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URGÊNCIAS E EMERGÊNCIAS PEDIÁTRICAS A CRIANÇA VÍTIMA DE QUEIMADURA Queimadura – definição Define-se queimadura toda lesão resultante do calor direto ou indireto (radiante) sobre o corpo. Pode ser provocada por um agente aquecido, agentes químicos (lesões cáusticas semelhantes à lesão térmica) ou descarga elétrica. As queimaduras por agentes químicos são menos comuns, sendo o principal exemplo a situação na qual a criança ingere soda cáustica. As crianças possuem uma vantagem em relação ao acidente com soda caustica, pois elas, geralmente, cospem. Com isso, eles apresentam queimadura de lábios e mucosa, mas não possuem queimadura de esôfago. A queimadura de esôfago causada por soda caustica é terrível, uma vez que ela provoca uma lesão cicatricial com estenose e, com isso, a criança, invariavelmente, necessita ser traqueostomizada e, posteriormente, é submetida a várias sessões de dilatação de esôfago em decorrência da estenose gerada pela ingestão de soda cáustica. Portanto, felizmente, na maioria das vezes é queimadura dos lábios, da língua e da mucosa. A queimadura por descarga elétrica é sempre uma queimadura grave, pois ela possui um ponto de entrada, mas não se consegue definir um ponto de saída. Com isso, há muitas lesões de órgãos internos e não se consegue definir muito bem a extensão da queimadura. Epidemiologia No Brasil, 50% das queimaduras ocorrem em ambiente doméstico, sendo que 80% destas acontecem na cozinha por um agente aquecido. O último levantamento realizado em 2011, por Leão et al no Hospital João XXIII – BH/MG, hospital referência em Minas Gerais, apontou que 33% dos pacientes vítimas de queimaduras tem entre zero e 15 anos de idade, ou seja, 1/3 das vítimas de queimaduras são crianças. Principais causas: ✓ Lactentes = escaldadura (liquido que derrama sobre a criança ou a criança é colocada sobre um liquido aquecido) ✓ Pré-escolar = escaldadura + chamas (nessa fase a criança já começa a brincar com fogo) ✓ Escolar = chamas (predomínio sexo masculino, assim como os acidentes por animais peçonhentos, por causa das brincadeiras masculinas que em geral incluem atividades mais perigosas) A escaldadura com alimentos, principalmente alimentos doces, tem maior gravidade - Queimar com água pura é muito menos grave do que queimar com água com açúcar, doces, por exemplo. O açúcar caramelizado ou doces são grudentos e quanto mais se tem dificuldade em retirar esse agente aquecido da superfície, mais a queimadura se aprofunda. Anatomia da pele Epiderme – camada mais superficial da pele Derme – possui os anexos (glândulas, folículos pilosos) Hipoderme - camada mais profunda da pele, onde há inervação URGÊNCIAS E EMERGÊNCIAS PEDIÁTRICAS Orientações para domicilio diante de uma criança vítima de queimadura Lavagem das lesões com água fria corrente por cerca de 5 a 15 minutos, o que promove: ✓ Alívio da dor; ✓ Redução da profundidade e do edema causados pela queimadura; ✓ Redução da liberação de cininas e histaminas envolvidas no processo inflamatório, inclusive, de aprofundamento da queimadura; ✓ Melhora da microcirculação. ✓ Retirada de roupas e acessórios, principalmente em queimaduras nas mãos (anéis) ✓ NUNCA aplicar gelo! (O gelo pode ser um novo agente de queimadura, podendo aprofundar ainda mais as lesões. Assim como nos acidentes por animais peçonhentos, está proscrito garrotear o membro, nas queimaduras está proscrito aplicação de gelo). Classificação As queimaduras podem ser classificadas quanto à profundidade e quanto à superfície corporal queimada (SCQ), o que é essencial para definir se o tratamento vai ser ambulatorial ou hospitalar, bem