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RECURSOS DIDÁTICOS NA EJA: CONCEPÇÕES E USOS LIVRO TEXTO GOVERNADOR DE PERNAMBUCO Paulo Henrique Saraiva Câmara VICE-GOVERNADOR Raul Jean Louis Henry Júnior SECRETÁRIO DE EDUCAÇÃO Frederico da Costa Amancio SECRETÁRIO EXECUTIVO DE PLANEJAMENTO E COORDENAÇÃO Severino José de Andrade Júnior SECRETÁRIA EXECUTIVA DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO Ana Coelho Vieira Selva SECRETÁRIA EXECUTIVA DE EDUCAÇÃO PROFISSIONAL Maria de Araújo Medeiros Souza SECRETÁRIO EXECUTIVO DE ADMINISTRAÇÃO E FINANÇAS Ednaldo Alves de Moura Júnior SECRETÁRIO EXECUTIVO DE GESTÃO DA REDE João Carlos de Cintra Charamba GERENTE DE POLÍTICAS EDUCACIONAIS DE JOVENS, ADULTOS E IDOSOS Claudia Abreu RECURSOS DIDÁTICOS NA EJA: CONCEPÇÕES E USOS LIVRO TEXTO GERENTE DE POLÍTICAS EDUCACIONAIS DE JOVENS, ADULTOS E IDOSOS Claudia Mendes de Abreu CHEFE DA UNIDADE DA EDUCAÇÃO DE JOVENS, ADULTOS E IDOSOS Jandy Feitosa Carlos da Silva EQUIPE TÉCNICO-PEDAGÓGICA UEJAI Claudia Mendes de Abreu Jandy Feitosa Carlos da Silva Ana Lucia Gomes Cavalcante Neto Ângela Cristina Pascaretta Gallo Danielle da Mota Bastos Danubia Charlene da Silva Nascimento Diego Bruno Barbosa Felix Emanuella de Jesus Ferreira da Silva Helder Domingues Mendes da Silva Jaciane Gomes Sousa de Lima Silva Gerência de Políticas Educacionais de Jovens, Adultos e Idosos Katarina Vasconcelos de Melo Márcio Tiago dos Anjos Mariana Silvia Bezerra Raimundo Ferreira de Arruda Rita de Kássia Pontes Silva Roberto de Carvalho Ventura Roseane Pereira da Silva Thiago de Oliveira Reis Marques Freire Valdenice Leitão da Silva Verônica Luzia Gomes de Sousa ORGANIZAÇÃO E SISTEMATIZAÇÃO DO CADERNO Danielle da Mota Bastos Diego Bruno Barbosa Felix Jaciane Gomes Sousa de Lima Silva Rita de Kássia Pontes Silva Roseane Pereira da Silva Thiago de Oliveira Reis Marques Freire SUMÁRIOSUMÁRIO Apresentação 07 Unidade 1 Livros em sala de aula – modo de usar 11 Unidade 2 O lúdico na Educação de Jovens e Adultos Texto complementar – Ludicidade como instrumento pedagógico 17 Unidade 3 Deuses e monstros 27 Unidade 4 Mídia e Educação: o uso das novas tecnologias no espaço escolar 35 Unidade 5 Principais recursos didáticos analisados no ensino de geografia do Brasil 44 “Inteligência não é possuir todas as ferramentas. Inteligência é possuir poucas (para andar leve) e saber onde encontrar as que não se têm, na eventualidade de se precisar delas. Sabedoria não é ter. É saber onde encontrar.” (Rubem Alves) APRESENTAÇÃOAPRESENTAÇÃO O tema desse caderno – como o próprio título sugere – trata de Recursos Didáticos. Sua confecção surge da necessidade de tecer considerações e novas leituras sobre as concepções e os usos desses importantes instrumentos pedagógicos nos proces- sos de ensino e aprendizagem de jovens e adultos, proposta, aliás, sugerida pelos próprios formadores e professores dessa modalidade de ensino. É fruto também do compromisso da Secretaria Executiva de Desenvolvimento da Educação/SEDE, representada pela Gerência de Políticas Educacionais de Jovens, Adultos e Idosos/GEJA, de fortalecer e renovar as práticas de formação continuada em serviço de multiplicadores e professores atuantes na EJA em todo o Estado. Nesse sentido, e na tentativa de contribuir para o trabalho do professor, visto aqui como profissional autônomo e reflexivo, organizamos esta coletânea de textos com o propósito de estabelecer diálogos com os profissionais da EJA e suscitar reflexões – junta- mente com o Livro Guia – sobre questões comuns e atuais do cotidiano da sala de aula, utilizando-se de um aporte teórico e de encaminhamentos didáticos que contribuam para uma prática docente mais crítica, reflexiva e em sintonia com as especificidades da EJA. Em outras palavras, ousamos sugerir textos e atividades didáticas que fossem relevantes para os saberes docentes, especialmente no momento de escolher e propor estratégias com os mais diferentes recursos didáticos. Com isso, é importante melhor definir recurso didático, bem como apresentar a estrutura desse livro. Assim, iniciamos a discussão conceituando recurso didático, como sendo qualquer meio, instrumento ou ferramenta que subsidie o professor em sua prática pedagógica. É, portanto, um elemento pedagógico que está presente no ambiente de aprendizagem, que ajuda a estimular o aprendiz a construir e consolidar saberes e competências e que torna os processos de ensino e aprendizagem mais concretos, mais eficazes e eficientes. Temos os livros, os jogos, as novas TICs (Tecnologias da Informação e da Comunicação), e também outros materiais, como equipamentos de laboratório, vídeos, áudio, recursos da natureza etc., que são necessários como suportes para os proces- sos de ensino e aprendizagem. Os recursos didáticos são grandes instrumentos de apoio aos professores nesses processos, se forem bem escolhidos e usados adequadamente, de acordo com as condições estruturais da escola e as necessi- dades de seus alunos, e ainda relacionados ao plane- jamento do professor, uma vez que sua presença por si não é capaz de transformar significativamente os processos de ensino e aprendizagem. 1 Segundo Cerqueira e Ferreira (2011) , Recursos didáticos são todos os recursos físicos, utilizados com maior ou menor freqüên- cia em todas as disciplinas, áreas de estudo ou atividades, sejam quais forem as técnicas ou métodos empregados, visando auxiliar o educando a realizar sua aprendizagem mais eficientemente, constituindo-se num meio para facilitar, incentivar ou possibilitar o processo ensino-aprendizagem. Deste modo, considerando as definições de recursos didáticos dadas acima, entendemos que muitos instrumentos em um ambiente no qual ocorrem os processos de ensino e aprendizagem, que não foram especificamente criados para funcionarem como 1 CERQUEIRA, Jonir Bechara; FERREIRA, Elise de Melo Borba. Recursos didáticos na educação especial. Revista Benjamin Constant. Edição 05. Vol. 6, nº 15. Rio de Janeiro- Dezembro de 1996. Disponível em: <http// www.inep.gov.br>. Acesso em: 26.04.2011. 07 recursos didáticos, podem ser tomados como tal, dependendo da forma como forem utilizados. Destacamos que os artigos disponibilizados nesta coletânea são explorados – por meio de atividades didáticas – no Livro Guia que juntos compõem os materiais didáticos produzidos para subsidiar o programa de formação continuada de professores atuantes na EJA. Ao selecionarmos estes textos, procuramos ver a relevância dada ao tema tratado e às especificidades da EJA, bem como a maneira como os autores o apresentam, embora tenhamos percebido, em alguns textos, certas fragilidades de ordem textual e normativa. O livro foi dividido em 5 unidades, cada uma represen- tando uma categoria específica de recursos didáticos. Há um capítulo específico para mídias e TICs, pois entendemos que, apesar de comportarem também os recursos audiovisuais, possuem um largo espaço nas práticas didáticas em sala de aula e por isso merecem uma discussão mais aprimorada. No mais, são 5 textos mais 1 complementar, de diferentes autores, que abordam diferentes recursos didáticos. Além disso, é importante não perder de vista o forte diálogo entre Livro Texto e Livro Guia, em que cada capítulo do Livro Texto corresponde a uma unidade do Livro Guia. No texto 1 “Livros em Sala de Aula- Modo de Usar”, a autora Roxane Rojo historia de forma sucinta a escrita e o livro na escola, trazendo as principais categorias do livro escolar, a partir de Chopin(1992), situando e delineando o perfil do livro didático no Brasil e o relaciona com outros impressos e veículos de textos que fazem parte da escola contemporânea. Logo após, a autora discute o livro didático como suporte de textos ou como discurso de autor em gênero didático e aborda três modos mais frequentes na escola de usar o livro: o livrocomo arquivo de textos e propostas; o livro “de fio a pavio” e a escolha consci- ente e criteriosa do livro, de partes e textos de livros e de outros impressos para a composição de um projeto de ensino situado. Rojo conclui o texto chamando a atenção para algo fundamental na formação cidadã que é ser capaz de discriminar e 08 avaliar discursos hegemônicos na globalização, e fazer escolhas éticas entre discursos presentes na sociedade. No texto 2 “O Lúdico na Educação de Jovens e Adultos”, de Eliene de Oliveira, Marcia do Socorro Rodrigues, Rejanete Silva e Souza e André Rodrigues Guimarães, temos a abordagem de um trabalho de investigação sobre as práticas lúdicas desenvolvidas na Escola Estadual Maria de Nazaré Pereira Vasconcelos. Os pesquisadores pretendiam saber se essas práticas com os adultos estão respeitando a realidade deles, pois a Educação de Jovens e Adultos (EJA) é uma modalidade de ensino que tem especifici- dades que precisam ser levadas em conta no cotidia- no escolar. O texto está estruturado em duas partes. Na primeira parte, eles trazem uma abordagem teórica sobre a temática ludicidade na EJA, e levantam questões que envolvem a importância e a necessidade de aulas direcionadas com dinâmicas e jogos que envolvam, divirtam, ensinem e formem novas apren- dizagens. Na segunda parte, eles enfocam o resultado da pesquisa de campo, em que verificaram pontos relevantes quanto à utilização do lúdico na EJA. Por fim, fazem algumas considerações sobre a importân- cia da busca de novas metodologias que atendam e desperte o interesse a motivação dos alunos da EJA. No texto 3 “Deuses e monstros” fragmento da disser- tação de Mestrado de Roseli Pereira Silva, a autora aborda a introdução do cinema como uma das formas culturais mais significativas e traz exemplos de experiências locais que incentivam a utilização do cinema como recurso educativo. Mostra ainda a importância de se reconhecer o trabalho com o audiovisual como uma ferramenta pedagógica, abordando, inclusive, diferentes visões sobre o audiovisual: enquanto alguns o consideram a solução para todos os problemas, outros o encaram como um vilão, que subverte as mentes mais pacíficas. Já os autores do texto 4 “Mídia e Educação: o uso das novas tecnologias no espaço escolar”, Gilza Maria Leite Dorigoni e João Carlos da Silva, trazem uma reflexão sobre o uso das mídias na área educacional. 