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HEMATOLOGIA BÁSICA Bruna Amorin Casos clínicos em hematologia Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Realizar a interpretação dos parâmetros hematológicos liberados pelo contador celular. Comparar os parâmetros liberados com a microscopia hematológica. Ilustrar a correlação clínico-laboratorial dos dados hematológicos. Introdução A interpretação de um exame hematológico requer uma avaliação do que é normal ou patológico. Nesse caso, “normal” significa que o resultado espe- rado está dentro dos valores de referência de acordo, por exemplo, com a idade e o sexo do paciente ou até mesmo uma gestação. Esses valores são obtidos por meio de resultados de exames realizados em indivíduos sadios e estatisticamente dentro de limites que são estabelecidos por média, mediana e moda. A mediana revela, numa curva de distribuição, os resultados dos valores acima e abaixo da média. A moda indica os valores mais frequentes da distribuição celular. Desses cálculos, obtém-se os valores normais, que se distribuem numa faixa de normalidade e são estabelecidos por valores normais mínimos e máximos. É importante destacar que, para cada índice quantitativo avaliado no hemograma, como, por exemplo, a contagem de eritrócitos (RBC), a dosagem de hemoglobina (HGB), o hematócrito (HCT), o volume corpuscular médio (VCM), entre outros, há unidades de medidas específicas, que indicam a sua referência em relação ao espaço ocupado. Neste capítulo, você vai aprender que, além da avaliação desses parâme- tros quantitativos citados e que são obtidos por contadores hematológicos eletrônicos, é importante a comparação dos mesmos com os parâmetros qualitativos, que são visualizados na microscopia hematológica, tais como anormalidades morfológicas relevantes à clínica. Para isso, vai ver como rea- lizar a interpretação dos parâmetros hematológicos liberados pelo contador celular, comparar os parâmetros liberados com a microscopia hematológica e ilustrar a correlação clínico-laboratorial dos dados hematológicos. Interpretação de parâmetros hematológicos liberados por contadores celulares De acordo com Silva et al. (2016), dentre os exames laboratoriais atualmente solicitados por médicos de qualquer especialidade, o hemograma é o mais requerido. Por esse motivo, existe uma grande necessidade de evitar conclusões dúbias e/ou erros nesse teste. Sem a velocidade e a habilidade que os modernos contadores automáticos hematológicos oferecem, os laboratórios clínicos seriam incapazes de entregar uma grande quantidade de laudos corretos com segurança e qualidade. Desde 1980, com o advento da contagem diferencial automatizada de leucócitos, esse processo tem tornado-se um evento comum nos laboratórios. Os contadores eletrônicos contam e medem uma série de dados objetivos acerca das células examinadas e utilizam diferentes canais com impedâncias específicas, permitindo a contagem de leucócitos, eritrócitos e plaquetas ao mesmo tempo. A partir desses dados primários, um computador deriva, por meio de cálculos, uma série de valores matemáticos, estatísticos e gráficos. Os conjuntos desses resultados são considerados “parâmetros”, e esses compõem o hemograma. O hemograma é composto por determinações básicas, que incluem as avaliações dos eritrócitos (eritrograma), dos leucócitos (leucograma) e das plaquetas (contagem de plaquetas ou plaquetograma). A Figura 1 ilustra um exemplo de resultado de hemograma emitido por um contador eletrônico. Note que o resultado fornecido pelo analisador hematológico contém resultados numéricos (A) e gráficos (histogramas e citogramas). Para a identificação de subtipos de leucócitos (B e C), os principais fatores utilizados pelos contado- res são o tamanho e a complexidade da estrutura celular interna, ou seja, os linfócitos são identificados pelo seu tamanho, e os granulócitos, pelas suas estruturas internas — e cada um fica distribuído em um local específico do citograma de acordo com esses parâmetros. Para identificar se há presença de