como as estratégias de tratamento. Quanto à profundidade: Grau da lesão Definição Aspecto clinico Primeiro grau Espessura superficial. Destruição apenas da epiderme. Ex.: Queimadura solar Geralmente provoca eritema e dor. Descama em 4-6 dias. Em geral o tratamento é domiciliar com hidratação da pele e hidratação oral Segundo grau SUPERFICIAL Possui espessura parcial. Destruição de toda a epiderme e da derme superior, sempre com formação de bolhas (flictenas). A lesão é exsudativa (“mais molhada”), eritematosa e muito dolorosa. Geralmente reepiteliza em 10-14 dias, não necessitando de enxertia. Segundo grau PROFUNDA Espessura parcial. Destruição da epiderme e da derme superior e profunda, com formação de bolhas. Lesão com menor umidade e maior palidez, dolorosa. Reepiteliza em 21 dias, mas em alguns casos necessita de enxertia. Terceiro grau Espessura total. Destruição da epiderme, derme e hipoderme (destruição de glândulas, folículos pilosos, inervação), podendo atingir estruturas mais profundas. Lesão seca, dura, inelástica (textura coreácea – aspecto de couro), indolor (destruição de terminações nervosas). Pele bem esbranquiçada. Não reepiteliza e necessariamente necessita de enxertia. Primiero grau – queimadura solar URGÊNCIAS E EMERGÊNCIAS PEDIÁTRICAS Segundo grau superficial - base da bolha rósea/eritematosa, exudativa/úmida, muito dolorosa. Todas as bolhas devem ser desbridadas! Segundo grau profunda - base da bolha branca, mais seca, na base mesmo é indolor. Terceiro grau – completamente branca, seca, inelástica, indolor; lesão coreacia Quanto à superfície corporal queimada (SCQ): CLASSIFICAÇÃO ADULTOS CRIANÇAS Pequeno queimado 2º grau <10% ou 3º grau <5% 2º grau <5% Médio queimado 2º grau 10-25% ou 3ºgrau 5-10% 2ºgrau 5-15% e 3º grau <3% Grande queimado 2º grau >25% ou 3º grau >10% 2ºgrau >15% ou 3º grau > 3% *Para crianças, a classificação é bem menos permissiva. Queimaduras que em adultos são classificadas como pequeno queimado, nas crianças são classificadas como médio ou grande queimado, pois as crianças se desidratam com mais facilidade e tem, dessa forma, maior risco de choque hipovolêmico do que o adulto. *Queimadura elétrica: SEMPRE grave e grande queimado, pois é profunda e extensa! A corrente tem ponto de entrada, mas não tem ponto de saída >> não dá para calcular a superfície corporal atingida: você vê parte do corpo queimado, mas a corrente passa internamente destruindo tudo. URGÊNCIAS E EMERGÊNCIAS PEDIÁTRICAS Estimativa da SCQ - Lund e Browder: Idade (anos)/Área ≤1 (lactente) 1 – 4 (lactente + pré-escolar) 5 – 9 (escolar) 10 – 14 (adolescente) 15 (jovem) Cabeça* 19 17 13 11 9 Pescoço 2 2 2 2 2 Tronco anterior 13 13 13 13 13 Tronco posterior 12 13 13 13 13 Nádega direita 2,5 2,5 2,5 2,5 2,5 Nádega esquerda 2,5 2,5 2,5 2,5 2,5 Genitália 1 1 1 1 1 Braço 4 4 4 4 4 Antebraço 3 3 3 3 3 Mao 2,5 2,5 2,5 2,5 2,5 Coxa 5,5 6,5 8 8,5 9 Perna 5 5 5,5 6 6,5 Pé 3,5 3,5 3,5 3,5 3,5 *O bebê possui uma cabeça desproporcional em relação ao resto do corpo, ou seja, ele possui uma cabeça que significa muito mais do que em todas as outras idades. À medida que a criança cresce a cabeça vai perdendo esse significado/percentual. Estimativa da SCQ - Pulanski e Tennison (Regra dos Nove): Idade (anos)/Área Crianças > 1 ano Crianças < 1 ano Cabeça e pescoço 9% 18% Membro superior direito 9% 9% Membro superior esquerdo 9% 9% Região anterior de tronco 19% 19% Região posterior de tronco 18% 18% Genitália 1% 1% Coxa direita 9% 4,5% Coxa esquerda 9% 4,5% Perna direita 9% 4,5% Perna esquerda 9% 4,5% Hierarquização do atendimento Ambulatorial x Hospitalar 1º) Estimar a superfície corporal queimada (SCQ) pela regra de