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Farmacologia e Farmacoterapia do Sistema Cardiovascular 1 Farmacologia e Farmacoterapia do Sistema Cardiovascular Profª Msc. Heder Frank Gianotto Estrela Farmacologia e Farmacoterapia do Sistema Cardiovascular 2 Introdução 3 Tratamento não medicamentoso ou não farmacológico 5 Tratamento medicamentoso ou farmacológico da HAS 6 Emergência hipertensiva 23 Angina 25 Angina instável e infarto agudo do miocárdio (IAM) 40 Insuficiência cardíaca (IC) 45 Arritmias cardíacas 48 Referência bibliográficas 52 Sumário Farmacologia e Farmacoterapia do Sistema Cardiovascular 3 Introdução De acordo com a American Heart Association, nos Estados Unidos, e o Ministério da Saúde, no Brasil, as doenças cardiovasculares são as principais causas de morte tanto nos dois países como em todo o mundo ocidental. Nos Estados Unidos, cerca de 79 milhões de indivíduos são afetados por distúrbios do sistema cardiovascular, resultando em quase 900 mil mortes por ano. No Brasil, 30% das mortes são causadas por essas doenças, despendendo bilhões de reais dos cofres públicos. Diversos fatores de risco estão relacionados ao aparecimento desses distúrbios, e todos eles serão discutidos com mais cuidado em cada patologia. Figura 1. Dados epidemiológicos das doenças cardiovasculares no Brasil (SBC, 2010). O tema desta aula tem como objetivo oferecer ao aluno conhecimentos básicos e clínicos da farmacologia aplicada aos distúrbios do sistema cardiovascular. Serão discutidos mecanismo de ação, reações adversas, interações medicamentosas e outras informações pertinentes aos diversos fármacos utilizados no tratamento de hipertensão arterial sistêmica, angina de peito, infarto agudo do miocárdio, insuficiência cardíaca congestiva e arritmias cardíacas. Iniciaremos nosso estudo com as drogas capazes de alterar a fisiologia dos leitos vasculares, sejam eles arteriais ou venosos, e daremos sequência com as que alteram os componentes elétricos e/ou mecânicos do coração. Diversos fármacos utilizados no tratamento da hipertensão arterial também são utilizados no tratamento de angina, insuficiência cardíaca e demais distúrbios, portanto, eles serão discutidos com maior riqueza de detalhes na primeira parte deste material e, quando forem citados novamente, as informações estarão mais resumidas. Sabe-se que os rins são órgãos de extrema importância na regulação da pressão arterial e na manutenção da homeostasia, porém a ação dos diuréticos no corpo humano será estudada com maior riqueza de detalhes no módulo de farmacologia e farmacoterapia do sistema renal. Hipertensão arterial sistêmica (HAS) É uma condição clínica multifatorial caracterizada por níveis elevados e sustentados de pressão arterial. A HAS é caracterizada por alterações morfofuncionais de órgãos-alvo, como coração, rins e cérebro. Vale lembrar que a pressão arterial é a pressão que o sangue exerce na parede das artérias e deve ser mantida dentro de uma faixa apropriada de 110 mmHg a 120 mmHg (para a pressão sistólica, PS) e 70 mmHg a 80 mmHg (para a pressão diastólica, PD). Esses valores de PS e PD são comuns e esperados para a maior parte da população mundial, porém podem variar entre os gêneros, masculino e feminino, em função do peso corporal, entre outros, sem causar danos aos indivíduos. A diminuição significativa da pressão arterial pode prejudicar a perfusão tecidual, diminuindo a quantidade de oxigênio e nutrientes que chega aos tecidos. Por outro lado, o aumento crônico da pressão (hipertensão) predispõe o paciente a outros distúrbios cardiovasculares, que serão discutidos neste módulo. De acordo com o Ministério da Saúde (BRASIL, 2010), em 2010, o Brasil contava com 30 milhões de pacientes hipertensos, sendo que apenas 10% destes tinham a pressão controlada. A mortalidade por doença cardiovascular aumenta progressivamente com o aumento da pressão arterial (a partir de 120/80 mmHg). Farmacologia e Farmacoterapia do Sistema Cardiovascular 4 Fatores de risco para a hipertensão O fator genético é o principal fator de risco para a hipertensão. Diversos genes já foram identificados como causadores de alterações nos sistemas de controle da pressão arterial. Além desse fator principal, existem outros, como: »Gênero: os homens apresentam maior predisposição à hipertensão do que as mulheres. »Idade: o avanço da idade aumenta o risco (homem > 55 e mulheres > 65 anos). »Etnia: a população afrodescendente tem maior predisposição. »Sedentarismo. »Excesso de peso: especialmente depósito de gordura abdominal. »Ingestão excessiva de sal (NaCl). »Tabagismo. »Ingestão excessiva de bebida alcoólica. »Dislipidemias: triglicérides > 150 mg/dL, fração LDL do colesterol > 100 mg/dL e HDL < 40 mg/dL. » Diabetes mellitus. » Histórico familiar de doença cardiovascular prematura. Classificação e avaliação da Hipertensão Arterial Sistêmica (HAS) De acordo com as causas/origem, a hipertensão pode ser classificada em: » Hipertensão primária ou essencial: é o quadro mais comum de hipertensão, representando 90-95% dos casos. Esse quadro não tem uma causa completamente definida, apenas está relacionado à presença dos fatores de risco citados acima. » Hipertensão secundária: é menos frequente em nossa sociedade (5-10% dos casos) e pode ser causada por doença renal, doenças endócrinas (exemplo: síndrome de Cushing, hipertiroidismo, hiperaldosteronismo primário etc.), feocromocitoma (tumor na glândula adrenal), apneia obstrutiva do sono, causas neurológicas e uso de drogas capazes de aumentar a pressão arterial (anfetaminas, vasoconstritores, etc.). Tabela 1. Classificação da hipertensão arterial sistêmica de acordo com as Diretrizes Brasileiras de Hipertensão Classificação PAS (mmHg) PAD (mmHg) Ótima <120 <80 Normal <130 <85 Limitrofe 130 - 139 85 - 89 Hipertensão Estágio I (leve) 140 - 159 90 - 99 Estágio II (moderado) 160 - 179 100 - 109 Estágio III (grave) ≥180 ≥110 Sistólica isolada ≥140 <90 Fonte: www.crfsp.org.br. A tabela 1 mostra a classificação dos valores de pressão arterial sistólica e diastólica em indivíduos normotensos e hipertensos nos diferentes estágios de hipertensão. Antes que qualquer tratamento medicamentoso seja instituído ao paciente, é importante a avaliação clínica e laboratorial deste. Os objetivos dessas avaliações são: » Confirmar o diagnóstico de HAS por medida da pressão arterial. Farmacologia e Farmacoterapia do Sistema Cardiovascular 5 » Identificar fatores de risco para doenças cardiovasculares. » Pesquisar lesões em órgãos-alvo, tanto clínicas quanto subclínicas. » Pesquisar a presença de outras doenças associadas. » Estratificar o risco cardiovascular global. » Avaliar indícios de diagnóstico de hipertensão arterial secundária. Após o estudo dos diferentes agentes anti- hipertensivos, retomaremos esses itens acima, a fim de estratificar os riscos cardiovasculares e orientar a aplicação de uma terapia medicamentosa mais eficiente e com menor risco de reações adversas. Benefícios do tratamento da HAS Diversos estudos clínicos mostraram benefícios na associação de tratamento medicamentoso e não medicamentoso a pacientes. » Com idade inferior a 60 anos apresentaram: • Redução de 42% do risco de acidente vascular encefálico (AVE). • Redução de 14% do risco de evento coronário. » Com idade acima de 60 anos apresentaram: • Redução de 20% na mortalidade global. • Redução de 33% na mortalidade cardiovascular. • Redução de 40% na incidência de AVE. • Redução de 15% na doença arterial coronária. Tratamento não medicamentoso ou não farmacológico O tratamento não farmacológico da HAS e de todos os demais distúrbios cardiovasculares consiste na mudança de hábitos alimentares e do comportamento diário do paciente. Sendo assim, recomenda-se: » Redução do peso corporal. » Redução da ingestão de sal. » Ingestão de ácidos graxos insaturados. » Ingestãode proteínas da soja. » Ingestão de vitaminas e fibras. » Ingestão de alimentos integrais, grãos, hortaliças e frutas. » Abandono do tabagismo. » Prática regular de exercício físico, sob orientação de um profissional. » Controle do estresse psicossocial. As Diretrizes Brasileiras de Hipertensão (SBC, 2010) recomendam a adoção da dieta DASH (Dietary Approaches to Stop Hypertension), como mostra a tabela 2. Tabela 2. Dieta DASH (Dietary Approaches to Stop Hypertension) Farmacologia e Farmacoterapia do Sistema Cardiovascular 6 Escolher alimentos que possuam pouca gordura saturada, colesterol e gordura total. Por exemplo, carne magra, aves e peixes, utilizando-os em pequena quantidade Comer muitas frutas e hortaliças, aproximadamente de oito a dez porções por dia (uma porção é igual a uma concha média). Incluir duas ou três porções de laticínios desnatados ou semidestados por dia. Comer oleaginosas (castanhas), sementes e grãos, de quatro a cinco porções por semana (uma porção é igual a 1/3 de xícara ou 40 gramas de castanhas, duas colheres de sopa ou 14 gramas de sementes, ou 1/2 xícara de feijões ou ervilhas cozidas e secas). Reduzir a adição de sal aos alimentos. Evitar também molhos e caldos prontos, além de produtos industrializados. Diminuir ou evitar a o consumo de doces e bebidas com açúcar Fonte: www.nhlbi.nih.gov/health/public/heart/hbp/dash/new_ dash.pdf. SBC, 2010. Tratamento medicamentoso ou farmacológico da HAS Antes de estudarmos a farmacologia dos anti- hipertensivos, é importante resgatar alguns conceitos da fisiologia aplicada à farmacologia, focando nos mecanismos de controle da pressão arterial. Na sequência, estão algumas figuras e fórmulas importantes para o bom entendimento desse assunto. A pressão arterial (PA) é o produto do débito cardíaco (DC) pela resistência vascular total (RVT), também conhecida como resistência vascular periférica ou sistêmica. O débito