09 Eles abordam os elementos históricos sobre a mídia ao longo do século XX e falam também da influência do avanço tecnológico na educação. O texto também traz questões sobre a efetivação e aplicação da tecnologia na escola e, por fim, aborda o uso pedagó- gico da internet. O último capítulo “Principais Recursos Didáticos Analisados no Ensino de Geografia do Brasil”, de Inêz de Deus Neiva Brandão e Márcia Cristina de Oliveira Mello, trata de uma investigação sobre as atuais tendências das metodologias de ensino de Geografia difundidas pelos livros paradidáticos brasileiros, tendo os recursos didáticos como ponto principal, considerando as técnicas tradicionais e as introduzi- das pelas novas tecnologias. Eles apresentam um panorama geral da estrutura metodológica difundida por autores brasileiros que apontam novos caminhos e possibilidades de materiais e suas aplicações, buscando facilitar a aprendizagem e o diálogo entre professores e alunos. Os resultados preliminares apontam que, à luz da bibliografia especializada, tais estudos concentram-se mais em explorar as técnicas de aplicação de tal ou qual recurso, ou sua importân- cia na relação ensino-aprendizado, nem sempre apresentando um panorama da utilização real dos mesmos in loco, bem como eles se concentram no tema cartográfico, havendo uma lacuna nos demais temas, principalmente na Geografia Humana. Esta realidade será explicada através do breve histórico do ensino de Geografia no Brasil, e o atual foco na cartografia escolar. Após a leitura desses cinco capítulos, espera- mos que o professor encontre elementos que ampli- em sua compreensão sobre recursos didáticos, bem como suas implicações na prática de quem tem feito uso desses recursos, e que, participando de um processo de formação continuada, reflita sobre sua prática e possa aprimorar seu desempenho profissio- nal, melhorando a qualidade de ensino nas escolas. 10 LIVROS EM SALA DE AULA – MODO DE USAR LIVROS EM SALA DE AULA – MODO DE USAR 2Unidade 12Unidade 1 Este texto historia brevemente a escrita e o livro na escola, distinguindo as principais categorias de livro escolar, a partir de Choppin (1992). Com isso, situa e delineia brevemente o perfil do livro didático hoje no Brasil em suas relações com os outros impressos e veículos de textos que estão presentes na escola contemporânea. A partir daí, discute-se o livro didático como suporte de textos ou como discurso de autor em gênero didático, abordando três modos de usar o livro muito freqüentes em sala de aula: o livro como arquivo de textos e propostas; o livro “de fio a pavio” e a escolha consciente e criteriosa seja do livro, seja de partes e textos de livros e de outros impressos, para compor, de maneira harmônica, um projeto de ensino situado. Sugerem-se dois conjuntos de critérios de escolha e seleção para uso de textos impressos: o das necessidades de ensino e o das possibilidades de aprendizagem. Conclui-se lembran- do uma meta central para a formação cidadã hoje, para a qual concorrem as adequadas seleção e abordagem de textos e impressos, que é a da capaci- dade de discriminar e avaliar discursos hegemônicos na globalização, de maneira a fazer escolhas éticas entre discursos. ESCRITA, LIVRO E ESCOLA – UMA RELAÇÃO MUITO ANTIGA Mesmo antes da revolução de Gutenberg – a invenção da escrita impressa – a escrita sempre foi um dos principais instrumentos de comunicação da escola. A escola sempre foi um espaço de circulação das “letras”, um espaço letrado. Com a reprodutibilidade alcançada pela impressão de livro e de outros suportes, a escola também passa a ser um dos principais espaços de circulação do livro. O livro escolar, entretanto, ao longo da História, passou por diversas mudanças. O pesquisador Alain Choppin (1992), dedicado ao estudo do livro escolar, distingue quatro grandes tipos de livros escolares, organizados de acordo com sua função no processo de ensino-aprendizado: - Os manuais ou livros didáticos, quer dizer, “utilitários da sala de aula” (p. 16), obras produzidas com o objetivo de auxiliar no ensino de uma determinada disciplina, por meio da apresentação de um conjunto extenso de conteúdos do currículo, de acordo com uma progres- são, sob a forma de unidades ou lições, e por meio de uma organização que favorece tanto usos coletivos (em sala de aula), quanto individuais (em casa ou em sala de aula); · Os livros paradidáticos ou para-escolares, obras complementares “que têm por função resumir,in- tensificar ou aprofundar” (p. 17) conteúdos específicos do currículo de uma disciplina, seja por meio de uma utilização individual em casa, seja por meio de uma utilização orientada pelo professor, na escola, como ocorre no Brasil2. Na tradição brasileira, esse tipo de livro escolar abarca, priorita- riamente, obras que aprofundam ou enriquecem um conteúdo específico de uma disciplina (o tema da escravidão ou da vida cotidiana no Brasil Colônia, por exemplo) ou que se voltam para a formação do leitor (como os títulos de literatura infantil, em geral, apresentados nos catálogos de editoras como obras “paradidáticas”); · Os livros de referência, como dicionários, Atlas e gramáticas, destinados a servir de apoio aos aprendizados, ao longo da escolarização; 2 ROJO. Roxane. Livro em Sala de Aula: modo de usar. Materiais didáticos: escolha e uso. Programa Salto para o Futuro. Boletim 14.Agosto de 2005. Disponível em http://www.alemdasletras.org.br/biblioteca/material_formadoras/Salto_para_o_futuro_Praticas_de_leitura_e_escrita.pdf. 11 1Roxane Rojo · As edições escolares de clássicos, que reúnem, de modo integral ou sob a forma de excertos, “as edições de obras clássicas (gregas, latinas, estran- geiras ou em língua materna), abundantemente anotadas ou comentadas para o uso em sala de aula” (p. 16) 3. Nos meus tempos de estudante na Educação Básica, os impressos que havia em sala de aula – não tão abundantes como hoje em dia – eram, principalmen- te, as obras de referência (mapas, Atlas, dicionários e gramáticas – latinos, portugueses, franceses) e uma edição escolar de autores clássicos da literatura brasileira e portuguesa – uma coletânea ou antologi- a4. Na verdade, comprávamos as antologias, dicioná- rios, e mesmo, quando possível, enciclopédias e gramáticas. Atlas e mapas ficavam trancados em grandes gaveteiros das estantes da biblioteca da escola e o professor os requeria quando necessários para sua aula. A biblioteca escolar era grande e bem fornida de obras clássicas e de divulgação, entretanto o acesso do aluno a ela não era livre, nem tampouco freqüente. Os livros estavam nas casas dos alunos. Por esta época, os livros ou manuais didáticos, tais como os conhecemos hoje, e os livros paradidáticos sequer existiam. É somente com a reforma da grade curricular e da educação da década de 70 do século passado que o perfil e a circulação do livro escolar começa a mudar. Segundo Clare (2002, s/p), a situação começa a se transformar ainda na década de 60, quando se firma o processo de democratização de acesso da população à escola, em conseqüência de um novo modelo econômico. Trata-se de novas condições sociopolíticas. Com a ditadura militar, a partir de 1964, passa-se a buscar o desenvolvimento do capitalismo, mediante expansão industrial. A proposta educacional, agora, passa a ser condizente com a expectativa de se atribuir à escola o papel de fornecer recursos humanos que permitam ao Governo realizar a pretendida expansão industrial. Com a ampliação do acesso da população à escola pública, muda o perfil não somente econômico, mas também cultural, tanto do alunado como do professo- rado. Não é mais uma escola pública destinada apenas aos filhos das elites, mas as camadas popula- res passam a ter assento nas salas de aula. O novo perfil cultural do alunado acarreta heterogeneidade nos letramentos, nos falares dos alunos. Os esforços das escolas em adequarem-se à nova realidade têm impactos visíveis na qualidade do ensino e no perfil do livro escolar. Também o perfil sociocultural, econômi- co e profissional dos docentes sofre alteração, com a ampliação das redes. A profissão de professor começa a desprestigiar-se, a perder autonomia, a deslocar-se nos espaços sociais: antes, uma profis- são que conferia status às moças de classe média e alta; agora, a ascensão social para os que pertencem à classe mais pobre da sociedade (Clare, 2002, s/p). É por esta época que começa a surgir o livro didático e, depois, os paradidáticos, tais quais os conhecemos hoje. De certa maneira, esses manuais didáticos trazem para si uma soma do que antes era a aula do professor e a consulta do aluno a obras de referência e a antologias. Na disciplina de Língua Portuguesa, esse fenômeno é bastante visível – as instruções do livro se combinam (ou entram em conflito) com as do professor na aula e os antigos dicionários, a gramáti- ca e a antologia encontram-se hoje espalhados pelas páginas dos volumes do livro didático. Com a mudança de perfil do alunado, sobretudo no que diz respeito ao perfil socioeconômico, o livro deixa de estar na casa do aluno e passa a se sediar na escola. Por outro lado, os Programas nacionais de distribuição do livro incrementam seu alcance, de maneira