Lund e Browder OU Pulanski e Tennison (Regra dos Nove) e classificar a lesão quanto a profundidade 2º) Registrar o agente causador* e a circunstância do trauma**. *Descarga elétrica é sempre grande queimado, então o paciente sempre deve ser internado. *As escaldaduras com líquidos açucarados são mais perigosas. Assim, a queimadura que, em um primeiro momento, é classificada como 2º grau superficial,pode aprofundar mais, já que não se consegue retirar todo aquele líquido da superfície corporal da criança, por mais que se lave a criança. *Portanto, dependendo do agente causador, embora se classifique a criança como pequeno queimado e o tratamento poderia ser ambulatorial, a SCQ ou a profundidade pode aumentar e, com isso, a criança passa a ser um médio ou grande queimado e necessita ser hospitalizado. Regra prática *Regra da Palma da mão: a palma do paciente representa 1% da superfície corporal >> Somar quantas palmas tem a área queimada para ter a estimativa da SCQ. URGÊNCIAS E EMERGÊNCIAS PEDIÁTRICAS **Como essa criança queimou? Por que? Sob a vigilância de quem essa criança queimou? Quem queimou essa criança? Dependendo da situação, deve-se fazer uma internação social e, com isso, as vezes a criança é um pequeno queimado, tem uma SCQ bem pequena, o agente causador foi só água, mas por uma questão social é preciso internar. 3º) Registrar a idade* e comorbidades associadas**. *Crianças menores possuem um risco bem maior, logo, geralmente são internadas, assim como os idosos. **Cardiopatas, pneumopatas, diabéticas – maior risco em relação às crianças hígidas. Atendimento ambulatorial Pequenos queimados, sejam eles adultos ou crianças; Médios queimados com condição de realizar cuidados e curativos em domicílio (crianças com queimadura de 2º grau 5-10% e 3º grau <3%). *O agente causador da queimadura é bem definido (por exemplo água quente) – resfriar, lavar e sem risco de aprofundamento da lesão; sem suspeita de negligência e violência; família bem orientada. Abordagem ambulatorial ✓ Analgesia venosa (dipirona, paracetamol ou morfina, dependendo da intensidade dor do paciente) ✓ Limpeza vigorosa (esfregar) das áreas acometidas com clorexidine degermante 2% e soro fisiológico. Analgesia com morfina ou cetamina. A cetamina é um anestésico dissociativo; a criança não rebaixa, mas tem um desligamento do terminal de dor e continua consciente. ✓ Desbridamento de tecidos desvitalizados, ruptura e desbridamento de bolhas (o liquido dentro das bolhas funciona como meio de cultura) ✓ Curativo com sulfadiazina de prata a 1%, ocluindo com gaze aberta e atadura de crepom (trocar diariamente) ✓ Verificar vacinação anti-tetânica. *** Em queimaduras de primeiro grau: hidratação da pele*** Atendimento hospitalar Médios queimados sem condições de cuidados domiciliares (crianças com queimaduras de 2º grau >10% e 3º grau >3%); Todos os grandes queimados; ✓ Queimaduras da face e pescoço (independentemente do grau de profundidade, sempre internar – risco de edema de vias aéreas com necessidade de IOT ou traqueostomia precoce); ✓ Queimaduras incapacitantes (mãos e pés – são sempre de maior risco); ✓ Queimaduras graves de genitália e períneo (área extremamente contaminada e, muitas vezes, são incapacitantes); ✓ Lesões por inalação ou queimaduras elétricas; ✓ Crianças em idade tenra (geralmente até 1 ano); ✓ Comorbidades associadas (diabéticos, cardiopatas, pneumopatas, sindrômicas) Abordagem hospitalar ▪ Abordagem inicial sistematizada, conforme o PALS (Pediatric Advanced Life Suport) – ABCDE A – Via aérea B – Respiração C – Circulação D – Neurológico E – Exposição/Queimaduras ▪ Avaliar evidências sugestivas de lesão por inalação em