Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
EMANUELA HANNOFF PILON – MEDICINA 202 1 Tutorial 7 – mod IX – Dor em faixa Pancreatites Pancreatite aguda DEFINIÇÃO - Doença inflamatória da glândula pancreática. - Caracterizada por dor abdominal, náuseas e vômitos. - Quadro acompanhado por elevação dos níveis de amilase e lipase, além da evidência radiológica da inflamação, edema e/ou necrose do órgão. - Após o surto, recuperação completa da estrutura e função pancreática. Mas, quando o dano celular que ocorreu é importante, a recuperação pode não ser completa e com a recorrência das crises, pode haver inflamação crônica e fibrose, características da pancreatite crônica. EPIDEMIOLOGIA - Acredita-se que seja um número que vem aumentando pelos calos de colelitíase, num contexto de obesidade. Além disso, o índice de tabagismo (multifatorial) também tem trazido preocupação. - No Brasil, a principal causa é a litíase biliar, relacionada com alcoolismo (> 90% dos portadores). FISIOPATOLOGIA - As etiologias levam a ativação prematura das enzimas digestivas no interior da glândula pancreática. - A ativação do tripsinogênio para tripsina parece ser o ponto crítico inicial do processo, com a tripsina ativando outras proteases ainda no interior do órgão. - Essas enzimas quando ativadas produzem injúria e morte celular, com autofagia, necrose e apoptose. Ciclo vicioso: autofagia leva a ativação das enzimas, que leva a autofagia e .... - A necrose pode envolver o pâncreas, gordura peripancreática e as estruturas adjacentes, levando ao extravasamento do fluido para espaços retroperitoniais (pancreatite aguda necrosante ou grave). - Nessa forma da doença, quando não se interrompe o ciclo vicioso, há lesão local e liberação de citocinas pró-inflamatórias e de enzimas digestivas ativadas para a circulação, que pode levar a uma resposta inflamatória sistêmica (síndrome): hipotensão, insuficiência renal e respiratória. - Os cálculos biliares (colelitíase) e o álcool são responsáveis por 70-80% de todos os casos de pancreatite aguda, com uma causa desconhecida de 10%. ETIOLOGIAS - Litíase: passa através da ampola de Vater. Mais comum (75%) em microcálculos ou lama biliar. - Medicamentos e toxinas: raro (<5%); muitas possibilidades; temporalidade (tempo entre sintomas e PA) - Álcool, tabaco, azatioprina, tiazida, inseticidas - Metabólica - Hipertrigliceridemia: >1000mg/dL. Pode ser 1ª ou secundária. São mais graves e podem ter níveis falsamente normal de amilase. Maior TGR, menor amilase. - Hipercalcemia: associada a hiperparatireoidismo 1º por aumentos abruptos do cálcio - Trauma: pós-CRPE - Obstrução do ducto pancreático: adeno ou carcinoma. Disfunção do esfíncter de Oddi, pâncreas divisum, defeito congênito. - Infecções: vírus Caxumba, fungo Aspergillus, parasitas Ascaris. EMANUELA HANNOFF PILON – MEDICINA 202 2 - Pancreatite autoimune é um processo fibroinflamatório da glândula pancreática que acomete indivíduos do sexo M em idade avançada com uma boa resposta aos glicocorticoides. Associada a Hipergamaglobulinemia ou outras doenças autoimunes. - Genética: >35a; PA recorrente, histórico familiar, idiopática. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS: sintomas ditos pela resposta inflamatória sistêmica. - Sintomas típicos: dor abdominal, náuseas e vômitos. - Dor que inicia no epigástrio e se irradia para a região dorsal. Dor contínua, com máxima intensidade em 30- 60min. - Sintomas podem ser mascarados em pctes com delírio, falência de múltiplos órgãos ou coma. - Exame físico com taquicardia. Hipotensão, taquipneia, dispneia e febre aparecem nos casos mais graves. - Paniculite: necrose gordurosa subcutânea, semelhante ao eritema nodoso. - Retinopatia: diminuição súbita da acuidade visual. Um fundo de olho pode mostrar exsudato e hemorragia. - Abdome distendido com frequência, com sensibilidade à palpação com reação de defesa em casos graves. - Pode haver maciez na percussão (derrame pleural), equimoses em flancos (sinal de Grey-turner), equimose em região periumbilical (sinal de Cullen) e equimose na base do pênis (sinal de Fox) que resultam do extravasamento de fluidos e sangue do retroperitônio para essas regiões. - A icterícia