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Branda de Oliveira de Lima, Turma LVI - MedUnicamp A miocardiopatia é uma doença primária do miocárdio. É diferente das doenças cardíacas estruturais, como doença coronariana (DAC), valvulopatias e das doenças cardíacas congênitas. As cardiomiopatias dividem-se em 3 tipos principais com base nas características patológicas: Dilatadas Hipertrófica Restritiva O termo “miocardiopatia isquêmica” refere-se ao miocárdio dilatado e mal contraído que pode ocorrer em pacientes com DAC grave (com ou sem áreas de infarto). Não é classicamente considerado nas categorias listadas acima porque não descreve uma doença primária do miocárdio. Alguns autores dividem em miocardiopatias isquêmicas e não isquêmicas. As manifestações de cardiomiopatias são, em geral, aquelas da insuficiência cardíaca e variam dependendo de haver disfunção sistólica, disfunção diastólica ou ambas. Algumas cardiomiopatias também podem causar dor torácica, síncope, arritmias ou morte súbita. A avaliação normalmente exige história familiar, exames de sangue, ECG, radiografia de tórax, ecocardiograma e às vezes RM cardíaca, se disponível. Alguns pacientes necessitam de biópsia endomiocárdica (ventricular direita transvenosa ou ventricular esquerda retrógrada). Outros testes são feitos conforme necessário para determinar a causa. O tratamento depende do tipo específico e da causa da miocardiopatia. 1. MIOCARDIOPATIAS DILATADAS Como uma doença primária do miocárdio, a disfunção do miocárdio ocorre na ausência de doença coronariana oclusiva grave ou doenças que envolvem sobrecarga de pressão ou volume do ventrículo (p. ex., hipertensão, doença cardíaca valvular). Em alguns pacientes, acredita-se que a miocardiopatia dilatada comece com miocardite aguda (viral na maioria dos casos), seguida de fase latente variável, fase com necrose difusa dos miócitos miocárdicos (decorrente de reação autoimune aos miócitos alterados pelo vírus) e fibrose crônica. Independentemente da causa, o miocárdio se dilata, adelgaçando-se e hipertrofiando-se em Branda Destacar Branda de Oliveira de Lima, Turma LVI - MedUnicamp compensação, geralmente levando à insuficiência mitral ou insuficiência tricúspide funcional e à dilatação atrial. Na maioria dos pacientes, a doença compromete ambos os ventrículos; em alguns pacientes, a doença compromete apenas o VE (a menos que a causa seja isquemia); e, raramente, compromete apenas o ventrículo direito. Pode haver formação de trombos murais quando a dilatação da câmara é significativa, especialmente durante a fase de miocardite aguda. Com frequência, taquiarritmias cardíacas complicam as fases de miocardites aguda e dilatada crônica tardia, da mesma forma que o bloqueio atrioventricular. À medida que o átrio se dilata, em geral ocorre fibrilação atrial. As miocardiopatias dilatadas tem etiologia muito variada, desde fatores tóxicos, infecciosos, endócrinos, genéticos ou idiopáticos (desconhecidos). Apesar disso, tem um fenótipo muito semelhante, muitas vezes com dilatação das 4 câmaras cardíacas. Há hipertrofia, fibrose, perda de miócitos, reduz contratilidade do VE e VD, tendência a trombose parietal. Mais de 20 vírus podem causar miocardiopatia dilatada e, em zonas temperadas, é mais comum o Coxsackievirus B. Nas Américas Central e do Sul, a doença de Chagas, provocada por Trypanosoma cruzi, é a causa infecciosa mais comum, embora seja uma causa de somente 10% dos casos de insuficiência cardíaca em estudos recentes. A miocardiopatia dilatada está se tornando progressivamente comum entre pacientes com infecção por HIV ativa. Outras causas incluem taquicardia prolongada, toxoplasmose, tireotoxicose e beribéri. Muitas substâncias tóxicas, especialmente álcool, vários solventes orgânicos, ferro ou íons de metal pesado e certos quimioterápicos (p. ex., doxorrubicina) prejudicam o coração. Ectopia ventricular frequente (> 10.000 batimentos ventriculares prematuros/dia) foi associada à disfunção sistólica do ventrículo esquerdo. O coração fica muito dilatado, globoso (“em moringa”), com paredes afiladas, muita trabeculação e muita fibrose intersticial. Há déficit contrátil global do