pacientes expostos a fumaça ou vapor: - Queimadura cervical ou facial; - Queimadura de sobrancelhas, cílios ou vibrissas nasais; URGÊNCIAS E EMERGÊNCIAS PEDIÁTRICAS - Escarro carbonáceo/escuro; - Rouquidão; - História de queimadura em ambiente fechado; - Confusão mental; - Carboxihemoglobina > 10% (quando há possibilidade de dosagem). *Esses pacientes precisam de IOT precoce, pois eles tendem a evoluir com edema de glote. ▪ Considerar IOT precoce - Estridor respiratório – RA inspiratório; - Rouquidão progressiva; - Uso de musculatura acessória; - Queimaduras com edema em face e pescoço; - Redução do nível de consciência; - Hipoxemia ou hipercarbia. ▪ Acesso venoso - Mesmo em extensa área acometida, é permitida a punção; preferir membro preservado, mas uma área queimada não impede que se pegue um acesso - Considerar acesso venoso central (AVC) em SCQ > 50%; crianças com SCQ >50% apresentam mortalidade de quase 100%. - Grandes queimados: monitorização contínua (PA, FC, SpO2). ▪ Analgesia: analgésicos comuns a opióides. ▪ Tricotomia, caso existam pelos que não foram queimados (geralmente é feita com lâmina de bisturi). ▪ Desbridamento: sob analgesia, considerando sedação (midazolam e cetamina), ou anestesia geral em bloco cirúrgico quando a criança é um grande queimado. O ambiente hospitalar permite intubar e ventilar o paciente muito mais facilmente, então não fazer sedação em pacientes em abordagem hospitalar é crueldade! (NÃO utilizar succinilcolina: risco de hiperK). ▪ Escarotomia: queimadura de 3º grau com escaras rígidas circunferenciais em membros ou placas em tórax com restrição dos movimentos respiratórios (abrir a superfície para favorecer a circulação nos membros e a ventilação no tórax) ▪ NÃO utilizar ATB sistêmico na fase inicial! Em pediatria raramente se usa ATB sistêmico profilático, pois selecionar bactérias em uma criança é muito diferente de selecionar bactérias em um adulto. Usar ATB tópico – sulfadiazina de prata a 1%, com curativo oclusivo. ▪ Sempre lembrar da vacina anti-tetânica. *NÃO necessariamente há internação envolvida, pois o paciente pode ir diariamente ao hospital para troca de curativo. Internação hospitalar ▪ Queimadura de 2º grau > 10% em crianças; ▪ Queimadura de 3º grau > 3% em crianças; ▪ Queimaduras elétricas; ▪ Queimaduras em áreas especiais: vias aéreas, face, mãos, pés ou períneo; ▪ Pacientes com comorbidades: desnutrição, diabetes, cardiopatias, drepanocitose; URGÊNCIAS E EMERGÊNCIAS PEDIÁTRICAS ▪ Suspeita de maus-tratos – internação social O paciente queimado morre por duas causas principais: em um primeiro momento, ele pode morrer de desidratação, então o risco principal e de choque hipovolêmico. Num segundo momento, o paciente pode morrer por infecção, pois há perda da barreira de proteção cutânea, predispondo a infecções. Assim, inicialmente o paciente perde muito calor e por outro lado quando ele começar a ser hidratado, há um momento em que ele vai ter um choque hipovolêmico relativo; o paciente perde muitas vezes, liquido para o terceiro espaço e não para o ambiente externo e quando o paciente começa a se nutrir, esse liquido que saiu do capilar volta para o compartimento intravascular e as vezes o paciente faz um edema generalizado, o que é pior ainda. Por isso, deve-se ter muito cuidado nos pacientes queimados e nos pacientes com cetoacidose diabética, em que se deve hidratar, mas há um limite de hidratação. Muitas vezes, os médicos colocam para correr 500mL/1L em crianças com 8kg e o que ela deveria receber em mais de 24h ela recebe em 30min. A criança precisa ser hidratada pelo risco de choque hipovolêmico, mas a hiper-hidratação pode ser tão iatrogênica quanto