a poder prover, progressivamente, um número cada vez maior de escolas e de estudantes com os acervos necessários. Hoje, podemos dizer, ao contrário, que os tipos de livro escolar mais presentes em sala de aula são os manuais didáticos e os livros paradidáticos, além de, mais recentemente, por meio da distribuição do PNLD, os dicionários5. Atualmente, esses livros não são os únicos impressos que circulam nas escolas. Revistas (de divulgação científica e outras) e grandes empresas jornalísticas 12 colocam à disposição das escolas doações de assina- turas permanentes de periódicos jornalísticos (revistas, jornais de grande circulação). Finalmente, a revolução eletrônica – com a multiplica- ção dos meios de comunicação de massa, como a televisão e o vídeo – e a revolução digital, trazendo a crescente importância dos computadores e da Rede Internet para a circulação e distribuição da informa- ção, também ampliaram os veículos de circulação da escrita para muito além dos limites dos livros.Hoje, as escolas mais equipadas contam com TV, vídeo e computadores – em algumas delas, conectados – que permitem novos acessos à informação escrita ou oralizada, a partir de novos veículos. Todas essas mudanças acarretam impactos importantes para a escolha e uso de materiais didáticos e paradidáticos e veículos de informação na escola contemporânea. LIVROS DIDÁTICOS CONTEMPORÂNEOS – UM BREVÍSSIMO PERFIL Como vimos em outros Programas desta série, a capacidade governamental de avaliação, compra e distribuição do livro escolar no Brasil de hoje ampli- ou-se muito. Além de avaliar e comprar e, ainda, distribuir livros didáticos das principais disciplinas acadêmicas (infelizmente, exceto Língua Estrangeira) ao conjunto dos alunos da rede pública de Ensino Fundamental brasileira, por meio do PNLD – o que, por si só, já atinge números astronômicos6, dada a proporção continental do país e a universalização recente das matrículas –, atualmente o Governo Federal ainda investe, no mesmo PNLD, na compra e distribuição de dicionários; por meio do PNBE, na renovação e ampliação de acervos das bibliotecas escolares e, ainda, inicia a extensão do direito ao livro escolar, por meio do PNLEM, ao Ensino Médio, por enquanto nas disciplinas de Língua Portuguesa e Matemática. Para 2006, o PNLEM atenderá a todo o país. Uma das iniciativas importantes nesses Programas governamentais foi a instituição da avaliação dos livros que serão comprados, em todas as áreas do conhecimento. As pesquisas das décadas de 70 e 80 do século passado, a respeito do livro escolar, cons- tantemente denunciavam a baixa qualidade e a condução ideológica destes materiais. Instituída a avaliação, a qualidade desses materiais melhorou enormemente e o cuidado com os projetos gráfico- editoriais intensificou-se, tendo impacto no tratamen- to dos textos e das imagens veiculadas nos livros. São muitos os manuais didáticos, dicionários, obras de referência e livros paradidáticos propostos hoje para a escolha dos professores e todos eles apresen- tam níveis de qualidade necessários ao bom desen- volvimento dos projetos de ensino-aprendizagem em que o professor está envolvido. Mas isso coloca uma questão relevante para os professores: Como escolher e utilizar em sala de aula livros e impressos que não entrem em conflito ou contradi- gam os projetos de ensino-aprendizagem dos profes- sores? Que sejam adequados às necessidades e possibilidades do alunado e da comunidade escolar? LIVROS E OUTROS IMPRESSOS EM SALA DE AULA – TRÊS MODOS DE USAR Discute-se hoje, na análise do livro didático, se este é um suporte de textos ou um gênero de discurso. Já explico: a visão do livro didático como um suporte ou veículo de textos variados (Marcuschi, 2004; Soares, 1999), encara o LD como um livro (suporte) – uma brochura de papel em certo formato, com certo tipo de cobertura, com resmas costuradas e coladas na lombada – que reúne em si umacerta distribuição de textos e imagens de diversos tipos – textos expositi- vos e instruções do autor do livro; outros documentos (históricos, por exemplo); imagens, como reprodu- ções de fotografias, de pinturas, mapas, gráficos, infográficos; textos de campos variados, como o literário, o publicitário, o jornalístico, o da divulgação científica etc. Quase algo como uma coletânea variada ou um arquivo. Quem vê o livro como um gênero discursivo (Bunzen, 13 2005; Bunzen & Rojo, no prelo) admite a presença deste conjunto de textos “migrados”7 de outros campos da vida social, mas encara o livro como um discurso do autor, a partir de um projeto didático autoral, dirigido a certos professores e a certo aluna- do, a certo tipo de projeto de ensino-aprendizagem e não a outro, e que implica uma posição do autor sobre o que ensinar, como ensinar, a quem ensinar, para que e quando etc. Este projeto autoral é, inclusive, respon- sável pela seleção deste ou daquele “conjunto de textos migrados” de outros campos da vida social. Esta questão, embora pareça coisa apenas de pesqui- sadores, tem impacto na escolha e, sobretudo, no uso do livro em sala de aula. Se eu encaro o livro como um acervo de textos, ou um arquivo de textos, como faz crer a definição do livro como suporte, posso retirar deste e de outro arquivo qualquer, como quiser e de acordo apenas com meu projeto de ensino – se houver – os textos/imagens necessários para dar suporte a meu projeto de ensino naquele momento. Não preciso me preocupar com a compatibilidade destes arquivos com meu projeto de ensino. Preciso apenas ter condições logísticas de reprodução destes textos/imagens – retroprojetor, xerox – ou que o aluno tenha o livro em mãos, para poder dar minhas aulas. O uso do livro escolar por parte do professor como arquivo é o que acontece com freqüência nas escolas, quando os alunos não dispõem cada um do livro para uso próprio, como foi o caso do Ensino Médio até agora. Uma das decorrências deste tipo de uso do livro é o alto índice de cópia de questões ou instruções da lousa nessas aulas, tomando parte preciosa do escasso tempo escolar. Nada em contrário à autonomia e à supremacia do projeto de ensino situado no contexto e na comunida- de escolar de cada professor. Ao contrário8. Mas quando e se este projeto de ensino existe. Muitas vezes o que se dá é uma prática didática cristalizada na tradição e na vivência de um dado professor, descon- textualizada da realidade da comunidade escolar, que, ao tratar o livro como arquivo, ignora também o projeto didático autoral. Como bem definia Choppin (1992, p. 16), no início deste texto, os manuais ou livros didáticos são “utilitários da sala de aula”, ou seja, obras produzidas com o objetivo de auxiliar no ensino de uma determi- nada disciplina, que favorecem tanto usos coletivos (em sala de aula), quanto individuais (em casa ou em sala de aula). Este é um segundo problema: se o professor trata o livro didático como um arquivo, retirando textos e partes que lhe interessam de obras variadas e igno- rando o projeto autoral, mas solicita dos alunos que estudem, em sala de aula, em casa, para aulas ou provas, usando o livro adotado, podem ocorrer projetos de ensino em conflito (por exemplo, diferen- tes visões de como se fazer História), que induzirão o aluno a erro, do ponto de vista da proposta escolhida pelo professor. Tratar o livro didático como um discurso do autor (num gênero didático) é, ao contrário, tanto na escolha do livro como no uso, levar em conta o projeto do autor, no que diz respeito à seleção dos conteúdos, assim como no que tange à metodologia de ensino adotada. Em seguida, comparar seu próprio projeto de ensino situado com o projeto do autor, para ver se são compatíveis. E aí, são necessários critérios, tanto para adotar um livro para os próximos 3 anos naquela comunidade escolar como para selecionar textos e atividades no livro e em outros impressos e veículos variados (paradidáticos, obras de referência, coletâneas, jornais, revistas, vídeos, Internet etc). Quais seriam esses critérios? Gostaria de propor aos professores duas ordens de critérios: as necessidades de ensino e as possibilida- des de aprendizagem. Na ordem das necessidades de ensino, encontra-se, principalmente, o projeto de ensino situado do professor (ou, preferencialmente, do grupo de professores) para aquela comunidade escolar: Para este alunado, o que se deve ensinar, para atingir metas determinadas? Para esta comunidade escolar – que incorpora, por exemplo, alunado de favelas em São Paulo ou Rio de Janeiro ou que está situada em zona rural do Centro-Oeste –, quais metas 14 de ensino foram eleitas? E, a partir delas, quais conteúdos são importantes para atingir essas metas? Que tipos e níveis de letramento são necessários para que esta comunidade alcance para a vida cidadã nesta comunidade? Que textos devem, então, ser seleciona- dos e trazidos para os alunos? Esta obra contempla esses conteúdos e textos? Como complementá-la, a partir de outros impressos? Na ótica das possibilidades de aprendizagem do alunado, algumas questões já mencionadas são também importantes: Que conhecimentos, valores, atitudes e tipos e níveis de letramento estes alunos já trazem? Quais são importantes no projeto de ensino do professor? O que será preciso ensinar e aprender nesta coletividade? Como se organizam o tempo e o espaço escolar de que se dispõe (número e tempo de aulas, número e tipo de alunos por sala, disposição da sala, existência de biblioteca, laboratório, salas ambientes etc.)? Com que recursos tecnológicos é possível contar (retroprojetor, xerox, vídeo, computa- dor, Internet etc.)