reticulócitos pelo citograma (D), o contador avalia a fluorescência lateral (eixo x do gráfico) em relação à dispersão frontal de luz (eixo y); sendo assim, há um ponto específico do gráfico em que há os eritrócitos (RBC) e fração de células mais jovens, que são os reticulócitos (RET). A dispersão das plaquetas (D e E) é observada no mesmo citograma dos RBC e RET, mas mais abaixo do gráfico devido ao fato de que essas são estruturas menores. Os histogramas de eritrócitos (D) mostram uma distribuição dos volumes dessas células. Amostras com eritrócitos microcíticos (VCM diminuído) encontram-se desviadas para a esquerda do histograma devido a um aumento numérico dos eritrócitos de pequenas dimensões. Já amostras com eritrócitos Casos clínicos em hematologia2 macrocíticos (VCM aumentado) dão origem a histogramas com um desvio para a direita do gráfico. A mesma linha de raciocínio serve para o histograma que distribui o volume das plaquetas (G), em que plaquetas menores se posicionam mais à esquerda do gráfico e, conforme o tamanho aumenta, posicionam-se mais à direita do gráfico. Figura 1. Exemplo de resultados obtidos a partir de contador hematológico eletrônico. Fonte: Adaptada de Silva et al. (2016, p. 24). Quando os contadores julgam uma insegurança na identificação de um elemento celular, podem emitir um aviso, denominado flag ou alerta (SILVA et al., 2016). Esses flags devem ser respeitados e as normas do fabricante do equipamento precisam ser seguidas; nesses casos, é de suma importância a revisão do hemograma e a obrigatoriedade de análises microscópicas asso- ciadas. Na Figura 2, há um exemplo de resultado de hemograma emitido por contador eletrônico e com a presença de flags. Independentemente da existência de flags, apesar de o contador hemato- lógico fornecer uma grande quantidade de informações numéricas e visuais, é importante verificar se há congruência entre o observado nos gráficos e os 3Casos clínicos em hematologia valores numéricos obtidos no hemograma. Além disso, dependendo da situa- ção, há a necessidade de confirmar os dados por meio de dados qualitativos, obtidos pela microscopia. Figura 2. Exemplo de resultados obtidos por meio de contador hematológico eletrônico com a presença de resultados considerados suspeitos — presença de flags. Fonte: Silva et al. (2016, p. 25). Resultados numéricos Os resultados numéricos (quantitativos) obtidos pelo contador eletrônico estão divididos de acordo com a série celular: eritrocitária, leucocitária e plaque- tária. A análise da série vermelha contempla a quantifi cação de eritrócitos, hematócritos, dosagem de hemoglobina e índices hematimétricos (VCM, HCM, CHCM, RDW). Já a análise da série branca avalia as contagens total e diferencial (valores relativo e absoluto) dos leucócitos. O Quadro 1, a seguir, resume quais são esses parâmetros e os seus respectivos signifi cados. Casos clínicos em hematologia4 Parâmetro numérico Unidade de medida Interpretação WBC 10 3̂/µl Contagem global de leucócitos. A eleva- ção pode ser classificada em: 1) leucocitose fisiológica — geralmente de grau leve, é comum em gestantes, RN, lactantes, após exercícios físicos e em pessoas com febre; 2) leucocitose reativa — estão notadamente relacionadas com o aumento de neutrófilos e se devem a infecções bacterianas, infla- mações, necrose tecidual; 3) leucocitose patológica — estão relacionadas a doenças mieloproliferativas (leucemias mielóides, po- licitemia vera) e linfoproliferativas (leucemias linfóides e alguns linfomas). As leucopenias também podem ocorrer em situações de infecções, leucemias, pacientes com imunos- supressão ou uso de quimioteráoicos. RBC 10^6/µl Contagem global de eritrócitos. Em casos de diminuição, chama-se eritrocito- penia (anemia). A contagem de eritrócitos, normalmente, tem uma correlação inversa com o VCM, ou seja, indivíduos com VCMelevado têm contagem mais baixa de RBC e vice-versa. HGB g/L Hemoglobina. Encontrada no sangue sob várias formas, como, por exemplo, oxihe- moglobina e carboxihemoglobina. Sua diminuição