miocárdio. Branda Destacar Branda de Oliveira de Lima, Turma LVI - MedUnicamp Na avaliação usamos bastante o ECG, extremamente importante. Raras vezes é normal, muitas vezes temos alterações como inversão de onda T, onda Q que representa extensas fibroses no ventrículo esquerdo, bloqueios de ramo, taquicardia sinusal ou supraventricular, fibrilação atrial. ECG com BRE (imagem). A radiografia de tórax também é extremamente útil. Sempre utilizado por baixo custo e fácil realização. Avaliamos o índice cardiotorácico, presença de derrame pleural, congestão pulmonar. Na cardiomegalia tem aumento difuso do índice cardiotorácico. Outro exame muito utilizado é o ecocardiograma. Ele consegue ver alterações cinéticas, da função ventricular, alterações dos fluxos do sangue nas válvulas, alteração tecidual, até disfunção diastólica. Muito fácil de ser feito, extremamente útil. Para os casos em que existe duvida da etiologia da disfunção do VE, a ressonância cardíaca é uma alternativa. Oferece informações sobre a função (maior acurácia que eco) e avalia muito bem a caracterização tecidual. Conseguimos documentar presença de edema, fibrose, padrões de fibrose, perfusão sanguínea e isquemia e, talvez, num futuro próximo, veremos placas de aterosclerose. A característica mais importante da ressonância cardíaca é a avaliação da fibrose que chamamos de Realce Tardio (RT). O Gadolínio é um contraste paramagnético extracelular que se acumula nos tecidos com fibrose e assim conseguimos detectar. Branda Destacar Branda de Oliveira de Lima, Turma LVI - MedUnicamp O RT tem aplicação para diversas etiologias das miocardiopatias. Conseguimos diferenciar entre causas isquêmicas e não isquêmicas. Quando o gadolínio se acumula na região subendocárdica focal (em uma área só da parede) ou de forma transmural evidencia fibrose por causa isquêmica. Os outros padrões de acumulo sugerem miocardiopatia não isquêmica. Para cada uma dessas alterações tem um padrão de fibrose. Branda de Oliveira de Lima, Turma LVI - MedUnicamp • MIOCARDITES Uma causa importante das miocardiopatias dilatadas. Está presente em 12% dos jovens adultos com morte súbita. É causada por infecção direta ou reação imunomediada pós infecção. Geralmente a infecção é viral, mas podem ser outros agentes, como Clamídia, Leptospira, T. cruzi, Toxoplasma. Pode ter causa não infecciosa também, mas é mais rara (tóxicas, radioterapia, mecânica, fármacos). Comum enterovírus e Coxsackie B (>50% dos casos). Outras são: reação de hipersensibilidade a fármacos (penicilina, ampicilina, hidroclorotiazida, metildopa, sulfas), pós radiação, doenças do colágeno (LES). Diagnóstico é por apresentação clinica como dor torácica após quadro gripal, mas sintomas bem inespecíficos ou semelhantes ao IAM ou IC. Precisa de um eletro, vemos alterações no segmento ST, onda T, ondas Q patológicas, BAV, bloqueio de ramos. A função ventricular pode estar normal ou disfunção global ou segmentar. Em disfunção biventricular tem o pior prognóstico e é indicado transplante ou a pessoa morre. Quando tem muita inflamação, coração hiperemiado e com grande infiltrado de células inflamatórias pode ser necessário drogas antiinflamatórias. Bastante inflamado, o coração tem edema. Na doença de chagas tem também inflamação ativa com edema. Na grande maioria das vezes o tratamento de miocardite é tratamento de suporte. Apesar do curso ser benigno, quando tem fibrose os pacientes tem tendência maior de desenvolver eventos vasculares. Evolução desfavorável. • IDIOPÁTICA Quando investigamos todas as causas, mas não identificamos uma causa definida. Só sabemos que nos pacientes com mais de 6% de fibrosehá um risco aumentado de arritmias ventriculares e morte súbita. 