? É possível contar com professores de outras disciplinas para atingir estas metas? Que obra/trechos de obras interessantes podem ser selecionadas para atingir estas metas, em face destas restrições? Como é possível complementar esta obra a partir de outros impressos e recursos9? Para finalizar, provisoriamente, esta discussão, quero lembrar de uma meta geral na formação cidadã do alunado no Brasil de hoje – que envolve, de maneira crucial, os textos, impressos e livros que circulam em sala de aula e, correspondentemente, os tipos e níveis de letramento que buscamos que nossos alunos construam –, que é o fato de que, no mundo altamente semiotizado da globalização, saber situar os discur- sos a que somos expostos e recuperar sua situaciona- lidade social (quem escreveu, com que propósito e ideologia, onde foi publicado, quando, quem era o interlocutor projetado etc.) – é importantíssimo para fornecer artifícios para os alunos aprenderem, na prática escolar, a fazer escolhas éticas entre os discursos que circulam à sua volta. Isso possibilita aprender a problematizar o discurso hegemônico da globalização e os significados antiéticos que, nele, desrespeitem a diferença, o pluralismo e a democracia. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BATISTA, A. A. G. (2003). A avaliação dos livros didáticos: Para entender o Programa Nacional do Livro Didático (PNLD). In: R. H. R. Rojo & A. A. G. Batista (orgs.) O Livro Didático de Língua Portuguesa no Ensino Funda- mental: Letramento escolar e cultura da escrita, pp. 25-67. Campinas: Mercado de Letras. BUNZEN, C. S. (2005). Livro didático de Língua Portuguesa: um gênero do discurso. Dissertação de Mestrado. Campinas, SP: Universidade Estadual de Campinas. BUNZEN, C. S. & R. H. R. Rojo (no prelo). Livro didático de Língua Portuguesa como gênero do discurso: autoria e estilo. In: E. Marcuschi & M. G. Costa Val (orgs.) O livro didático de Língua Portuguesa – Letramento, inclusão e cidadania. A sair por: Belo Horizonte: Autêntica/CEALE. CHOPPIN, A. (1992). Les manuels scolaires: historie et actualité. Paris : Hachette Éducation. CLARE, N. A.V. (2002). 50 anos de ensino de Língua Portuguesa (1950-2000). Anais do VI Congresso Nacional de Lingüística e Filologia, Cadernos do CNLF, Série VI: Leitura e Ensino de Línguas, s/p. http://www.filologia.org.br/vicnlf/anais/ caderno06- 05.html, acessado 12/01/2005. MARCUSCHI, L. A. (2004). Gêneros e suporte: a identida- de de gênero no livro didático. Apresentação no II Simpósio de Estudo dos Gêneros Textuais (SIGET). União da Vitória, Paraná. RAZZINI, M. P. G. (2000). O Espelho da Nação: A Antologia Nacional e o ensino de Português e de Literatura (1838-1971). Tese de Doutorado. Campinas: IEL/UNICAMP. RIBEIRO, V. M. (org.) (2003) Letramento no Brasil – Reflexões a partir do INAF 2001. São Paulo: Global. SOARES, M. B. (1999). A escolarização da literatura infantil e juvenil. In: A. Evangelista et al. (orgs.). A escolari- zação da leitura literária. Belo Horizonte: Autêntica. 15 NOTAS 1. Prof.ª Dr.ª do Departamento de Lingüística Aplicada do Instituto de Estudos de Linguagem IEL/UNICAMP. Consultora dessa série. 2. O programa de aquisição e distribuição de livros para o Ensino Fundamental do estado de São Paulo, por exemplo, como vimos, possibilita ao professor a escolha de livros didáticos e de paradidáticos e obras de referência. Na maior parte das vezes, porém, a utilização de paradidáticos é feita para complementar o trabalho pedagógico apoiado pelo livro didático. 3. Definições retiradas de Batista (2003). 4. “A permanência da Antologia Nacional no currículo de Português nas séries iniciais do curso secundá- rio, até a década de 1940, reforça a longevidade deste modelo clássico e beletrista de ensino da língua nacional, em que autores e textos eram considerados sobretudo 'paladinos da lingua- gem'.[…] Desta maneira, nos primeiros cinqüenta anos de sua existência, a Antologia Nacional não só influenciou o 'bem falar' e o 'bem escrever' de muitas gerações de brasileiros, como também lhes forneceu a formação literária nacional” (Razzini, 2000, p. 243). 5. Pesquisas recentes, como as do INAF - ver Ribeiro (org.), 2003 - mostram que os livros distribuídos diretamente aos alunos e os consumíveis – livros de alfabetização ou cartilhas e dicionários – são dos mais presentes nas casas dos brasileiros (junta- mente com livros religiosos), mesmo dos brasilei- ros analfabetos. 6. “Entre 1994 e 2004, o PNLD adquiriu, para utiliza- ção nos anos letivos de 1995 a 2005, um total de 1,026 bilhão de unidades de livros, distribuídos para uma média anual de 30,8 milhões de alunos, matriculados em cerca de 172,8 mil escolas. Nesse período, o PNLD investiu R$ 3,7 bilhões. Pelo PNLD 2006 Dicionários serão atendidas mais de 478 mil salas de aula de quase 139 mil escolas públicas de 1ª a 4ª séries do Ensino Fundamental, beneficiando mais de 16,9 milhões de alunos. Para isso, o FNDE vai adquirir cerca de 490 mil acervos, cada um com 10 dicionários, que serão utilizados coletivamente pelos alunos em sala de aula.” (Retirado do site do FNDE, http://www.fnde.gov.br/ home/index. jsp?arquivo=/livro_didatico/livro_didatico.html#d dosesta, em 30/05/2005) 7. Marcuschi, 2004. 8. A pior forma de uso do livro é aquela em que o profes- sor perde autonomia e abandona seu próprio projeto de ensino em favor daquele livro, executando com seus alunos as instruções do autor, de “fio a pavio”. 9. Neste ponto, uma das questões importantes hoje é a inclusão nas salas de alunos portadores de necessidades especiais, particularmente os cegos, cujo atendimento com obras e textos traduzidos em Braille é hoje, sabemos, ainda altamente insuficien- te. Este é um problema, a meu ver, insolúvel por meio da tradução de cada livro ou impresso em Braille. Quero apostar, num futuro breve, nas soluções computacionais para a questão das necessidades especiais: presença de computado- res dotados de acesso universal nas salas; ensino paralelo dos alunos para uso das máquinas; tradutores automáticos de texto ao Braille por meio de softwares; livros e textos digitais. 16 17 O LUDICO NA EDUCAÇÃO DE 3JOVENS E ADULTOS O LUDICO NA EDUCAÇÃO DE 3 JOVENS E ADULTOS Unidade 2Unidade 2 1 2 3 4Eliene de Oliveira | Marcia do Socorro Rodrigues | Rejanete Silva e Souza | André Rodrigues Guimarães INTRODUÇÃO O objetivo deste trabalho é investigar se as práticas lúdicas desenvolvidas na Escola Estadual Maria de Nazaré Pereira Vasconcelos com os adultos estão respeitando a realidade desses alunos, visto que a Educação de Jovens e Adultos (EJA) é uma modalida- de de ensino com especificidades que precisam ser consideradas no cotidiano escolar. Um outro fator inquietante que motivou a pesquisa foi averiguar se o lúdico auxilia na construção de repre- sentações e significados por parte dos discentes. Assim, buscamos compreender como a realidade colocada através das brincadeiras e jogos é percebida pelos jovens e adultos, fazendo a interação entre sua real situação e os conhecimentos sistematizados que são trabalhados na escola. Neste processo, almejando um ensino-aprendizagem emancipatório, superador da educação tradicional, é que vislumbramos que as vivências lúdicas estejam efetivamente presentes na sala de aula, contribuindo para a compreensão e enriquecimento da realidade de vida dos alunos jovens e adultos. Para desenvolver a temática, o trabalho está estrutu- rado em duas partes. Inicialmente fazemos uma breve abordagem teórica referente à temática ludicidade na EJA, abordando principalmente questões que envol- vem a importância e a necessidade de aulas direciona- das com dinâmicas e jogos que possam envolver, divertir e, ao mesmo tempo, ensinar e formar novas aprendizagens. Em seguida enfoca-se o resultado da pesquisa de campo, na qual verificamos pontos relevantes quanto à utilização do lúdico na EJA. A análise exposta nesta comunicação foi feita numa perspectiva qualitativa, para melhor percebermos a realidade específica da escola pesquisada, sem intenção de generalizar os resultados. Ao final fazemos nossas considerações enfatizando que é significativo aos docentes o envolvimento em busca de novas metodologias que atendam e desperte o interesse a motivação dos educandos. A LUDICIDADE E SUAS CONTRIBUIÇÕES NA FOR- MAÇÃO DO ALUNO DA EJA Ao longo da história da educação brasileira pouco se fez em prol de um ensino de qualidade para os jovens e adultos. É somente a partir de 1940 que no Brasil começa-se a pensar em uma educação voltada a estas camadas populares, as quais tomaram maior eviden- cia a partir de 1960. Neste cenário Freire propunha uma concepção de educação libertadora, a qual almeja, a partir das experiências vividas cotidianamente pelo aluno, a constituição de um processo emancipador na qual a leitura está intimamente vinculada à transformação social com a superação da opressão. Neste sentido, ressalta-se a necessidade de respeitar os saberes dos educandos, suas realidades, pois impor “a eles a nossa compreensão em nome da sua libertação é aceitar soluções autoritárias como caminhos para liberdade” (FREIRE, 2003, p. 27). As propostas de Freire visam uma educação popular, conscientizadora, na qual a leitura de mundo precede a leitura da palavra. Entretanto, contrariamente à esta perspectiva, em 1967 foi lançado o MOBRAL (Movi- mento Brasileiro de Alfabetização), que se expandiu para todo país. Este programa levava o educando a apenas decifrar letras e, muito precariamente, a leitura e a escrita. De um modo geral, mesmo após a 3 OLIVEIRA, Eliene; RODRIGUES, Marcia do Socorro; SOUZA, Rejanete Silva; GUIMARÃES, André Rodrigues. O Lúdico na Educação de Jovens e Adultos. Disponível em: http://alb.com.br/arquivomorto/edicoes_anteriores/anais16/sem01pdf/sm01ss04_08.pdf. 18 extinção do Mobral e com os sucessivos programas governamentais para atender