a desidratação. Internação hospitalar: hidratação ▪ Hidratação é oral para pacientes com <15% de SCQ (crianças maiores, colaborativas, conscientes) ▪ Hidratação venosa, sempre, para os grandes queimados. ▪ Avaliar a hidratação através do débito urinário: ≥ 1ml/Kg/h em queimaduras térmicas e ≥ 2ml/Kg/h em queimaduras elétricas (há acometimento renal muito grande, por isso precisa-se de um debito urinário maior). Avaliação da diurese: 1. Sondagem vesical 2. Fraldas (pesagem da fralda) 3. Frasco *** Evitar sondagem vesical de demora (SVD), pois sonda sempre é uma porta de entrada para microrganismos! Hidratação venosa no grande queimado (1º dia) ▪ Reposição volêmica: Fórmula de Parkland: 3mL/Kg/SCQ ▪ Deve-se iniciar no atendimento pré-hospitalar (SAMU), em que o médico faz os cálculos e inicia a hidratação. Nunca colocar soro aleatório, pois essa condutapode ser iatrogênica, já que se pode estar dando um soro em 30min, o qual se daria em 8h. *SCQ: considerar apenas queimaduras de 2º e 3º graus e, no máximo, 50% SCQ. **Fórmula de Holliday-Segar: - Até 10kg: 100ml/kg; - De 10 a 20kg: 50ml/kg acima de 10kg + 1000ml; - Acima de 20kg: 20ml/kg acima de 20kg + 1500ml. ▪ 50% volume da fórmula de Parkland + 1/3 da manutenção em 8 horas. ▪ 50% volume da fórmula de Parkland + 2/3 da manutenção em 16 horas, considerando o que foi administrado em atendimento pré-hospitalar. ▪ Ringer lactato é sempre preferencial ao NaCl 0,9%, mas é mais caro. Os estudos não demonstram tanta diferença entre RL e SF. ▪ NÃO é indicada administração de colóide nas primeiras 24h máxima permeabilidade capilar. A criança queimada perde muito calor e muito liquido para o meio externo, mas ela também perde para o terceiro espaço. A liberação de mediadores inflamatórios (cininas, histamina) aumenta muito a permeabilidade capilar, permitindo o extravasamento de liquido para o interstício. Ao administrar coloide, ele “puxa” todo esse liquido para o compartimento intravascular, resultando em edema. Pode-se fazer coloide após 24, pois o paciente pode evoluir com hipoalbuminemia. 3ml/Kg/SCQ* + Soroterapia de manutenção** URGÊNCIAS E EMERGÊNCIAS PEDIÁTRICAS Hidratação venosa no grande queimado (2º dia) ▪ Reposição volêmica: Fórmula de Parkland: 2mL/Kg/SCQ *SCQ: considerar apenas queimaduras de 2º e 3º graus e, no máximo, 50% SCQ. **Fórmula de Holliday-Segar: - Até 10kg: 100ml/kg; - De 10 a 20kg: 50ml/kg acima de 10kg + 1000ml; - Acima de 20kg: 20ml/kg acima de 20kg + 1500ml. ▪ Administrar em 24 horas. ▪ NaCl 0,9% + SGI 5% + KCl 3mEq/100ml de necessidade básica + Gluc Ca 10% 1ml/100ml de necessidade básica. ▪ Se a criança já estiver em uso de dieta, descontar o volume de manutenção. Hidratação venosa no grande queimado (3º dia) ▪ Reposição volêmica: Fórmula de Parkland: 1mL/Kg/SCQ *SCQ: considerar apenas queimaduras de 2º e 3º graus e, no máximo, 50% SCQ. **Fórmula de Holliday-Segar: - Até 10kg: 100ml/kg; - De 10 a 20kg: 50ml/kg acima de 10kg + 1000ml; - Acima de 20kg: 20ml/kg acima de 20kg + 1500ml. ▪ Administrar em 24 horas. ▪ NaCl 0,9% + SGI 5% + KCl 3mEq/100ml de necessidade básica + Gluc Ca 10% 1ml/100ml de necessidade básica. ▪ Se a criança já estiver em uso de dieta, descontar o volume de manutenção. Hidratação venosa no grande queimado – Albumina - Considerar em pacientes com hipoalbuminemia, em anasarca ou que não respondem à expansão com NaCl 0,9%; - 1g/Kg/dia em 4 horas. 