2. MIOCARDIOPATIA HIPERTRÓFICA Miocardiopatia hipertrófica (MCH) é uma doença congênita ou adquirida caracterizada por intensa sobrecarga ventricular, com disfunção diastólica, mas sem aumento da pós-carga (p. ex., devido à estenose valvar aórtica, coarctação da aorta ou hipertensão sistêmica). Branda Destacar Branda Destacar Branda de Oliveira de Lima, Turma LVI - MedUnicamp Os sintomas incluem dor torácica, dispneia, síncope e morte súbita. Tipicamente, há sopro sistólico, intensificado pela manobra de Valsalva, no tipo hipertrófico obstrutivo. Efetua-se o diagnóstico por ecocardiografia ou RM cardíaca. O tratamento consiste na prescrição de betabloqueadores, disopiramida e, às vezes, redução química ou remoção cirúrgica da obstrução da via de saída. Miocardiopatia hipertrófica é uma causa comum de morte súbita de atletas jovens. Pode causar síncope sem explicação e pode não ser diagnosticada antes da necropsia. A maioria dos casos de miocardiopatia hipertrófica é herdada. É uma doença cardíaca genética mais comum existente. Prevalência de pelo menos 1:500, não tão rara assim. Distribuição global, em mais de 50 países. Incidência semelhante entre os sexos. Autossômica dominante com penetrância variável e padrão mendeliano. Geralmente familiar, mutação em um dos genes que codificam uma proteína do sarcômero, disco Z ou controladores intracelulares de cálcio. 90% dos pacientes com doença familiar. 10% mutações de novo. O miocárdio é anormal, com desarranjo celular e miofibrilar, embora esse achado não seja específico para miocardiopatia hipertrófica. No fenótipo mais comum, o septo anterior e a parede anterior contínua abaixo da valva aórtica estão intensamente hipertrofiadas e espessadas, com pouca ou nenhuma hipertrofia da parede posterior do ventrículo esquerdo (VE). Pode causar obstrução da via de saída (para aorta). Às vezes ocorre hipertrofia apical isolada; entretanto, pode-se observar praticamente qualquer padrão assimétrico de hipertrofia ventricular esquerda e, em uma pequena minoria de pacientes, observou-se até mesmo uma hipertrofia simétrica. Cerca de dois terços dos pacientes apresentam fisiologia obstrutiva em repouso ou durante exercícios. A obstrução é resultado da impedância mecânica da saída do VE durante a sístole devido ao movimento anterior sistólico (MAS) da valva mitral. Durante esse processo (MAS), a valva mitral e o aparelho valvar são sugados pela via de saída do VE por um efeito de Venturi do fluxo Branda Destacar Branda de Oliveira de Lima, Turma LVI - MedUnicamp sanguíneo de alta velocidade, resultando em obstrução do fluxo e diminuição do débito cardíaco. Também pode ocorrer insuficiência mitral como resultado da distorção do movimento da cúspide pelo MAS da valva mitral. Essa obstrução e insuficiência valvular contribuem para o desenvolvimento dos sintomas relacionados à insuficiência cardíaca. A contratilidade é grosseiramente normal, revelando fração de ejeção normal. Tardiamente, a fração de ejeção eleva-se, pois o ventrículo tem volume pequeno, esvaziando-se quase completamente para manter o DC. A hipertrofia torna a câmara rígida e não complacente (em geral no ventrículo esquerdo), a qual resiste ao enchimento diastólico, elevando a pressão diastólica final e, por essa razão, aumentando a pressão venosa pulmonar. À medida que aumenta a resistência ao enchimento, diminui o débito cardíaco, um efeito piorado pela existência de qualquer gradiente de via de saída. Como a taquicardia proporciona menos tempo para o enchimento, os sintomas tendem a surgir principalmente durante o esforço ou taquiarritmias. O fluxo sanguíneo coronariano pode estar comprometido, acarretando angina de peito, síncope ou arritmias, na ausência de DC epicárdica. Endocardite infecciosa pode complicar a miocardiopatia hipertrófica por causa da alteração da valva mitral e do fluxo sanguíneo rápido pela via de saída durante o início da sístole. Às vezes, o bloqueio AV é uma complicação tardia. Tipicamente, os sintomas surgem entre 20 e 40 anos de idade e estão relacionados a esforços, mas os sintomas podem ser altamente variáveis. Consistem em dor torácica (em geral semelhante à angina típica), dispneia, palpitações e síncope. Como a função sistólica está preservada, raramente há relatos de fadiga. A função diastólica anormal é responsável pela maioria dos sintomas. Síncope pode ocorrer durante esforços porque a obstrução da via de saída piora com o aumento da contratilidade ou por causa de arritmia não sustentada ventricular ou atrial. Síncope é um marcador de aumento do risco de morte súbita. Em pacientes com a forma obstrutiva da miocardiopatia hipertrófica, pode-se