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Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Elisa Ferreira CLE 2013/2017 nº 5841 1 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Índice Aula de apresentação ................................................................................................. 5 Módulo I ........................................................................................................................... 6 Introdução Farmacocinética e vias de administração de medicamentos ... 21 Passagem de fármacos através de membranas celulares ........................... 22 Vias de administração de medicamentos, formas farmacêuticas e absorção ................................................................................................................ 26 Vias de administração e biodisponibilidade .................................................... 38 Introdução Farmacocinética ................................................................................. 39 Distribuição ............................................................................................................ 39 Metabolização ...................................................................................................... 43 Excreção ................................................................................................................ 50 Farmacodinâmica ................................................................................................... 54 Interações medicamentosas .................................................................................. 63 Terapêutica medicamentosa em grupos populacionais específicos ............. 72 Uso de medicamentos por grávidas ................................................................. 72 Medicamentos nas crianças .............................................................................. 78 Medicamentos na Pessoa Idosa ........................................................................ 83 Reações Adversas a Medicamentos (Seminário) ................................................... 88 Classificação das RAM’s (Rawlin & Thompson, 1991) ..................................... 91 Farmacovigilância e Notificação Espontânea (Seminário) .................................. 96 RAM por grupo farmacoterapêutico (Seminário) ................................................ 116 Anti-infeciosos ......................................................................................................... 116 Sistema nervoso ...................................................................................................... 117 Sistema cardiovascular ......................................................................................... 118 Sistema sanguíneo ................................................................................................. 119 Sistema respiratório ................................................................................................ 120 Sistema digestivo .................................................................................................... 121 Sistema endócrino.................................................................................................. 122 Anti-inflamatórios, antigotosos, bifosfonatos ...................................................... 123 Antineoplásicos e imunomoduladores ............................................................... 124 Reacções adversas a vacinas (Seminário) ............................................................ 126 Reacções alérgicas e anafilácticas (Seminário) .................................................. 135 Sistema Imunológico .............................................................................................. 135 2 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Reações Alérgicas ................................................................................................. 136 Reacções anafilácticas ........................................................................................ 139 Aula teórico-prática nº 1 e 2 .................................................................................... 141 Aula teórico-prática nº 3 e 4 .................................................................................... 143 Fontes de informação de medicamentos na prática de enfermagem ....... 143 Aula OT 1 e 2 ............................................................................................................... 158 Módulo II – Vacinas e medicamentos anti-infecciosos........................................ 160 Imunização: conceitos chave .......................................................................... 160 Classificação das vacinas e seus constituintes .................................................. 161 Administração de vacinas: aspetos clínicos ...................................................... 166 Módulo II : Antibacterianos ...................................................................................... 170 Terapêutica anti-infecciosa: introdução ............................................................ 170 I. Inibição da síntese da parede bacteriana ................................................ 181 II. Alteração da síntese dos ácidos nucleicos ................................................ 191 III. Inibidores da síntese proteica ................................................................... 194 VANCOMICINA (Glicopéptidos) .......................................................................... 200 Módulo II : Antifúngicos ............................................................................................. 213 Polienos .................................................................................................................... 219 Azóis .......................................................................................................................... 223 Imidazóis .................................................................................................................. 225 Triazóis 1ª geração ................................................................................................. 228 Triazóis 2ª geração ................................................................................................. 230 Alilaminas ................................................................................................................. 233 Equinocandinas ...................................................................................................... 234 Pirimidina .................................................................................................................. 236 Módulo II : Antituberculosos ..................................................................................... 239 Isoniazida ................................................................................................................. 242 Rifampicina ............................................................................................................. 243 Etambutol ................................................................................................................ 243 Pirazinamida ............................................................................................................ 244 Rifabutina e Rifapentina........................................................................................ 244 Cicloserina ............................................................................................................... 248 Etionamida .............................................................................................................. 248 Estreptomicina ........................................................................................................ 249 3 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Aminoglicosídeos ...................................................................................................249 Capreomicina ......................................................................................................... 250 Ácido Para-Aminosalicílico (PAS)......................................................................... 250 Quinolonas .............................................................................................................. 251 Módulo II : Anti-retrovirais .......................................................................................... 257 Vírus da Imunodeficiência Humana (VIH) .......................................................... 