também representa um quadro de anemia. HCT % Hematócrito. Além de confirmar a conta- gem de RBC, ajuda na estimativa de quadro de anemia. É um parâmetro preferido para técnicas de hemodiluição e se correlaciona bem com viscosidade sanguínea; logo, é um bom parâmetro para acompanhamento de policitemia. Quadro 1. Parâmetros quantitivos obtidos por contadores eletrônicos hematológicos e seus significados (Continua) 5Casos clínicos em hematologia Parâmetro numérico Unidade de medida Interpretação VCM fL Volume Corpuscular Médio. Quando o pa- ciente apresenta anemia e o VCM diminuído, isso significa que as hemácias se apresentam com microcitose (tamanho diminuído), o que pode estar relacionado, por exemplo, à deficiência de ferro ou a anemias hemolíticas, como a talassemia. Se o valor de VCM estiver acima do valor de referência, isso significa que as he- mácias se apresentam com macrocitose, comum em anemia por deficiência de vita- mina B12 e/ou ácido fólico. Essas alterações devem ser confirmadas na microscopia (análise qualitativa). HCM pg Hemoglobina Corpuscular Média. Reflete a quantidade de hemoglobina de cada eritrócito; por isso, podemos dizer que um eritrócito de tamanho pequeno tem menos hemoglobina do que um eritrócito grande, o que não quer dizer que ele seja hipocrômico por essa razão, pois a quantidade de hemoglobina em seu in- terior é proprocional ao seu tamanho. Essa situação pode ser vista em alguns tipos de anemias, tais como talassemias e anemias ferropênicas. CHCM g/L Concentração de Hemoglobina Corpus- cular Média. Nem sempre está diminuído nas anemias, mas pode observar-se sua diminuição em casos graves de hipocromia, como na talassemia beta maior e na anemia ferropênica grave. Por outro lado, a elevação do CHCM quase sempre está relacionada com elevado número de eritrócitos esferó- citos, como, por exemplo, na esferocitose hereditária. Quadro 1. Parâmetros quantitivos obtidos por contadores eletrônicos hematológicos e seus significados (Continuação) (Continua) Casos clínicos em hematologia6 Parâmetro numérico Unidade de medida Interpretação PLT 10 3̂/µl Contagem de Plaquetas. A elevação relaciona-se com casos de trombocitose (trombose, infarto, acidente vascular ence- fálico) e a diminuição está relacionada com trombocitopenia (hemorragias, dengue, anemia aplásica, quimioterapia). VPM fL Volume Plaquetário Médio. Apresenta a média dos volumes de todas as plaque- tas contadas e avaliadas volumetricamente em um número de 10.000 células. PDW fL Amplitude de Distribuição de Plaquetas. Avalia o grau de variação de tamanho das plaquetas. Deve ser avaliado com o VPM. RDW-SD fL Amplitude de Distribuição dos Eritrócitos medido como Desvio Padrão. Avalia o grau de anisocitose, que indica o grau de variação do tamanho dos eritrócitos. Junto ao VCM, auxilia no diagnóstico diferencial de patolo- gias, em especial, alguns tipos de anemias. RDW-CV % Amplitude de Distribuição dos Eritrócitos medido como Coeficiente de Variação. Avalia o grau de anisocitose, que indica o grau de variação do tamanho dos eritrócitos. Com o VCM, auxilia no diagnóstico diferencial de pato- logias, em especial, alguns tipos de anemias. NEUT 10 3̂/µl Contagem de Neutrófilos. Elevação: neu- trofilia; diminuição: neutropenia. LYMPH 10 3̂/µl Contagem de Linfócitos. Elevação: linfoci- tose; diminuição: linfopenia. MONO 10 3̂/µl Contagem de Monócitos. Elevação: mono- citose; diminuição: monocitopenia. EO 10 3̂/µl Contagem de Eosinófilos. Elevação: eosino- filia; diminuição: eosinopenia. Quadro 1. Parâmetros quantitivos obtidos por contadores eletrônicos hematológicos e seus significados (Continuação) (Continua) 7Casos clínicos em hematologia Apesar de os elementos numéricos fornecerem uma grande quantidade de informações acerca do estado clínico do paciente, cabe salientar que esses dados devem ser confrontados com a análise microscópica sempre que necessária, pois é por meio da microscopia, com dados qualitativos, que se pode validar as informações que estão fora do valor de referência na análise quantitativa. Nem