cardíaco (DC) é o volume de sangue ejetado pelo coração durante um minuto e pode ser determinado pelo produto do volume sistólico (VS) pela frequência cardíaca (FC). É importante lembrar que VS é o volume de sangue ejetado pelo coração em cada sístole, e FC corresponde ao número de batimentos (sístoles) por minuto. Portanto, qualquer alteração na FC e no VS vai alterar o DC, que, por sua vez ,vai alterar a PA. A RVT é o principal determinante da PA, portanto pequenas variações no calibre dos vasos sanguíneos, especialmente das arteríolas, vão alterar significativamente a RVT e consequentemente a PA. São conhecidos diversos mecanismos reguladores da pressão arterial, porém, no momento, vamos nos focar somente em um deles (regulação neural) e, em seguida, discutiremos os principais grupos de fármacos que atuam nessa regulação. Num segundo momento, estudaremos o sistema renina- angiotensina- aldosterona e os fármacos capazes diminuir os efeitos e ações desse sistema. Controle neural da PA O sistema nervoso autônomo (SNA), por meio das fibras simpáticas e parassimpáticas, regula momento a momento as funções do sistema cardiovascular, especialmente a pressão arterial. Farmacologia e Farmacoterapia do Sistema Cardiovascular 7 Figura 2. Fibras simpáticas do sistema nervoso autônomo. Fonte: Lent, 2000. A figura 2 ilustra a fibras simpáticas chegando até alguns órgãos e tecidos do corpo humano. Vale lembrar que os neurônios pré-ganglionares são colinérgicos e liberam acetilcolina na sinapse ganglionar e os neurônios pós-ganglionares liberam noradrenalina nas sinapses com os tecidos. As fibras simpáticas, ao liberarem noradrenalina (NA) no coração, promovem aumento da FC e da contratilidade (força de contração), por meio da ativação dos receptores β adrenérgicos. É importante lembrar que, no coração, os receptores β1 estão em maior quantidade do que os receptores β2. Nos vasos sanguíneos, a NA promove vasoconstrição, via receptores α1, e vasodilatação, via receptores β2. É importante lembrar que os receptores α1 são encontrados em maior quantidade do que os receptores β2. Nos rins, os receptores β1, ativados pela NA, estimulam a liberação de renina pelas células do aparelho justaglomerular. A tabela 3 resume essas informações. Tabela 3. Efeitos da noradrenalina no coração, vasos sanguíneos e rins Órgão/tecido Receptores Efeitos Coração β1 (maior quantidade) β2 Aumento da FC e da contratilidade Vasos sanguíneos α1 (maior quantidade) Vasoconstrição β2 Vasodilatação Rins (aparelho justaglomerular) β1 Liberação de renina A partir dessas informações, podemos sugerir que o SNA simpático promove aumento da pressão arterial, já que a liberação de NA nos tecidos descritos acima aumenta FC, contratilidade, RVT (devido a vasoconstrição) e liberação de renina. No tronco encefálico, mais precisamente no bulbo, existe uma área conhecida como centro vasomotor (CVM). Nessa região, existem neurônios que projetam seus axônios pela medula espinal até os neurônios pré-ganglionares do simpático, que, por sua vez, regulam as funções cardiovasculares. Em resumo, podemos dizer que o CVM estimula as fibras simpáticas, que, por sua vez, liberam NA em coração, vasos e rins. Figura 3. Representação do centro vasomotor (CVM) do bulbo. Fonte: http://www.auladeanatomia.com/neurologia/ troncoencefalico.htm, modificado. Farmacologia e Farmacoterapia do Sistema Cardiovascular 8 É importante lembrar que, no arco aórtico e nos seios carotídeos, existem barorreceptores, que são receptores sensoriais que detectam o aumento da pressão arterial. À medida que a pressão arterial aumenta, esses barorreceptores são ativados e mandam a informação para o bulbo. Nesse momento, o CVM é inibido, e, portanto, a atividade elétrica nas fibras simpáticas fica reduzida, consequentemente diminuindo a liberação de NA em coração, vasos e rins e diminuindo a pressão arterial. A figura 4 ilustra a via de controle da pressão arterial descrita acima. Ela cita também a participação das fibras parassimpáticas, que seguem pelo nervo vago, que ao liberar acetilcolina no coração, diminui a frequência cardíaca. Figura 4. Controle da pressão arterial envolvendo os barorreceptores arteriais. Fonte: http://www.studyblue.com/ notes/note/n/frmacos-que-actuam-em-casos-hta/deck/5262406. A partir das informações discutidas até o momento, podemos interpretar que o sistema nervoso autônomo simpático promove aumento da pressão arterial e, portanto, diminuir a ação e/ou os efeitos promovidos por ele pode trazer benefícios a pacientes hipertensos. Sendo assim, os primeiros grupos de anti-hipertensivos a ser estudados serão os agentes simpatolíticos, ou seja, drogas que diminuem ou impedem as ações do SNA simpático. Agentes simpatolíticos Antagonistas β-adrenérgicos » Atenolol. » Propranolol. » Metoprolol. » Nadolol. » Nebivolol. » Bisoprolol. » Pindolol. Os antagonistas dos receptores β-adrenérgicos, também conhecidos como betabloqueadores, diminuem as ações da adrenalina e noradrenalina no coração, portanto promovem: » Cronotropismo negativo – diminuição de frequência cardíaca. » Inotropismo negativo – diminuição da força de contração. Além desses efeitos cardíacos, os betabloqueadores também diminuem a liberação de renina, pois bloqueiam receptores β1 nas células do aparelho justaglomerular. Por meio de todas estas ações, os betabloqueadores são capazes de diminuir a pressão arterial de pacientes hipertensos, porém dificilmente promovem quedas de pressão nos normotensos. Nós veremos, ao longo deste módulo, que os betabloqueadores são amplamente utilizados no tratamento de vários distúrbios cardiovasculares, porém, neste momento, vamos focar na ação anti- hipertensiva deles. Farmacologia e Farmacoterapia do Sistema Cardiovascular 9 É importante saber que a atividade nervosa simpática está aumentada na maior parte dos hipertensos, e, portanto, bloquear os receptores β-adrenérgicos cardíacosé uma grande vantagem, especialmente para poupar o coração da sobrecarga de noradrenalina. Algumas diferenças entre os betabloqueadores Propranolol – é antagonista de receptores β1 e β2-adrenérgicos. É lipossolúvel e portanto passa significativamente pela barreira hematoencefálica. Por ultrapassar essa barreira, exerce ações no sistema nervoso central, como sedação. Atenolol – é antagonista seletivo de receptores β1-adrenérgicos, hidrossolúvel e portanto sem ação central; Metoprolol – é antagonista seletivo de receptores β1-adrenérgicos, com lipossolubilidade moderada. Nadolol e timolol – são antagonista de receptores β1 e β2-adrenérgicos, pouco utilizados para o tratamento de distúrbios cardiovasculares. Pindolol – é classificado como betabloqueador, porém não é antagonista, mas sim agonista parcial dos receptores β1 e β2-adrenérgicos. Sendo assim, produz menos bradicardia do que os demais betabloqueadores. É importante lembrar que a cardiosseletividade pelos receptores β1-adrenérgicos é dependente da dose, podendo ser perdida em quadros de intoxicação. Reações adversas » Broncoconstrição – devido ao antagonismo de receptores β2-adrenérgicos, que promovem broncodilatação quando ativados por um agonista. » Fadiga e intolerância ao exercício. » Sedação – somente com os fármacos que atravessam a barreira hematoencefálica. » Bradicardia – geralmente quando associados a outras drogas que promovem cronotropismo negativo. » Hipotensão postural – queda da pressão arterial que ocorre quando um indivíduo se levanta, gerando tontura e desconforto. » Cianose – por bloquear receptores β-adrenérgicos nos vasos sanguíneos periféricos, levando a vasoconstrição e consequentemente diminuição do fluxo sanguíneo periférico. Desse modo, além de diminuir a oferta de oxigênio aos tecidos periféricos, eles também prejudicam a utilização da glicose por eles. » Disfunção erétil – também por bloquear receptores β2-adrenérgicos nos vasos sanguíneos periféricos, que irrigam os corpos cavernosos, levando a vasoconstrição e diminuição do fluxo sanguíneo neste local. Cuidados A terapia com betabloqueadores não deve ser interrompida abruptamente, pois podem acontecer taquicardia e hipertensão rebote. Posologia Propranolol: » Inicial – 40 mg, 2 x/dia. » Usual – 320 mg ao dia, divididos em duas ou três administrações VO. » Dose diária máxima – 640 mg. Atenolol: » Usual – 25 mg a 50 mg ao dia, 1 x/dia, VO. Farmacologia e Farmacoterapia do Sistema Cardiovascular 10 » Se necessário, aumentar até 100 mg/dia Metoprolol: » Inicial – 50 mg, 2 x/dia. » Usual – 100 mg a 450 mg ao dia, dividido em duas ou três administrações VO. Antagonistas de receptores α-adrenérgicos » Prazosin ou prazosina. » Terazosin ou terazosina. » Doxazosin ou doxazosina. » Fentolamina. No sistema cardiovascular, os receptores α1- adrenérgicos estão presentes na musculatura lisa vascular e promovem vasoconstrição quando são ativados. Além deles, nas terminações pré- sinápticas do neurônio adrenérgico, há receptores α2-adrenérgicos, que fazem um feedback negativo na liberação de NA, ou seja, diminuem a liberação desse neurotransmissor quando são ativados. A figura 5 ilustra a terminação nervosa de um neurônio adrenérgico liberando NA na fenda sináptica e suas interações com receptores pós-sinápticos, pré-sinápticos e proteínas transportadoras que fazem a recaptação neuronal. Figura 5. Terminação nervosa adrenérgica. Fonte: http:// dc317.4shared.com/doc/bwQNaL-h/preview.html. Os fármacos prazosin, terazosin e doxazosin são antagonistas seletivos dos receptores α1- adrenérgicos. Sendo assim, promovem vasodilatação, diminuição da resistência vascular periférica ou total e consequentemente da pressão arterial. A fentolamina é antagonista de receptores α1 e α2-adrenérgicos, portanto ela também promove vasodilatação de artérias e arteríolas, além de reduzir a