ouvir um sopro sistólico do tipo ejetivo que não se irradia para o pescoço. Ouve-se melhor esse sopro na borda esternal esquerda no 3º ou 4º espaço intercostal. É possível auscultar sopro de insuficiência mitral decorrente da distorção do aparelho dessa valva, no ápice. O sopro ejetivo na via de saída do VE na miocardiopatia hipertrófica pode ser intensificado por manobra de Valsalva (que reduz o retorno venoso e o volume diastólico do VE), por medidas que diminuem a pressão aórtica (p. ex., nitroglicerina) ou contração após extrassístole (o que aumenta o Branda de Oliveira de Lima, Turma LVI - MedUnicamp gradiente de pressão da via de saída). A manobra da preensão manual aumenta a pressão aórtica e, por isso, reduz a intensidade do sopro. → Resumo dos achados do Exame Físico: Pulso Arterial: ascensão rápida do pulso arterial, muitas vezes seguida por um segundo pico sistólico tardio (ponta e cúpula ou spike-and-dome). Pulso Jugular Venoso: onda A proeminente que está relacionada com diminuição da complacência do VE. Impulso ventricular (ictus) é forte (hiperimpulsivo) e pode ser duplo ou triplo. Presença de B4 relacionada com hipertrofia. Pode ter sopro típico ouvido na sístole tardia, mais intenso na margem esternal e irradiando- se para as áreas aórtica e mitral. Presente em pacientes com obstrução da via de saída. Manobras fisiológicas e farmacológicas que diminuem a pós-carga (em pé, Vasalva, inalação de nitrito de amilo) aumentam a intensidade do sopro. As manobras que aumentam a pós-carga e o retorno venoso (aganhamento, aperto de mão) reduzem o sopro. É importante tentar diferenciar o sopro se é da obstrução da via de saída ou se é da valva aórtica. Podemos fazer isso comparando a intensidade dos sopros agachado ou em pé. Agachado: aumento do retorno venoso, aumento da distância entre as paredes do ventrículo, se for um sopro das vias de saída ele diminui de intensidade. → Critérios Diagnósticos: suspeitamos de MCH quando tem hipertrofia sem causa direta, a espessura da parede miocárdica excede 2 desvios-padrões para o sexo, idade e superfície corpórea. Se >1,5cm na ausência de causas diretas (como HAS, EAo, doenças infiltrativas); Se >13mm em parentes de pacientes suspeitos; Branda Destacar Branda de Oliveira de Lima, Turma LVI - MedUnicamp Movimento dos folhetos mitrais e obstrução da via de saída. Exames complementares: ECG, ECO, cateterismo e ressonância. O eletro deve ser realizado em todo paciente com suspeita de CMH, frequentemente alterado. Os achados são variáveis: relacionados com alteração no seguimento ST e com sobrecarga ventricular esquerda. SVE, ondas Q profundas > 40ms, distúrbios de condução intraventricular, inversão de onda T, alterações RV, ondas S profundas em V2. Ecocardiograma permite a identificação do aumento do septo e ventrículo. Pode avaliar os fluxos e a presença de obstrução das vias de saída. No cateterismo conseguimos medir as pressões no ventrículo, aorta. Raramente utilizamos o cateterismo, mas em alguns casos sutis utilizamos para esclarecer. A ressonância é muito útil para sabersobre a fibrose (realce tardio). Tem características atípicas, pode ser transmural, acontecer no septo, no ápice. Ocorre em 50% das situações. Pode ser útil para diferenciar essa cardiomiopatia de outras alterações importantes como a hipertrofia do atleta (mas que não tem realce tardio, não tem fibrose). A grande maioria dos pacientes tem evolução benigna, mas em alguns casos precisam de tratamentos específicos como marcapasso, cirurgia. O paciente com obstrução da via de saída tem um prognostico totalmente diferente, sem mais sintomas e precisa tratar essa obstrução. O tratamento principal é cirúrgico: ressecar a projeção do miocárdio que está obstruindo. Morte súbita é uma preocupação importante nos pacientes com essa doença. Em geral são mais em atletas <35 anos com HCM que tem morte súbita. Quando tem mais de 15% de realce tardio tem um risco aumentado de morte súbita. 