a EJA, percebemos queainda são fortes as influências de perspectivas limitadas de educação nesta modalidade de ensino. Deste modo, para reverter este quadro, seria preciso envolver os alunos em um processo de ensino norteado por práticas que possibilite a inclusão educacional e social. Para tal, os trabalhos educativos com jovens e adultos devem estar alicerçados com práticas que desenvolvam a permanência do educan- do na escola, permitindo o seu desenvolvimento em múltiplas dimensões e fazendo com o mesmo se prepare para novos desafios que surgem. Assim sendo, o lúdico passa a constituir-se em uma possibilidade de um novo olhar para os jovens e adultos, na qual esses alunos que não tiveram oportuni- dades educacionais na idade própria e retornaram à escola na tentativa de superar o tempo perdido, possam encontrar na escola um ambiente prazeroso, descon- traído e de satisfação pessoal. É neste contexto que a escola de jovens e adultos pode tornar-se para os educandos um espaço privilegiado de formação com metodologias divertidas e dinamizadas, desfrutando de momentos prazerosos ao mesmo tempo construindo um conhecimento escolar agradável. A ludicidade é uma necessidade do ser humano em qualquer idade e não pode ser vista apenas como diversão. O desenvolvimento do aspecto lúdico facilita a aprendizagem, o desenvolvi- mento pessoal, social e cultural, colabora para uma boa saúde mental, prepara para um estado interior fértil, facilita os processos de socializa- ção comunicação, expressão e construção do conhecimento (SANTOS, 1997, p 12). Numa concepção lúdica, a linguagem oral e escrita deve ser considerada como forma de interação para externar pensamentos ou para apropriação de conhecimentos. Desse modo, poderemos através de jogos, brincadeiras, montagens e produções dos alunos criar um ambiente alfabetizador significativo e concreto. Além disso, a descrição de objetos práticos pode ajudar o aluno no desenvolvimento de variadas dimensões (ética, estética, artística, afetiva etc.). Neste processo é importante lembrar que a leitura crítica da realidade proporciona um novo fazer pedagógico reconhecendo que a alfabetização está associada, sobretudo as mudanças que queremos implementar na sociedade. Ou seja, concebemos que a educação deve ser “vista como um dos meios capazes de proporcionar à classe trabalhadora um saber que seja instrumento de luta, a fim de que possa de forma consciente, renascer enquanto homens e com eles uma nova escola”. (VALE, 2001, p. 46). Ressalta-se, que é preciso respeitar os níveis de compreensão dos alunos da EJA valorizando a sua realidade para que se efetive o processo de ensino aprendizagem. Isto deve ser feito sem imposição, pois ninguém sabe tudo, cada um tem intrínseco o seu conhecimento pautado em suas convicções e experiências vividas. Assim sendo, o trabalho com a ludicidade, para além da recreação, deve envolver a sensibilidade e a descoberta de um novo sentido para a leitura e a escrita, vislumbrando o desenvolvimento pleno da capacidade do sujeito. Se observarmos atentamente a dinâmica de alfabeti- zação evidenciada por Freire (BRANDÃO, 1981) perceberemos o trabalho com gravuras, desenhos, imagens que estão sempre em contato com as formas lúdicas. Através das fichas com gravuras, os alunos irão tendo noção das palavras que fazem parte do seu vocabulário. Esta tomada de consciência possibilita aos docentes e discentes a criação de novas estratégi- as de ensino presentes na cotidianidade do fazer pedagógico. Desta forma é importante redimensionar através das atividades lúdicas os conteúdos a serem trabalhados na EJA, modificando atitudes e comportamentos facilitando a aprendizagem, e tornando-a significati- va. Paralelamente a essa utilização existem duas questões preponderantes. Primeiramente a utilização de atividades lúdicas com novas metodologias de ensino com perspectiva de um novo olhar para o currículo da EJA. Isso será necessário para efetivar a construção do conhecimento junto à vivência e a 19 capacidade criadora dos alunos. Em segundo lugar deve-se verificar que a educação de hoje precisa acompanhar as inovações e aproveitar a ludicidade em benefício de todos, garantindo a integração na sociedade como agentes mais críticos e criativos, só assim o aluno terá mais facilidade de expressar sua afetividade, emoções e até mesmo integrar-se ao grupo de forma consciente e crítica. Nesta perspectiva, é preciso romper com o ensino tradicional que discrimina, exclui e trata com inferiori- dade e incapacidade os jovens e adultos, que também fazem parte da nossa sociedade precisando apenas ser reconhecidos e valorizados como indivíduos com cultura e personalidade própria. Entretanto, ao pensar sobre a utilização do lúdico na EJA é preciso conside- rar que esta modalidade possui suas especificidades as quais devem ser respeitadas. Não podemos mais ver a EJA como uma extensão do ensino regular ou com atividades meramente recreativas que não são usadas para implementar novas práticas e sobretudo criar um ambiente de integração entre professores e aluno. O lúdico não pode nem deve ser usado simplesmente para passar o tempo, como se não tivesse nenhum valor pedagógico. Ao contrário essas atividades devem envolver os alunos para o trabalho coletivo, é através das atividades lúdicas como jogo e brincadei- ras que o adulto poderá indagar transformar e expres- sar suas vontades Neste sentido, Haidt (2003, p. 176) enfatiza que além dessas questões “o jogo tem um valor formativo porque contribui para a formação de atitudes sociais: respeito mutuo, solidariedade, cooperação, obediên- cia à regras, senso de responsabilidade iniciativa, pessoal e grupal”. Uma outra questão a considerar é a concepção de formação humana contínua, segundo a qual todos, educadores e educandos, são eternos aprendizes, trocando e inovando suas experiências e aumentando a perspectiva de permanência desses alunos na escola. Assim a escola deve constituir se em um espaço de troca de experiências, onde a ludicidade auxiliam o professor na sua prática. A LUDICIDADE NA EJA: CAMINHOS PARA FORMA- ÇÃO DA CIDADANIA NA ESCOLA Para verificar como vem sendo utilizado o lúdico na Educação de Jovens e Adultos (EJA) na Escola Maria de Nazaré Pereira Vasconcelos, realizamos no mês de outubro de 2006, uma pesquisa com abordagem qualitativa. Para tanto, foram realizadas entrevistas estruturadas com duas docentes e aplicados questio- nários fechados com vinte discentes. Especificamente os questionários nos auxiliaram a perceber quais as perspectivas que os educandos têm a respeito da utilização do lúdico na sua formação escolar. a) A necessidade do lúdico como apoio para as novas práticas pedagógicas A utilização de jogos na educação de jovens e adultos estimula os alunos para uma participação ativa na prática escolar, envolvendo-os em trabalhos bem elaborados e tornando-os independentes para perceberem seus potenciais, enquanto agentes participativos. Assim, quanto mais vivências lúdicas tiverem esses alunos maiores serão as suas participa- ções em sala de aula, favorecendo até mesmo ao professor para que tenha um envolvimento maior com seus alunos com momentos prazerosos e descontraídos. Isto é significativo, pois a aprendizagem só ocorre quando o aluno participa ativamente do processo de construção e reconstrução do conhecimento. Nesta construção os procedimentos didáticos devem ajudar o aluno a incorporar novas formas de aprender e desenvolver-se. Tanto os professores quanto os alunos investigados, de um modo geral, compreendem que o lúdico torna as atividades escolares mais atrativas e descontraí- das. Constatou-se também que as professoras reconhecem a possibilidade de estabelecer, com 20 utilização dos jogos, uma ligaçãoentre o que o aluno já sabe e aquilo que ele ainda precisa alcançar. Conforme demonstra Freire (1996) a tarefa do educador é desafiar o educando a pensar criticamente a partir de seu mundo imediato e não lhe impor um mundo alheio. Neste contexto, as professoras ao elaborarem atividades lúdicas se mostraram comprometidos com a realidade dos alunos, estimulando e trabalhando esses com novos procedimentos didáticos. Para elas, através do jogo a aprendizagem acontece de forma natural, com envolvimento e a participação ativa dos alunos, tornando a sala de aula um lugar onde se constrói conhecimento e não apenas se transfere informações. Através do jogo há um maior interesse do aluno em brincar e aprender mais rápido estimula a memória, eles acham interessantes. E também você tem a oportunidade de conhecer melhor os alunos interagir com eles, proporcionando a eles atitudes e valores ético através dos jogos essas atitudes são desenvolvidas sem obriga- ção de forma consciente, coletiva, com justiça e igualdade, sem discriminação (Professora A). Mesmo com todos os entraves e dificuldades encon- tradas para efetivação e implementação de novas práticas, fica evidente que as professoras dentro das suas limitações estão procurando implementar suas aulas com atividades prazerosas. Porém, apesar de todos os benefícios que a ludicidade trás para sala de aula, percebemos que as professoras ainda utilizam os jogos esporadicamente, em atividades eventuais, trabalhando geralmente jogos matemáticos, de montagem de letras, algumas construções e outros. Além destas questões já expostas, outro aspecto significativo mencionado pelas professoras refere-se à melhoria do relacionamento e da amizade que envolve a presença do lúdico no contexto escolar. O valor da ludicidade é visível quando possibilita o relacionamento entre aluno e professores, que acabam criando um elo de respeito e companheirismo. Por outro lado, os alunos reconhecem que a ludicida- de torna-os