PA. É importante lembrar que essa droga, por bloquear receptores α2-adrenérgicos pré-sinápticos, promove aumento da liberação de noradrenalina nas terminações nervosas adrenérgicas, causando alguns efeitos colaterais. A infusão rápida de fentolamina pode produzir hipotensão grave, portanto seu uso deve ser cauteloso. Embora os antagonistas α-adrenérgicos não sejam primeira escolha no tratamento da hipertensão, eles são excelentes vasodilatadores e podem ser utilizados no tratamento da HAS leve a moderada. Além disso, eles podem rapidamente reverter uma crise hipertensiva. Uma das principais indicações clínicas dessa classe é a hipertensão causada por feocromocitoma, um tumor benigno da glândula adrenal que promove intensa liberação de catecolaminas na corrente sanguínea e consequentemente aumento da pressão arterial. Reações adversas » Taquicardia reflexa – para entender melhor a causa desse problema, é importante voltar à figura 4, que trata sobre o controle da pressão arterial envolvendo os barorreceptores. Esses antagonistas α-adrenérgicos, por causarem vasodilatação e diminuição da pressão arterial, irão levar a desativação dos barorreceptores arteriais. Sendo assim, ocorrerá diminuição da informação inibitória sobre o centro vasomotor e consequentemente ativação desse centro. É importante lembrar que o centro vasomotor irá aumentar a atividade elétrica das fibras simpáticas, especialmente em coração, vasos sanguíneos e rins. Nos vasos, a quantidade excessiva de noradrenalina não conseguirá causar Farmacologia e Farmacoterapia do Sistema Cardiovascular 11 vasoconstrição, pois os receptores α-adrenérgicos estão bloqueados. Porém, no coração, vai ocorrer intensa ativação dos receptores β-adrenérgicos, levando ao aumento da frequência cardíaca (taquicardia). Como a fentolamina aumenta ainda mais a liberação de NA, esse efeito será mais pronunciado com seu uso. Diante dessa situação, esse grupo de anti- hipertensivos não deve ser utilizado por pacientes hipertensos com cardiopatias, a não ser que seja feita a associação com betabloqueadores. » Hipotensão postural. » Cefaleia. » Fadiga. » Miose – é causada pelo bloqueio de receptores α1-adrenérgicos no músculo radial da íris. Lembrem-se de que a ativação desses receptores causa contração do músculo e consequentemente midríase. » Congestão nasal e rubor facial - esses dois efeitos são causados pela dilatação de vasos sanguíneos na mucosa nasal e na face, respectivamente. Posologia Prazosin: » Inicial: 1 mg 3 x/dia. » Manutenção: 3 mg a 15 mg/dia, divididos em duas a quatro vezes. » Urgência hipertensiva: 10 mg a 20 mg em dose única. Terazosin: » Inicial: 1 mg antes de deitar e aumentar a dose lentamente até obter a pressão arterial desejada. » Manutenção: 1 mg a 20 mg. Fentolamina: » 5 mg, uma vez ao dia. » Crise hipertensiva: 5 mg a 20 mg, iniciar com a menor dose. Antagonistas α1, β1 e β2-adrenérgicos » Labetalol. » Carvedilol. Essas drogas também são conhecidas como simpatolíticos de ação mista, pois bloqueiam ambos os receptores adrenérgicos (α e β). Alguns autores defendem uma pequena ação antagonista sobre os receptores α2 também, porém poucas evidências mostraram esse efeito. Ações farmacológicas Vasodilatação de artérias e veia – devido ao bloqueio dos receptores α1-adrenérgicos no músculo liso vascular e à diminuição da renina e da angiotensina circulantes (devido ao antagonismo de receptores β1). Cronotropismo e inotropismo negativo - devido ao bloqueio dos receptores β1 e β2 no coração. Ambas as drogas têm sido amplamente utilizadas no tratamento da HAS associada a outros distúrbios cardiovasculares, pois, além de diminuir a resistência vascular total, também diminuem a pré e a pós- carga (conceitos discutidos mais adiante) e a sobrecarga adrenérgica no coração. Outra grande vantagem desses fármacos é proteger o coração Farmacologia e Farmacoterapia do Sistema Cardiovascular 12 de uma taquicardia reflexa, comum com váriosvasodilatadores. Reações adversas » Broncoconstrição. » Hipotensão arterial. » Fadiga e intolerância ao exercício. Posologia Carvedilol: Formulação de liberação imediata: » Inicial: 6,25 mg, 2 x/dia. » Manutenção: 12,5 mg, 2 x/dia, podendo ser aumentada até 50 mg/dia. É importante monitorar a frequência cardíaca do paciente, limitando-a até 55 batimentos por minuto. Além disso, a dose deve ser diminuída. Formulação de liberação prolongada: » Inicial: 20 mg, 1 x/dia. » Manutenção: 40 mg, 1 x/dia, podendo chegar até 80 mg, 1 x/dia. Labetalol: » Inicial: 100 mg, 2 x/dia. » Manutenção: 200 mg a 400 mg, 2 x/dia. Simpatolíticos de ação central » Metildopa. » Clonidina. » Guanabenzo. » Guanfacina. Figura 6. Centro vasomotor e fibras simpáticas. Fonte: http:// dc182.4shared.com/doc/43Ma7vet/preview.html. Essas drogas são consideravelmente lipossolúveis, portanto atravessam a barreira hematoencefálica, e são conhecidas como simpatolíticos de ação porque atuam diretamente sobre o centro vasomotor, deprimindo sua atividade e consequentemente a atividade elétrica das fibras simpáticas, que comandam as estruturas cardiovasculares. Ações farmacológicas no sistema nervoso central Agonistas de receptores α2 – deprimem o centro vasomotor por ativar receptores α2- adrenérgicos nos neurônios deste centro. Portanto, irão diminuir a liberação de NA em coração, vasos e rins. Também aumentam a sensibilidade do reflexo barorreceptor. Agonista de receptores imidazólicos – somente a clonidina é agonista desses receptores, que recentemente têm sido muito estudados e descritos como reguladores das fibras simpáticas no controle das funções cardiovasculares. Ações farmacológicas no sistema nervoso periférico Farmacologia e Farmacoterapia do Sistema Cardiovascular 13 Agonistas de receptores α2 pré-sinápticos – diminui a liberação de NA nas terminações nervosas periféricas por ativar o mecanismo de feedback negativo. α-metildopa – atua como um falso substrato na terminação nervosa adrenérgica. Essa droga compete com a dopa pela enzima L-aminoácido aromático descarboxilase (ou dopa descarboxilase), formando α-metildopamina e em seguida α-metilnoradrenalina, que possui grande afinidade pelos receptores α2 pré- sinápticos. Reações adversas O uso dessas drogas tem sido cada vez mais restrito devido aos prejuízos causados pelas reações adversas. As mais comuns são: » Hipotensão postural. » Sedação. » Déficit de concentração. » Pesadelos. » Sinais extrapiramidais. » Hiperprolactinemia e lactação. » Disfunção sexual. Posologia Metildopa: » Inicial: 250 mg, 2-3 x/dia. » Manutenção: 250 mg a 1.000 mg/dia, divididos em 2 x. Clonidina: » Inicial: 0,1 mg, 2 x/dia. » Manutenção: 0,1 a 0,8 mg/dia. Bloqueadores de canais de cálcio No sistema cardiovascular, o cálcio está envolvido com a contração do músculo liso vascular e do músculo estriado cardíaco e a despolarização do nodo sinusal. Neste momento, vamos focar no papel do cálcio promovendo contração do músculo liso vascular Figura 7. Contração do músculo liso. Fonte: Golan, 2009. Pode-se observar na figura 7 que o cálcio é essencial para ativar a maquinaria contrátil da fibra muscular lisa, resultando em contração. Sendo assim, as drogas capazes de bloquear os canais de cálcio do tipo L no músculo liso vascular causarão vasodilatação, diminuição da resistência vascular e consequentemente redução da pressão arterial. Farmacologia e Farmacoterapia do Sistema Cardiovascular 14 Podemos dividir os bloqueadores de canais de cálcio em três grupos: » Diidropiridinas. » Fenilalquilaminas (verapamil). » Benzotiazepinas (diltiazem). O primeiro grupo, as diidropiridinas, atuam preferencialmente no músculo liso vascular, enquanto os outros dois grupos atuam mais no coração, e, portanto, serão discutidos em outro momento. » Diidropiridinas • Nifedipina. • Nicardipina. • Anlodipina. • Felodipina. • Isradipina. • Lacidipina. • Lercarnidipina. • Manidipina. • Nisoldipina. • Nitrendipina. Anlodipina e nicardipina Essas duas diidropiridinas são excelentes bloqueadores de cálcio no músculo liso vascular, porém suas moléculas também permitem interação significativa com canais de cálcio do coração, sobretudo do nodo sinusal. Dessa maneira, também promovem cronotropismo negativo, além de dificilmente causarem taquicardia reflexa, como a nifedipina. Reações adversas » Tontura. » Hipotensão. » Cefaleia. » Rubor facial – característico de todos os vasodilatadores. » Congestão nasal. » Obstipação (ou constipação) – por diminuir a entrada de cálcio no músculo liso intestinal e consequentemente reduzir o peristaltismo. » Edema periférico e pulmonar – resultado da vasodilatação. » Tosse e sibilos. » Taquicardia reflexa – efeito exclusivo das di-hidropiridinas, especialmente da nifedipina. É importante lembrar que todo vasodilatador, incapaz de causar inotropismo negativo, provoca desativação de barorreceptores, ativação do centro vasomotor e aumento da descarga simpática no coração, causando taquicardia. » Doses excessivas podem causar cãibras musculares. Posologia Nifedipina: » Inicial: 30 mg, 1 x/dia (formulação de liberação controlada), ou 10 mg, 3 x/dia (liberação imediata). » Manutenção: 10 mg a 30 mg, 3 x/dia (formulação de liberação controlada), ou 30 mg a 60 mg, 1 x/dia (liberação imediata). Farmacologia e Farmacoterapia do Sistema Cardiovascular 15 Anlodipina: » Inicial: 5 mg, 1 x/dia. » Manutenção: 2,5 mg a 10 mg, 1 x/dia. Nicardipina: » Inicial: 20 mg, 3 x/dia (liberação imediata), ou 30 mg, 2 x/dia (formulação de liberação controlada). » Manutenção: 20 mg a 40 mg, 3 x/dia (liberação imediata), ou 60 mg, 2 x/dia (formulação de liberação controlada). Vasodilatadores diretos Minoxidil É classificado como agente vasodilatador direto ativador de canal de K+. Essa droga promove abertura dos canais de K+, causando efluxo