pode estar presente se houver obstrução biliar por um cálculo. - Sinais acima ou sinais de choque associados a perdas substanciais para o 3º espaço evidenciam maior probabilidade de complicações e um pior prognóstico. Sistemas para avaliação de gravidade da pancreatite aguda/ Classificações - Ranson: pancreatite grave se >= 3 Na admissão o Idade > 55a o WBC (contagem de leucócitos) > 16.000 o Glicose > 200 o LDH > 350 o AST > 250 Nas 48h seguintes o Diminui hematócrito em mais de 10% o Aumento da ureia > 10% o Cálcio sérico < 8mg/dL o PaO2 < 60mmHg - Prognóstico: 0-2 critérios (1% letalidade); 3-4 (16%); 5-6 (40%) e > 6 (100%) - Quadros clínicos Intersticial (Edematosa, com quadros mais leves) Necrosante (Necro-hemorrágica e quadros mais graves) Leve (sem falência orgânica e sem complicações locais) Moderadamente grave (Complicações locais ou falência orgânica transitória (<48h) Grave (Falência orgânica persistente >48h - Critério de Balthazar: usado cada vez mais Critério tomográfico de Balthazar Grau A Pâncreas normal 0 ponto Grau B Aumento do pâncreas, sem comprometimento peripancreático 1 ponto Grau C Alterações pancreáticas intrínsecas associadas com aumento da densidade peripancreática difusa 2 pontos EMANUELA HANNOFF PILON – MEDICINA 202 3 Grau D Coleção líquida única mal definida 3 pontos Grau E Duas ou mais coleções líquidas mal definidas ou presença de gás adjacente ao pâncreas 4 pontos - Ainda se associa a pontuação obtida com o grau de necrose pancreática, da seguinte forma: - Sem necrose (0p), até 33% (2p), 33-50% (4p) e acima de 50% (6p) - O escore final qualifica a doença em leve (1-3 pontos), moderada (4-6 pontos) e grave (7-10 pontos). DIAGNÓSTICO - Sugerido nos achados clínicos e confirmado por exames de imagem e laboratoriais ao excluem outras condições intra-abdominais, e sempre que possível, definem a gravidade e causa provável da doença. 1. Amilase e lipase - Tem elevação algumas horas após início dos sintomas, de 3x sendo característico, embora nem sempre esteja aumentado dependendo de quando foi feito o exame. A lipase permanece elevada por mais tempo. - Ambas são eliminadas pelo rim e a insuficiência renal pode elevar falsamente o nível delas na ausência de pancreatite. - Por ser mais específico, mais custo e com sensibilidade semelhante, a dosagem de lipase é preferida como teste diagnóstico único da doença. Isoladamente, as dosagens não são úteis para tomar a decisão clínica. 2. Outros labs - Leucocitose, hemoconcentração. Manutenção de ureia e creatinina e hemoconcentração levam a um pior prognóstico. - Hiperglicemia, hipocalcemia e elevação discreta de triglicerídeos pode estar presente em casos mais graves. - Elevação da ALT > 150 sugere etiologia biliar. - Hipocalcemia - Acidose metabólica - Aumento de LDH - Diminuição de PO2 3. Imagens - USG (mais precisa para ver cálculos biliares ou dilatação do colédoco) e TC (mais específica, avalia presença de necrose pancreática e coleções peripancreática. Ela exclui condições intra-abdominais). - Aumento do volume a glândula, presença de edema e coleções peripancreática, embora a possibilidade de ver os órgãos seja limitada. - A extensão da necrose é observada com mais êxito a partir do 3º dia do início do quadro, não podendo ser evidenciada quando a TC é feita precoce. - A RM é equivalente a TC no diagnóstico da doença e complicações. Colangiopancreatografia por RM mais precisa, embora seja mais difícil realizar. - CRPE e Ultrassom endoscópico são importantes no diagnóstico e tratamento da pancreatite aguda. O primeiro para procedimentos terapêuticos, como retirar cálculos, diagnosticar disfunções. O segundo usadopara identificar doenças malignas ou pré-malignas. 