sempre quando o paciente possui níveis de hemoglobina (HGB) abaixo do valor de referência, indicando um quadro anêmico, o hemograma irá apresentar elevação ou diminuição de VCM, HCM e CHCM. Nesses casos, em que o paciente tem HGB baixa e os índices hematimétricos normais, há um caso de anemia normocítica e normocrômica, que é muito comum em casos de doenças crônicas, como, por exemplo, um paciente com doença renal crônica ou um paciente com perda de sangue aguda. Comparação dos parâmetros quantitativos com a microscopia Apesar do grande progresso na automação, a análise microscópica ainda é insubstituível em uma série de situações. Fonte: Adaptado de Failace e Fernandes (2016) e Silva et al. (2016). Parâmetro numérico Unidade de medida Interpretação BASO 10 3̂/µl Contagem de Basófilos. Elevação: basofilia; diminuição: basopenia. RET % Percentual de Reticulócitos. Quando presentes na corrente circulatória, indicam grande atividade medular, com estímulo de produção de células eritrocitárias. É impor- tante para acompanhamento de pacientes em tratamento de anemias. Quadro 1. Parâmetros quantitivos obtidos por contadores eletrônicos hematológicos e seus significados (Continuação) Casos clínicos em hematologia8 A avaliação qualitativa do hemograma depende da confecção de uma adequada lâmina de extensão sanguínea (esfregaço sanguíneo) e de coloração apropriada, que, com o auxílio de um microscópio óptico, permitirá uma avaliação eficiente para a detecção de anormalidades sanguíneas. A contagem de leucócitos e plaquetas pode ser estimada e confrontada com os dados fornecidos pelo contador hematológico, e a contagem diferencial dos subtipos de leucócitos, a identificação de células imaturas, bem como a morfologia dos eritrócitos devem ser realizados por essa técnica. A indicação da microscopia vai além da presença de flags da automação. Alguns dos critérios para indicação de microscopia são: Hemoglobina (g/dL) < 11 > 17 VCM (fL) < 78 > 105 CHCM (%) < 30 > 36,5 RDW (%) - > 18 Leucócitos (/µL) < 4.000 > 30.000 Neutrófilos (/µL) < 1.500 > 8.000 Linfócitos (/µL) < 1.000 >4.500 (adultos) >7.000(<12anos) Monócitos (/µL) - >1.500 Eosinófilos (/µL) - > 2.000 Basófilos (%) - > 3 Plaquetas (/µL) < 120.000 > 500.000 (adultos) VPM (fL) < 6,0 > 12,5 Reticulócitos (/µL) <10.000 > 100.000 Fonte: Adaptado de Failace e Fernandes (2016). Além de valores numéricos abaixo ou acima dos valores de referên- cia, outros parâmetros devem ser observados na microscopia, pois, em equipamentos eletrônicos, passam desapercebidos, tanto no eritrograma 9Casos clínicos em hematologia quanto no leucograma e no plaquetograma, tais como: policromatofilia, pecilocitose, esferocitose (CHCM elevado pode subentender-se, mas devem ser visualizados), inclusões eritrocitárias, <5% de eritoblastos, drepanóci- tos, inclusões neutrofílicas (granulações tóxicas, vacúolos, corpúsculo de Döhle), Pelger-Hüet, linfócitos atípicos, hairy cells (que podem aparecer como monócitos na leitura do equipamentos), plasmócitos, satelitismo plaquetário e agregação plaquetária discreta. Pecilocitose: eritrócitos com vários formatos em grande quantidade, encontrados em vários distúrbios hematológicos. Granulações tóxicas: excesso de granulações neutrofílicas, ficando com tonalidade azurofílica, características de processos infecciosos. Vacúolos: presença de vacúolos no citoplasma de neutrófilos, associada a infec- ções, tratamento com G-CSF e GM-CSF (fatores estimuladores da leucopoiese) e alcoolismo agudo. Corpúsculo de Döhle: corpúsculo basofílico em forma de inclusão citoplasmática devido a LMA, SMD e infecçõese processos inflamatórios. Pelger-Hüet: núcleo hipossegmentados de neutrófilos. Doença rara congênita, denominada anomalia de Pelger-Hüet. Hairy Cells: linfócitos com projeções citoplasmáticas, característica atribuída em casos de tricoleucemia. Satelitismo plaquetário: plaquetas que se aderem in vitro ao redor de neutró- filos. Não tem significado clínico, pois, in vivo, as plaquetas não se comportam dessa forma. Outro parâmetro