desse íon de dentro da célula. Dessa forma, ocorrerá hiperpolarização da membrana celular e relaxamento da musculatura lisa vascular. Embora esta droga seja citada nas Diretrizes Brasileiras de Hipertensão (SBC, 2010), seu uso clínico é pouco frequente no tratamento da HAS, sendo mais utilizado topicamente para prevenir queda de cabelo (alopécia). Reações adversas (para uso sistêmico) » Pericardite e derrame pericárdico. » Alterações eletrocardiográficas. » Edema periférico. Posologia » Tratamento da HAS: 2,5 mg/dia, 1 x/dia. » Tratamento da alopécia: uso tópico, aplicar 2 x/dia, durante aproximadamente quatro meses. Hidralazina É um vasodilatador direto com mecanismo de ação incerto. Existem alguns relatos na literatura que descrevem o envolvimento de canais de K+, cujo efluxo deixa a membrana do músculo liso hiperpolarizada, consequentemente levando a vasodilatação de leitos arteriais. Seu uso é mais frequente no tratamento da hipertensão moderada a grave e especialmente no tratamento de pré-eclampsia e eclampsia. É importante considerar que frequentemente ocorre tolerância e taquifilaxia. Reações adversas » Retenção compensatória de Na+ e H2O. » Taquicardia reflexa. » Anorexia. » Rubor facial. » Lúpus induzido por fármaco. Posologia » Inicial – 10 mg, 4 x/dia. » Manutenção – 25 mg a 100 mg/dia, divididos em duas doses. Fármacos que atuam no sistema renina- angiotensina-aldosterona Antes de discutirmos esses fármacos, é importante resgatar alguns conceitos básicos do sistema renina- angiotensina-aldosterona (SRAA) no controle da pressão arterial. Farmacologia e Farmacoterapia do Sistema Cardiovascular 16 A diminuição da taxa de filtração, bem como a ativação de receptores β1-adrenérgicos, estimulam as células do aparelho justaglomerular a liberar renina na corrente sanguínea, o que, por sua, vez catalisa a conversão de angiotensinogênio em angiotensina I, que sofre ação da enzima conversora de angiotensina(ECA), formando angiotensina II. Esta última, por meio de receptores AT1, estimula a liberação de alguns hormônios e promove alguns efeitos hipertensores. Figura 8. Sistema renina-angiotensina-aldosterona. Fonte: http:// dc403.4shared.com/doc/bVLzVuCl/preview.html. Inibidor de renina Alisquireno Essa droga é o protótipo desse grupo. Atua inibindo diretamente a renina e, dessa forma: » Diminui a formação de angiotensina I. » Diminui a formação de angiotensina II. » Diminui todos os efeitos hipertensores causados pela angiotensina II. Reações adversas » Hipercalemia (aumento da concentração de K+ no líquido extracelular) – especialmente associado a diuréticos poupadores de K+. » Hipotensão arterial – especialmente no início do tratamento. Posologia » Inicial: 150 mg, 1 x/dia. » Manutenção: 300 mg, 1 x/dia. Inibidores da enzima conversora de angiotensina (IECAS) » Captopril. » Enalapril. » Ramipril. » Lisinopril. Essas drogas inibem competitivamente a enzima conversora de angiotensina, diminuindo a formação de angiotensina II e, consequentemente, diminuindo a pressão arterial. Embora compartilhem o mesmo mecanismo de ação, existem algumas propriedades Ativação de receptores AT1 pela angiotensina II - Vasoconstrição - Reabsorção renal de Na+ - Liberação de aldosterona - Liberação de ADH - Ativação do centro vasomotor. Farmacologia e Farmacoterapia do Sistema Cardiovascular 17 peculiares entre elas, especialmente no perfil farmacocinético. O enalapril e o ramipril são pró-drogas farmacologicamente inativas e precisam ser metabolizados em enalaprilato e ramiprilato, respectivamente, para interagir e inibir a ECA. Portanto, essas drogas não devem ser utilizadas por pacientes com insuficiência hepática, já que a metabolização delas estará significativamente comprometida. Ações farmacológicas promovidas pelos inibidores da ECA: Efeitos dos IECAS - Vasodilatação - Aumento da eliminação de Na+ e água - Diminuição da liberação de aldosterona - Diminuição da liberação de ADH - Aumento da disponibilidade de bradicinina - Diminuição da descarga simpática no coração, vasos e rins. O hormônio aldosterona, liberado pelo córtex da glândula suprarrenal, atua no néfron, mais precisamente na final do túbulo distal, estimulando a reabsorção de Na+ e a secreção de K+. O hormônios ADH (hormônio antidiurético ou vasopressina), liberado pela neuro-hipófise ou hipófise posterior, também atua no final do túbulo distal e no ducto coletor dos néfrons, estimulando a reabsorção de água. Sendo assim, ambos, aldosterona e ADH, promovem: » Aumento da volemia (volume plasmático). » Aumento do retorno venoso. » Aumento do volume sistólico. » Aumento do débito cardíaco. » Aumento da pressão arterial. A diminuição da liberação desses dois hormônios pelos IECAS é bastante vantajosa no controle da pressão arterial. A bradicinina é uma cinina que ativa receptores específicos na superfície das células endoteliais, estimulando a produção e a liberação local de óxido nítrico (NO). Sabe-se que o NO é um poderoso vasodilatador e que foi definido, no início da década de 1990, como o principal fator relaxante derivado do endotélio. Nos tecidos, a bradicinina sofre degradação pela ECA, portanto, a utilização de IECAS aumenta a disponibilidade de bradicinina, aumentando ainda mais a ação vasodilatadora dessas drogas. Recentemente, pesquisas mostraram que a angiotensina I que não sofreu ação da ECA pode sofrer ação de outra isoforma, chamada de ECA- 02. Essa isoforma catalisa uma reação, que quebra a angiotensina I em angiotensina 1-7, que, por sua vez, interage com receptores MAS. Estes promovem vasodilatação, potencializando os efeitos anti- hipertensivos dos IECAS. Farmacologia e Farmacoterapia do Sistema Cardiovascular 18 Figura 9. Receptores AT1, AT2 e Mas de angiotensina II. Fonte: http://clubedolaringoscopio.blogspot.com.br/2012/02/ renineangiotensin-system-antagonists-in.html. Reações adversas » Tosse – causada pelo aumento de bradicinina nas vias aéreas. » Hipercalemia – geralmente quando os IECAS estão associados a diuréticos poupadores de K+ (espironolactona). » Angioedema. Farmacologia e Farmacoterapia do Sistema Cardiovascular 19 » Hipotensão arterial. Posologia Captopril: » Inicial: 12,5 mg a 25 mg, 2 a 3 x/dia. » Manutenção: 25 mg a 100 mg/dia, divididas em 2 a 3 x/dia. Enalapril: » Inicial: 2,5 mg a 5 mg/dia. » Manutenção: 2,5 mg a 40 mg/dia, divididas em 1 ou 2 x/dia. Antagonistas de receptores AT1 » Losartana. » Valsartana. » Candesartana. » Telmisartana. » Irbesartana. » Olmesartana. » Evalsartana. Este grupo de drogas não interfere com a síntese de angiotensina II, mas impede que ela possa ativar os receptores AT1, que são responsáveis pelos efeitos hipertensivos descritos. Portanto, elas atuam como antagonistas seletivos e competitivos desses receptores. Sem a ativação de receptores AT1 na hipófise e na glândula adrenal, as concentrações plasmáticas de ADH e aldosterona também estarão diminuídas. Como a síntese de angiotensina II não é alterada por essas drogas, ela pode ativar mais facilmente os receptores AT2, que causam vasodilatação e outras respostas anti-hipertensivas. Uma desvantagem dessas drogas para o tratamento da hipertensão é não contar com a ação vasodilatadora da bradicinina. Por outro lado, os pacientes não terão tosse como efeito colateral. Os efeitos farmacológicos, bem como a resposta clínica anti-hipertensiva, são muito semelhantes entre os diversos fármacos desse grupo. Alguns estudos demonstraram que a olmesartana apresentava maior potência, quando comparada às demais. Reações adversas » Hipercalemia – especialmente se forem associadas a diuréticos poupadores de K+. » Hipotensão arterial, especialmente após a primeira dose do tratamento. » Tontura. Posologia Losartana: » Inicial: 50 mg, 1 x/dia. » Manutenção: 25 mg a 100 mg, divididas em 1 ou 2 x/dia. Candesartana: » Inicial: 16 mg, 1 x/dia. » Manutenção: 4 mg a 32 mg, 1 x/dia. Olmesartana: » Inicial: 20 mg, 1 x/dia. » Manutenção: 40 mg, 1 x/dia. Farmacologia e Farmacoterapia do Sistema Cardiovascular 20 Cuidados É importante saber que tanto os inibidores da enzima conversora de angiotensina como os antagonistas de receptores AT1 são contraindicados durante a gestação, podendo comprometer o desenvolvimento fetal e causar morte. Estratificação de risco cardiovascular Como dito no início deste assunto, antes da aplicação de uma farmacoterapia racional para o tratamento da HAS, é importante investigar completamente o quadro clínico do paciente. As Diretrizes Brasileiras de Hipertensão (SBC, 2010) disponibilizam uma tabela de estratificação de riscos, essencial para essa investigação. Tabela 4. Estratificação do risco cardiovascular global: risco adicional atribuído à classificação de hipertensão arterial de acordo com fatores de risco, lesões de órgãos-alvo e condições clínicas associadas Normotensão Hipertensão Outros fatores de risco ou doenças Ótimo PAS <120 ou PAD < 80 Normal PAS 120 - 129 ou PAD 80-84 Limitrofe PAS 130-139 ou PAD 85-89 Estágio 1 PAS 140-159 PAD 90-99 Estágio 2 PAS 160-179 PAD 100-109 Estágio 3 PAS ≥ 180 PAD ≥110 Nenhum fator de risco Risco basal Risco basal Risco basal Baixo risco adicional Moderado risco adicional Alto risco adicional 1-2 fatores de risco Baixo risco adicional Baixo risco adicional Baixo risco adicional Moderado risco adicional Moderado risco adicional Risco adicional muito alto ≥ 3 fatores de risco, LOA ou SM - DM Moderado risco adicional Moderado risco adicional Alto risco adicional Alto risco adicional Alto risco adicional Risco adicional muito alto Condições clínicas associadas Risco adicional muito alto Risco adicional muito alto Risco adicional muito alto Risco adicional muito alto Risco adicional muito altoRisco adicional muito alto LOA: lesão de órgãos-alvos; SM: síndrome metabólica; DM: diabetes