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1 Fernanda E. Bocutti T6 1. Entender a etiologia da palavra somatoformes Tipo de transtorno no qual a presença de sintomas físicos de doenças tem causa inexistente ou sem explicação aparente. (grego sôma, -atos, corpo + -forme) 2. Definir transtornos somatoformes e transtornos dissociativos e diferencia-los Transtornos somatoformes seriam um “salto” do psíquico para o orgânico, tendo como repercussão múltiplas queixas somáticas referentes ao sistema nervoso, cardiovascular, digestório, etc. Nos transtornos dissociativos tal mecanismo ocorre da estância psíquica para o próprio psíquico, ocasionando ruptura nas funções usualmente integradas de consciência, identidade, memória e percepção Transtornos somatoformes Transtornos dissociativos Transtorno de somatização Amnésia dissociativa Transtorno somatoformes indiferenciado Fuga dissociativa Transtorno doloroso Transtorno de despersonalização Transtorno conversivo Transtorno dissociativo de identidade Transtorno dismórfico corporal Transtorno dissociativo sem outra especificação Hipocondria Transtorno somatoformes sem outra especificação 3. Definir critérios diagnósticos dos transtornos somatoformes Critérios transtorno de sintomas somáticos A. Um ou mais sintomas somáticos que causam aflição ou resultam em perturbação significativa da vida diária. B. Pensamentos, sentimentos ou comportamentos excessivos relacionados aos sintomas somáticos ou associados a preocupações com a saúde manifestados por pelo menos um dos seguintes: 1. Pensamentos desproporcionais e persistentes acerca da gravidade dos próprios sintomas. 2. Nível de ansiedade persistentemente elevado acerca da saúde e dos sintomas. 3. Tempo e energia excessivos dedicados a esses sintomas ou a preocupações a respeito da saúde. C. Embora algum dos sintomas somáticos possa não estar continuamente presente, a condição de estar sintomático é persistente (em geral mais de seis meses). Especificar se: Com dor predominante (anteriormente transtorno doloroso): Este especificador é para indivíduos cujos sintomas somáticos envolvem predominantemente dor. Especificar se: Persistente: Um curso persistente é caracterizado por sintomas graves, prejuízo marcante e longa duração (mais de seis meses). Especificar a gravidade atual: Leve: Apenas um dos sintomas especificados no Critério B é satisfeito. Moderada: Dois ou mais sintomas especificados no Critério B são satisfeitos. Grave: Dois ou mais sintomas especificados no Critério B são satisfeitos, além da presença de múltiplas queixas somáticas (ou um sintoma omático muito grave). 4. Diagnóstico Na investigação dos TSD, alguns desafios se impõem. Com base na observação do estado mental do paciente, na história objetiva, na entrevista de familiares e na solicitação dos exames necessários, devem ser discriminadas as seguintes condições: • Síndrome clínica funcional: ocorrência de sintomas somáticos no contexto de uma síndrome clínica funcional (p. ex., fibromialgia, síndrome do cólon irritável e dispepsia funcional); • Doenças psicossomáticas: a fisiopatologia está definida e se associa a uma vulnerabilidade a estressares psicológicos que pode facilitar a ocorrência dos sintomas (p. ex., retocolite ulcerativa); • Condição médica geral ou uso de substância: podem explicar ou justificar os sintomas. Importante lembrar que podem ocorrer simultaneamente (p. ex., lúpus sistêmicos e esclerose múltipla); • Outros transtornos mentais: ocorrência de sintomas somáticos e/ou dissociativos no contexto de um transtorno mental (p. ex., sintomas autonômicos nas crises agudas de Transtornos somatoformes 2 Fernanda E. Bocutti T6 ansiedade, dores na depressão e delírios que incluam sintomas corporais nos quadros psicóticos); • Transtorno factício e simulação: no primeiro, não só a observância dos sintomas, mas também a compreensão de motivações conscientes e inconscientes do indivíduo para surgimento deles torna-se imperiosa. A simulação não é um diagnóstico psiquiátrico, e ganhos externos como benefícios financeiros e resolução de problemas legais podem ser identificados na história. Transtornos somatoformes Os TS são uma classe diagnóstica que agrupa condições caracterizadas por sintomas físicos sugestivos, porém não plenamente explicados por uma condição médica geral ou por efeito direto de uma substância, bem como os sintomas não são produzidos intencionalmente ou atribuíveis a outra condição mental. A sintomatologia deve ser clinicamente significativa de forma a causar prejuízo em importantes áreas do funcionamento do indivíduo. Os dados de prevalência e incidência são muito variáveis, seja em populações de um ambiente clínico, quanto na população geral. Um estudo mostra prevalência de hipocondria em 1 %e de somatização em 4% em pacientes de atenção primária. Outro estudo mostrou que 14% dos pacientes de atenção primária sofrem de algum TS e, em estudo epidemiológico na comunidade, estimou-se prevalência de 0,06 a 6%. Seguem, no Quadro 6, os fatores etiopatogênicos implicados no transtorno de somatização e na hipocondria. 