259 Terapêutica anti-retroviral ..................................................................................... 261 Nucleósidos Inibidores da Transcriptase Reversa .............................................. 269 Não Nucleósidos Inibidores da Transcriptase Reversa ..................................... 271 Inibidores da Protease ........................................................................................... 273 Inibidores da Integrase .......................................................................................... 275 Antagonistas dos correceptores CCR5 ............................................................... 277 Inibidores da Fusão ................................................................................................ 279 Aula teórico-prática 5 e 6 ......................................................................................... 285 Módulo III : Aparelho locomotor .............................................................................. 288 Antiinflamatórios não-esteróides (AINE) .............................................................. 297 Fármacos usados no tratamento da gota ......................................................... 301 Módulo IV- Hormonas e medicamentos utilizados no tratamento de doenças endócrinas .................................................................................................................. 304 Corticosteróides e anticoncepcionais ................................................................ 304 Corticosteróides .................................................................................................. 304 Hormonas sexuais: anticoncecionais .............................................................. 311 Módulo IV: Tratamento Farmacológico da Diabetes mellitus ............................ 319 Aula teórico-prática nº 7 e 8 .................................................................................... 340 Módulo V - Aparelho Cardiovascular ..................................................................... 343 Hipertensão Arterial................................................................................................ 343 Selecção da Terapêutica ..................................................................................... 371 Antidislipidémicos ................................................................................................... 373 Anti anginosos ......................................................................................................... 383 Antiarrítmicos .......................................................................................................... 390 Aula teórico-prática 9 e 10 ....................................................................................... 401 Módulo VI – Sangue ................................................................................................... 405 Módulo VII - Aparelho Respiratório .......................................................................... 421 Módulo VIII - Sistema Nervoso Central .................................................................... 434 4 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Anestésicos locais ................................................................................................... 434 Paracetamol ........................................................................................................... 439 Analgésicos estupefacientes ............................................................................... 444 Tratamento Farmacológico da Depressão e Psicose ...................................... 452 Aula teórico-prática 11 e 12 ..................................................................................... 467 Módulo IX - Aparelho digestivo ................................................................................ 471 Modificadores da secreção gástrica.................................................................. 474 Orientação tutorial : Aula 3 e 4 ................................................................................ 482 Modificadores da motilidade gastrointestinal ................................................... 484 Laxantes ............................................................................................................... 484 Procinéticos ......................................................................................................... 492 Módulo X - Medicamentos antineoplásicos e imunomoduladores ................... 496 Imunomodeladores ................................................................................................ 517 Hormonas ................................................................................................................ 521 Tratamento das neoplasias Aspectos mais relevantes para enfermagem Monitorização de efeitos secundários ................................................................ 524 Aula teórico-prática 13 e 14 ..................................................................................... 537 5 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Aula de apresentação Contribuir para a aquisição de conhecimentos que permitam a gestão efetiva e segura da terapêutica medicamentosa ao longo do ciclo de vida, no âmbito das funções do enfermeiro. Dispensa Administração Monitorização Prescrição Processo do uso do medicamento 6 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 cirurgia fisioterapia radioterapia psicoterapia Exemplo de outras formas de tratamento Módulo I Farmacologia Ramo da Ciência que estuda os fármacos – Abrange um vasto leque de conhecimentos, como: • Origem dos fármacos • Ações que provocam no corpo humano e mecanismos pelos quais atuam • Absorção, distribuição, biotransformação e excreção dos fármacos • Efeitos terapêuticos e adversos 1.1Introdução à Farmacologia Medicamento Toda a substância ou associação de substâncias apresentada como possuindo propriedades curativas ou preventivas de doenças em seres humanos ou dos seus sintomas ou que possa ser utilizada ou administrada no ser humano com vista a estabelecer um diagnóstico médico ou, exercendo uma acção farmacológica, imunológica ou metabólica, a restaurar, corrigir ou modificar funções fisiológicas Fármaco versus medicamento Terapêutica medicamentosa • Ramo da ciência que estuda o tratamento das doenças com o auxílio de medicamentos – ex: – Indicações – Contra-indicações – Reacções adversas • Sinónimo de Farmacoterapia Fármaco é um agente químico que modifica as funções dos seres vivos 7 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Matéria prima qualquer substância, activa ou não, e qualquer que seja a sua origem, empregue na produção de um medicamento, quer permaneça inalterável quer se modifique ou desapareça no decurso do processo” Excipiente qualquer componente de um medica- mento, que não a substância ativa e o material da embalagem Matérias-primas Denominação comum designação comum internacional recomendada pela Organização Mundial de Saúde para substâncias ativas de medicamentos (DCI), de acordo com regras definidas e que nãopode ser objeto de registo de marca ou de nome Nome do medicamento designação do medicamento, a qual pode ser constituída por uma marca insusceptível de confusão com a denominação comum, pela denominação comum acompanhada de uma marca ou pelo nome do requerente ou do titular da autorização substância(s) ativa(s) excipientes Medicamento Denominação Comum Internacional (DCI) Nome do medicamento Forma farmacêutica Dosagem Apresentação Classificação quanto à dispensa 8 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Denominação comum internacional: exemplo de regras úteis Prefixo, infixo, sufixo em português Definição adol ou -adol- Analgésicos (ex. tramadol) -lucaste Antagonistas dos receptores dos leucotrienos (ex. montelucaste) -caína Anestésicos locais (ex. lidocaína) -coxib Inibidores selectivos da cicloxigenase (ex. celecoxib) -filina Derivados xantínicos N-metilados (ex. teofilina) gli- Sulfamidas hipoglicemiantes (ex. glibenclamida) -grel- ou -grel Inibidores da agregação plaquetária (ex. clopidogrel) -cireno Inibidores da renina (ex. aliscireno) -oxetina Antidepressivos, derivados da fluoxetina (ex. paroxetina) -prazol Anti-ulcerosos, derivados do benzimidazol (ex. omeprazol) Forma farmacêutica - Estado final que as substâncias activas ou excipientes apresentam depois de submetidas às operações farmacêuticas necessárias, a fim de facilitar a sua administração e obter o maior efeito terapêutico desejado; Exemplos