quantitativo importante para ser utilizado em associa- ção com a microscopia é o RDW, pelo fato de avaliar o grau de anisocitose. Esse parâmetro deve ser observado com o VCM, HCM, CHCM e histo- gramas (BAIN, 2017). A Figura 3 mostra hemácias normais e, também, com microcitose e hipocromia (VCM e CHCM baixos) e com macrocitose (VCM elevado). Casos clínicos em hematologia10 Figura 3. a) Hemácias normais. b) Hemácias microcríticas. c) Hemácias macrocríticas. Fonte: Adaptada de Bain (2017, p. 72–74). De acordo com um estudo realizado no Hospital Universitário Oswaldo Cruz, o RDW-CV é o mais sensível indicador de anisocitose em casos em que o VCM está diminuído (microcitose), enquanto o RDW-SD é mais sensível para indicar macrocitose (VCM elevado); sendo assim, é melhor avaliar os RDW em conjunto, com o intuito de elevar a sensibilidade de detecção de anisocitose na lâmina. https://goo.gl/bAQaJD Relação clínico-laboratorial com os dados hematológicos Segundo Failace e Fernandes (2016), “[...] o hemograma é a semiologia das células do sangue”. De fato, o hemograma é o exame complementar mais solicitado, fazendo parte da triagem de saúde, além de ser indispensável no diagnóstico e controle evolutivo de diferentes doenças. Porém, ele deve ser interpretado levando em consideração características clínicas do paciente somadas aos dados hematológicos. A seguir, você verá exemplos de correlações clínicas e laboratoriais de determinadas patologias. 11Casos clínicos em hematologia Anemias Os sinais e sintomas das anemias agudas podem ser: hipovolemia, queda da pressão arterial, taquicardia, oligúria e sede; e, em casos de anemia crônica, volemia normal. Porém, se a HGB for inferior entre 6 a 9g/dL, há cansaço aos menores esforços e palidez. De acordo com Stefani e Barros (2013), a anemia pode ser um sinal de presença de doença subjacente e as principais causas são: Anemia pós-hemorrágica: o hemograma apresenta-se inicialmente normal e, em torno de 7 a 10 dias, há sinais de regeneração medular, ou seja, aparecerá achados como policromatofilia e reticulócitos na análise qualitativa. Anemia por deficiência de ferro: a HGB está diminuída, juntamente com VCM (microcitose) e CHCM (hipocromia). Pode haver anisocitose (verificar o RDW). As causas podem estar relacionadas à perda crônica de sangue (pelo tratogastrointestinal ou geniturinário, por exemplo), má absorção, ingesta de ferro deficiente e gestação, devido ao aumento da demanda de ferro. Anemia hemolítica: podem ser hereditárias (eliptocitose, esferocitose, anemia falciforme (HbSS), talassemias, deficiências enzimáticas) ou adquiridas (imunomediadas, microangiopática, por agentes infecciosos). Na avaliação clínica, é importante diferenciar as causas congênitas a partir das adquiridas, bem como considerar o histórico de icterícia (crises hemolíticas) e hemoglobinúrias. Ao exame físico, pode haver esplenomegalia leve e icterícia. A nível laboratorial, além da análise do hemograma (HGB, índices hematimétricos e microscopia: fragmentação de eritrócitos, drepanócitos, células em alvo, esferócitos, eliptócitos, pontilhado basofílico e hipocromia), é importante avaliar reticulócitos, LDH, coombs direto e dosagem de bilirrubinas. Anemia megaloblástica: causada pela deficiência de vitamina B12, deficiência de ácido fólico ou induzida por drogas, como quimioterá- picos. Na anamnese, pode-se observar pele e/ou mucosas amareladas e alterações neurológicas. Em relação ao hemograma, observa-se VCM e RDW elevados. A plaquetopenia e a neutropenia podem coexistir. Além do hemograma, pode-se avaliar LDH, que estará elevada, e é importante a dosagem de folato e de B12. Anemia de doenças crônicas: ocasionada por tuberculose, endocardite, doenças hepáticas crônica, doença renal crônica, insuficiência cardíaca Casos clínicos em hematologia12 congestiva, patologias reumáticas, hipotireoidismo, entre outras. A investigação da doença de base ocorre pela anamnese e por exame físico. Quanto à avaliação laboratorial, do ponto de vista do hemograma, a anemia geralmente não é