5. Citar a epidemiologia - A prevalência de TSD varia entre 10 a 20%. - É mais comum em mulheres (2 a 5 vezes mais frequente do que homens, conforme o estudo) - É mais comum em áreas rurais e em indivíduos com nível socioeconômico baixo. - Em hospitais gerais até 16% das consultas psiquiátricas envolvem pacientes com algum sintoma conversivo. - Transtorno de humor e ansiedade são 3,3 vezes mais frequentes nesses casos do que na população geral. 6. Descrever a condução ideal de uma anamnese e citar as principais dificuldades Algumas dificuldades são frequentemente encontradas durante a anamnese e diante do quadro clínico dos pacientes com TSD: - Descrição vaga ou dramática dos sintomas que turva a investigação psicopatológica - Presença de múltiplas queixas e plasticidade dos sintomas que confundem o raciocínio clínico - Indiferença afetiva incongruente com as queixas, verificada principalmente nos casos dissociativos - Demanda constante por exames (paciente acredita que a investigação diagnóstica não foi suficiente para desvendar a causa dos sintomas) - Indução de respostas durante a anamnese, que pode não ser percebida pelo entrevistador e se deve à sugestionabilidade aumentada dos pacientes - Falta de empatia do médico - Atitude polarizada de muitos familiares que hostilizam ou superprotegem o paciente reforçando comportamentos indesejáveis Pacientes com sintomas somatoformes podem apresentar uma variedade de queixas, sendo as mais comuns: dores, sintomas gastrointestinais, como náuseas, vômitos e diarreia, alteração dos sentidos, como afonia, cegueira, surdez, paralisias, alterações de marcha, movimentos involuntários, blefaroespasmo, crise não epiléptica psicogênica, distonia, “fraqueza”, globus hytericus (sensação de uma “bola na garganta” que sobe e desce), alterações menstruais, pseudociese, retenção ou incontinência fecal e urinária e alterações táteis. Combinações desses sintomas podem caracterizar verdadeiras síndromes que confundirão o examinador pela estreita semelhança com doenças orgânicas, como esclerose múltipla, endometriose, doenças cerebrovasculares agudas e crônicas, epilepsia, miopatias, etc. Já em relação à despersonalização, amnésia e fuga dissociativas, o diagnóstico diferencial ocorre com quadro de demência, delirium, intoxicação exógena, crise epiléptica, acometimento neurológico por infecção, neoplasia ou evento cerebrovascular. Os casos com alteração da percepção são comumente confundidos com transtornos psiquiátricos (psicoses, transtornos de humor, de personalidade e do impulso). Vale lembrar que alucinações visuais são muito raras fora dos casos dissociativos ou orgânicos. 3 Fernanda E. Bocutti T6 É mais comum que os sintomas tenham curta duração, de diasou semanas, e surjam pouco tempo após experiências traumáticas ou conflitos psíquicos insolúveis. Nos casos sujeitos a estressores crônicos, o surgimento dos sintomas pode ser gradual. Além de eventos traumáticos, a investigação deve incluir doenças vividas ou presenciadas pelo indivíduo ao longo da vida, tendo em vista que funcionariam como modelos de doença. Os pacientes podem exibir um padrão de comportamento caracterizado por indiferença afetiva ou dramaticidade na descrição dos sintomas. Podem ter dificuldade de referir com precisão suas queixas e organizá- las temporalmente. O profissional tende a ficar confuso diante da inconsistência e da patoplastia dos sintomas. A sensação de incompreensão dos pacientes que, em geral, negam a relação dos sintomas com questões psicodinâmicas torna o vínculo médico-paciente sensível. A impotência diante do paciente pode gerar reações como irritabilidade, rejeição e hostilidade por parte da equipe de saúde, o que deve ser evitado por meio de informação e empatia. 