3. MIOCARDIOPATIAS RESTRITIVAS A cardiomiopatia restritiva (CMR) caracteriza-se por paredes ventriculares não complacentes que resistem ao enchimento diastólico; um (mais comumente o esquerdo) ou ambos os ventrículos podem ser afetados. Os sintomas incluem fadiga e dispneia de esforço. Efetua-se o diagnóstico por ecocardiografia. Com frequência, o tratamento é insatisfatório e direcionado melhor à causa. Às vezes, a cirurgia é útil. A miocardiopatia restritiva é a forma menos prevalente da miocardiopatia. É classificada como: Não obliterante (infiltração miocárdica por substância anormal); Branda de Oliveira de Lima, Turma LVI - MedUnicamp Obliterante (fibrose de endocárdio e subendocárdio); Cada tipo pode ser difuso ou não difuso (quando a doença compromete apenas um ventrículo ou parte de um ventrículo desigualmente). A miocardiopatia restritiva nem sempre é um distúrbio cardíaco primário. Embora a causa geralmente seja desconhecida, pode surgir como consequência de doenças sistêmicos ou genéticas. Algumas doenças que desencadeiam miocardiopatia restritiva também comprometem outros tecidos (p. ex., amiloidose, hemocromatose). Alguns distúrbios infiltrativos do miocárdio também afetam outro tecido cardíaco. Raramente, a amiloidose afeta as artérias coronárias. Sarcoidose e doença de Fabry também podem afetar o tecido da condução nodal. A síndrome de Löffler (uma subcategoria de síndrome hipereosinofílica com comprometimento cardíaco primário), que ocorre nos trópicos, começa como arterite aguda com eosinofilia, seguida por formação de trombo em endocárdio, cordoalhas tendinosas e valvas atrioventriculares, progredindo para fibrose. Espessamento endocárdico ou infiltração miocárdica (às vezes, com morte dos miócitos, infiltração do músculo papilar, hipertrofia miocárdica compensatória e fibrose) pode ocorrer em um dos ventrículos, tipicamente o esquerdo, ou ambos. Consequentemente, as valvas mitral ou tricúspide podem desenvolver disfunção, conduzindo à insuficiência. A insuficiência valvar AV funcional pode ser decorrente de infiltração do miocárdio ou espessamento endocárdico. Se houver comprometimento de tecidos nodais ou de condução, pode ocorrer disfunção do nó sinoatrial (SA) e atrioventricular, causando, algumas vezes, vários graus de bloqueio SA e bloqueio AV. A principal consequência hemodinâmica é a disfunção diastólica, com um ventrículo rígido e não complacente, o comprometimento do enchimento diastólico e a elevação da pressão de enchimento, conduzindo à hipertensão venosa pulmonar. A função sistólica pode deteriorar se a hipertrofia compensatória dos ventrículos infiltrados ou fibrosados for inadequada. Pode haver a formação de trombos murais, resultando em embolias sistêmicas. Sintomas envolvem dispneia por esforço, ortopneia, dispneia paroxística noturna e edema periférico. A fadiga decorre do DC fixo em virtude da resistência ao enchimento ventricular. São comuns arritmias atriais e ventriculares e bloqueio AV; são incomuns angina e síncope. Sinais e sintomas mimetizam muito aqueles da pericardite constritiva. O exame físico detecta precórdio calmo, pulso carotídeo rápido e de pequeno volume, estertores pulmonares e distensão pronunciada das veias do pescoço, com descendente y rápida (ondas venosas jugulares normais). Uma 3ª e/ou 4ª bulha cardíaca (B3, B4) podem ocorrer e precisam ser diferenciadas do estalo precordial da pericardite constritiva. Em alguns casos, pode-se auscultar sopro de insuficiência mitral ou tricúspide, pois a infiltração miocárdica ou endocárdica ou fibrose alteram cordoalhas ou geometria ventricular. Não há pulso paradoxal. • CAUSAS INFILTRATIVAS Formam um grupo importante de causas para miocardiopatias restritivas. Ocorre infiltração do miocárdio e endocárdio. Predomínio da disfunção diastólica (restrição) e IC direita. As principais causas infiltrativas são amiloidose, hemocromatose, sarcoidose, endomiocardiofibrose, pós-irradiação, genética e idiopática. → Amiloidose Branda de Oliveira de Lima, Turma LVI - MedUnicamp Amiloidose é um grupo de condições distintas caracterizadas por deposição extracelular de fibrilas insolúveis compostas de proteínas mal agregadas. Essas proteínas podem se acumular localmente, causando relativamente poucos sintomas, ou se disseminar, envolvendo múltiplos órgãos e provocando graves insuficiências. A amiloidose pode ocorrer de novo ou ser