grave e o VCM pode estar normal (normo- citose) ou diminuído (microcitose). Como exames complementares, cita-se a ferritina, que pode estar normal ou elevada. Policitemias A policitemia ou eritrocitose é a elevação dos níveis de HGB. As causas podem ser: hipóxia, tabagismo, terapia com androgênios, policitemia vera e hemococentração secundária à desidratação. Além do hemograma contendo elevação de HGB, a dosagem de eritropoetina sérica é importante (HOFF- BRAND; MOSS, 2018). Alterações leucocitárias As alterações leucocitárias podem ser a elevação do número total de leucóctios >11.000/mm3 (leucocitoses) ou a sua diminuição <4.000/mm3 (leucopenias). Os aumentos recebem sufi xo “fi lia” ou “oses” e a diminuição no número de um tipo leucocitário específi co, o sufi xo “penias”. Veja alguns exemplos: Neutrofilia: causada, principalmente, em quadros infecciosos, mas também pode ocorrer devido a infarto agudo no miocárdio, doenças mieloproliferativas e induzidas por drogas. No hemograma, ocorre elevação de neutrófilos >8.000/mm3. Neutropenia: quando a contagem absoluta de neutrófilos segmentados e bastões encontra-se abaixo de 1.500/mm3. Causas: infecções bacteria- nas, indução por drogas, distúrbios imunológicos (por exemplo, lupus), pós-quimioterapia e hemodiálise. Linfocitose: contagem absoluta >4.000/mm3 devido a infecções virais e bacterianas (coqueluche, tuberculose, sífilis, etc.), reação de hiper- sensibilidade induzida por drogas e leucemias. Linfopenias: contagem absoluta de linfócitos <1.500/mc. Causas: infecções virais e bacterianas (por exemplo, tuberculose, febre tifoide), malária, uso de imunossupressores, radioterapia, etilismo, estresse, trauma, neoplasias. 13Casos clínicos em hematologia Os linfócitos que apresentam alterações morfológicas não tão específicas (relativamente inespecíficas) são denominados linfócitos atípicos. Veja o vídeo a seguir, que ilustra as principais patologias em que se pode observar a presença de linfócitos atípicos com mais de 5% no esfregaço sanguíneo. https://goo.gl/MUZQQZ Além de alterações quantitativas na série branca, pode haver presença de células imaturas na corrente periférica. Quando há presença de blastos, o quadro clínico pode tratar-se de um caso de leucemia, que pode ser classificada, basicamente, em aguda e crônica. Avaliando-se essas combinações, há 4 tipos principais. Acesse o link do Instituto Nacional do Câncer e saiba mais sobre os tipos de leucemias. https://goo.gl/WPhoKu Alterações plaquetárias As alterações quantitativas plaquetárias podem estar relacionadas a um quadro de trombocitopenia (<150.000/µL). As causas são diversas, mas é importante verifi car se houve formação de grumos, caso positivo, deve-se realizar nova coleta sanguínea, acondicionando o sangue num tubo contendo o anticoagulantecitrato de sódio. Descartada essa causa, outras opções são: hipoplasia de megacarió- citos, trombocitopoiese inefi caz, trombocitopenias hereditárias, defi ciência de vitamina B12, aumento da destruição plaquetária devido a processos imunes, coagulação intravascular disseminada (CIVD), púrpura trombocitopênica trom- bótica (PTT), síndrome hemolítico-urêmica associada à hipertensão na gestação (síndrome HELLP), válvulas cardíacas estenosadas, queimadura, doenças com acometimento da baço, neoplasias, quimioterapia (STEFANI; BARROS, 2013). O aumento das contagens (>450.000/µL) está relacionadoa uma trombocite- mia. As causas são: infecção grave; doença mieloproliferativas, como leucemia mielóide crônica (LMC); policitemia vera e mielofibrose; doenças cardíacas; insuficiência renal; pós-esplenectomia, entre outras. Além do hemograma Casos clínicos em hematologia14 completo, são importantes dosagens da função renal, exames de imagem, ferritina, provas de coagulação. Pancitopenia A pancitopenia é um quadro de diminuição nos três tipos celulares (eritrócitos, leucócitos e plaquetas). A aplasia de medula, anemia de Fanconi, mielodispla- sia, leucemias, mielofi brose e desnutrição severa podem levar a esse quadro. Além de anamnese, exame físico e hemograma, é importante a biópsia de medula óssea. 