de nome do medicamento DCI + marca/nome do requerente Marca insusceptível de confusão com DCI Apresentação - Dimensão da embalagem tendo em conta o número de unidades Dose - Quantidade determinada de um medicamento ou agente terapêutico que se administra de uma só vez ou durante um dia Dosagem - Teor de substância activa, expresso em quantidade por unidade de administração ou por unidade de volume ou de peso, segundo a sua apresentação 9 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 1.2 Origem dos fármacos para medicamentos de uso humano Origem dos medicamentos Atualmente os fármacos são fabricados em laboratório: – Síntese química • Produzidos através de reações químicas (transformação da estrutura de moléculas originais, resultando em novas moléculas) – Síntese biológica (ou biotecnologia) • Produzidos a partir de microrganismos vivos, como bactérias ou fungos (ex. tecnologia do DNA recombinante) • Geralmente moléculas complexas de alto peso molecular Extracção do ópio a partir da papoila, antes do advento da síntese de fármacos 10 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Pesquisa e desenvolvimento do fármaco Fase pré-clinica Fase clínica Aprovação pela entidade reguladora Farmacovigilância Do desenvolvimento de novos fármacos ao medicamento Custo médio de desenvolvimento: USD 800 mil milhões a 1 bilião Fase pré-clínica • Realizados em animais ou in vitro • Permitem conhecer as características do medicamento e risco de toxicidade – Estudos farmacológicos - Fornecem indicações sobre o potencial terapêutico do medicamento, mecanismo de ação, entre outros aspetos – Estudos farmacocinéticos - Fornecem indicações sobre a absorção, distribuição, metabolismo e excreção da substância ativa, entre outras, nos animais. – Estudos toxicológicos - Fornecem indicação sobre aspetos como toxicidade aguda, toxicidade subaguda, sub-crónica e crónica, mutagenicidade, carcinogenicidade, toxicidade sobre a função reprodutora e risco de malformações fetais 3 a 6 anos 6 a 7 anos 7 an Patente pós-comercialização: 11 anos Tempo médio 11 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Medicamento experimental “A forma farmacêutica de uma substância ativa ou placebo, testada ou utilizada como referência num ensaio clínico, incluindo os medicamentos cuja introdução no mercado haja sido autorizada mas que sejam utilizados ou preparados, quanto à forma farmacêutica ou acondicionamento, de modo diverso da forma autorizada, ou sejam utilizados para uma indicação não autorizada ou destinados a obter mais informações sobre a forma autorizada” Alínea mm), Nº1, Artigo 3º, Estatuto do Medicamento) Ensaios clínicos em Portugal (2014) Fase Nº de ensaios Nº total de doentes envolvidos I 14 9759 II 62 III 253 IV 22 Fonte: Infarmed Ensaios clínicos (Fase I) • Duração média de 1 ano • Administração de doses crescentes do fármaco a voluntários saudáveis (20 a 100 indivíduos) • Direccionada para a segurança e perfil farmacológico – Identificação de efeitos secundários – Determinação da relação dose-efeito, duração, propriedades farmacocinéticas, etc Nota: No caso de medicamentos antineoplásicos e fármacos para os quais se antecipam efeitos adversos graves (ex. SIDA) estuda-se a fase I em conjunto com a fase II 12 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Ensaios clínicos (Fase II) • Duração média de 2 anos • Efectuada em voluntários que apresentam a doença (100 a 500 indivíduos) para a qual o medicamento foi desenvolvido o O desenho do estudo pode contemplar aumento gradual da dose o Os doentes podem ser integrados de forma sequencial • Pretende verificar a eficácia do medicamento • Determinação da dose ótima, da eficácia absoluta, efeitos adversos, entre outros Ensaios clínicos (Fase III) • Duração média superior às fases anteriores • Pretende-se avaliar novamente a eficácia e a segurança do medicamento numa população maior – Aleatorização – Controlo (contra placebo ou comparador) – Ocultação • Realiza-se em voluntários doentes (1000 a 5000 indivíduos), selecionados de acordo com critérios rigorosos – Normalmente efetuados em vários países em simultâneo 13 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Aprovação pela entidade reguladora • Apreciação do dossiê de Autorização de Introdução no Mercado, com recurso a peritos internos e externos – Nível nacional: Infarmed IP – Nível Europeu: agências de outros estados membros ou agência europeia do medicamento – EMA • O proponente deverá fornecer dados sobre a qualidade do medicamento, a sua eficácia e segurança • A informação sobre medicamentos aprovados está disponível em dois documentos oficiais: – RCM (Resumo das Características do Medicamento) – Folheto Informativo RCM 1. Nome do medicamento 2. Composição qualitativa e quantitativa 3. Forma farmacêutica 4. Informações clínicas 5. Propriedades farmacológicas 6. Informações farmacêuticas 7. Titular de AIM 8. Nºs AIM 9. Data da 1ª AIM/renovação 10. Data da revisão do texto 14 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Dose • Quantidade determinada de um medicamento que se administra, de uma só vez ou durante um dia, ao doente Nota: a dosagem é um atributo que diz respeito ao medicamento, e não a quem o utiliza Posologia • Inclui a dose e outros elementos, como a frequência de administração (ex. 1 vez por dia, de 6 em 6 horas) • Pode conter elementos como: – Dose máxima diária ou total – Necessidade de titular a dose ou conselhos respeitantes à cessação do tratamento – Duração normal do tratamento e restrições à duração do tratamento – Toma com alimentos e/ou bebidas 15 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Circuito do medicamento de uso humano Farmacovigilância Estudo da segurança dos medicamentos na fase decomercialização, sob as condições de utilização na prática clínica, na comunidade (Mann, 2002) – Por vezes designada por ensaios de fase IV • Assenta principalmente na notificação espontânea de reações adversas – Responsabilidade do titular de AIM, profissionaisde saúde e doente – Tutela da entidade reguladora – Diretiva comunitária sobre farmacovigilância transposta para o direito nacional pelo DL nº 20/2013, de 14 de fevereiro 16 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Ensaios clínicos (Fase IV) • Decorrem após a comercialização do medicamento • Permitem avaliar a segurança em grupos de maiores dimensões e em doentes que não foram elegíveis em ensaios anteriores (ex. idosos, polimedicados) Utilização de medicamentos “off-label” • Consiste na utilização de medicamentos fora das indicações aprovadas, ou efetuada em populações não estudadas (ex. pediátricas) ou em vias de administração e doses não aprovadas – Ex. orlistato para emagrecimento em indivíduos com IMC < 28 kg/m2 e sem fatores de risco associados, topiramato (antiepilético) para tratamento da dor neuropática • Permite acesso a medicamentos quando não existe um tratamento eficaz aprovado (ex. pediatria, doenças raras) ou quando se esgotaram as opções aprovadas • Acarreta geralmente aumento do risco (perfil de segurança fora das condições aprovadas pode ser desconhecido) • Deve ser fundamentado por evidência científica de boa qualidade e precedido de consentimento informado do doente Uso compassivo de medicamentos • Acesso a um medicamento sem AIM por doentes com patologias crónicas ou debilitantes ou que coloquem a vida em risco, quando não podem ser tratados satisfatoriamente com medicamentos aprovados e não é exequível aguardar até que o medicamento esteja disponível no mercado – O medicamento deve estar em processo de requerimento de AIM ou em ensaios clínicos • Só são elegíveis para o uso compassivo doentes que não participem em ensaios clínicos – Após conclusão dos ensaios clínicos é garantido o uso compassivo gratuito desde que o investigador considere indispensável a continuação da utilização do medicamento e não existam alternativas de eficácia e segurança equiparáveis 17 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Trabalho autónomo Na base de dados Infomed pesquise o medicamento Ben-u-ron: – Indique as formas farmacêuticas disponíveis – Indique as dosagens disponíveis – Com base no resumo das características do medicamento do Ben-u-ron 500 mg comprimidos responda às seguintes questões: • Como se classifica o medicamento face à dispensa? • Face à lista de excipientes considera o medicamento indicado para indivíduos intolerantes à lactose? Justifique. • Qual é a posologia recomendada? • Qual é a dose diária máxima recomendada? – Indique a classificação ATC do medicamento Ben-u-ron 500 mg comprimidos 