2ml/Kg/SCQ* + Soroterapia de manutenção** em 24h 1ml/Kg/SCQ* + Soroterapia de manutenção** em 24h URGÊNCIAS E EMERGÊNCIAS PEDIÁTRICAS Internação hospitalar – Cuidados ▪ Se possível, pesar o paciente antes de iniciar a HV e, após, semanalmente; *Se o paciente estiver ganhado peso rapidamente, pode estar recebendo maior volume; se estiver perdendo peso, ele necessita de dieta hipercalórica para dar conta da demanda metabólica que o trauma está consumindo. ▪ Monitorizar: oximetria de pulso e ECG contínuos, principalmente no grande queimado; ▪ Observar as medidas de isolamento e de lavagem de mãos no contato com cada paciente; ▪ Determinar diariamente a extensão e a profundidade das lesões e observar sinais de infecção da ferida logo no primeiro curativo e todos os dias durante o banho do paciente; ▪ Atentar aos sinais de instabilidade hemodinâmica (o principal risco é o choque hipovolêmico – ficar atento a PA, pulsos, FC, perfusão); ▪ Verificar a presença, volume e característica de diurese (a hidratação é baseada no debito urinário); ▪ Verificar a função do trato gastrointestinal e estado nutricional (evacuação, eliminação de flatos, se já está se alimentando bem); ▪ Avaliar o estado mental e emocional do paciente; ▪ Observar a presença de queimaduras circunferenciais e a profundidade da lesão, reavaliando constantemente a necessidade de escarotomia. ▪ Banho e troca de curativos sob anestesia - Midazolam 0,1mg/Kg em bolus + cetamina 1,0 mg/Kg, 5 minutos após o midazolam. *A dose é titulada de acordo com a tolerância do paciente, podendo ser a mesma repetida durante o procedimento até a obtenção de um nível de analgesia confortável. *Todos os pacientes devem ser monitorizados (oximetria, FC). *O midazolam geralmente leva à dependência quando é administrado em infusão contínua. Por exemplo, se um paciente fica sedado 72h a 5 dias, dependendo da concentração, já é necessário fazer desmame gradual. Normalmente troca-se Midazolam, EV, por lorazepam, VO; e quando há fentanil associado ele é trocado por metadona. O desmame pode durar semanas. Bolus pontuais, geralmente, não causam dependência. ▪ Banho e troca de curativos sob anestesia (Balneoterapia) - Limpeza da lesão através da aplicação de água corrente e/ou desbridamento mecânico do tecido desvitalizado, com solução de clorexidine a 2%; - Curativo oclusivo com sulfadiazina de prata 1% nas áreas não enxertadas, e óleo a base de ácidos graxos essenciais (AGE) em áreas pós-enxertos ou já cicatrizadas. ▪ Hemotransfusão - 10ml/Kg de concentrado de Hm em casos de preparo para enxertia ou na presença de distúrbios hemodinâmicos. Não é realizada de rotina. ▪ Nutrição - Dieta iniciada precocemente (2ºdia), via oral ou sonda - Necessidades básicas + 1.300cal/m² SCQ; - Se SCQ > 20% = SNG em bomba de infusão contínua (BIC). ▪ Polivitamínicos - SuFe a partir do 3º dia, dose 3mg/Kg/dia, por 4 meses. Internação hospitalar – Propedêutica ▪ Propedêutica laboratorial DIÁRIA: - Hemograma completo e plaquetas; - Coagulograma; - Ionograma; - Ureia, creatinina; - Glicemia; URGÊNCIAS E EMERGÊNCIAS PEDIÁTRICAS - Gasometria arterial e lactato; - Proteínas (albumina); - CK, em caso de queimadura elétrica (lesão muscular – aumento da CK). ▪ Propedêutica laboratorial: - Urina rotina e urocultura nos pacientes em SVD ou se suspeita infecciosa (paciente com febre, foco de infecção não determinado, características da lesão estão boas); - Gram, cultura e antibiograma de secreção de pele SEMANAL; - Hemocultura: Se suspeita de infecção, antes do início do ATB. ▪ Propedêutica: - Radiografia de tórax em pacientes sépticos ou na suspeita de comprometimento pulmonar, principalmente em pacientes que foram hiperhidratados; - Eletrocardiograma em queimaduras elétricas, no paciente idoso e naqueles com história de patologias cardiovasculares. Internação hospitalar – Alterações sistêmicas ▪ Aparelho cardiovascular: extravasamento vascular, hipovolemia e choque hipovolêmico. É