriz Machado de Almeida 
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1. Repouso relativo (RR); 
2. Dieta zero: a ideia é operar o paciente. Não é 
uma emergência que tenha que sair correndo 
para operar, então pode esperar. 
Depois da dieta zero, não é hidratação, é aporte 
calórico. Sempre que tiver dieta zero, tem que ter 
o aporte calórico para evitar a hipoglicemia! 
3. Soro glicosado (SG) a 5% - 1.500ml: só o soro 
glicosado não fornece o aporte calórico 
suficiente, então glicose hiperbólica (GH) a 50% 
- 40 mL cada frasco de 500 mL. Eletrólitos (NaCl 
a 20% e KCl a 19,1% em 10mL – 1 ampola – de cada 
frasco de 500 mL – volume basal). 
4. Hidratação: lembrando que soro glicosado não 
hidrata. Então soro fisiológico a 0,9%, 100 mL 
EV em 24 horas. 
5. Antibiótico: o paciente tá com uma resposta 
inflamatória importante, leucocitose, PCR 
aumentado, VHS aumentado. Nem sempre 
precisa fazer, mas nesse paciente aqui precisa. 
Ciprofloxacina 400 mg EV de 12/12 horas, 
Metronidazol 500 mg EV de 8/8 horas. 
6. Analgesia: Dipirona; 
7. Anti-inflamatório não esteroidal: Nimesulida 
(se fosse um paciente com mais de 60 anos não 
colocaria para preservação do rim); 
8. Tramal: dor, 3 noites sem conseguir dormir. 
9. Dramin: anti emético, antes do Tramal (enjoo). 
Não fazer profilaxia para TVP, porque esse 
paciente não precisa, nem para lesão aguda de 
mucosa gástrica. TVP hoje em dia, quando a gente vai 
preescrever nesses hospitais, você faz um score. O 
paciente chega, você coloca idade e comorbidade e 
já vai dizer se ele é obrigado a fazer ou não, mas 
provavelmente pelo caso não seria obrigado, não 
precisaria, pois o risco dele é baixo. O paciente é 
jovem, não é acamado, não tem doença oncológica. 
No pré operatório, o laxante não era necessário, 
mas no pós operatório, é. Por que esse paciente faz 
constipação e retenção urinária? É pela dor! A 
constipação é óbvio, pela dor anal, então diminui 
mesmo o reflexo da vontade de defecar e a 
retenção urinária é pela inervação semelhante, isso 
acontece muito. Por conta disso: 
10. Muvinax: colocar um envelope em copo com água 
2x ao dia. Depois disso, solicitação de exames: 
hemograma, Na, K, ureia, creatinina, glicemia, 
TP, TTPA, VHS, PCR, lactato. Além disso, para 
a cirurgia, pedimos ECG e raio x.

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