18 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 1.3 Classificação dos medicamentos Classificação dos medicamentos quanto à dispensa • Medicamentos sujeitos a receita médica – Medicamentos de receita médica renovável – Medicamentos de receita médica especial – Medicamentos de receita médica restrita, de utilização reservada a certos meios especializados • Medicamentos não sujeitos a receita médica – MNSRM dependentes de dispensa exclusiva em farmácia Classificação dos medicamentos Com base na estrutura química o Têm em comum a mesma estrutura Penicilinas Opiáceos Com base no efeito farmacológico o Analgésicos o Antipsicóticos o Antidepressores • Por local de acção o Agrupados de acordo com a enzima ou o receptor onde interagem – ex: IECA Anticolinérgicos 19 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Classificação ATC Publicada pela OMS em 1976 Classifica os fármacos de acordo com o órgão ou sistema em que atuam, as suas propriedades terapêuticas e químicas, para um determinada indicação ou uso o Um fármaco pode ter mais do que um código ATC Ácido Acetilsalicílico 100 mg: B01AC06 Ácido Acetilsalicílico 500 mg: N02BA01 EXEMPLO: Ácido Acetilsalicílico 100 mg: B01AC 1º nível: uma letra, grupo anatómico (B: blood and blood forming organs | nervous system) 2º nível: dois algarismos. Principal grupo terapêutico 3º nível: uma letra. Grupo farmacológico 4º nível: uma letra. Grupo químico : dois números. Substância química Classificação farmacoterapêutica (CFT) de medicamentos • É a classificação de medicamentos oficial em Portugal – Despacho nº 21 844/2004, de 12 de Outubro (2ª série) • Abrange: – Processos para a autorização de introdução no mercado de medicamentos – Sistema de comparticipação de medicamentos – Todas as publicações do INFARMED IP, nomeadamente o Formulário Hospitalar Nacional de Medicamento e o Prontuário Terapêutico de Medicamentos 20 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Trabalho autónomo: Consulte o Prontuário Terapêutico na sua edição atual – Liste os grupos da classificação Farmacoterapêutica 1. Medicamentos Anti-infecciosos 2. Sistema Nervoso Central 3. Aparelho Cardiovascular 4. Sangue 5. Aparelho Respiratório 6. Aparelho digestivo 7. Aparelho geniturinário 8. Hormonas e medicamentos usados no tratamento das doenças endócrinas 9. Aparelho locomotor 10. Medicação antialérgica 11. Nutrição 12. Correctivos da volemia e das alterações electrolíticas 13. Medicamentos usados em afecções cutâneas 14. Medicamentos usados em afeções otorrinolaringológicas 15. Medicamentos usados em afecções oculares 16. Medicamentos antineoplásicos e imunomoduladores 17. Medicamentos usados no tratamento de intoxicações 18. Vacinas e imunoglobulinas 19. Meios de diagnóstico 20. Material de penso, hemostáticos locais, gases medicinais e outros produtos – Identifique o grupo e subgrupo farmacoterapêutico a que pertence o paracetamol -Grupo 2 - Sistema Nervoso Central - 2.10. Analgésicos e antipiréticos 21 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Introdução Farmacocinética e vias de administração de medicamentos Ciclo geral dos fármacos no organismo Farmacocinética • Estudo do percurso dos fármacos e/ou seus metabolitos no organismo: – bsorção: passagem do fármaco do local de administração para a corrente sanguínea – istribuição: transferência reversível do fármaco da corrente sanguínea para o espaço extravascular (fluidos corporais, órgãos e tecidos) – etabolismo: alteração da estrutura química do fármaco no organismo – xcreção: Saída do fármaco ou dos seus metabolitos para o exterior do organismo A farmacocinética estuda aspetos como: • A passagem dos fármacos através das membranas celulares • As concentrações dos fármacos nos compartimentos biológicos (em particular plasma) ao longo do tempo • Os processos individuais de absorção, distribuição, metabolismo e excreção • As vias de administração e posologia (dose e intervalos de administração) Farmacocinética é o que o organismo faz ao fármaco 22 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Passagem de fármacos através de membranas celulares Epitélios e endotélios como barreiras ao movimento dos fármacos • Os fármacos entram em contacto com o organismo por várias formas (vias de administração) • A maior parte atua em determinadas células, através da alteração de processos bioquímicos • Geralmente os fármacos têm que “viajar” do local onde são administrados até às células onde vão atuar, atravessando membranas celulares – Características dos epitélios e endotélios influenciam o movimento dos fármacos no organismo 23 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Passagem dos fármacos através das membranas celulares • É um pré-requisito para absorção dos fármacos e para a sua entrada nas células onde vão atuar • Na maioria dos casos ocorre por: – Difusão passiva – Transporte mediadoPor norma a passagem de fármacos faz-se através das células e não através dos espaços intercelulares 24 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Características físico-químicas dos fármacos e transporte através das membranas celulares • Eletrólitos (ex. ácido acetilsalicílico) – Ionizam-se em grau variável, de acordo com o pH do meio – No organismo existem compartimentos com diferentes pH (ex. lúmen estômago, plasma) – As moléculas não ionizadas são geralmente mais lipossolúveis (e como tal conseguem-se difundir melhor através das membranas celulares); as moléculas ionizadas são mais hidrossolúveis (menor facilidade em atravessar as membranas celulares) • Substâncias incapazes de se ionizarem, independentemente do pH do meio (ex. digoxina, hormonas esteroides) – Substâncias não polares (ou apolares), maior lipossolubilidade • Substâncias permanentemente ionizadas, independentemente do pH do meio (ex. heparina, ipratrópio) – Substâncias polares, maior hidrossolubilidade Características dos farmacos que influenciam o transporte através das membranas celulares •Características fisico-quimicas •Tamanho da molécula 25 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Difusão passiva • Ocorre a favor de um gradiente de concentração e sem consumo de energia • Não é saturável • Não é inibido por outras moléculas • Envolve a passagem através de: – Poros aquosos (substâncias hidrófilicas e de baixo peso molecular) – Difusão através da membrana lipídica (processo mais generalizado) – depende: • Permeabilidade do fármaco (coeficiente de partição óleo/água e tamanho da molécula) • Se eletrólito, grau de ionização do fármaco face ao pH do meio Transporte mediado • Utiliza transportadores fisiológicos (proteínas integrais da membrana plasmática) • Ocorre: – A favor do gradiente de concentração e sem consumo de energia (difusão facilitada) ou – Contra gradientes de concentração, com gasto de energia (transporte ativo) – ex ATPase Na+/K+ • Caracteriza-se por ser seletivo, competitivo e saturável • Importante para: – Moléculas com baixa permeabilidade na membrana celular e/ou – Moléculas de maiores dimensões 26 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Vias de administração de medicamentos, formas farmacêuticas e absorção Vias de administração e absorção • A velocidade e extensão da absorção dependem não apenas das características físico-químicas do fármaco, tamanho molecular e solubilidade nos fluidos corporais mas também: – Da forma farmacêutica – De fatores fisiológicos e/ou patológicos • Irrigação sanguínea do local de absorção • Superfície para absorção • Espessura da estrutura absorvente • Tempo de contacto no local de absorção Vias de administração de medicamentos • É a forma pela qual o medicamento entra em contacto com o organismo • Tradicionalmente divididas em: – Entérica (utiliza o trato GI, inclui a administração através de sonda nasogástrica) – Parentérica (não utiliza a via digestiva, geralmente associada a administração de injetáveis) – Tópica (administração feita diretamente sobre a pele ou mucosas) • A administração entérica nem sempre pretende um efeito sistémico e a tópica nem sempre visa um efeito local 27 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Via oral É a ingestão de um medicamento por deglutição • Pretende-se geralmente efeito sistémico, mas existem exceções – Ex: administração de vancomicina por via oral para tratamento da colite pseudomembranosa causada por Clostridium difficile • Formas farmacêuticas utilizadas – Formas farmacêuticas orais sólidas – exs: • Comprimido, cápsula, cápsula mole, granulado – Formas farmacêuticas orais líquidas – exs: • Xarope, solução oral, emulsão oral, suspensão