mellitus. Fonte: SBC, 2010. Para trabalhar com essa tabela, é importante relacionar os valores de pressão sistólica e diastólica de um paciente com os fatores de risco e condições patológicas que o acometem (primeira coluna da esquerda). Os fatores de risco podem ser encontrados no início deste material. As lesões de órgãos-alvo incluem: » Hipertrofia de ventrículo esquerdo – identificada por meio de eletrocardiograma e/ou ecocardiograma. » Espessura médio-intimal de carótida > 0,9 mm ou presença de placa de ateroma. » Prejuízo de função renal – com depuração de creatinina estimada em < 60 ml/min/1,72 m2 ou microalbuminúria de 30-300 mg/ 24h ou relação albumina/creatinina > 30 mg/g. As condições clínicas associadas incluem: Farmacologia e Farmacoterapia do Sistema Cardiovascular 21 » Doença cerebrovascular - acidente vascular encefálico hemorrágico e isquêmico (AVEH e AVEI) e alteração da função cognitiva. » Doença cardíaca – infarto agudo do miocárdio (IAM), angina, insuficiência cardíaca. » Doença renal - nefropatia diabética e insuficiência renal. » Retinopatia avançada - hemorragias ou exsudatos e papiledema. » Doença arterial periférica. Para solidificar melhor o entendimento da tabela de estratificação de riscos, vamos utilizar o relato de caso abaixo para fazer esse procedimento de um paciente. Por favor, primeiramente tente responder as questões e em seguida compare com as respostas. “Paciente: J. W., 26 anos, masculino, branco, solteiro, professor, procedente de São Jose do Rio Preto, interior de São Paulo. O paciente refere que, há um mês, submeteu- se a exame médico e constatou níveis pressóricos de 150/90 mmHg e clearance de creatinina de 40 ml/min/1,72 m2. Embora estivesse totalmente assintomático, foi aconselhado a procurar atendimento clínico. Nega doenças sérias no passado e refere que sua pressão arterial, medida há cinco anos, era normal. Não pratica atividade física regular, e a obesidade acompanhao desde criança. Seu pai e sua mãe são hipertensos, e seu avô faleceu em decorrência de um AVE.” Utilizando as informações do relato de caso e a tabela de estratificação de risco cardiovascular, responda às questões abaixo: 1. Qual a classificação da pressão arterial do paciente? 2. Quais fatores de risco para doença cardiovascular estão presentes no caso? 3. Foi realizada alguma identificação subclínica de órgão-alvo? 4. Considerando que o paciente teve diagnóstico de hipertensão arterial sistêmica, você consegue classifica-la em primária ou secundária? 5. Faça a estratificação de risco cardiovascular do paciente. Decisão terapêutica Como descrito anteriormente, a decisão terapêutica deve ser baseada no risco cardiovascular, considerando-se a presença de fatores de risco, lesão em órgão-alvo e/ou doença cardiovascular estabelecida, e não apenas no nível da PA. A tabela 5 demonstra a decisão terapêutica mais apropriada para cada caso. Tabela 5. Decisão terapêutica Categoria de risco Considerar Sem risco adicional Tratamento não- medicamentoso isolado Risco adicional baixo Tratamento não- medicamentoso isolado por até 6 meses. Se não atingir a meta, associar tratamento medicamentoso Risco adicional médio, alto e muito alto Tratamento não- medicamentoso + medicamentoso Fonte: SBC, 2010. A partir da tabela 5, podemos sugerir que o paciente J.W. deve seguir um tratamento não medicamentoso associado ao tratamento medicamentoso. Monoterapia Deve ser iniciada a pacientes com hipertensão arterial de estágio 1 e com risco cardiovascular baixo Farmacologia e Farmacoterapia do Sistema Cardiovascular 22 a moderado. A escolha da monoterapia deve ser baseada nos seguintes aspectos: » Capacidade de o agente escolhido reduzir morbidade e mortalidade cardiovasculares. » Perfil de segurança do medicamento. » Mecanismo fisiopatológico envolvido. » Características individuais do paciente. » Doenças associadas. » Condições socioeconômicas. Classes preferenciais: » Diuréticos. » Betabloqueadores. » Inibidores da ECA. » Bloqueadores do receptor AT1. » Bloqueadores dos canais de cálcio. A posologia deverá ser ajustada de acordo com a dose inicialmente recomendada da droga escolhida até que se consiga redução da PA pelo menos a um nível inferior a 140/90 mmHg. Se a resposta terapêutica não tiver sido apropriada e o objetivo de controlar a PA não tiver sido alcançado, é recomendado: » Aumentar a dose do medicamento. » Associar um anti-hipertensivo de outro grupo terapêutico. » Substituir o fármaco por outro fármaco, de outro grupo terapêutico, no caso de reações adversas não toleráveis ao paciente. » Em último caso, associar mais de dois medicamentos até atingir níveis pressóricos adequados. Terapia com dois ou mais anti-hipertensivos A associação de dois ou mais anti-hipertensivos faz-se necessária quando: » A monoterapia não foi suficiente para controlar a PA. » Pacientes hipertensos com alto e muito alto risco cardiovascular. » Pacientes diabéticos. » Pacientes com doença renal crônica. » Pacientes com hipertensão em estágios 2 e 3, com a finalidade de prevenção primária e secundária de acidente vascular encefálico. Embora os diuréticos não tenham sido descritos neste módulo, eles são amplamente utilizados no tratamento da HAS. Seguem algumas associações terapeuticamente reconhecidas como eficazes e sugeridas pelas Diretrizes Brasileiras de Hipertensão (SBC 2010): » Diuréticos com outros diuréticos de diferentes mecanismos de ação. » Diuréticos com betabloqueadores. » Diuréticos com inibidores da ECA. » Diuréticos com bloqueadores do receptor AT1. » Diuréticos com bloqueadores de canais de cálcio. » Diuréticos com simpatolíticos de ação central. » Diuréticos com inibidor direto da renina. Farmacologia e Farmacoterapia do Sistema Cardiovascular 23 » Bloqueadores de canais de cálcio com betabloqueadores. » Bloqueadores de canais de cálcio com inibidores da ECA. » Bloqueadores de canais de cálcio com bloqueadores do receptor AT1. » Bloqueadores de canais de cálcio com inibidor da renina. Figura 10. Fluxograma do tratamento da hipertensão arterial. Fonte: SBC, 2010. A associação de dois ou mais anti-hipertensivos é necessária em determinadas situações, como as descritas anteriormente. Porém aumenta o risco de ocorrência de reações adversas e interações medicamentosas. Interações medicamentosas entre anti-hipertensivos » Diuréticos poupadores de K+ (espironolactona, triantereno e amilorida) com inibidores da ECA: risco de hipercalemia (aumento do K+ no líquido extracelular). » Betabloqueadores com bloqueadores de canais de cálcio (verapamil e diltiazem): bradicardia e depressão sinusal. » Antagonistas de receptores AT1 e diuréticos popadores de K+: risco de hipercalemia. Emergência hipertensiva É o aumento crítico da pressão arterial, com quadro clínico grave, progressiva lesão de órgãos-alvo e risco de morte, exigindo imediata redução da pressão arterial. Em quase todos os casos, o tratamento exige administração de drogas por via intravenosa. Farmacologia e Farmacoterapia do Sistema Cardiovascular 24 Nitroprussiato de sódio Fonte: Golan, 2009. O nitroprussiato de sódio (NPS) é um dos vasodilatadores mais potentes e eficazes, se não o mais, disponível para uso clínico. É um composto que contém Fe (ferro), CN (cianeto) e NO (óxido nítrico) na molécula. Essa droga é administrada via intravenosa e rapidamente libera NO e CN na corrente sanguínea. Como podemos observar na figura 11, o óxido nítrico migra para o interior do músculo liso vascular e ativa a enzima guanilil ciclase (ou guanilato ciclase), que por sua vez catalisa a reação que converte GTP em GMPcíclico. O GMPcíclico é conhecido como segundo mensageiro e vai promover diversos efeitos intracelulares, entre eles a ativação da enzimamiosina fosfatase de cadeia leve. Essa enzima é responsável por desfosforilar a cadeia leve da miosina do músculo e dessa forma quebrar as interações entre os miofilamentos de actina e miosina, causando relaxamento da musculatura lisa vascular. Figura 11. Fonte: Golan, 2009. NPS é um potente vasodilatador de artérias e veias capaz de diminuir significativamente a pressão arterial de um paciente. Sendo assim, seu uso é restrito a emergências hipertensivas e insuficiência cardíaca grave. É importante que o paciente tenha sua pressão continuamente monitorada durante a utilização dessa droga, pois há grande risco de hipotensão grave e morte. Além disso, o NPS é extremamente fotossensível, necessitando de revestimento de todo o equipamente que armazena e conduz o medicamento até o paciente. Para cada molécula de NPS, cinco moléculas de CN são liberadas na corrente sanguínea, que são metabolizadas em tiocianato pelo fígado e excretadas pelos rins. O acúmulo de CN no organismo causa grave toxicidade, levando a desequilíbrio ácido- base, arritmias cardíacas e morte. Até mesmo o seu metabólito tiocianato apresenta toxicidade e pode causar desorientação, psicose, espasmos musculares e convulsões. É importante lembrar que o cianeto tem elevada afinidade pelo ferro no estado férrico e portanto reage com o ferro trivalente da citocromo oxidase na mitocôndria, inibindo a respiração celular. As doses terapêuticamente utilizadas de NPS dificilmente são causadoras de intoxicações, sendo mais comuns em pacientes com prejuízo de função renal e hepática ou idade avançada. Reações adversas » Hipotensão grave. » Zumbido. » Supressão da tireoide. Posologia Uso de bomba de infusão. Farmacologia e Farmacoterapia do Sistema Cardiovascular 25 » Inicial: 0,3 a 0,5 mcg/kg/minuto, aumentar com incremento de 0,5 mcg/kg/min até obter a resposta clínica desejada. » Manutenção: 3 mcg/kg/minuto. Cuidados com a preparação de NPS A reconstituição do nitroprussiato de sódio deve ser feita no momento da administração. Deve-se diluir 50 mg em 250-1.000 