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Estudos de Charcot sobre a histeria

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Estudos de Charcot sobre a histeria
Freud encontra Charcot
	Logo após sua formação, de outubro de 1885 a fevereiro de 1886, Freud trabalhou em um hospital psiquiátrico, o que foi crucial, pois assim transferiu seu interessa das neuropatologias para a psicopatologia. Ainda que outros fatores possam ter ajudado essa transferência, a personalidade de Charcot foi uma grande influência. 
	Freud estava interessado em compreender a vida psíquica cotidiana, para além da adoecida, para compreender como é que o sujeito adoece e o que o leva a adoecer. 
	Charcot via que, o aparente caos apresentado pela repetição contínua dos mesmos sintomas cedia lugar à ordem: os novos quadros emergiam, caracterizados pela combinação constante de certos grupos de sintomas. Ele buscava diagnosticar e observar as histerias e agrupar aqueles cujos sintomas se pareciam, propondo diagnósticos, categorias nosológicas. 
OBS.: A nosologia é a ciência que busca agrupar e categorizar casos clínicos. 
	Para ele, a maior satisfação humana é conhecer uma coisa nova e insistia nesse olhar clínico do médico, para ver novas faces de doenças já muito antigas, cujos médicos já haviam sido expostos. Não é fácil para os seres humanos compreenderem isso de vez, logo que olham. 
	Para Charcot, as teorias existentes podem estar erradas, é preciso que o olhar clínico seja soberano. 
	Na época, tanto os pacientes neuróticos, quanto os médicos que se dedicavam a estuda-las, caiam em descredito. Sustentava-se que na histeria qualquer coisa era possível e por isso não se dava crédito aos histéricos. A desconfiança em relação aos doentes mentais sempre existiu, mas os histéricos também não levavam crédito e eram vistos como pessoas que estavam mentindo ou querendo chamar atenção. 
	“A histeria é o discurso de um desejo refreado no campo da razão” – Elizabeth Roudinesco. 
	A histeria é um estado de sofrimento psíquico, que pode se manifestar em sintomas subjetivos.
	Freud estruturou uma topologia do sistema psíquico, desenvolvendo a teoria do id, ego e superego. O nome que ele deu aos sistemas psíquicos se atualizou ao longo de sua escrita. O primeiro sistema teorizava a existência de um estado inconsciente (iceberg submerso), pré consciente (linha d'água) e consciente (iceberg acima d'água), um modelo mais simples, que comparou a um iceberg. 
Mais a frente, Freud compreende uma série de outras questões sobre o sistema psíquico e percebe que o modelo anterior era precário, elaborando o modelo do id (isso, it), ego (eu) e superego (super eu). 
- O id é a instância do inconsciente, de onde surgem nossos impulsos e desejos, não é uma parte de nosso psiquismo, mas ele todo. O ego surge dentro do id. 
	- O superego é como se o indivíduo exigisse muito do seu ego. 
	- As forças do nosso psiquismo se colocam em contraposição constantemente, gerando o sentimento de indecisão, de culpa. 
A culpa é um sentimento muito presente nos neuróticos. 
	- Libido: prazer, energia que é aplicada em nossas atividades cotidianas. 
	- Desejo é diferente de vontade, o desejo é inconsciente, um impulso, um movimento de procura, não necessariamente o desejo é consciente. Esse desejo pode ser um pulso de construção ou de destruição (pulso de morte, por exemplo). 
A histeria, no senso comum, está associada a chatice, a descontrole, mau humor. Na psicanálise, a histeria é um sofrimento psíquico que se converte em sintomas. 
Na vida social, chamar alguém de histérico ou neurótico é xingamento. 
Os tiques por exemplo, podem ser causados por problemas psicológicos. É a repetição automática de sintomas. 
Charcot começou a falar de histeria e garantiu credibilidade e autoridade ao fenômeno, tirando do paciente o estigma de “mentiroso”. Ele repetira, em menor escala, o ato de libertação de Pinel. Abandonando a ideia de que o paciente poderia estar mentindo, podia-se levantar a questão de qual método de abordagem levaria mais rapidamente à solução de problemas. 
A percepção da loucura está muito relacionada a questões culturais, e na nossa cultura, a loucura está relaciona com a ausência de razão. A maneira como Pinel foi importante para o entendimento da loucura como um sofrimento, Charcot o foi em relação a histeria. 