mais receptivos aos assuntos trabalha- dos. Isto demonstra que os jovens da EJA percebem o valor dos jogos e brincadeiras na sala de aula como um recurso pedagógico que os favorece em suas aprendizagens. Os alunos afirmam que os jogos fazem com que eles aprendam coisas novas, ativam a sua mente e estimulam o aprendizado, porque os deixam mais extrovertidos e relaxados. Os educandos acrescentam que gostam de tudo que envolve a ludicidade, tanto os jogos como as brinca- deiras, dramatizações, músicas e as dinâmicas que ajudam a resolver problemas e construírem novas concepções e também de jogos da memória, quebra- cabeça, montagem, dominó, baralho e gincanas educativas. Isso é fundamental, pois demonstra que os educadores aos poucos estão internalizando e incorporando a necessidade de novas concepções de educação voltadas para adequação de um ensino significativo. b) Contribuições da formação lúdica do professor para trabalhar na EJA A formação continuada do educador da EJA também contribui para sua melhor atuação em sala de aula, pois possibilita um repensar de suas ações, para que através da troca de experiência com outros educado- res ele seja capaz de melhorar a sua prática, afastan- do-se um pouco da rotina massacrante das aulas tradicionais e incorporando por meio da ludicidade a satisfação de compartilhar com o outro o saber. Entendemos que o educador é um mediador, um organizador do tempo, do espaço, das atividades [...] na construção do conhecimento. È ele quem cria e recria sua proposta pedagógi- ca e para que ela seja concreta, critica dialética, este educador deve ter competência técnica para fazê-la (SANTOS, 1997, p. 61). Compreendendo esta questão, a formação continua- da foi apontada pelas docentes como uma das condições básicas para termos um ensino diferencia- do em nossas escolas. As práticas lúdicas ajudam os 12 É importante que o multiplicador verifique previamente a confecção e a viabilidade da execução desses jogos. O link para baixar o aplicativo é http://www.baixaki.com.br/download/lincity-ng.htm#ixzz2wyrAW9iZ 21 educadores na formação do educando, valorizando o homem em sua condição de pessoa humana que necessita também do lazer que muitas vezes é negado pela falta de tempo e de oportunidade. Por outro lado sabemos que só a formação do educa- dor não é o bastante para termos um ensino público de qualidade, é preciso assimilação desta prática por todos que fazem parte da escola. A formação do educador também depende do seu esforço próprio, não podendo contentar-se apenas com a sua forma- ção inicial. É preciso reconhecer-se com ser inacaba- do, que sempre esta aprendendo. Estas considerações evidenciam a necessidade de uma política permanente e específica para a EJA, que entre outras questões considere a formação inicial e continuada dos profissionais da educação. CONSIDERAÇÕES FINAIS A especificidade da EJA exige que busquemos analisar e propor práticas educativas condizentes com a realidade socialmente excludente em que vivemos. Repensar a educação de adultos apresenta- se como um desafio para aqueles que se propõe na construção de uma educação emancipadora, que considere o ser humano em todas as suas dimensões. Neste processo, as atividades lúdicas representam um caminho para implementarmos uma pedagogia mais humana, fraterna e libertadora. Na pesquisa que realizamos pudemos constatar que os educadores investigados dizem utilizar a ludicida- de em sua prática pedagógica, reconhecendo a sua importância no seu fazer pedagógico para implemen- tação da aprendizagem dos alunos. Entretanto, verificamos que essas atividades ainda acontecem de forma esporádica que muitas vezes não chegam a motivar todos os educandos precisando ser mais bem planejada e adequada à realidade de todos e com maior freqüência. E neste processo, o professor precisa assumir a crença no poder de transformação que o lúdico pode trazer para a educação e o brincar deve ser visto como um potencializador do desempenho do educador que sabe e gosta de brincar, que eleva e respeita o potenci- al de cada indivíduo. Para tanto é preciso repensar nossas práticas, adequando as ações pedagógicas para promover o exercício da cidadania e também perceber que a sala de aula constitui-se em um espaço com diferentes vivências que podem ser aproveitadas para estimular os alunos facilitando e dinamizando as aulas. O desafio então é usar esses recursos didáticos com responsabilidade e maturidade saindo do discurso para efetivação do processo de mudança do ato de aprender e ensinar voltados para as necessidades dos alunos da EJA. Isso pode dar-se a partir da mudança de postura de alguns professores que ainda insistem nas aulas conteudistas sem motivação, sendo isso um desafio que a escola precisa superar. Outro aspecto a ser acrescentado é que com as atividades lúdicas o professor promove a auto-estima e favorece o desenvolvimento da linguagem, pois alguns alunos têm dificuldades de comunicar-se e através dos jogos e brincadeiras as idéias fluem com naturalidade. Assim, é possível compreender o outro, amar e sentir-se aceito pelos colegas respeitando e compartilhando seus anseios, suas dúvidas e dese- jos. Para Freire, “a alegria necessária à atividade educativa é a esperança. A esperança de que profes- sor e alunos juntos podem aprender ensinar, inquie- tar-nos, produzir e juntos igualmente resistir aos obstáculos” (1996, p. 80). De um modo geral, os alunos têm boa receptividade às atividades lúdicas utilizadas no processo de ensino aprendizagem, porém alguns apresentam críticas a certas atividades que “são infantis”. Assim, o desafio não estar somente na introdução do lúdico na EJA, mas acima de tudo, compreender as especificidades que esta modalidade exige. Para concretização destasquestões as docentes investigadas apontam um elemento basilar para a realização de práticas lúdicas que respeitem a EJA: sua formação permanente. Deste modo, é evidente a necessidade de construirmos uma política educacio- 4 ALMEIDA, Anne. Ludicidade como instrumento pedagógico. Disponível em: http://www.cdof.com.br/recrea22.htm. Acesso em 30.05.2014. 22 nal permanente para jovens e adultos. Somente assim, poderemos efetivamente construir uma educação plena e que possibilite uma formação emancipadora para todos. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BRANDÃO, Carlos Rodrigues. O que é o método Paulo Freire. São Paulo: Brasiliense, 1981. FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa, 6ª ed. São Paulo: Paz e Terra, 1996. __________. A importância do ato de ler. 45ª ed. São Paulo: Cortez, 2003. HAIDT, Regina Célia Cazaux. Curso de Didática Geral: O uso de jogos (cap.9). 7 ed. São Paulo: Ática, 2003. SANTOS, Santa Marli Pires dos. O lúdico na formação do Educador. 6ª ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 1997. VALE, Ana Maria do. Educação popular na escola pública, 3ª ed. São Paulo: Cortez, 2001. NOTAS 1.Graduanda em Pedagogia pela Universidade Federal do Amapá – UNIFAP. 2.Graduanda em Pedagogia pela Universidade Federal do Amapá – UNIFAP. 3.Graduanda em Pedagogia pela Universidade Federal do Amapá – UNIFAP. 4.Professor de Fundamentos da EJA/UNIFAP e Mestrando em Desenvolvimento Regional pela UNIFAP. TEXTO COMPLEMENTAR 4LUDICIDADE COMO INSTRUMENTO PEDAGÓGICO 1Profª. Esp. Anne Almeida O lúdico tem sua origem na palavra latina "ludus" que quer dizer "jogo". Se se achasse confinado à sua origem, o termo lúdico estaria se referindo apenas ao jogar, ao brincar, ao movimento espontâneo. A evolução semântica da palavra "lúdico", entretanto, não parou apenas nas suas origens e acompanhou as pesquisas de Psicomotricidade. O lúdico passou a ser reconhecido como traço essencial de psicofisiologia do comportamento humano, de modo que a definição deixou de ser o simples sinônimo de jogo. As implicações da necessidade lúdica extrapolaram as demarcações do brincar espontâneo, passando a necessidade básica da personalidade, do corpo e da mente. O lúdico faz parte das atividades essenciais da dinâmica humana, caracterizando-se por ser espontâ- neo funcional e satisfatório. Sendo funcional: ele não deve ser confundido com o mero repetitivo, com a monotonia do comportamento cíclico, aparentemente sem alvo ou objetivo. Nem desperdiça movimento: ele visa produzir o máximo, com o mínimo de dispêndio de energia. Segundo Luckesi, lúdicas são aquelas atividades que propiciam uma experiência de plenitude, em que nos envolvemos por inteiro, estando flexíveis e saudáveis. Para Santin, são ações vividas e sentidas, não definí- veis por palavras, mas compreendidas pela fruição, povoadas pela fantasia, pela imaginação e pelos sonhos que se articulam como teias urdidas com materiais simbólicos. Assim, elas não são encontra- das nos prazeres estereotipados, no que é dado pronto, pois estes não possuem a marca da singulari- dade do sujeito que as vivencia. Na atividade lúdica, o que importa não é apenas o produto da atividade, o que dela resulta, mas a própria ação, o momento vivido. Possibilita a quem a vivencia momentos de encontro consigo e com o outro, momentos de fantasia e de realidade, de ressignifica- ção e percepção, momentos de autoconhecimento e conhecimento do outro, de cuidar de si e olhar para o outro, momentos de vida. Uma aula com características lúdicas não precisa ter jogos ou brinquedos. O que traz ludicidade para a sala de aula é muito mais uma "atitude" lúdica do educador e dos educandos. Assumir essa postura implica sensibilidade, envolvimento, uma mudança interna e 23 não apenas externa, implica não somente uma mudança cognitiva, mas, principalmente, uma mudança afetiva. A ludicidade exige uma predisposi- ção interna, o que não se adquire apenas com a