mL de soro glicosado. A solução possui coloração característica rosa acastanhado ou laranja claro. Soluções laranja escuro ou azul escuro indicam decomposição da droga pela luz. Hidralazina É um vasodilatador direto, como já descrito anteriormente, utilizado via endovenosa e intramuscular na emergência hipertensiva. Posologia - Via IM ou IV: Inicial: 10 mg a 20 mg/dose a cada 4-6 horas, podendo aumentar-se até 40 mg. Angina Antes de falarmos das drogas empregadas no tratamento da angina de peito, é importante entender os tipos e os mecanismos fisiopatológicos envolvidos com ela. A partir daí, ficará mais simples compreender e justificar a utilização de cada grupo farmacológico. A angina é uma síndrome clínica caracterizada por sensação de pressão torácica, dor ou desconforto em qualquer das seguintes regiões: tórax, epigástrio, mandíbula, ombro, dorso ou membros superiores. A dor da angina tem duração aproximada de um a cinco minutos. Dores prolongadas, quando atípicas, normalmente não são anginosas e, quando típicas e maiores que 20 minutos, sugerem a ocorrência de angina instável ou infarto agudo do miocárdio. A palavra angina, de origem latina, significa sufocar e está associada a isquemia transitória do miocárdio. Figura 12. Angina de peito. Fonte: http://cardiologia. facafisioterapia.net/2010/11/dor-no-peito-pos-infarto.html. Causas A angina é desencadeada pelo desequilíbrio entre a oferta e o consumo de oxigênio (O2) no miocárdio, por isso que se diz isquemia transitória do miocárdio. A baixa perfusão tecidual e/ou o elevado consumo de O2 pelo miocário aumenta a concentração tecidual de alguns compostos sinalizadores, por exemplo, H+, ADP, lactato etc. Esses sinalizadores ativam quimiotransdutores viscerais, presentes em neurônios nociceptivos (receptores de dor) localizados no coração. Esses quimiotransdutores são chamados de canais iônicos sensíveis a ácido (CISA). Suprimento de O2 ao miocárdio As artérias coronárias são responsáveis por garantir adequada perfusão no miocárdio. Elas devem conduzir sangue em quantidade suficiente Farmacologia e Farmacoterapia do Sistema Cardiovascular 26 para atender às demandas metabólicas desse músculo, levando O2, glicose, lipídios, eletrólitos e outros nutrientes essenciais aos cardiomiócitos (fibras musculares do miocárdio). Figura 13. Artérias coronárias e miocárdio. Fonte: http://www. eagostini.com.br/Coronariografia.htm. A maior parter do suprimento sanguíneo ao coração é garantido pelas artérias coronárias direita e esquerda. Nota-se, na figura 13, que elas estão localizadas na superfície do coração, e as artérias menores penetram na massa muscular a partir da superfície. A artéria coronária esquerda irriga principalmente as porções anterior e lateral esquerda do ventrículo esquerdo, enquando a artéria coronária direita supre a maior parte do ventrículo direito e a parte posterior do ventrículo esquerdo. Durante a sístole ventricular, a contração das fibras musculares miocárdicas pressiona os vasos coronarianos das camadas mais internas e o plexo arterial subendocárdico, portanto ocorre diminuição do fluxo sanguíneo nesses locais. A situação é invertida durante a diástole, em que ocorre grande aumento do fluxo sanguineo nas camadas subendocárdicas. Fatores que alteram o suprimentos de O2 ao miocárdio O fluxo sanguineo coronariano é determinado por: A. Pressão de perfusão: A pressão de perfusão aumenta consideramente durante a diástole ventricular e diminui durante a sístole. B. Resistência coronariana: Metabólitos que dilatam as arteríolas coronarianas – adenosina, K+, H+, CO2 e bradicinina são alguns exemplos de compostos liberados localmente na circulação coronariana que são capazes de dilatar esses vasos, diminuindo a resistência. É importante saber que a maior parte desses metabólitos interage com receptores específicos diretamente na musculatura lisa vascular ou em células endoteliais. Geralmente, nestas últimas células, vai ocorrer liberação de grande quantidade do NO, que migrará para a camada muscular lisa, causando dilatação. Controle autonômico – as fibras parassimpáticas são escassas nas coronárias, porém as simpáticas irrigam abundatemente esses vasos. Os receptores α1-adrenérgicos são causadores de vasoconstrição e estão localizados predominantemente nos vasos mais superficiais. Os receptores β2-adrenérgicos estão localizados nas arteríolas mais subendocárdicas e são causadores de vasodilatação. Aterosclerose – a formação de placas de ateroma é responsável por dificultar a passagem de sangue pela luz dos vasos, o que aumenta a resistência vascular. A fisiopatologia da aterosclerose será discutida com mais cuidado no próximo assunto. Neste momento, é importante saber que o aumento da resistência vascular causado pelas placas de ateroma pode diminuir o fornecimento de O2 ao miocárdio. Fatores que alteram o consumo de O2 pelo miocárdio Frequência cardíaca (FC) - o aumento do número de batimentos por minuto aumenta o consumo de O2 pelo miocárdio. Portanto, em algumas Farmacologia e Farmacoterapia do Sistema Cardiovascular 27 situações, como exercício físico, estresse emocional, agonistas de receptores β-adrenérgicos, taquicardia reflexa ou qualquer outro evento capaz de aumentar a FC, se esse aumento não for acompanhado de aumento do fluxo sanguíneo coronariano, uma crise de angina pode ser iniciada. Contratilidade – o aumento da força de contração do miocárdio também aumenta a demanda por ATP, que, por sua vez, é formado em maior quantidade pelo metabolismo oxidativo da mitocôndria. Esse metabolismo exige O2 para ser executado, já que este é o aceptor final da cadeia de transporte de elétrons. Logo, o aumento da contratilidade leva ao aumento do consumo de O2 pelo miocárdio. Estresse da parede ventricular – o estresse da paredeventricular envolve os conceitos de pré e pós-cargas. A pré-carga é o trabalho cardíaco necessário para ejetar o volume de sangue que chega aos ventrículos pelo retorno venoso. Portanto, se aumentar o volume de sangue que chega ao ventrículo direto a partir das veias cavas, a tensão na parede ventricular será aumentada, para que o sangue seja completamente ejetado, evitando qualquer tipo de congestão. Lembre-se de que o volume ejetado é igual ao que chegou pelo retorno venoso e, após a sístole, ainda permanece uma pequena quantidade de sangue no ventrículo (volume sistólico final, 40 mL). A pós-carga é o trabalho cardíaco necessário para vencer a resistência vascular total ou periférica. Quando o miocárdio ventricular esquerdo se contrai, a pressão dentro do ventrículo deve ser maior que a pressão na aorta e na rede arterial, garantindo, dessa forma, que o sangue deixe a câmara ventricular e atinja esse sistema. Portanto, uma vasoconstrição sistêmica aumenta a resistência vascular total e consequentemente a tensão na parede ventricular esquerda. Em resumo, a pré-carga está diretamente relacionada ao volume do retorno venoso, e a pós- carga, à resistência vascular total. Tanto o aumento da pré quanto da pós-carga causa aumento da tensão na parede ventricular, aumentando o consumo de O2 pelo miocárdio. Classificação da angina De acordo com as causas, características clínicas e fisiopatológicas da angina, ela pode ser classificada em: » Angina estável. » Angina variante. » Angina instável. A. Angina estável ou angina de esforço Os episódios anginosos são causados por situações que aumentam a demanda de trabalho cardíaco, como exercício físico, estresse emocional ou ainda exposição ao frio intenso. Durante a exposição ao frio intenso, grande volume de sangue é deslocado para outros tecidos, a fim de auxiliar na manutenção da temperatura corporal, causando diminuição da oferta de O2 ao miocárdio. Tanto o exercício físico como o estresse emocional aumentam a descarta das fibras simpáticas no coração, que, por intermédio dos receptores β-adrenérgicos, aumentam a frequência cardíaca e a contratilidade. Dessa forma, ocorre aumento do consumo de O2 pelo miocárdio. Além disso, é importante lembrar que o aumento do número de sístoles ventriculares pode diminuir o fluxo sanguíneo coronariano, diminuindo o fornecimento de O2 ao tecido. Tudo isso pode gerar um desequilíbrio entre a oferta e o consumo de O2 ao coração, desencadeando uma crise. Farmacologia e Farmacoterapia do Sistema Cardiovascular 28 B. Angina variante ou vasoespástica ou de Prinzmetal Esse tipo de angina ocorre geralmente durante o repouso ou em exercício físico mínimo. As crises são mais frequentes durante a noite, embora grande parte dos pacientes tenham alguns episódios logo pela manhã. Os pacientes com angina variante são mais jovens, e as crises seguem comumente um padrão cíclico ou regular de ocorrência. Causas A grande característica desse tipo de angina são os espasmos das artérias coronárias, que são focais, na maior parte das vezes, podendo ocorrer simultaneamente em mais de um local. Os espasmos coronarianos geralmente causam isquemia subendocárdica, devido à oclusão incompleta de uma artéria epicárdica e ao aumento transitório do fluxo coronariano, sustentado pela circulação colateral. Portanto, diferentemente da angina estável, na angina variante ocorre diminuição do fornecimento de O2 ao miocárdio, mesmo em condições de menor consumo. Figura 14. Espasmo da artéria coronária. Fonte: http://www. lookfordiagnosis. com/mesh_info.php?term=Isquemia+Mioc%C 3%A1rdica&lang=3. Principais causas dos espasmos das artérias coronárias » Respostas hiperativas do sistema nervoso autônomo simpático. » Defeito no manejo do cálcio no músculo liso vascular – é importante lembrar que o cálcio, ao interagir com a proteína calmodulina, ativa toda a maquinaria contrátil da fibra muscular, causando espasmos. » Produção reduzida de compostos vasodilatadores derivados do endotélio – o endotélio é uma importante estrutura reguladora do tônus vascular. Ele faz isso liberando moléculas capazes de migrar para a musculatura lisa, algumas causando contração e outras, relaxamento. A diminuição da síntese ou da disponibilidade de vasodilatadores, como o NO e a prostaciclina, podem aumentar o tônus muscular, causando espasmos. C. Angina instável É classificada como uma síndrome coronária aguda de isquemia miocárdica. Sua fisiopatologia está situada entre a angina estável e o infarto do miocárdio, portanto, seus detalhes e tratamento serão discutidos com mais cuidado no próximo assunto. Tratamento da angina de peito estável e variável O tratamento é feito com acompanhamento clínico, utilizando medidas não farmacológicas e farmacológicas, angioplastia e cirurgia de revascularização. No acompanhamento clínico do paciente, é importante: a) Controlar fatores desencadeantes de crise: » Exercício exagerado. Farmacologia e Farmacoterapia do Sistema Cardiovascular 29 » Anemia. » Estresse emocional. » HAS não controlada. » Taquiarritmias. » Febre. » Tireotoxicose. b) Controlar fatores de risco para a cardiopatia: » Tabagismo. » Sedentarismo. » Dislipidemia. » Obesidade. » Diabetes mellitus. Tratamento medicamentoso ou farmacológico O tratamento farmacológico é dividido em dois grupos: tratamento para aliviar a crise de angina já desencadeada e tratamento crônico para prevenção de crises. 