1. Em consulta médica devido à inter- nação, um paciente adulto de 40 anos, alcoólatra apresenta quadro clí- nico de palidez acentuada, cansaço e fraqueza. Relata, ainda, episódios de sangramento intestinal e nasal com certa frequência. Não faz uso de nenhuma medicação e aparenta desnutrição. A seguir, estão relacio- nados os exames solicitados para avaliação clínica do paciente. Resultados de exames laboratoriais: Hemograma: Leucócitos: 3.200/µL; N. Segmentados: 52% Bastonetes: 2% Eosinófilos: 2% Linfócitos: 38% Mo- nócitos: 6%. Hemoglobina: 10,3g/dL; Hematócrito: 34%; Hemácias: 3,0mi- lhões/µL; VCM: 113 fL; HCM: 34,1,5pg; CHCM: 31,0%; Plaquetas: 110.000/µL. Considerando que o paciente em questão é portador de anemia megaloblástica, que alterações no hemograma permitem suspeitar de tal patologia? a) Microcitose, hipocromia, hiper- segmentação neutrofílica. b) Leucopenia, macrocitose, hiper- segmentação neutrofílica. c) Plaquetopenia, microcitose e hipocromia. d) Desvio à esquerda e leucopenia. e) Esferocitose, macrocitose e hipocromia. 2. Linfócitos reacionais (“atípicos”) no sangue periférico, com núcleo um pouco maior, cromatina mais frouxa e citoplasma abundante e irregular são achados importantes em esfre- gaço de sangue em: a) mieloma múltiplo. b) leucemia linfocítica aguda. c) monocleose infecciosa. d) leucemia mieloide crônica. e) anemia aplásica. 3. Observe os histogramas contendo o RBC a seguir e marque a alternativa correta. 15Casos clínicos em hematologia a) No histograma 2, está apontando um quadro de microcitose e a análise quantitativa do VCM, nesse caso, deve estar < 80fL. b) No histograma 3, está apontando um quadro de microcitose e a análise quantitativa do VCM, nesse caso, deve estar >100fL. c) No histograma 1, está apontando um quadro de normocitose e a análise quantitativa do VCM, nesse caso, deve estar 89±9 fL. d) No histograma 2, está apontando um quadro de normocitose e a análise quantitativa do VCM, nesse caso, deve estar 89±9 fL. 4. Observe o resultado a seguir, emitido por um contador hematológico, e marque a alternativa correta. a) O histograma apresentado mostra que há presença de células microcíticas, nesse caso, corroborando o resultado do VCM e RDW elevados. b) O histograma apresentado mostra que há presença de células microcíticas puras, nesse caso, corroborando o resultado do VCM diminuído. c) O histograma apresentado mostra que há presença de células macrocíticas, nesse caso, corroborando o resultado do VCM e RDW elevados. d) O histograma apresentado mostra que há presença de células microcíticas e normocíticas, uma vez que o RDW revela presença de anisocitose. e) O histograma apresentado mostra que há presença de células de dupla população eritrocitária, corroborando o resultado do VCM diminuído e do RDW elevado. 5. Leia o texto a seguir: “[...] esta anemia é causada pela deficiência de vitamina B12, ácido fólico ou induzida por drogas, como quimioterápicos. Na anamnese do paciente pode-se observar pele amarelada. Em relação ao hemograma observa VCM e RDW elevados e na microscopia observa-se hemácias macrocíticas e pode haver neutrófilos hipersegmentados. A plaquetopenia e neutropenia podem coexistir”. O texto acima refere-se a um quadro típico de qual anemia? a) Anemia megaloblástica. b) Anemia ferropênica. c) Anemia hemolítica. d) Anemia de doença crônica. e) Anemia Falciforme. Casos clínicos em hematologia16 BAIN, B. J. Células Sanguíneas: um guia prático. 5. ed. Porto Alegre: Artmed, 2017. FAILACE, R.; FERNARDES, F. Hemograma: manual de interpretação. 6. ed. Porto Alegre: Artmed, 2016. HOFFBRAND, A. V.; MOSS, P. A. H. Fundamentos em Hematologia de Hoffbrand. 7. ed. Porto Alegre: Artmed, 2018. SILVA, P. H. et al. Hematologia Laboratorial: teoria e procedimentos. Porto Alegre: Art- med, 2016. STEFANI, S.; BARROS, E. (Org.). Clínica Médica – Consulta Rápida. 4. ed. Porto Alegre: Artmed, 2013. 17Casos clínicos em hematologia Conteúdo:
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