aquisição de conceitos, de conhecimentos, embora estes sejam muito importantes. Uma fundamentação teórica consistente dá o suporte necessário ao professor para o entendimento dos porquês de seu trabalho. Trata-se de ir um pouco mais longe ou, talvez melhor dizendo, um pouco mais fundo. Trata-se de formar novas atitudes, daí a necessidade de que os professores estejam envolvidos com o processo de formação de seus educandos. Isso não é tão fácil, pois, implica romper com um modelo, com um padrão já instituído, já internalizado. A escola tradicional, centrada na transmissão de conteúdos, não comporta um modelo lúdico. Por isso é tão frequente ouvirmos falas que apóiam e enalte- cem a importância do lúdico estar presente na sala de aula, e queixas dos futuros educadores, como tam- bém daqueles que já se encontram exercendo o magistério, de que se fala da importância da ludicida- de, se discutem conceitos de ludicidade, mas não se vivenciam atividades lúdicas. Fala-se, mas não se faz. De fato não é tão simples uma transformação mais radical pelas próprias experiências que o professor tem ao longo de sua formação acadêmica. Como bem observa Tânia Fortuna, em uma sala de aula ludicamente inspirada, convive-se com a aleato- riedade, com o imponderável; o professor renuncia à centralização, à onisciência e ao controle onipotente e reconhece a importância de que o aluno tenha uma postura ativa nas situações de ensino, sendo sujeito de sua aprendizagem; a espontaneidade e a criativida- de são constantemente estimuladas. Podemos observar que essas atitudes, de um modo geral, não são, de fato, estimuladas na escola. Para Jucimara: "as atividades lúdicas permitem que o indivíduo vivencie sua inteireza e sua autonomia em um tempo- espaço próprio, particular. Esse momento de inteireza e encontro consigo gera possibilidades de autoconhe- cimento e de maior consciência de si". São lúdicas as atividades que propiciem a vivência plena do aqui-agora, integrando a ação, o pensamen- to e o sentimento. Tais atividades podem ser uma brincadeira, um jogo ou qualquer outra atividade que possibilite instaurar um estado de inteireza: uma dinâmica de integração grupal ou de sensibilização, um trabalho de recorte e colagem, uma das muitas expressões dos jogos dramáticos, exercícios de relaxamento e respiração, uma ciranda, movimentos expressivos, atividades rítmicas, entre outras tantas possibilidades. Mais importante porém, do que o tipo de atividade é a forma como é orientada e como é experienciada, e o porquê de estar sendo realizada. Enquanto educadores, damos ênfase às metodologi- as que se alicerçam no "brincar", no facilitar as coisas do aprender através do jogo, da brincadeira, da fantasia, do encantamento. A arte-magia do ensinar- aprender (Rojas, 1998), permite que o outro construa por meio da alegria e do prazer de querer fazer. O jogo e a brincadeira estão presentes em todas as fases da vida dos seres humanos, tornando especial a sua existência. De alguma forma, o lúdico se faz presente e acrescenta um ingrediente indispensável no relacio- namento entre as pessoas, possibilitando que a criatividade aflore. Por meio da brincadeira a criança envolve-se no jogo e sente a necessidade de partilhar com o outro. Ainda que em postura de adversário, a parceria é um estabe- lecimento de relação. Esta relação expõe as potencia- lidades dos participantes, afeta as emoções e põe à prova as aptidões testando limites. Brincando e jogando, a criança terá oportunidade de desenvolver capacidades indispensáveis a sua futura atuação profissional, tais como atenção, afetividade, o hábito de permanecer concentrado e outras habilidades perceptuais psicomotoras. Brincando a criança torna- se operativa. Observamos que quando existe representação de uma determinada situação (especialmente se houver verbalizado)a imaginação é desafiada pela busca de solução para problemas criados pela vivência dos papéis assumidos. As situações imaginárias estimu- 24 lam a inteligência e desenvolvem a criatividade. O ato de criar permite uma Pedagogia do Afeto na escola, permite um ato de amor, de afetividade cujo território é o dos sentimentos, das paixões, das emoções, por onde transitam medos, sofrimentos, interesses e alegrias. Uma relação educativa que pressupõem o conhecimento de sentimentos próprios e alheios que requerem do educador a disponibilidade corporal e o envolvimento afetivo, como também, cognitivo de todo o processo de criatividade que envolve o sujeito- ser-criança. A afetividade é estimulada por meio da vivência, a qual o educador estabelece um vínculo de afeto com o educando. A criança necessita de estabili- dade emocional para se envolver com a aprendiza- gem. O afeto pode ser uma maneira eficaz de se chegar perto do sujeito e a ludicidade, em parceria, um caminho estimulador e enriquecedor para se atingir uma totalidade no processo do aprender. Percebemos em Machado (1966) o ressaltar do jogo como não sendo qualquer tipo de interação, mas sim, uma atividade que tem como traço fundamental os papéis sociais e as ações destes derivadas em estreita ligação funcional com as motivações e o aspecto propriamente técnico-operativo da atividade. Dessa forma destaca o papel fundamental das relações humanas que envolvem os jogos infant is. Entender o papel do jogo nessa relação afetiva- emocional e também de aprendizagem requer que percebamos estudos de caráter psicológico, como mecanismos mais complexos, típicos do ser humano, como a memória, a linguagem, a atenção, a percepção e aprendizagem. Elegendo a aprendizagem como processo principal do desenvolvimento humano enfocamos Vygotsky (1984) que afirma: a zona de desenvolvimento proximal é o encontro do individual com o social, sendo a concepção de desenvolvimento abordada não como processo interno da criança, mas como resultante da sua inserção em atividades socialmente compartilhadas com outros. Atividades interdisciplinares que permitem a troca e a parceria. Ser parceiro é sê-lo por inteiro. Nesse sentido, o conhecimento é construído pelas relações interpes- soais e as trocas recíprocas que se estabelecem durante toda a vida formativa do indivíduo. Machado (1966) salienta, que a interação social implica transformação e contatos com instrumentos físicos e/ou simbólicos mediadores do processo de ação. Esta concepção reconhece o papel do jogo para formação do sujeito, atribuindo-lhe um espaço importante no desenvolvimento das estruturas psicológicas. De acordo com Vygtsky (1984) é no brinquedo que a criança aprende a agir numa esfera cognitiva. Segundo o autor a criança comporta-se de forma mais avançada do que nas atividades da vida real, tanto pela vivência de uma situação imaginária, quanto pela capacidade de subordinação às regras. A ludicidade é uma necessidade do ser humano em qualquer idade e não pode ser vista apenas como diversão. O desenvolvimento do aspecto lúdico facilita a aprendizagem; o desenvolvimento pessoal, social e cultural, colabora para uma boa saúde mental, prepara para um estado interior fértil, facilita os processos de socialização, comunicação, expressão e construção do conhecimento. A formação do sujeito não é um quebra-cabeça com recortes definidos, depende da concepção que cada profissional tem sobre a criança, homem, sociedade, educação, escola, conteúdo, currículo. Neste contexto as peças do quebra-cabeça se diferenciam, possibilitando diversos encaixes. Negrine (1994) sugere três pilares que sustentariam uma boa formação profissional, com a qual concorda- mos: a formação teórica, a prática e a pessoal, que no nosso entendimento, a esta última preferimos chamá- la de formação lúdica interdisciplinar. Este tipo de formação é inexistente nos currículos oficiais dos cursos de formação do educador, entretanto, algumas experiências têm-nos mostrado sua validade e não são poucos os educadores que têm afirmado ser a ludicidade a alavanca da educação para o terceiro milênio. A formação lúdica interdisciplinar se assenta em propostas que valorizam a criatividade, o cultivo da sensibilidade, a busca da afetividade, a nutrição da alma, proporcionando aos futuros educadores 25 vivências lúdicas, experiências corporais que se utilizam da ação do pensamento e da linguagem, tendo no jogo sua fonte dinamizadora. Quanto mais o adulto vivenciar sua ludicidade, maior será a chance deste profissional trabalhar com a criança de forma prazerosa, enquanto atitude de abertura às práticas inovadoras. Tal formação permite ao educador saber de suas possibilidades e limitações, desbloquear resistências e ter uma visão clara sobre a importância do jogo e do brinquedo para a vida da criança. Percebemos com isso que se o professor tiver conhecimento e prazer, mais probabilidade existirá de que os professores/aprendizes se utilizem desse "modelo" na sua sala de aula. Nóvoa (1991) afirma que o sucesso ou insucesso de certas experiências marcam a nossa postura pedagógica, fazendo-nos sentir bem ou mal com esta ou aquela maneira de trabalhar na sala de aula. Ao sentir que as vivências lúdicas podem resgatar a sensibilidade, até então adormecida, ao perceber-se vivo e pulsante, o professor/aprendiz faz brotar o inesperado, o novo e deixa cair por terra que a lógica da racionalidade extingue o calor das paixões, que a matemática substitui a arte e que o humano dá lugar ao técnico (Santin, 1990), permitindo o construir alicerçado no afeto, no poder fazer, sentir e viver. Poder vivenciar o processo do aprender colocando-se no lugar da criança, permitindo que a criatividade e a imaginação aflorem através da interdisciplinaridade enquanto atitude. A intersubjetividade se mostre por meio do afeto e da alegria de poder liberar o que cada sujeito (professor) traz consigo mesmo e quanto pode contribuir com o outro. Segundo Snyders (1988) o despertar para o valor dos conteúdos das temáticas trabalhadas é que fazem com que o sujeito aprendiz tenha prazer em aprender. Conteúdos estes despertados pelo prazer de querer saber e conhecer. Devemos despertá-los para, com sabedoria, poder- mos exteriorizá-los na nossa vida diária. A alegria, a fé, a paz, a beleza e o prazer das coisas estão dentro de nós. Por entender e concordar com o autor percebe- mos que se o professor não aprende com prazer não poderá ensinar com prazer. É isso que procuramos fazer em nossa prática peda- gógica, dando ênfase à formação lúdica: ensinar e sensibilizar o professor-aprendiz para que, através de atividades dinâmicas e desafiadoras, despertem no sujeito-aprendiz o gosto e a curiosidade pelo conheci- mento. Curiosidade que segundo Freire (1997) é natural e cabe ao educador torná-la epistemológica. Tudo se decide no processo de reflexão que o profes- sor leva a cabo sobre sua própria ação (Nóvoa, 1995). O homem da ciência e da técnica perdeu a felicidade e a alegria de viver, perdeu a capacidade de brincar, perdeu a fertilidade da fantasia e da imaginação guiadas pelo impulso lúdico (Santin, 1994). Que a sala de aula seja um ambiente em que o autoritarismo seja trocado pela livre expressão da atitude interdisci- plinar (Fazenda, 1994). Que as aulas sejam vivas e num ambiente de inter-relação e convivência (Masse- to, 1992). A formação lúdica possibilita ao educador conhecer- se como pessoa, saber de suas possibilidades, desbloquear resistências e ter uma visão clara sobre a importância do jogo e do brinquedo para a vida da criança, do jovem e do adulto (Santos, 1997; Kishimoto, 1999). A afetividade como sustentáculo significativo e fundamental de uma pedagogia que se alicerça na arte-magia interdisciplinar doensinar- aprender (Rojas, 1998). Sala de aula é um lugar de brincar se o professor consegue conciliar os objetivos pedagógicos com os desejos do aluno. Para isso é necessário encontrar equilíbrio sempre móvel entre o cumprimento de suas funções pedagógicas e contribuir para o desenvolvi- mento da subjetividade, para a construção do ser humano autônomo e criativo. Credita ao aluno, isto é, 'a sua ação, à parte de responsabilidade no desenvol- vimento. Mesmo procurando fazer sua parte, o professor e a escola dão/respeitam a possibilidade de que outra coisa aconteça. Como tão bem afirma Tânia Fortuna: brincar na sala de aula é uma aposta. 26 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS VYGOTSKY, L.S. (1993) Pensamento e linguagem. São Paulo: Martins Fontes. FORTUNA, Tânia Ramos. Formando professores na Universidade para brincar. In: SANTOS, Santa Marli P.dos (org.). A ludicidade como ciência. Petrópolis: Vozes, 2001, p.116. FAZENDA, I. C. (1995) A Interdisciplinaridade: história, teoria e pesquisa. Campinas/SP, Papirus. MORIN, E. (1999). Amor, Poesia e Sabedoria. Lisboa: Instituto Piaget. LUCKESI, Cipriano Carlos. Educação, ludicidade e prevenção das neuroses futuras: uma proposta pedagógica a partir da Biossíntese. In: LUCKESI, Cipriano Carlos (org.) Ludopedagogia - Ensaios 1: Educação e Ludicidade. Salvador: Gepel, 2000. NOTAS 1 A profª. Esp. Anne Almeida é licenciada em Educação Física Pelas Faculdades Montenegro - Ibicaraí, Bahia. Especialista em Educação Física Escolar pela Universidade Salgado de Oliveira – RJ. Professora da Rede Estadual em Itabuna Bahia, Colégios: Eraldo Tinoco Melo e Colégio Modelo - Luis Eduardo Magalhães. Docente das Faculdades Montenegro nos cursos de Educação Física e Pedagogia. A Almeida - Disponível: http://www. cdof. com. br/recrea22. htm. …, 2006 - cdof.com.br 27 5 Esse capítulo é parte da dissertação de Mestrado intitulada Cinema e educação: uma reflexão sobre a formação dos educadores na/para a linguagem audiovisual de Adriana Marques Ferreira (Capítulo 02). Juiz de Fora, 2009. Filme norte-americano (1998) dirigido por Bill Condon. Título original: Gods and Monsters. 6 De acordo com Ferreira e Júnior (1986), o primeiro filme de caráter realmente educativo foi produzido por Oskar Messter para a Marinha Alemã, em 1897. 5 DEUSES E MONSTROS5DEUSES E MONSTROS Unidade 3Unidade 3 De acordo com Ferreira e Junior (1986), o inventor Thomas Edison, após suas primeiras experiências com máquinas de projeção, já anunciava a possibili- dade de que os filmes chegariam a substituir os livros didáticos. Os primeiros cineastas já produziram 6muitos filmes educativos com caráter instrucional . Com a invenção do projetor portátil, concomitante à praticidade dos filmes não-inflamáveis inventados por Eastman Kodak, foi possível uma maior penetra- ção do cinema nas escolas. De acordo com Belloni e Subtil (2002) essa questão começa a ganhar maior visibilidade a partir da Segunda Guerra Mundial quando, nos Estados Unidos da América, começa-se a utilizar recursos audiovisuais na educação tendo em vista a grande eficiência do uso desses recursos, principalmente retroprojetores, projetores e filmes educativos para treinamentos de homens para a guerra. No período pós Segunda Guerra Mundial, algumas empresas se firmaram no ramo de produ- ções educativas como a Encyclopaedia Britannica Films, Coronet e Walt Disney, que se dedicou a produções de vídeos sobre animais e fenômenos da natureza. Louro (2000) afirma que no século XX o cinema passou a ser uma das formas culturais mais significa- tivas. Ao que foi inicialmente surgido como mais uma modalidade de lazer, em pouco tempo passou a ser encarado como uma importante instância formativa com representações de gênero, etnias, classes, dentre outras sendo legitimadas ou marginalizadas. A educação sempre foi alvo de inúmeros debates, experiências e reformas no intuito de transformá-la. Acompanhada de um pensamento que percebe a educação como o principal veículo de transformação social, algumas destas tentativas visavam, dentre outras coisas, a expansão, qualificação e a moderni- zação do ensino. No Brasil, essas iniciativas vieram no bojo da tentativa de construção de um país também moderno e progressista. A década de 1920 representou um marco das lutas por uma grande reforma da educação. Em 1930, subseqüente às idéias consolidadas nas Conferências Nacionais de Educação foi criado o então denominado Ministério da Educação e Saúde Pública. Neste momento, com o anseio de modernização e progres- so do país, afirmava-se a ideologia do grupo da Escola Nova que ensejava principalmente pelo ensino público, obrigatório e laico. A proposta de utilização do cinema como aliado educativo veio a partir das idéias renovadoras de utilizá-lo como recurso e aliado da educação moder- na, seja como propaganda do país ou como auxiliar da educação na formação dos cidadãos. Dentre os primeiros defensores da utilização do cinema na educação podemos citar Fernando de Azevedo que, já na década de 1920, será mentor de reformas educaci- onais que, entre outras medidas, incluirão o cinema como proposta de ensino. Como possível portador de uma ideologia nacionalis- ta, a contribuição do cinema se daria principalmente no que se refere à “formação” da nação. Os filmes trariam grandes benefícios para o cidadão e cumpriri- am o papel de apresentar aos brasileiros o seu próprio país. Assim, apresentariam a geografia do Brasil, os monumentos históricos, os heróis nacionais e até mesmo a origem das raças. Este projeto de consolidação de uma nação, de acordo com Catelli (2004) se caracterizava por uma moderni- zação conservadora já que o cinema era concebido Educar é substantivamente formar. Divinizar ou diabolizar a tecnologia é uma forma altamente negativa e perigosa de pensar errado. (PAULO FREIRE, 2002, p.37). 28 como uma obra da elite. Portanto, como a arte e a cultura eram direitos reservados exclusivamente a esta elite os novos meios de comunicação tinham como função irradiar uma cultura elaborada “de cima”, ou, no caso da cultura popular, ao menos selecionada por profissionais especializados. Até então se conhecem algumas experiências locais que incentivam a utilização do cinema como recurso didático. Em 1927, no Rio de Janeiro, foi criada uma “Commissão de Cinema Educativo”. Esse pensamen- to também fez parte da reforma educacional do Distrito Federal realizada em 1928 por Fernando de Azevedo. Durante o Estado Novo, este projeto de transformar o cinema em um grande veículo educati- vo e de integração nacional será levado à frente pelo poder político. Foi em 1935 que, Edgard Roquette-Pinto encaminhou ao então Ministro da Educação, Gustavo Capanema, um projeto de criação de um Instituto de Cinematografia Educativa. Funcionou, assim, de 1936 a 1966, o Instituto Nacional do Cinema Educativo (INCE). Criado no governo Getúlio Vargas e influenciado pelo movi- mento da Escola Nova, a função do INCE era documen- tar as atividades científicas e culturais realizadas no país para difundi-las, principalmente, na rede escolar. Seu objetivo era editar filmes educativos populares e escolares. O cinema, visto como uma tecnologia ligada ao progresso científico das sociedades modernas, insere-se na concepção que define os meios de comu- nicação de massa como capazes de difundir a cultura para a população, percebida como ainda em formação e deficiente culturalmente. O pensamento de Getúlio Vargas era de que as distâncias regionais, políticas, territoriais e econômicas eram um obstáculo ao crescimento nacional e o cinema, na sua visão, era capaz de aproximar os diferentes núcleos de pessoas dispersas no território da República. Sendo assim, o cinema poderia representar um instrumento de mudan- ça social e de modernização da sociedade,
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