oral, gotas orais (solução, suspensão ou emulsão) atenção a prazo de utilização depois da abertura da embalagem! Via oral: fatores fisiológicos que influenciam a absorção • Superfície para absorção – Quanto maior for a área para absorção maior é a sua velocidade • A superfície do estômago tem uma área pequena, em comparação com o intestino delgado (vilosidades e microvilosidades fornecem área para absorção de cerca de 200 m2) • Espessura da estrutura absorvente – Por norma a absorção é mais rápida através de um mucosa fina • A mucosa gástrica apresenta maior espessura que a do intestino delgado • Tempo de contacto no local de absorção – Quanto maior o tempo de contacto com a superfície absorvente maior a velocidade de absorção • Há zonas pelas quais o medicamento “passa” tão depressa que não é possível qualquer absorção significativa (ex. esófago) •Dado que a absorção no trato GI ocorre maioritariamente por difusão passiva é de esperar que fármacos não ionizados e mais lipossolúveis sejam mais facilmente absorvidos • Com base no grau de ionização os ácidos fracos deveriam ser melhor absorvidos no estômago (pH 1,5) que no intestino delgado (pH entre 3 e 7,4) – Vice-versa para bases fracas • Contudo, devido à superfície para absorção e fraca espessura do epitélio, a absorção é sempre mais significativa no intestino delgado do que no estômago (mesmo para fármacos com maior grau de ionização) 28 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 A absorção de fármacos por via oral ocorre maioritariamente no intestino delgado. Via oral: fatores fisiológicos/patológicos que influenciam a absorção • Independentemente das características físico-químicas do fármaco: – Fatores que aceleram o esvaziamento gástrico podem aumentar a velocidade de absorção • Ex. fármacos procinéticos – Fatores que atrasam o esvaziamento gástrico podem reduzir a velocidade de absorção • Ex. presença de alimentos no estômago – O aumento da motilidade intestinal pode reduzir a velocidade/extensão da absorção • Ex. diarreia 29 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Via oral: fatores que influenciam a absorção relacionados com a forma farmacêutica • Para ser absorvido o fármaco tem de dissolver-se no conteúdo do trato GI • No caso de formas farmacêuticas sólidas, é necessária a sua libertação – Regra geral os medicamentos em formulações líquidas são mais rapidamente absorvidos Via oral: absorção e formas farmacêuticas sólidas • A libertação do fármaco depende do tipo de forma farmacêutica – Libertação imediata – Libertação modificada • Prolongada: libertação ao longo do tempo a partir de um “reservatório” • Controlada: ocorre apenas no intestino delgado ou grosso Concentrações plasmáticas de um fármaco ao longo do tempo após administração múltiplas irregulares (? indica tomas omitidas) formulações de libertação prolongada evitam flutuações na concentração plasmática do fármaco e reduzem a frequência da administração, promovendo a adesão à terapêutica 30 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Via oral Vantagens – Conveniente – Não invasiva (o que não significa isenta de riscos) – Adaptável à maioria dos fármacos Limitações •Necessário colaboração do doente • Não adequada em caso de vómitos ou diarreia • Fármacos sujeitos a eliminação pré-sistémica (efeito de primeira passagem) • Em relação à via parentérica: absorção mais lenta e variável Efeito de primeira passagem: metabolização do fármaco antes de atingir a circulação sistémica e sofrer distribuição. Ocorre essencialmente no fígado, mas também no intestino 31 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Riscos da via oral: ulceração esofágica • Idealmente os comprimidos/cápsulas devem ser deglutidas em pé,com o auxílio de um copo cheio de água (cerca de 150 ml) • A ulceração esofágica está particularmente associada a fármacos cáusticos para a mucosa, como doxiciclina e alendronato • Vários fatores podem potenciar a retenção de comprimidos/ cápsulas no esofágo, aumentando o risco de ulceração: – Ingestão insuficiente de líquido – Deglutir cápsulas/comprimidos deitado – Deglutir cápsulas/comprimidos imediatamente antes de dormir (redução da salivação e peristaltismo esofágico) – Idosos (diminuição do peristaltismo esofágico) Sugestões de trabalho autónomo 1. Será que todos os comprimidos podem ser divididos? 32 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Via sublingual É a administração de um medicamento por baixo da língua, para obter um efeito sistémico • Absorção ocorre no epitélio da mucosa sublingual – Superfície para absorção tem área relativamente pequena mas atingem-se elevadas concentrações de fármaco no local de absorção (aumento da velocidade de absorção à efeito rápido) • Pode ser utilizada para administrar fármacos com efeito de primeira passagem marcado (ex. nitroglicerina) • A salivação excessiva pode promover a deglutição do fármaco Via retal É a administração de um medicamento no reto, para obter um efeito local (ex. administração de antiinflamatórios intestinais para tratamento da colite ulcerosa) ou sistémico (ex. administração de diazepam em crianças com status epilético) • Tal como na mucosa gástrica e intestinal, a absorção ocorre fundamentalmente por difusão passiva – Em relação ao intestino delgado: menor superfície para absorção e menor irrigação sanguínea • Absorção pode ser irregular e incompleta – Contacto com a mucosa prejudicado pela presença de fezes • Em média 50% da dose administrada “escapa” ao efeito de primeira passagem hepático • Útil em doentes com vómitos, com dificuldade em deglutir ou incapazes de colaborar (ex: pós-operatório) 33 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Exemplo de formas farmacêuticas: ampolas, frasco para injetáveis • Permite administrar substâncias irritantes para o estômago (ex. indometacina, aminofilina) • Alguns fármacos podem causar irritação local • Formas farmacêuticas utilizadas – exs: supositórios, enemas, creme/pomada retal Administração de injetáveis: vias mais comuns • Subcutânea (SC): injeção de um medicamento diretamente sob a pele (tecido conjuntivo sob a derme) • Intramuscular (IM): injeção de um medicamento no tecido muscular • Intravenosa (IV): injeção de um medicamento numa veia – Bólus (injeção rápida) – Perfusão • Em qualquer dos casos o procedimento de administração é invasivo – Comporta risco de infeção – Requer técnica assética Via intravenosa (IV) • Medicamento colocado diretamente na corrente sanguínea – Obtenção de concentrações fiáveis e previsíveis do fármaco – Início de ação imediato • Permite a administração de volumes mais elevados que a via SC e IM • Minimiza a irritação ou lesão tecidular local (diluição no sangue) • Obvia problemas de insuficiência circulatória • Pode ser utilizada através de um acesso periférico, de forma contínua (perfusão) • Maior risco de incidentes – ex. reações adversas decorrentes de administração rápida, trombose venosa na perfusão prolongada 34 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Via SC e IM: panorâmica Via SC • Só podem ser administradas: -Substâncias não irritantes (sob pena de ocorrer dor intensa e necrose tecidular) -Pequenos volumes (1 a 2 ml para um adulto) • Podem ser usadas soluções ou suspensões aquosas • Exs. de medicamentos administrados por esta via: vacinas, insulina e heparina Via IM • Permite a administração de maiores volumes -Volume máximo depende do local anatómico (músculos de grandes dimensões comportam volumes até 5 ml) • Podem ser administradas soluções/suspensões aquosas ou oleosas • Geralmente menos dolorosa que a via SC Via SC e IM: influência de fatores fisiológicos/patológicos na absorção • Irrigação sanguínea do local de administração é um fator importante – Presença de capilares fenestrados facilita o movimento de fármacos independentemente da sua lipossolubilidade, grau de ionização e, em certa medida, do seu tamanho – Maior intensidade de irrigação sanguínea acelera a absorção • Músculo geralmente mais vascularizado que o tecido subcutâneo Nota: nem todos os músculos são igualmente irrigados (ex. a velocidade de absorção de um fármaco administrado em solução aquosa no deltoide ou vasto lateral é maior do que no glúteo máximo) 35 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 • Intensidade de irrigação pode ser modulada, aumentando a velocidade de absorção – Aplicação de calor (ex. banho quente) ou massagem à promove vasodilatação – Exercício físico (maior irrigação sanguínea aos locais envolvidos) – Associação de um vasoconstritor ao fármaco, quando se pretende efeito