7. Exemplificar qual a postura ideal do médico diante de tais pacientes É importante construir e manter o vínculo com o paciente com TSS, ouvindo-o atentamente e encorajando-o para descrever seus sintomas. Depois de desenvolver um bom relacionamento, deve-se legitimar as queixas do paciente e depois limitar as investigações diagnósticas para abordar apenas achados específicos com base em uma história cuidadosa e exame físico. Deve-se evitar confrontar ou desafiar o paciente com TSS; em vez disso, concordar que existe um problema e trabalhar com o paciente para formular um plano de cuidados e encaminhamento. A prioridade é ouvir o paciente e comunicar uma compreensão do que ele está sentindo e a extensão do comprometimento funcional que ele está experimentando. O sofrimento é um fenômeno subjetivo e, nesse sentido, é genuíno nesses casos. É apropriado legitimar os sintomas do paciente e, em seguida, tentar caracterizar o diagnóstico de TSS, explicando-o para o paciente, o que pode ajudar a construir uma aliança terapêutica com ele. Os esforços terapêuticos incluem terapia cognitiva, técnicas, psicoterapia e, em alguns casos, a utilização de medicamentos psicotrópicos. Se um diagnóstico de TSS for seriamente considerado pelo emergencista, esses pacientes precisarão de atenção primária e, posteriormente, de consulta psiquiátrica para avaliação e manejo. Os pacientes devem ser informados a respeito de que diagnósticos que representem uma ameaça grave à vida foram descartados no DE e que novos testes e exames adicionais e medicamentos não são indicados nesse momento. Também é apropriado salientar que os cuidados continuados e a reavaliação periódica são indicados, embora não no DE. Pacientes com ansiedade ou depressão devem receber consulta psiquiátrica ou encaminhamento, especialmente quando se apresentam com descompensação aguda desses sintomas. 8. Dentre os transtornos focar na fuga dissociativa e amnésia dissociativa Transtorno de somatização Trata-se de um transtorno polissintomático, caracterizado por múltiplas dores recorrentes, sintomas gastrointestinais, sexuais e pseudoneurológicos, com início antes dos 30 anos e que perduram por anos. Os sintomas não são deliberadamente produzidos e não são plenamente explicados por uma condição médica geral ou efeito direto de substâncias, que atestariam a organicidade dos achados. Para que o diagnóstico seja feito, tal transtorno deve demandar atenção. Transtornos dissociativos O termo dissociação é utilizado em psiquiatria para descrever a existência de perturbação nas funções habitualmente integradas da consciência, da memória, da identidade ou da percepção. O fenômeno dissociativo pode acontecer de forma súbita (mais comum) ou gradual, pode ser transitório ou tornar-se crônico. Os transtornos psiquiátricos caracterizados fundamentalmente pelas alterações das funções descritas são denominados transtornos dissociativos. Estes são categorizados como amnésia dissociativa, fuga dissociativa, transtorno dissociativo de identidade, transtorno de despersonalização e transtorno dissociativo não especificado. Fuga dissociativa A fuga caracteriza-se pelo afastamento súbito de casa ou de local em que costuma exercer as atividades diárias. O indivíduo pode ficar confuso quanto à própria identidade e também não se lembrar de fatos passados, mas continuar exercendo suas atividades normalmente no novo contexto 4 Fernanda E. Bocutti T6 em que se instala. Alguns assumem novas ocupações e relacionamentos sociais e podem permanecer nessa condição por anos. Diferencia-se da amnésia, em que o paciente vagueia por outros ambientes, pelo fato de ter um propósito, como o afastamento inconsciente de uma situação estressora. Como diagnósticos diferenciais mais frequentes, destacam-se quadros demenciais graves, episódios maníacos com desorganização comportamental e/ou grandiosidade, surtos psicóticos em esquizofrênicos paranoides ou hebefrênicos, transtorno dissociativo de identidade, uso de substâncias e transtorno factício. Quando o indivíduo se recupera de um episódio de fuga dissociativa, em geral surpreende-se e não se lembra do ocorrido. A recorrência leva a prejuízos sócio-ocupacionais e sofrimento significativo para os pacientes e as pessoas próximas. O tratamento inclui abordagem psicoterápica para identificar eventos estressores e manejo comportamental. Transtorno de despersonalização A despersonalização caracteriza-se pelo estranhamento ou distanciamento de si próprio, vividos como impressão de estar sonhando ou se vendo em um filme. O indivíduo refere também sensação de não controlar as próprias ações durante os episódios. Entretanto, mantém a crítica