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Anestesiologia Farmacologia dos Anestésicos Locais FARMACOCINÉTICA DOS ANESTÉSICOS LOCAIS Absorção: Quando injetados nos tecidos moles, os anestésicos locais exercem uma ação farmacológica sobre os vasos sanguíneos da área. Distribuição: Depois de absorvidos pela corrente sanguínea, os anestésicos locais são distribuídos para todos os tecidos do corpo. A concentração plasmática de um anestésico local em certos órgãos-alvo tem um impacto significativo sobre a toxicidade potencial da substância. O nível sanguíneo do anestésico local é influenciado pelos seguintes fatores: 1. Velocidade de absorção da substância para o sistema cardiovascular 2. Velocidade de distribuição da substância do compartimento vascular para os tecidos (mais rápida em pacientes saudáveis do que naqueles que apresentam comprometimento médico [como insuficiência cardíaca congestiva], levando, assim, a níveis Manual de Anestesiologia Local – 6ª Edição – Malamed 2013 @mariha_fernandes Anestesiologia Farmacologia dos Anestésicos Locais sanguíneos mais baixos nos pacientes saudáveis). 3. Eliminação da substância por vias metabólicas ou excretoras. Os dois últimos fatores reduzem o nível sanguíneo do anestésico local. A velocidade em que o anestésico local é removido do sangue é descrita como a meia-vida de eliminação. Definida de forma simples, a meia-vida de eliminação é o tempo necessário para uma redução de 50% do nível sanguíneo (uma meia-vida = redução de 50%; duas meias-vidas = redução de 75%; três meias-vidas = redução de 87,5%; quatro meias-vidas = redução de 94%; cinco meias-vidas = redução de 97%; seis meias-vidas = redução de 98,5%). Todos os anestésicos locais atravessam com facilidade a barreira hematoencefálica. Eles também atravessam prontamente a placenta e entram no sistema circulatório do feto em desenvolvimento. Metabolismo (Biotransformação, Destoxificação) Uma diferença significativa entre os dois principais grupos de anestésicos locais, os ésteres e as amidas, é o meio pelo qual o organismo transforma biologicamente a substância ativa em uma substância farmacologicamente inativa. O metabolismo (ou biotransformação ou detoxificação) dos anestésicos locais é importante, pois a toxicidade geral da substância depende do equilíbrio entre a velocidade de absorção pela corrente sanguínea no local de injeção e a velocidade em que ela é removida do sangue por meio dos processos de absorção tecidual e de metabolismo. Anestésicos Locais do Tipo Éster Manual de Anestesiologia Local – 6ª Edição – Malamed 2013 @mariha_fernandes Anestesiologia Farmacologia dos Anestésicos Locais Os anestésicos locais do tipo éster são hidrolisados no plasma pela enzima pseudocolinesterase. A velocidade de hidrólise possui um impacto na toxicidade potencial de um anestésico local. Quando o anestésico for hidrolisado rapidamente a toxidade é menor por exemplo a cloroprocaína, e quando mais lento for o nível de toxidades potencialmente será maior, por exemplo a tetracaína. A hidrólise da procaína transforma-se em ácido para-aminobenzoico (PABA), que é excretado em sua forma inalterada na urina, e em álcool dietilamino, que sofre posteriormente biotransformação antes da excreção. As reações alérgicas que ocorrem em resposta aos anestésicos locais do tipo éster geralmente não são relacionadas com a substância original (p. ex., a procaína), mas com o PABA, que é o produto metabólico principal de muitos anestésicos locais do tipo éster. Aproximadamente uma em cada 2.800 pessoas tem uma forma atípica de pseudocolinesterase, que causa uma incapacidade de hidrolisar anestésicos locais do tipo éster e outras substâncias quimicamente relacionadas (p. ex., succinilcolina). Sua presença leva a um prolongamento dos níveis sanguíneos elevados de anestésicos e um aumento do potencial de toxicidade. A succinilcolina é um relaxante muscular de ação curta, comumente empregado durante a fase de indução da anestesia geral. Ela produz parada respiratória (apneia) por um período de aproximadamente 2 a 3 minutos. Em seguida, a pseudocolinesterase plasmática hidrolisa a succinilcolina, fazendo