4. Anamnese – identificar etiologia - Investigar sobre consumo de álcool e tabaco, ocorrência de cólica biliar, ingestão de medicamentos, histórico familiar e trauma recorrente. - Num ataque agudo da doença, há vazamento de flui inflamatório para espaços retroperitoneal e peritoneal. A maior parte dele é reabsorvida e o que não é vira um pseudocisto. Isso leva semanas, até ser distinguido das áreas de necrose pancreática. TRATAMENTO EMANUELA HANNOFF PILON – MEDICINA 202 4 - Muitos se recuperam no intervalo de alguns dias, enquanto outros evoluem com forma satisfatória, embora não se saiba qual. Todos os pctes devem ficar em jejum. - Usa-se opióides ou então hidromorfona. - Muitas vezes há perda com diarreia e náuseas e isso requer uma reposição hídrica que deve ser feita nas primeiras 24 de internação, para corrigir a pressão arterial e o pulso, hematócrito e ureias séricas ao nível normal. - Para controlar náusea e vômito – prometazina ou ondansetram. - Numa Pancreatite aguda crônica é aconselhável internação em UTI e realizar uma reposição volêmica vigorosa. - É preciso ter cuidado ao monitorar a insuficiência progressiva e das complicações metabólicas. - Pcte que não consegue se alimentar por 5-7d, iniciar terapia nutricional. - CPRE feito também como medida protetiva para aqueles que possuem pancreatite biliar e evidência de Colangite ou coledocolitíase. - A infecção hospitalar agrava o prognóstico. Seja por infecção do trato urinário, infecção pulmonar, sonda, cateter ou Clostridium difficile. PREVENÇÃO - Abstinência de álcool e tabaco. Colecistectomia evita episódios recorrentes de pancreatite biliar e deve ser realizada poucas semanas após a alta, ou mais cedo se os cálculos biliares forem a causa. - O controle de lipídios séricos evita ataques subsequentes de pancreatite hiperlipidêmica. - Terapias de lesões que obstruem o ducto pancreático também podem prevenir a recidiva. PROGNÓSTICO - Mais de 80% dos pctes com pancreatite leve ou intersticial tem evolução favorável, sem desenvolver a grave. - A mortalidade vai decorrer da falência progressiva dos múltiplos órgãos, da pancreatite aguda em si ou de infecções hospitalares adquiridas. - Em pctes com comorbidades graves ou necrose, a mortalidade pode atingir até 30%. Pancreatite crônica - Indica a presença de fibrose irreversível e permanente, com presença de infiltrado inflamatório mononuclear, lesão nervosa, perda de ácinos, ductos e ilhotas. - Ela evolui após episódios de pancreatite aguda, subclínica ou não, embora possa ser difícil identificar a transição entre as pancreatites. EPIDEMIOLOGIA - Nos países ocidentais, a prevalência dela é de 25-30/100.000hab. - A prevalência de evidência histológica dessa pancreatite é 5%, indicando que muitas pessoas desenvolvem lesões pancreáticas como consequência do envelhecimento, de outras doenças, exposição a toxinas (álcool), mas não tem sintomas ou sinais de pancreatite por tida a vida. FISIOPATOLOGIA - Múltiplos episódios de inflamação aguda alteram a resposta inflamatória do pâncreas, evoluindo para inflamação crônica, ativação das céls estreladas pancreáticas e produção de fibrose. Isso é autossustentável e produz dano histológico. - Mutações genéticas predispõem a doença, associada à exposição a várias toxinas que precipitam a pancreatite aguda, com necrose e apoptose, que progride para cronicidade e fibrose do pâncreas. - Nos países ocidentais, o abuso de álcool e o tabaco são as principais causas. EMANUELA HANNOFF PILON – MEDICINA 202 5 - Há uma lesão dos nervos nociceptivo do pâncreas e a complexa interação autoimune induzida pelo estado inflamatório crônico. Há hiperalgesia vesical, medular e central, podendo continuar mesmo com o tratamento da insuficiência pancreática bem sucedido. - O aumento da pressão no interior da glândula, a isquemia associada, a obstrução do ducto pancreático e a formação de um pseudocisto podem causar dor, assim como a lesão dos nervos. Álcool e tabaco são responsáveis por 70-80% dos casos. É preciso uma ingestão substancial e prolongada de álcool ao longo de mais de 5 anos. Nem todos desenvolvem PC, concluindo que há cofatores, como alterações genéticas e tabagismo. Genética: mutações no gene do tripsinogênio, há um ganho de função onde tripsinogênio é ativado e vira tripsina, que se tiver numa quantidade maior que os mecanismos de proteção, pode ativar outras enzimas e provocar lesões agudas da glândula pancreática e pancreatite crônica. - Pode haver ainda mutações no gene inibidor da tripsina pancreática, embora não são suficientes para causa- la. - Doenças que causam crises repetidas de pancreatite aguda podem levar à pancreatite crônica. Pancreatite autoimune é uma doença que se apresenta como uma lesão pseudotumoral com icterícia obstrutiva, mimetizando o CA. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS - O sintoma mais comum é a dor abdominal, que pode ser episódica ou constante e é sentida no epigástrio, com irradiação para as costas. - Se a dor for episódica, o pcte pode ser considerado portador de pancreatite aguda ou exacerbação aguda da pancreatite crônica. - Na dor severa, pode haver náuseas e vômitos. - A dor pode piorar, melhorar ou ficar estável ao longo do tempo. Pode haver também emagrecimento e desnutrição (dor faz com que pcte não sinta fome) - Até 5% dos pctes não têm dor, tendo insuficiência pancreática exócrina (esteatorréia, perda de peso) ou endócrina (DM). - Tríade clássica da PC é composta de Esteatorréia + DM + Calcificações, mas há em menos de 1/3 dos pctes. - A doença é progressiva e lentamente, mesmo removendo a causa dela. (Ex: álcool) DIAGNÓSTICO - Pode ser suspeitado com base nas características clínicas, mas deve ser confirmado por testes que identificam a lesão estrutural do pâncreas e alterações na função pancreática. - A lesão visível da glândula e a insuficiência funcional podem não ser aparentes por anos. 1. RX abdome simples: demonstra calcificação pancreática difusa ou focal em pctes com quadro avançado. 2. USG abdominal: limitada porque a interposição gasosa limita a capacidade de visualizar o pâncreas. Um ducto pancreático anormal, calcificações pancreáticas, atrofia da glândula em 60% dos pctes. 3. TC: ducto pancreático dilatado, calcificações ductais ou parenquimatosas e atrofia. Pode não ser precisa na fase inicial da doença ou na mais avançada. 4. RM: imagens detalhadas e se adicionar CPRM permite uma melhor avaliação da morfologia do ducto pancreático. 5. CPRE mostra alterações na morfologia do ducto, incluindo dilatação, irregularidade, cálculos e estenoses. Porém, não são específicos para PC. 7. USE 8. Teste de função pancreática - O tripsinogênio sérico (tripsina) é baixo em pctes com grau avançado de pancreatite crônica, mas é normal em pctes com doença menos avançada. Níveis inferiores a 20. EMANUELA HANNOFF PILON – MEDICINA 202 6 - Níveis de glicose podem estar elevados em pctes com insuficiência endócrina. - Teste da Secretina, com uma sonda no duodeno, onde as secreções pancreáticas são coletadas e analisadas as concentrações de bicarbonato. Abordagem diagnóstica - Conforme o passar dos anos, os danos estruturais e funcionais se acumulam de modo que todos os testes de diagnóstico se tornam positivos. Geralmente, o diagnóstico se dá com TC ou RM. - CPRE não deve ser usada apenas como diagnóstico, pois pode haver complicações. TRATAMENTO - Realizar uma investigação das possíveis complicações tratáveis antes de dar início a terapias para dor. - Pctes com ducto pancreático dilatado são candidatos a terapia endoscópica e cirúrgica, que envolvem descompressão desses ductos. - Pctes sem dilatação devem ser mantidos em tratamento clínico. Interromper uso de álcool e tabaco Dieta fracionada e pobre em gorduras para diminuir a dor nestes pacientes. Analgésicos, como o tramadol ou codeína. Narcóticos potentes, como antidepressivo adjuvante (amitriptilina), inibidores serotoninérgicos, gabapentina Omeprazol para melhorar a ação das enzimas Enzimas pancreáticas (lipase) reduzem gordura fecal e perda de peso. Medicações para controle da hiperglicemia conforme necessidade - Neurólise: bloqueio do plexo celíaco guiado por USE, ou neurólise. Medida paliativa para aliviar dor debilitante. - Terapia endoscópica: dilatar e colocar stents através de estenose. Cálculos podem ser removidos, dependendo o tamanho ou uma litotripsia para reduzir cálculos maiores. - Terapia cirúrgica: descompressão do ducto, ressecção do pâncreas ou ambos. PROGNÓSTICO - A morte não decorre da pancreatite em si, mas da malignidade, das complicações pós-operatórias e complicações do uso de álcool ou tabaco. Figura 3 - USG endoscópica em pcte com pancreatite crônica, com um ducto dilatado. Figura 2 - Colangiopancreatografia endoscópica com um ducto irregular com áreas de dilatação e estruturação de pcte com pancreatite crônica. Figura 1 - TC com calcificação pancreática difusa
Compartilhar