o principal aparelho responsável pela alta morbimortalidade nos primeiros dias após a queimadura. ▪ Aparelho respiratório: hiperventilação em grandes queimados, edema de mucosa traqueobrônquica em inalação de produtos de combustão irritantes (acometimento de face ou ambientes fechados). ▪ Aparelho digestivo: úlcera de estresse (de Curling). Geralmente, se faz proteção gástrica. ▪ Aparelho renal: necrose tubular aguda pós choque hipovolêmico e proteinúria (principalmente se queimadura elétrica). ▪ Alterações hematológicas: hemólise em grandes queimados e hipoproteinemia, com necessidade de reposição de coloide. Internação hospitalar – Prevenção de complicações ▪ TEP e TVP: heparina não fracionada ou de baixo peso molecular em pacientes com mais limitação de movimentos e pacientes obesos. ▪ HDA: grandes queimados e queimaduras elétricas – inibidor de bomba de prótons + dieta oral/enteral precoce para evitar que o estômago fique vazio por muito tempo. ▪ Nefroproteção: sempre fazer nas queimaduras elétricas – hiper-hidratação (manter DU ≥ 2ml/Kg/hora). Em casos refratários, realizar a alcalinização urinária. ▪ Orelhas: curativos com sulfadiazina de prata a 1%, 2-3x/dia, para evitar condrite. A orelha é o único local em que se faz mais de 1 curativo por dia. ▪ Mãose pés: elevação por 24-48h após a queimadura e movimentação precoce. ▪ Olhos: irrigação vigorosa (SF) e uso de pomada oftálmica antibiótica com vedação ocular. Internação hospitalar – Uso de antibióticos ▪ Profilaxia para desbridamentos em blocos cirúrgicos: - SCQ > 10% e/ou >72h de internação; - Iniciar a infusão 1h antes do procedimento; - Vancomicina para G+ e Meropenem para G- (Protocolo do João XVIII – pode variar em relação a outros hospitais). ▪ Restrito à suspeita ou presença de infecção, sugerida por: - Taquipneia ou PaCO2< 32 na gasometria; - Íleo paralítico (estase gástrica, vômitos, distensão abdominal); - Hipertermia > 38ºC e hipotermia < 36ºC; o paciente pode fazer uma SIRS, na qual a liberação de uma cascata de mediadores inflamatórios pode levar à hipertermia - Hipotensão arterial ou taquicardia; URGÊNCIAS E EMERGÊNCIAS PEDIÁTRICAS - Alteração do estado mental; - Oligúria (DU < 2ml/Kg/hora nas queimaduras elétricas e DU < 1ml/Kg/hora nas queimaduras térmicas); - Desenvolvimento de insuficiência renal sem outra causa provável; - Leucopenia (<4.000/mm) ou leucocitose (>12.000/mm) ou mais de 10% de formas imaturas (bastões); - Plaquetopenia <100.000; - Acidose metabólica ou lactato > 2; - Hipoxemia; - Hiperglicemia; - Alterações sugestivas de consolidação pulmonar à radiografia de tórax; - Hemoculturas positivas. - Escurecimento da lesão, formação de abscesso, drenagem de secreção purulenta, necrose, petéquias, aprofundamento muito brusco do grau da lesão. ▪ ATENÇÃO: os achados sugestivos de infecção são extremamente frequentes na fase aguda da queimadura, como parte da SIRS – Síndrome da Resposta Inflamatória Sistêmica. Cuidado para não confundir os achados da SIRS com achados de infecção. ▪ Escolha do antimicrobiano: - Se internação <72h = cobrir Gram positivos (Vancomicina); - Se internação >72h = cobrir Gram negativos (Meropenem); - Outros: oxa + amica, cefepime + amica, vanco + mero + amica, ceftazidima + vanco + amica; - Considerar antifúngico se longa data (2 – 3 meses) de internação (Anfotericina). Internação hospitalar – Atenção multidisciplinar ▪ Médicos ▪ Equipe de enfermagem (muito importantes na balneoterapia, troca de curativos) ▪ Fisioterapeutas (deambulação precoce) ▪ Nutricionistas (aumento da demanda metabólica) ▪ Psicólogos (contexto social ruim) ▪ Assistentes sociais
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