com que seu nível sanguíneo diminua e ocorra o Manual de Anestesiologia Local – 6ª Edição – Malamed 2013 @mariha_fernandes Anestesiologia Farmacologia dos Anestésicos Locais restabelecimento da respiração espontânea. Pessoas que apresentam pseudocolinesterase atípica são incapazes de hidrolisar a succinilcolina em velocidade normal; portanto, a duração da apneia é prolongada. Anestésicos Locais do Tipo Amida O local primário da biotransformação dos anestésicos locais do tipo amida é no fígado. Praticamente todo o processo metabólico ocorre no fígado para a lidocaína, mepivacaína, etidocaína e bupivacaína. A velocidade de transformação entre elas são semelhantes. A prilocaína sofre o metabolismo primário no fígado, com algum metabolismo ocorrendo também possivelmente no pulmão. A articaína, uma molécula híbrida contendo componentes tanto éster quanto amida, é metabolizado tanto no sangue quanto no fígado. Pacientes com fluxo sanguíneo hepático abaixo do habitual (hipotensão, insuficiência cardíaca congestiva) ou função hepática deficiente (cirrose) são incapazes de efetuar a biotransformação dos anestésicos locais do tipo amida em velocidade normal. Essa biotransformação mais lenta acarreta níveis sanguíneos elevados do anestésico e aumento potencial na toxicidade. Metemoglobinemia em pacientes que recebem doses altas de prilocaína. A prilocaína, o composto original, não produz metemoglobinemia, mas a ortotoluidina, um metabólito primário da prilocaína, induz a formação da metemoglobina, que é responsável pela metemoglobinemia. Manual de Anestesiologia Local – 6ª Edição – Malamed 2013 @mariha_fernandes Anestesiologia Farmacologia dos Anestésicos Locais Sinais e sintomas clínicos são observados quando os níveis sanguíneos de metemoglobina se tornam elevados. Excreção: Os rins são os órgãos excretores primários tanto para os anestésicos locais quanto para seus metabólitos. Uma percentagem da dose do anestésico local é excretada inalterada na urina. Essa percentagem varia de acordo com a substância. Apenas pequenas quantidades dos ésteres se apresentam na urina na forma original do composto, pois são quase totalmente hidrolisados no plasma. A procaína aparece na urina como PABA (90%) e 2% na forma inalterada. Até 10% de uma dose de cocaína são encontrados inalterados na urina. As amidas são geralmente encontradas na urina como o composto primário em uma maior percentagem do que os ésteres, principalmente em razão de seu processo de biotransformação mais complexo. Os pacientes com insuficiência renal significativa podem ser incapazes de eliminar do sangue o anestésico local original ou seus principais metabólitos, resultando em um ligeiro aumento dos níveis sanguíneos desse composto e, portanto, em aumento no potencial de toxicidade. Isso pode ocorrer tanto com ésteres quanto com amidas e é especialmente provável com a cocaína. Portanto, doenças renais significativas (ASA 4 ou 5) constituem contraindicação relativa à administração de anestésicos locais. Isso inclui pacientes que se submetem à diálise e aqueles portadores de glomerulonefrite ou pielonefrite crônica. AÇÕES SISTÊMICAS DOS ANESTÉSICOS LOCAIS Manual de Anestesiologia Local – 6ª Edição – Malamed 2013 @mariha_fernandes Anestesiologia Farmacologia dos Anestésicos Locais Os anestésicos locais são compostos químicos que bloqueiam demaneira reversível os potenciais de ação em todas as membranas excitáveis. O sistema nervoso central (SNC) e o sistema cardiovascular (SCV) são, portanto, particularmente suscetíveis a suas ações. A maioria das ações sistêmicas dos anestésicos locais é relacionada com seu nível sanguíneo ou plasmático no órgão- alvo (SNC, SCV). Quanto maior o nível, mais intensa será a ação clínica. Sistema Nervoso Central Os anestésicos locais atravessam facilmente a barreira hematoencefálica. Sua ação farmacológica no SNC é a depressão. Em níveis sanguíneos baixos (terapêuticos, não tóxicos), não ocorrem efeitos clinicamente significativos no SNC. Em níveis mais altos (tóxicos, superdosagem), a manifestação clínica primária é a convulsão tônico-clônica generalizada. Propriedades Anticonvulsivantes: Alguns anestésicos locais (p. ex., procaína, lidocaína, mepivacaína, prilocaína, até mesmo a cocaína) têm demonstrado propriedades anticonvulsivantes. Sistema Cardiovascular Os anestésicos locais têm ação direta no miocárdio e na vasculatura periférica. Entretanto, em geral, o sistema cardiovascular parece ser mais resistente aos efeitos de substâncias anestésicas locais do que o SNC. Ação Direta no Miocárdio Os anestésicos locais modificam os eventos eletrofisiológicos que ocorrem no miocárdio de maneira semelhante às suas ações nos nervos periféricos. À medida que aumenta o nível Manual de Anestesiologia Local – 6ª Edição – Malamed 2013 @mariha_fernandes Anestesiologia Farmacologia dos Anestésicos Locais sanguíneo de anestésico local, a velocidade de elevação de várias fases da despolarização miocárdica diminui. Não há alterações significativas no potencial de membrana em repouso e não há prolongamento significativo das fases de repolarização. Os anestésicos locais produzem depressão do miocárdio que está relacionada com o nível sanguíneo do anestésico local. Os anestésicos locais diminuem a excitabilidade elétrica do miocárdio, a velocidade de condução e a força de contração. Essa ação depressora é utilizada como vantagem terapêutica no tratamento do miocárdio hiperexcitável, que se manifesta como várias arritmias cardíacas. somente a procaína e a lidocaína apresentam segurança clínica significativa em humanos. Ação Direta na Vasculatura Periférica A cocaína é o único anestésico local que produz vasoconstrição de maneira consistente nas doses comumente empregadas. A ropivacaína causa vasoconstrição cutânea, enquanto sua congênere, a bupivacaína, produz vasodilatação. Todos os outros anestésicos locais produzem vasodilatação periférica pelo relaxamento da musculatura lisa das paredes dos vasos sanguíneos. Isso resulta em aumento do fluxo sanguíneo de entrada e saída do local da deposição do anestésico local. O aumento no fluxo sanguíneo local eleva a velocidade de absorção da substância, o que leva, por sua vez, à diminuição da profundidade e da duração da ação anestésica local, ao aumento do sangramento na área de tratamento e à elevação dos níveis sanguíneos do anestésico local. Manual de Anestesiologia Local – 6ª Edição – Malamed 2013 @mariha_fernandes Anestesiologia Farmacologia dos Anestésicos Locais O efeito primário dos anestésicos locais sobre a pressão arterial é a hipotensão. A procaína o índice é maior do que a lidocaína para a hipotensão. Essa ação é produzida por depressão direta do miocárdio e relaxamento da musculatura lisa das paredes dos vasos pelo anestésico local. Em resumo, os efeitos negativos no sistema cardiovascular não são observados até que haja elevação significativa dos níveis sanguíneos dos anestésicos locais. A sequência habitual das ações induzidas pelos anestésicos locais no sistema cardiovascular é a seguinte: Manual de Anestesiologia Local – 6ª Edição – Malamed 2013 @mariha_fernandes Anestesiologia Farmacologia dos Anestésicos Locais 1. Em níveis abaixo da superdosagem, há um pequeno aumento ou nenhuma alteração na pressão arterial em razão do aumento do débito cardíaco e da frequência cardíaca, como consequência do estímulo da atividade simpática; há também vasoconstrição direta de alguns leitos vasculares periféricos. 2. Em níveis próximos, porém ainda abaixo da superdosagem, observa-se grau leve de hipotensão; isso é causado pela ação relaxante direta sobre o músculo liso vascular. 3. Em níveis de superdosagem, há acentuada hipotensão, causada pela diminuição da contratilidade do miocárdio e redução do débito cardíaco e da resistência periférica. 4. Em níveis letais, é observado colapso cardiovascular. Isso é causado pela vasodilatação periférica maciça e diminuição da contratilidade do miocárdio e da frequência cardíaca (bradicardia sinusal). 5. Alguns anestésicos locais, como bupivacaína (e em menor grau ropivacaína e etidocaína) podem precipitar fibrilação ventricular potencialmente fatal. Manual de Anestesiologia Local – 6ª Edição – Malamed 2013 @mariha_fernandes
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