local • Indivíduos muito obesos ou com doença vascular oclusiva podem ter absorção mais lenta, devido à redução da perfusão tecidual Via SC e IM: influência da forma farmacêutica na absorção • A velocidade absorção pode ser retardada reduzindo a solubilidade do fármaco no fluido intersticial e o seu gradiente de concentração – Via IM: utilização de soluções ou suspensões oleosas, utilização de misturas de sais com diferentes solubilidades (formulações “depot” ou reservatório) – Via SC: formulação de insulina com protamina ou zinco, implante anticoncecional À esquerda, associação de adrenalina a lidocaína (anestésico local), administrada por via SC, para prolongar a duração da anestesia (menor absorção) 36 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Via transdérmica É a aplicação de um medicamento na pele, de modo a obter um efeito local ou sistémico, após passagem da barreira da pele • Fármaco incorporado num sistema adesivo: – Exs. Hormonas sexuais para contraceção, nitroglicerina para tratamento da angina de peito, AINE para o tratamento da dor músculo-esquelética • Libertação do fármaco é constante a partir do sistema adesivo • Evita-se efeito de primeira passagem • Requer fármacos lipossolúveis e aplicação em pele íntegra • Custo relativamente elevado Via oftálmica É a aplicação de um medicamento sobre o globo ocular e/ ou a conjuntiva • Pretende-se geralmente um efeito local, que requer absorção através da cornea • Pode ocorrer efeito sistémico (indesejado) resultante da absorção por drenagem através do canal nasolacrimal – Ex: broncospasmo em doentes asmáticos, tratados com timolol em gotas oftálmicas para o glaucoma • Formas farmacêuticas utilizadas – exs: – Colírio (solução/suspensão/emulsão), creme oftálmico, pomada oftálmica, gel oftálmico – Importante: formulações estéreis, prazo de utilização limitado 37 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Via inalatória É a aplicação de um medicamento no sistema respiratório por inalação, de modo a obter um efeito sistémico (ex. anestésicos gasosos e voláteis) ou local (ex. salbutamol para tratamento da asma) no trato respiratório inferior. Não inclui a via nasal • Formas farmacêuticas - exs – Inaladores pressurizados com válvula doseadora – Inaladores de pó seco • De dose unitária – ex. Aeroliser • De dose múltipla – ex. Diskus • Na administração de medicamentos antiasmáticos com dispositivos inalatórios a maioria das partículas deposita-se na orofaringe e é deglutida – Pode ocorrer absorção oral, com consequentes efeitos secundários (como tremor após administração de salbutamol por via inalatória) – Ainda assim conseguem-seobter concentrações terapêuticas no local de ação com efeitos sistémicos mínimos 38 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Vias de administração e biodisponibilidade Via Biodisponibilidade* Efeito de primeira passagem (hepático) IV 100% Não IM 75 a ≤ 100% Não SC 75 a ≤ 100% Não Oral 5 a < 100% Sim (pode ser significativo) Retal 30 a < 100% Sim Inalatória 5 a < 100% Não Transdérmica 80 a ≤ 100% Não * Fração de fármaco inalterado que atinge a circulação depois da administração por qualquer via, ficando disponível para distribuição sistémica 39 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Introdução Farmacocinética Distribuição • Transferência reversível do fármaco da corrente sanguínea para o espaço extravascular (fluidos corporais, órgãos e tecidos) • Influenciada por: – Fatores relacionados com o fármacos • Características físico-químicas e tamanho da molécula – Fatores fisiológicos/patológicos, como: • Irrigação sanguínea dos tecidos • Permeabilidade dos capilares Permeabilidade dos capilares • A passagem dos fármacos para o espaço extravascular ocorre nos capilares Tipo de endotélio Características estruturais Características funcionais Contínuo (ex. SNC) Espaço intercelular bem ”vedado” por junções de oclusão Passagem de fármacos depende das suas características físico- químicas e tamanho, ou da existência de transportadores Fenestrado (ex. intestino, glândulas endócrinas) Espaço intercelular bem ”vedado” mas as células endoteliais possuem poros Permite a passagem de fármacos independentemente das sua lipossolubilidade e carga (até certo peso molecular) Sinusoidal (ex. fígado, medula óssea) Para além de poros, existem espaços entre as células endoteliais e a membrana basal é descontínua Não existem barreiras à passagem de fármacos 40 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Barreira hemato-encefálica (cérebro e espinal medula): • Fármacos muito hidrossolúveis ou substâncias ionizadas não conseguem atravessar o endotélio • Fármacos mais lipossoluveis têm maior facilidade no movimento transcelular Ex. antihistamínicos 1º geração versus 2º geração Irrigação sanguínea dos tecidos • Numa primeira fase os orgãos com maior irrigação recebem maior quantidade de fármaco; a passagem para órgãos menos irrigados é mais lenta • Numa segunda fase (minutos a horas) estabelece-se um equilíbrio entre concentração de fármaco nos compartimentos vascular e extravascular Afinidade para as PP Fármaco Fracção livre (%) Varfarina 1 Diazepam 2 Teofilina 35 Digoxina 75 Amoxicilina 82 41 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Ligação às proteínas plasmáticas (PP) • No compartimento vascular os fármacos podem ligar-se às PP – Geralmente albumina – Alguns fármacos podem ligar-se à beta-globulina ou outras PP • A % de ligação depende da afinidade do fármaco pelos sítios de ligação e da quantidade de fármaco e sítios de ligação disponíveis - Por norma os fármacos têm menor afinidade para as PP do que para os seus sítios específicos de ligação (recetores) - Fármacos com elevada afinidade para a albumina: redução na concentração desta PP (ex. doença hepática) leva a um aumento da fração livre de fármaco • A ligação às PP é reversível e competitiva – À medida que a fração de fármaco livre se reduz liberta-se mais fármaco – Um fármaco ligado pode ser deslocado dos sítios de ligação por outro fármaco com maior afinidade para estes sítios • A fração ligada de fármaco: – É incapaz de atravessar os capilares, logo: não sofre metabolização ou excreção e é farmacologicamente inativa 42 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Influência da ligação às proteínas plasmáticas na intensidade e duração do efeito • A fração livre de fármaco determina a intensidade do efeito; um fármaco ligado às PP em grande extensão tem um efeito menos intenso • A ligação às PP prolonga a duração do efeito (por retardar a metabolização e excreção) 43 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Metabolização • Alteração da estrutura química dos fármacos no organismo, com vista a facilitar a sua excreção • Levada a cabo por enzimas “especializadas” na metabolização de substâncias exógenas (ex. fármacos, poluentes ambientais, aditivos alimentares), embora algumas também metabolizem compostos endógenos • Com poucas exceções, inclui as vias metabólicas de fase I e fase II – Frequentemente os fármacos sofrem múltiplas reações de fase I e II, produzindo vários metabolitos Reações de fase I • Reações não sintéticas (transformação da estrutura química do fármaco) • Alteram pouco a hidrossolubilidade do fármaco, mas conduzem geralmente à sua inativação farmacológica • Em certos casos podem levar à bioativação do fármaco (pró-fármacos) • Há metabolitos que conservam a atividade farmacológica da molécula original (ex: ácido salicílico) ou que eventualmente são até mais potentes 44 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Pró-fármacos • Compostos inativos farmacologicamente, que são transformados em fármacos no organismo, depois de administrados – Permitem maximizar a estabilidade do fármaco, biodisponibilidade ou minimizar efeitos secundários (ex. irritação da mucosa gastrointestinal) Exemplo de enzimas envolvidas na fase I Reação Enzima Localização Localização intracelular Hidrólise Esterases Ubiquitárias, incluindo compartimento vascular Retículo endoplasmático liso Oxidação Redução Desalquilação Citocromo P450 Presentes na maior parte dos tecidos, mas preponderantes no fígado intestino, rim Retículo endoplasmático liso 45 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Citocromo P450 • Responsável pela maior parte das reações de metabolização de fase I • Super-família de hemoproteínas (monooxigenases de função mista) – Agrupadas em famílias e subfamílias de acordo com o grau de similaridade da sequência de amino-ácidos – Apenas 3 famílias intervêm no metabolismo de fármacos (1, 2 e 3) Nomenclatura das