1. Nitratos orgânicos ou organonitratos » Nitroglicerina ou trinitrato de gliceril. » Mononitrato de isossorbida. » Dinitrato de isossorbida. » Propatilnitrato. Figura 15. Fonte: Golan, 2009. São as drogas de primeira escolha no tratamento agudo da angina, ou seja, para retirar o paciente da crise. Essas drogas são excelentes vasodilatadores de veias e artérias coronárias. Em doses terapêuticas, causam pouca ação nas arteríolas periféricas e portanto pouco alteram a pressão arterial. Ao dilatar os leitos venosos, os nitratos orgânicos aumentam a capacitância venosa e consequentemente diminuem o retorno venoso e o volume diastólico final, que é o volume de sangue nas câmaras ventriculares ao final da diástole. Ao se reduzir retorno venoso, reduz-se a pré-carga e o consumo de O2 pelo miocárdio. A dilatação coronariana aumenta o fornecimento de O2 ao miocárdio. Portanto, com a diminuição Farmacologia e Farmacoterapia do Sistema Cardiovascular 30 do consumo, acompanhado do aumento do fornecimento, a crise de angina é interrompida. Os nitratos orgânicos são moléculas liberadoras de NO2, que precisam ser reduzidas para formar NO capaz de interagir com a enzima guanilil ciclase, conforme descrito no mecanismo de ação do nitroprussiato de sódio. Os nitratos encontram diversos agentes redutores intra e extracelulares, por exemplo, os radicais tióis das proteínas, formando nitrosotióis. A glutationa também é um importante agente redutor. Acredita-se que a necessidade de agentes redutores para uma melhor ação do nitrato orgânico seja a responsável pela preferência vasodilatadora de veias e coronárias, diferentemente do nitroprussiato de sódio, que prontamente libera NO, que, por sua vez, promove vasodilatação em todos os leitos vasculares. Figura 16. Fonte: Golan, 2009. Tolerância Geralmente é causada pela exposição contínua ou frequente aos nitratos orgânicos. Ainda não há uma hipótese completamente comprovada do mecanismo envolvido, porém a depleção celular dos grupos sulfidril pode estar envolvida. Lembre-se de que os grupos sulfidril são importantes agentes redutores intracelulares e essenciais para a ação dos organonitratos. Para diminuir a ocorrência de tolerância, é recomendado aumentar o tempo entre as administrações, para que o paciente fique algum tempo sem nitrato circulante no corpo. No caso de adesivo transdérmico de nitroglicerina, é recomendada sua remoçãodurante a noite. É importante lembrar que essa estratégia para diminuir a tolerância deve ser realizada com muita cautela em pacientes com angina grave, pois eles podem sofrer uma angina rebote. Esse procedimento é mais recomendado para a pacientes com angina estável. Outra medida capaz de diminuir a ocorrência de tolerância sem alterar a posologia é associar N-acetilcisteína ao tratamento, pois ela contém diversos grupos tióis que irão atuar como agentes redutores, necessários para a redução do NO2. Reações adversas » Hipotensão ortostática. » Taquicardia reflexa – ocorre somente quando o nitrato promove vasodilatação arteriolar significativa e consequente queda da pressão arterial. » Cefaleia pulsátil severa – devida à vasodilatação de artérias presentes nas meninges. » Tontura. » Rubor. » Síncope. » Edema periférico. Farmacologia e Farmacoterapia do Sistema Cardiovascular 31 Preparações de nitratos e posologia no alívio imediato da crise A via de administração sublingual é a primeira escolha no alívio imediato da crise, promovendo início de ação de um a dois minutos. Os comprimidos administrados pela via sublingual provocam sensação de queimação embaixo da lingua do paciente. A dose de nitrato utilizada deve ser insuficiente para causar queda significativa da pressão arterial, pois isso diminuiria o fluxo sanguíneo coronariano e permitiria a ativação de reflexos simpáticos, causando taquicardia reflexa e agravando a angina. Nitroglicerina, via sublingual – 0,2 mg a 0,6 mg a cada cinco minutos, até três administrações em 15 minutos. Dinitrato de isossorbida, via sublingual – 2,5 mg a 5 mg a cada 5 ou 10 minutos, até três doses, no máximo em 30 minutos. Preparações de nitratos e posologia no tratamento crônico e prevenção da crise A via oral é a que oferece maior comodidade ao paciente, e portanto, melhor aderência farmacoterapêutica, porém a nitroglicerina e o dinitrato de isossorbida apresentam baixa biodisponibilidade, devido ao intenso metabolismo de primeira passagem. Sendo assim, algumas vezes, dá-se preferência para administrações de adesivos transdérmicos. Embora o 5-mononitrato de isossorbida seja um metabólito do dinitrato, seu metabolismo hepático é menos intenso, o que aumenta significativamente sua biodisponibilidade quando administrado via oral. Nitroglicerina, via oral – 2,5 mg a 9 mg, 2 a 4 x/dia. Nitroglicerina, adesivo transdérmico – inicial: 0,2 mg a 0,4 mg/h; manutenção: 0,4 a 0,8 mg/h. Nitroglicerina, via sublingual – utilizada de 5 a 10 minutos antes de praticar um esforço, como um exercício, a fim de prevenir uma crise. Dinitrato de isossorbida, via oral – comprimido ou cápsula de liberação controlada, 5 mg a 40 mg, 4 x/dia, ou 40 mg a cada 8 ou 12 horas. Dinitrato de isossorbida, via sublingual - utilizada de 5 a 10 minutos antes de praticar um esforço, como um exercício, a fim de prevenir uma crise. Dose: 2,5 mg a 5 mg. Mononitrato de isossorbida, via oral: » Comprimido regular – 5 mg a 20 mg, 2 x/ dia, com intervalo de sete horas (para reduzir tolerância). » Comprimido de liberação controlada – inicial de 30 mg a 60 mg pela manhã, aumentar gradativamente até no máximo 240 mg. Preparações de nitratos e posologia no tratamento da angina instável Geralmente a nitroglicerina é administrada via intravenosa, mantendo infusão contínua. Nitroglicerina, via intravenosa – 5 mcg/min; aumentar a dose a cada três ou cinco minutos até atingir 20 mcg/min, podendo chegar até 200 mcg/ min. 2. Bloqueadores de canais de cálcio » Verapamil. » Diltiazem. » Diidropiridinas (nifedipina, anlodipina, nicardipina etc.). Farmacologia e Farmacoterapia do Sistema Cardiovascular 32 Os bloqueadores de canais de cálcio foram discutidos num primeiro momento como tratamento da HAS, em que se pode notar maior frequência de uso para as diidropiridinas. Neste momento, iremos focar no papel desse grupo no tratamento crônico e na prevenção das crises de angina. Como vimos anteriormente, o verapamil e o diltiazem promovem cronotropismo e inotropismo negativos e dessa forma diminuem o consumo de O2 pelo miocárdio. Por outro lado, as diidropiridinas (vasodilatadores arteriais) diminuem a pós-carga e, dessa forma, também diminuem o consumo de O2 por esse músculo. Logo, todos os bloqueadores de canais de cálcio podem prevenir as crises de angina. É importante ficar atento para a ocorrência de taquicardia reflexa, que é uma reação adversa das diidropiridinas, especialmente algumas formulações de nifedipina. Todas os bloqueadores de canais de cálcio são capazes de dilatar as arteríolas coronarianas, aumentando o fluxo sanguíneo no miocárdio e consequentemente o fornecimento de O2 ao músculo. Essas drogas são muito úteis no tratamento crônico de angina variante, pois, ao diminuir o influxo de cálcio no músculo liso coronariano, impedem a ocorrência de vasoespasmos, característicos da angina variante. Esse efeito pode ser obtido com qualquer bloqueador de canal de cálcio. Um estudo multicêntrico, realizado na década de 1980, apontou redução de 63% nas crises de angina variante com o uso de nifedipina. No caso da angina estável, essas drogas também são utilizadas na prevenção das crises. O uso das diidropiridinas no tratamento crônico das anginas estável e variante pode vir associado a betabloqueadores, para reduzir os riscos de taquicardia reflexa. Essa associação deve ser muito bem avaliada em pacientes utilizando verapamil ou diltiazem, especialmente aqueles com disfunção sistólica, pois a associação dessas drogas pode comprometer o débito cardíaco e a fração de ejeção. Preparações de bloqueadores de canais de cálcio e posologia Nimodipina, via oral – apresenta alta lipossolubilidade, portanto promove efeito central. É utilizada principalmente para tratar vasoespasmos de arteríolas subaracnoides, comuns após hemorragias nesses vasos. Dose: 60 mg a cada quatro horas, por 21 dias. A terapia deve ser iniciada em até 96 horas após a