de que o fenômeno experimentado não corresponde à realidade. Em alguns casos, a desrealização, o estranhamento relacionado ao ambiente externo, pode estar presente. Aproximadamente metade dos indivíduos adultos apresenta ao menos um episódio de despersonalização ao longo da vida, quando sob o impacto de algum evento estressor. Por ser uma experiência comum, precisa ser contextualizada. Pode representar um transtorno propriamente dito, quando há recorrência, riscos e sofrimento para o paciente e/ou àqueles que o cercam. Em outros casos, ocorre como parte dos sintomas de um transtorno psiquiátrico, como o estresse pós-traumático e os transtornos de personalidade histriônico e borderline. Por fim, é preciso excluir a despersonalização relacionada ao uso de substâncias e aquela ligada a contextos culturais e religiosos. O tratamento inclui abordagem psicoterápica e comportamental. Alguns inibidores seletivos de recaptura de serotonina (ISRS), como fluoxetina e fluvoxamina, podem ser úteis também. Amnésia dissociativa Na amnésia dissociativa, o indivíduo torna-se incapaz de recordar informações pessoais relevantes e, em geral, a natureza dessa incapacidade relaciona-se a um evento traumático ou estressor. A extensão da amnésia não é compatível com esquecimento normal. Os tipos mais comuns são a amnésia localizada, quando o indivíduo não se recorda dos fatos que ocorreram em um determinado período de tempo, e a amnésia seletiva, em que apenas uma parte dos fatos não é recordada. Existem, ainda, a amnésia generalizada, a sistematizada e a contínua, que são menos comuns. Vale ressaltar que comportamentos auto e heteroagressivos podem estar presentes no episódio de amnésia, expondo o indivíduo a situações de risco. Diagnósticos diferenciais importantes de serem destacados são: lesões neurológicas de natureza vascular, traumática ou neoplásica, demência, delirium, epilepsia, uso de álcool e outras drogas. Além das condições clínicas citadas, transtornos psiquiátricos, como depressão, estresse pós-- traumático, episódios psicóticos e outros TD, e de personalidade podem cursar com amnésia Fuga dissociativa A fuga caracteriza-se pelo afastamento súbitode casa ou de local em que costuma exercer as atividades diárias. O indivíduo pode ficar confuso quanto à própria identidade e também não se lembrar de fatos passados, mas continuar exercendo suas atividades normalmente no novo contexto em que se instala. Alguns assumem novas ocupações e relacionamentos sociais e podem permanecer nessa condição por anos. Diferencia-se da amnésia, em que o paciente vagueia por outros ambientes, pelo fato de ter um propósito, como o afastamento inconsciente de uma situação estressora. Como diagnósticos diferenciais mais frequentes, destacam- se quadros demenciais graves, episódios maníacos com desorganização comportamental e/ou grandiosidade, surtos psicóticos em esquizofrênicos paranoides ou hebefrênicos, transtorno dissociativo de identidade, uso de substâncias e transtorno factício. Quando o indivíduo se recupera de um episódio de fuga dissociativa, em geral surpreende-se e não se lembra do ocorrido. A recorrência leva a prejuízos sócio-ocupacionais e sofrimento significativo para os pacientes e as pessoas próximas. O tratamento inclui abordagem psicoterápica para identificar eventos estressores e manejo comportamental. 5 Fernanda E. Bocutti T6 9. Tratamento Farmacológico: a resposta a inibidores seletivos da recaptura de serotonina foi mínima. Inibidores da monoaminoxidase têm apresentado resultados modestos também, principalmente na população com sintomas vegetativos significativos. Preconiza-se que, embora o benefício de medicações antidepressivas não tenha sido atestado por meio de ensaios clínicos controlados, o sucesso em tratar distúrbios correlacionados à fibromialgia faz deles boa alternativa. O uso de anti-inflamatórios não hormonais pode ser útil quando há predominância de queixas musculoes-queléticas; Intervenções não farmacológicas: terapia cognitivo- comportamental ajudaria a não perpetuação de sintomatologia, bem como exercícios aeróbicos ajudariam a reduzir a fadiga e melhorar o condicionamento físico. O diagnóstico desse transtorno, uma vez que não há testes diagnósticos ou marcadores biológicos, acaba sendo feito após exclusão de outras causas de fadiga. Apesar de inúmeras hipóteses, pouco se sabe claramente sobre os mecanismos fisiopatológicos. Acredita-se que seja multifatorial, com elementos genéticos, fisiológicos e psicológicos.