enzimas • CYP • Nº árabe que designa a família • Letra maiúscula para designar a sub- família • Nº árabe para designar a enzima individual Localização intracelular do CYP 46 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Reações de fase II • Reações sintéticas (formação de novas substâncias, através de reações de conjugação, ie, ligação covalente entre o fármaco ou o metabolito de fase I e substâncias endógenas, como ácido glucorónico) • Metabolitos de fase II são geralmente inativos farmacologicamente e têm maior hidrossolubilidade e peso molecular, o que facilita a excreção Exemplo de enzimas envolvidas na fase II Reação Enzima Localização* Localização intracelular Glucoronoconjugação UDPglucuronosiltransferase Presentes na maior parte dos tecidos, mas preponderantes no fígado intestino, rim Retículo endoplasmático liso Conjugação com sulfato Sulfotransferase (SULT) Citosol *Frequentemente os fármacos metabolizados através de reações de fase I no retículo endoplasmático liso são conjugados em reações de fase II no mesmo local, ou no citosol da mesma célula 47 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Exemplo de fatores que influenciam a metabolização: inibição enzimática • Diminuição da capacidade metabólica das enzimas envolvidas na biotransformação de fármacos por um agente inibidor– Resultam na acumulação do fármaco, com potencial toxicidade – Manifesta-se rapidamente (2 a 3 dias) após administração do inibidor Inibidores de enzimas metabolizadoras de fármacos • Inibidores reversíveis – Competitivos: ligam-se diretamente ao centro ativo, bloqueando de forma competitiva o acesso do substrato • Inibição depende da concentração do inibidor, afinidade para a enzima – Não competitivos: ligam-se fora do centro ativo, não bloqueando o acesso do substrato, mas diminuindo a velocidade da catálise • Inibidores irreversíveis – Ligam-se de forma covalente à enzima • Atividade enzimática só pode ser regenerada através da biossíntese de mais enzima 48 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Exemplo de fatores que influenciam a metabolização: indução enzimática • Aumento da capacidade metabólica por estimulação específica da síntese da enzima – Resulta na diminuição da concentração de fármaco, com potencial perda de efetividade – Pode ocorrer toxicidade se forem produzidos metabolitos ativos – O aumento da atividade enzimática leva dias até 2 a 3 semanas a manifestar-se e pode manter-se até igual período após a suspensão do indutor (dependendo da velocidade de degradação da enzima) 49 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Tolerância por autoindução enzimática • Tolerância é a redução gradual da intensidade de resposta a um fármaco (e potencialmente do seu efeito terapêutico) decorrente da administração contínua ou repetida • Aplica-se o termo taquifilaxia quando o desenvolvimento de tolerância ocorre rapidamente • A tolerância ou taquifilaxia podem ter uma base farmacocinética – Ex. carbamazepina é um potente indutor enzimático, devido a auto- indução a dose deve ser aumentada em intervalos semanais 50 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Excreção • Saída do fármaco ou dos seus metabolitos para o exterior do organismo – A via mais importante é a renal mas também pode ocorrer excreção biliar e através do ar expirado – Excreção através do suor e da saliva têm pouca importância em terapêutica Excreção biliar 51 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Circulação enterohepática Excreção renal • Filtração glomerular – Os capilares glomerulares permitem a passagem de moléculas (até certo peso molecular) do sangue para o filtrado • Reabsorção tubular – O gradiente de concentração entre o filtrado glomerular e o fluido intersticial favorece a reabsorção, por difusão passiva, de fármacos lipossolúveis nos túbulos renais 52 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 A ionização dos ácidos e bases fracas depende do pH do fluido tubular (substâncias ionizadas são mais hidrossolúveis e como tal tendem a ser menos reabsorvidas) 53 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Excreção por secreção tubular • Alguns fármacos podem ser secretados por transporte ativo nos túbulos proximais Eliminação versus excreção • O termo eliminação engloba a metabolização e a excreção • Conceito de semi-vida de eliminação ou tempo de semi-vida (t1/2) – Tempo necessário para que a concentração plasmática do fármaco se reduza a metade – Depende, entre outros fatores, da metabolização e excreção 54 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Farmacodinâmica Introdução Farmacodinâmica • É o estudo do mecanismo de ação dos fármacos – “o que o fármaco faz ao organismo” Mecanismo de ação dos fármacos Específico - ligação a “alvos” Recetores fisiológicos Canais iónicos Transportadores Enzimas Inespecífico Efeito terapêutico • O efeito de um fármaco manifesta-se a partir de um determinado valor de concentração plasmática (concentração eficaz mínima) • A intensidade do efeito vai aumentando à medida que a concentração plasmática aumenta, até se atingirem concentrações que produzem toxicidade (concentração tóxica mínima) 55 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Janela terapêutica (ou margem terapêutica): diferença entre CTM e CEM Fármacos: mecanismo de ação por ligação a “alvos” Proteínas como o principal alvo dos fármacos Função da proteína Localização Recetores fisiológicos Membrana plasmática ou intracelular Canais iónicos Membrana plasmática Transportadores Membrana plasmática Enzimas Membrana plasmática, intracelular ou extracelular 56 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Ligação de fármacos a recetores fisiológicos à superfície da célula O que acontece quando o fármaco se liga ao recetor? 57 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Agonista • Possui afinidade para os recetores (ie, capacidade de ligação aos recetores) • Possui atividade intrínseca (ie, capacidade de estimular os recetores e originar um efeito que é igual ao provocado pela estimulação do ligando endógeno) Agonista parcial • Possui afinidade para os recetores • Menor atividade intrínseca que o agonista (dá origem a um efeito de menor intensidade) Antagonista • Tem afinidade para os recetores • Não tem atividade intrínseca (quando se liga aos recetores não origina estímulo dos mesmos, não reproduz o efeito da estimulação endógena e bloqueia o acesso dos agonistas ao recetor) Subtipos de recetores fisiológicos e exemplos de agonistas e antagonistas Ligando endógeno Tipo de recetor Subtipo de recetor Ex. de localização Ex. de agonista Ex. de antagonista Adrenalina, noradrenalina Adrenérgico Beta-1 coração dobutamina atenolol Beta-2 bronquíolos salbutamol ---------------- Acetilcolina Colinérgico Muscarínico bronquíolos --------------- ipratrópio Histamina Histamínico H-2 estômago --------------- ranitidina Péptidos opióides Opióides Miu sistema nervoso central morfina naloxona 58 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Salbutamol: agonista de recetores adrenérgicos beta 2 • Proteína efetora – Adenilciclase • Ligação ao recetor causa relaxamento do músculo liso (brônquico) Tolerância por mecanismo farmacodinâmico • “Down-regulation”: diminuição do nº de recetores expressos na superfície das células conduz a uma resposta decrescente ao fármaco, independente da via de administração Exemplo • Utilização prolongada de salbutamol (e outros agonistas β2 ) pode levar a redução da resposta broncodilatadora Ipratrópio: antagonista dos recetores muscarínicos • Recetor muscarínico: 7 domínios transmembranares, acoplado a uma proteína G • Proteína efetora - Fosfolipase C • Ligação da acetilcolina ao recetor causa contração do músculo liso (brônquico) • Ipratrópio (antagonista) não origina estímulo dos recetores e bloqueia o acesso da acetilcolina ao receptores 59 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Ligação de fármacos a recetores intracelulares 60 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Ligação de fármacos a canais iónicos Lidocaína: ligação a canais de sódio • Bloqueia, de forma reversível, a geração e condução de impulsos nervosos – Bloqueio da permeabilidade membranar ao sódio, por ligação aos canais de sódio Potencial de ação depende do rápido influxo de Na+ para o interior do axónio, através da abertura de canais de sódio Ligação de fármacos a transportadores • Exemplo: – Transportadores membranares de iões (com despêndio de energia) – Transportadores que captam neurotransmissores na fenda sinática 61 Farmacologia e Terapêutica