ocorrência de hemorragia subaracnoide. Verapamil, via intravenosa – causa pouca ação vasodilatadora, porém é dose-dependente. Com o aumento da concentração plasmática, pode diminuir a resistência vascular, causando queda da PA, sem risco de taquicardia reflexa. Verapamil, via oral: » Inicial: 80 a 120 mg, 3 x/dia; » Manutenção: 240 mg a 480 mg/dia, divididos em três ou quatro doses. Diltiazem, via intravenosa – causa pouca ação vasodilatadora, e os efeitos depressores cardíacos são inferiores ao verapamil. A associação com betabloqueadores deve ser evitada nessa via de administração. A via intravenosa é mais utilizada para o tratamento de arritmias. Diltiazem, via oral: » Cápsula de liberação prolongada – 120 mg a 180 mg, 1 x/dia. Dose máxima de 480 mg/dia. Farmacologia e Farmacoterapia do Sistema Cardiovascular 33 » Comprimido de liberação prolongada – 180 mg, 1 x/dia. Dose máxima de 360 mg/dia. » Comprimido regular – inicial: 30 mg, 4 x/dia; manutenção: 180 mg a 360 mg/dia. 3. Antagonistas β-adrenérgicos » Propranolol. » Atenolol. » Metoprolol. » Timolol. Essas drogas, ao bloquear receptores β2 e principalmente β1 no coração, promovem cronotropismo e inotropismo negativos. Dessa forma, diminuem o consumo de O2 pelo miocárdio, além de proteger o coração de descargas simpáticas durante o esforço e o estresse emocional. A dose dos betabloqueadores deve ser titulada até o paciente apresentar frequência cardíaca, no repouso, em torno de 55 batimentos por minuto e, durante o esforço, de cerca de 110 a 120 batimentos por minuto. No tratamento da angina estável, essas drogas são frequentemente associadas aos organonitratos, e estudos clínicos multicêntricos já demonstraram significativa redução na ocorrência das crises. Além disso, essa associação é de grande vantagem ao paciente, especialmente durante a ausência do efeito do nitrato, por exemplo, nas estratégias para diminuira tolerância. Como visto anteriormente, os betabloqueadores são frequentemente associados às diidropiridinas a fim de prevenir a taquicardia reflexa. A associação com verapamil ou diltiazem também é permitida, desde que observada a ocorrência de bradicardia severa. Os betabloqueadores devem ser evitados no tratamento da angina variante (ou de Prinzmetal), pois, ao bloquear receptores β2 adrenérgicos nas coronárias, aumentarão o risco de vasoespasmo, desencadeando uma crise. 4. Estatinas São drogas hipolipêmicas capazes de diminuir a fração LDL do colesterol, a fim de diminuir eventos cardiovasculares. Embora as estatinas não atuem diretamente na musculatura lisa vascular, como os nitratos, betabloqueadores e bloqueadores de canais de cálcio, diversos estudos clínicos já demonstraram redução de crises de angina e principalmente da evolução de eventos isquêmicos. Um estudo clínico chamado AVERT foi publicado no final de década de 1990 comprovando redução de 36% de eventos isquêmicos em pacientes fazendo uso de atorvastatina. Portanto, é comprovado que as estatinas reduzem a morbidade e a mortalidade em distúrbios cardiovasculares. Dessa forma, são indicadas na prevenção primária e secundária da doença coronariana. Resumo - Angina estável - Prevenção de crises Primeira escolha - Betabloqueadores. Se houver contraindicação de betabloquedor - antagonistas de cálcio (exceto as diidropiridinas de ação curta) ou nitratos de ação longa. Associações - quando a terapia isolada é insuficiente, deve-se combinar antagonistas de cálcio (exceto as diidropiridinas de ação curta) ou nitratos de ação longa com os betabloqueadores. Farmacologia e Farmacoterapia do Sistema Cardiovascular 34 Estatinas disponíveis para uso clínico no Brasil e EUA: » Lovastatina. » Pravastatina. » Atorvastatina. » Rosuvastatina. » Sinvastatina. » Fluvastatina. Os lipídios são essenciais para manutenção dos processos bioquímicos e fisiológicos dos órgãos e tecidos. Além de serem reservas energéticas, eles são utilizados para a síntese e manutenção de membranas biológicas e hormônios. Por serem moléculas hidrofóbicas, os lipídios são transportados pela corrente sanguinea na forma de lipoproteínas. De acordo com a densidade, as lipoproteínas são classificadas em lipoproteína de alta densidade (HDL – high density lipoprotein), baixa densidade (LDL – low density lipoprotein) e densidade muito baixa (VLDL – very low density lipoprotein). É importante lembrar que quanto maior a proporção de lipídios em relação às proteínas na lipoproteína, menor será a densidade dela. Figura 17. Lipoproteína. Fonte: www.medicinapreventiva.com.ve. As LDLs são capturadas pelos tecidos por meio de receptores de LDL e utilizadas pelas células, como citado inicialmente. Porém alterações genéticas (hipercolesterolemia familiar), dieta rica em gordura saturada e pobre em fibras e sedentarismo podem promover aumento exagerado dessa lipoproteína na corrente sanguínea. Ela, por sua vez, sofre oxidação e penetra na camada subendotelial, desencadeando resposta inflamatória. Durante esse processo, ocorre quimiotaxia de monócitos-macrófagos para o espaço subendotelial, dando origem às células espumosas, com grande quantidade de lipídios. Com o passar do tempo, todo esse processo leva à formação de uma placa de ateroma. Essa placa aumenta muito o risco de eventos cardiovasculares, pode desencadear uma crise de angina variante ou ainda progredir para angina instável e infarto agudo do miocárdio. Figura 18. Placa de ateroma. Fonte: http://biologiainterativaa. blogspot.com.br/. Mecanismo de ação das estatinas As estatinas são inibidoras competitivas e reversíveis da enzima HMGCoA redutase no fígado. Essa enzima catalisa uma etapa limitante da síntese do colesterol hepático, diminuindo modesta e transitoriamente a concentração intracelular de colesterol. Porém o principal efeito farmacológico das estatinas não está aí. Ao diminuir a concentração de colesterol intracelular, algumas vias de sinalização são ativadas na célula, resultando em ativação da proteína de ligação do elemento regulador de esteróis 2 (SREBP2). Essa proteína, por meio de toda a maquinaria de transcrição e tradução celular, estimula o aumento da expressão de receptores de Farmacologia e Farmacoterapia do Sistema Cardiovascular 35 LDL na membrana do hepatócito, que por sua vez removerão grande quantidade de LDL da corrente sanguínea. Figura 19. Síntese de colesterol no hepatócito. Fonte: Golan, 2009. Efeitos pleiotrópicos das estatinas São os efeitos adicionais promovidos pelas estatinas, ou seja, outros benefícios metabólicos e cardiovasculares além da diminuição da fração LDL do colesterol. São eles: » Melhoria da disfunção endotelial. » Aumento da biodisponibilidade do óxido nítrico (NO). » Ação antioxidante. » Inibição da resposta inflamatória. » Efeitos imunomoduladores. » Ação antitrombótica e estabilizadora das placas ateroscleróticas. Reações adversas » Miopatia – é dose-dependente e aumenta ainda mais quando as estatinas são associadas a fibratos (genfibrozil). Os mecanismos causadores parecem envolver alterações de membranas celulares e inibição de formação de substâncias importantes para o metabolismo celular e mitocondrial, como a ubiquinona. » Mialgia. » Rabdomiólise – é uma reação muito rara, que ocorre somente com doses elevadas. É caracterizada por intensa proteólise, com perda significativa de massa muscular esquelética. Com a perda de massa, grande quantidade de mioglobina é lançada na corrente sanguínea, podendo causar insuficiência renal aguda. » Elevação das transaminases hepáticas (ALT – alanina transaminase e AST – aspartato transaminase). É importante saber que esse aumento não se reflete necessariamente em hepatotoxicidade. Pode ser apenas uma adaptação hepática, relacionada ao metabolismo do colesterol. Respostas terapêuticas e posologia das estatinas Considerando o grupo num todo, as estatinas diminuem de 25% a 45% a fração LDL do colesterol, mas há algumas diferenças entre as drogas. Lovastatina – diminui de 20% a 40% a concentração de LDL plasmática, nas doses entre 10 mg e 80 mg/dia. Farmacologia e Farmacoterapia do Sistema Cardiovascular 36 » Comprimido de liberação imediata: deve ser administrado com as refeições, para obter melhor biodisponibilidade. Inicial - 20 mg/dia; manutenção – 80 mg/dia. » Comprimido de liberação controlada: deve ser administrado ao deitar, pois o alimento diminui a biodisponibilidade dessa formulação. Inicial - 20 mg/dia; manutenção – 60 mg/dia. Sinvastatina – é duas vezes mais eficaz do que a lovastatina. » Inicial – 20 mg a 40 mg, 1 x/dia, antes de deitar. » Manutenção – 5 mg a 80 mg, 2 x/dia. Fluvastatina – menos potente do grupo. Quando o objetivo terapêutico for reduzir em mais de 25% o LDL, deve-se administrar: Cápsula: 40 mg, 1x/dia à noite. Comprimido de liberação controlada: 80 mg, 1 x/ dia. Quando o objetivo terapêutico for reduzir em menos de 25% o LDL, deve-se administrar: » Cápsula: 20 mg, 1 x/dia à noite. » Comprimido de liberação controlada: 80 mg, 1 x/dia. Atorvastatina – juntamente com a rosuvastatina, são as estatinas mais potentes disponíveis para uso clínico. Além de diminuir a fração LDL do colesterol, a atorvastatina aumenta a fração HDL, promovendo mais benefícios ao sistema cardiovascular. Quando o objetivo terpêutico for reduzir em mais de 45% o LDL, deve-se administrar: » Inicial: 40 mg, 1 x/dia. » Manutenção: 10 mg a 80 mg, 1 x/dia. Na prevenção primária de doença cardiovascular, deve-se administrar 10 mg, 1 x/dia. Rosuvastatina – juntamente com a atorvastatina, são as estatinas mais potentes disponíveis para uso clínico. Além de diminuir a fração LDL do colesterol, a rosurvastatina aumenta a fração HDL, promovendo mais benefícios ao sistema cardiovascular. » Para pacientes com LDL >190 mg/dL: 20
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