secundária a várias doenças infecciosas, inflamatórias ou malignas. O diagnóstico é feito por biópsia do tecido afetado; a proteína amiloidogênica é tipificada utilizando uma variedade de técnicas imuno-histológicas e bioquímicas. O tratamento varia de acordo com o tipo de amiloidose. No coração, consiste em uma infiltração de proteínas plasmáticas anômalas que causam aumento da espessura do miocárdio, diminuição da função sistólica e fibrose difusa no miocárdio e endocárdio. Esse padrão é bem sugestivo de amiloidose e ocorre mais no idoso. Dentre as complicações estão: distúrbio da condução cardíaca, cardiomiopatia restritiva, baixo débito cardíaco e comprometimento atrial isolado. Na amiloidose sistêmica, proteínas amiloidogênicas na circulação formam depósitos em uma variedade de órgãos. Os principais tipos sistêmicos incluem: AL (amiloidose primária): causada por superexpressão adquirida de cadeias leves de imunoglobulina clonal; AF (amiloidose familiar): causada por hereditariedade de um gene mutante que codifica uma proteína propensa a enovelamento incorreto, mais comumente transtirretina (TTR); Branda de Oliveira de Lima, Turma LVI - MedUnicamp ATTRts (ATTR do tipo selvagem; anteriormente denominada amiloidose sistêmica senil ou ASS): causada por dobramento incorreto de proteínas com acúmulo de TTR do tipo selvavem (ATTR tipo selvagem); AA (amiloidose secundária): causada pela agregação de um reagente de fase aguda, amiloide A sérico. Hoje é fundamental diferenciar a amiloidose de cadeia leve (AL – primária) da transtirretina (AF – familiar), pois o tratamento é totalmente diferente. A de cadeia leve é doença hematológica com tratamento de quimioterapia e eventualmente transplante de medula. A de transtirretina é uma doença hepática, o fígado está produzindo proteína anômala (motivos genéticos ou adquirido). A ressonância tem boa especificidade e sensibilidade para amiloidose, mas não conseguimos diagnosticar os tipos. → Hemocromatose A hemocromatose é outra causa de miocardiopatia restritiva. Ocorre pelo aumento da oferta de ferro que acumula ferro nos tecidos. Isso pode causar ICC (causa comum de óbito na talassemia major). Trata-se de uma cardiomiopatia reversível com a quelação de ferro. O diagnóstico geralmente é atrasado, precisa de exames de imagem e até biópsia. Quando demora o diagnostico retarda o tratamento e altera muito o prognostico. O T2* é uma medida da ressonância que indica a quantidade de ferro nos tecidos. Consegue diagnosticar aumento de ferro no miocárdio, muito ferrodiminui o T2*. Branda de Oliveira de Lima, Turma LVI - MedUnicamp 4. DISPLASIA ARRITMOGÊNICA DO VENTRÍCULO DIREITO Em 1995, a Organização Mundial de Saúde (OMS) incluiu esta afecção entre as cardiomiopatias, ao lado da cardiomiopatia dilatada, hipertrófica e restritiva. Atualmente é chamada de Cardiomiopatia Arritmogênica do Ventrículo Direito. Assim, embora existam entidades distintas que possam evoluir com comprometimento predominante do ventrículo direito, entre as quais pode-se incluir a cardiopatia chagásica crônica, a cardiomiopatia arritmogênica do VD é considerada uma condição específica e bem individualizada do ponto de vista clínico. A cardiomiopatia arritmogênica do ventrículo direito é caracterizada por progressiva infiltração gordurosa e/ou fibrogordurosa de todas as camadas da parede livre do ventrículo direito (VD). Causa arritmias ventriculares, dilatação e disfunção do VD. Não é uma doença rara, em 50% a 80% dos casos têm origem familiar. A C/DAVD se manifesta geralmente dos 30-50 anos em episódios de arritmias ventriculares que podem evoluir para morte súbita. O paciente pode apresentar palpitações, síncope e arritmias ventriculares sintomáticas de origem no VD, desencadeadas por esforço físico. Infelizmente é bem comum parada cardíaca e morte súbita. Essas arritmias podem ser desde ectopias ventriculares isoladas, taquicardia ventricular não- sustentada, até morte súbita por fibrilação ventricular. Branda de Oliveira de Lima, Turma LVI - MedUnicamp O tratamento é implante de cardiodesfibrilador (CDI). Diagnóstico com biopsia e teste genético.
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