Um observador sem nenhum conhecimento profundo sobre a histeria poderia chegar a esta conclusão: Se encontro alguém num estado tal que manifesta todos os sintomas de um afeto doloroso – chorando, gritando -, parece provável a conclusão de que está ocorrendo nele um processo mental cuja expressão apropriada são estes fenômenos físicos. Uma pessoa saudável, se indagada, estaria em condições de explicar as razões mentais do seu tormento, um histérico, porém não sabe. 
“A indiferença dos histéricos” vem do fato de não saberem o motivo de seu adoecimento psíquico. 
Se penetramos na história da vida do paciente e descobrimos alguma ocasião, um trauma, que pudesse evocar aquelas expressões de sentimento. Caso o paciente não saiba o que o leva a sofrer, isso aponta para a existência de um inconsciente que o internalizou, gerando uma lacuna no consciente. (TEXTO: A psicopatologia da vida cotidiana). 
O recalque (verdrangung) não é a mesma coisa que repressão. O recalque é o afastamento, deslocamento, afastar algo da consciência, afastar lembranças que geraram traumas, “varrer pra baixo do tapete”. É um mecanismo de defesa do ego, que quando se vê em situações de ameaça, de instabilidade, pode rejeitar, recalcar a situação para longe. A repressão, por sua vez, é quando algo externo me proíbe de algo, não é um movimento interior. 
A teoria de Charcot
	O Charcot tratou a histeria como um tópico da neuropatologia, ele não desenvolveu uma teoria psicológica, ele se amparou na medicina e na neurologia, mas essas ideias possibilitaram que Freud desenvolvesse sua teoria psicológica. Demonstrou que a histeria tinha suas próprias leis e regularidades, mostrado como reconhecer os sintomas que possibilitaram o diagnóstico. 
	As mais trabalhosas investigações estavam relacionadas aos distúrbios histéricos da pele e dos tecidos mais profundos, ao comportamento dos órgãos dos sentidos e às suas peculiaridades das contraturas e paralisias histéricas, e das alterações do metabolismo. 
	Ele divide as neuroses histéricas em dois grupos: as grandes histerias, aqueles que são acometidos com ataques histéricos; os ataques “menores” com sintomas mais “brandos” seriam as pequenas histerias. 
	Ele percebeu que haviam regiões do corpo que ocorriam sintomas com mais frequência, as chamadas “zonas histerogênicas”. 
	Charcot descobriu que a histeria também acontecia em homens, especialmente nos da classe trabalhadora. 
	Demonstrou que certos estados atribuídos à intoxicação alcóolica ou ao envenenamento por chumbo eram de natureza histérica. 
Incluiu na histeria um conjunto de afecções, de sintomas, até então não compreendidas ou classificadas; e nos casos em que a neurose se juntara a outros distúrbios de modo a formar casos complexos, foi possível distinguir o papel desempenhado pela histeria. 
As investigações de maior alcance foram decorrentes de traumas graves – as neuroses traumáticas. A ideia de trauma surge com Charcot e é desenvolvida por Freud.
Etiologia da histeria (causa): Ele propôs uma fórmula simples, devia-se considerar a hereditariedade como causa única; consequentemente a histeria seria uma forma de degeneração, um membro da “famille néuropathique”, está dentro das doenças do campo da neurologia. Todos os outros fatores etiológicos desempenhariam o papel de causas incidentais, um agente provocador dispararia, desencadearia um quadro que já era seu, pela hereditariedade. A causa acidental é algo que poderia acontecer ou não. O sujeito já tinha uma fragilidade que veio pela sua genética, e quando ele é exposto a uma situação de tensão, de afeto, se desencadeiam os sintomas, as neuroses. 
Os sintomas histéricos deveriam ser analisados por via do “afeto”. Os afetos são como uma energia que move o sujeito para a ação e surgem quando uma forte carga emocional é impedida de nivelar-se ao longodo caminho normal que conduz à consciência e ao movimento, isto é, era impedido de ser ab-reagido, de ser descarregado. Os afetos sempre são sentidos no corpo, a angústia, por exemplo. As situações de estresse, de tenção geram uma grande quantidade de afeto dentro de nós e o normal é que meu aparelho mental encontre uma forma “adequada” de descarregar aquilo. As pessoas com histeria possuem uma condição hereditária que impede a descarga “adequada” daquele afeto. 
A histeria faz então a conversão somática, como consequência do represamento do afeto, ele passa a ser desviado ao longo de caminhos errados até ser transbordado para a intervenção somática. 
	
O trajeto “normal”: 
O trajeto do histérico: 
Para Charcot o trauma é uma coisa concreta, física, vivenciada conscientemente, um peso real, na concretude dos fatos, é diferente da visão de Freud.

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