MedicamentosaCLE 2014/2018 Ligação de fármacos a enzimas 62 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Captopril: inibição da enzima de conversão da angiotensina Fármacos: mecanismo de ação inespecífico Mecanismo de ação inespecífico Depende de mecanismos físico-químicos – exs: – Neutralização do ácido gástrico pelos antiácidos – Alívio da obstipação pelos laxantes osmóticos 63 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Interações medicamentosas Introdução Considere o seguinte caso: A Dª Maria Silva, 72 anos, está medicada com digoxina. Na última consulta médica é-lhe prescrito amiodarona para tratamento de taquicardia supraventricular. Passados uns dias dirige-se à consulta de enfermagem do centro de saúde para medir a pressão arterial. Diz que não tem andado bem, refere falta de apetite e queixa-se de fadiga e diarreia. São-lhe aconselhadas medidas não farmacológicas. Uns dias mais tarde Maria Silva é hospitalizada, sendo diagnosticada uma intoxicação por digoxina. •A hospitalização da Dª Maria Silva é evitável? – Se sim, como poderia o enfermeiro ter contribuído para evitar a hospitalização? Interações medicamentosas Interação Exemplo medicamento - medicamento Nitratos + sildenafil medicamento - alimento IMAO + alimentos ricos em tiramina (ex. Queijo) medicamento - bebida Metronidazol + bebidas alcoólicas Medicamento - planta Ciclosporina + Hipericão Medicamento – outra substância química Teofilina + tabaco É uma alteração da resposta farmacológica quando há administração conjunta de um medicamento e outro medicamento, alimento, bebida, planta ou outras substâncias químicas; esta resposta farmacológica é diferente da esperada quando as substâncias que interagem são administradas separadamente. Em termos clínicos a resposta farmacológica alterada pode não ter significado, ser benéfica ou ser prejudicial. 64 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 • Podem ser prejudiciais, se resultarem em: – Aumento da toxicidade do medicamento • Por potenciação exacerbada do efeito terapêutico - ex: hemorragia por associação de varfarina/ácido acetilsalicílico • Por potenciação de efeitos adversos – ex: hipercaliémia por associação de um IECA e diurético poupador de potássio – Redução da efetividade do medicamento • Ex: Tetraciclinas/antiácidos com catiões di ou trivalentes • Podem ser benéficas – Ex. antihipertensor/diurético • Podem não ter expressão clínica Considerações importantes na prática clínica • Efeito e a gravidade das interações podem variar entre os doentes – Dependem de fatores inerentes aos fármacos envolvidos, como: • Margem terapêutica • Dose • Duração da terapêutica – Dependem também de fatores relacionados com o doente, como: • Outras patologias (ex: insuficiência renal ou hepática) • Idade (ex: idoso) 65 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Incompatibilidades medicamentosas • Ocorrem antes da administração dos medicamentos (in vitro), entre dois ou mais medicamentos ou um medicamento e solventes/materiais de embalagem • São causadas por fenómenos de natureza física, química ou físico-química, que podem resultar em: – Alterações organoléticas (mudança da coloração, consistência, turvação, floculação, precipitação) – Diminuição da atividade das substâncias ativas – Formação de um novo composto (que pode ser ser tóxico) – Aumento da toxicidade dos fármacos originais Mecanismo das interações medicamentosas • As interações farmacocinéticas dependem das características do fármaco e não se podem generalizar para o grupo farmacoterapêutico • A extrapolação da interação observada com um fármaco para outros do mesmo grupo farmacoterapêutico é aceitável quando envolve mecanismos farmacodinâmicos • Os medicamentos podem interagir por diferentes mecanismos – Farmacocinéticos e farmacodinâmicos – Em diferentes fases da farmacocinética farmacocinético • alteração da resposta farmacológica por interferência ao nível da absorção, distribuição, metabolização ou excreção farmacodinâmico • alteração da resposta farmacológica por interferência ao nível dos recetores, locais de ação ou sistemas fisiológicos Atenção: alguns autores usam os termos interação medicamentosa e incompatibilidade medicamentosa indiscriminadamente, ou consideram as incompatibilidades como um tipo de interações medicamentosas. 66 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Interações farmacocinéticas Interações farmacocinéticas ao nível da absorção Exemplo de mecanismos Adsorção e quelação Interações farmacocinéticas ao nível da distribuição • Ocorrem geralmente por deslocação do fármaco ligado às proteínas plasmáticas • A relevância clínica depende: – De uma elevada afinidade para as proteínas plasmáticas (> 90%), como no caso da varfarina – Da presença da maioria do fármaco no plasma e não nos tecidos (baixo volume de distribuição) – Da taxa de eliminação do fármaco – Da sua margem terapêutica Adsorção e quelação •Tetraciclinas e antiácidos (Al3+, Ca2+, Mg2+, Bi2+) leite, e Fe2+ •Quinolonas e antiácidos (Al3+, Mg2+), leite e Fe2+ Alteração na motilidade GI •Metoclopramida ou domperidona e paracetamol 67 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Deslocação de um fármaco ligado às proteínas plasmáticas Interações farmacocinéticas ao nível da metabolização • A inibição e indução enzimáticas, em particular docitocromo P450, são os mecanismos responsáveis pela maioria das interacções a este nível – Os fármacos que sofrem um marcado efeito de primeira passagem são particularmente sensíveis • O significado clínico depende do efeito na concentração plasmática do medicamento afectado – Se as concentrações se mantiverem dentro do intervalo terapêutico a interacção pode não ser relevante 68 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Interações farmacocinéticas ao nível da metabolização: indução enzimática • Aumento da capacidade metabólica por estimulação específica da síntese da enzima – Resulta na diminuição da concentração de fármaco, com potencial perda de efetividade – Pode ocorrer toxicidade se forem produzidos metabolitos ativos • A sua manifestação depende do fármaco e da dose – Pode levar desde dias até 2 a 3 semanas a desenvolver-se de forma cabal e manter-se por igual período após a suspensão do fármaco • Pode ocorrer com fármacos não utilizados como medicamentos (ex: tabaco ou álcool) Interações farmacocinéticas ao nível da metabolização: inibição enzimática • Diminuição da capacidade metabólica por um agente inibidor – Resultam na acumulação do fármaco – potencial reacção adversa e/ou alteração do perfil de metabolitos formados • Manifesta-se rapidamente (2 a 3 dias) após administração do inibidor • É mais comum que a indução enzimática Interações farmacocinéticas (exemplo de indução/inibição CYP) 69 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Interações farmacocinéticas ao nível da excreção Exemplo de mecanismos Interações farmacocinéticas ao nível da excreção Alteração do pH urinário • Na prática poucos fármacos são afetados – Ácidos e bases fracas são metabolizadas em compostos inativos; poucos fármacos são excretados inalterados Alteração do pH urinário •Ácido acetilsalicílico em doses analgésicas e antiácidos Alteração na excreção renal tubular ativa Alteração do ciclo enterohepático •Contracetivos orais e alguns antibióticos 70 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Circulaçãoenterohepática Interações farmacodinâmicas • Efeito aditivo ou sinérgico – Fármacos têm efeito farmacológico semelhante • Ex.1 Potenciação da sonolência por associação de benzodiazepinas e álcool • Ex.2 Potenciação da hipocaliemia por associação de agonistas beta e fármacos e fármacos espoliadores de potássio • Efeito antagónico – Fármacos têm efeito farmacológico contrário • Ex. IECA e AINE ao nível da pressão arterial 71 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Interações medicamentosas na prática clínica Intervenção face a interações medicamentosas na prática clínica • Deve ser decidida casuisticamente • Depende da informação disponível sobre a interação – Bem estabelecida? Ou baseada em evidência pouco robusta? – Qual a gravidade? • Depende das características do regime terapêutico e do doente • Raramente implica a contraindicação à utilização simultânea dos medicamentos que interagem Exemplo de formas de gerir interações medicamentosas • Escolher um medicamento alternativo, para evitar a interação • Distanciar a toma de medicamentos • Ajustar a dose do medicamento afetado ou do que provoca a interação • Monitorizar o regime terapêutico – Laboratorialmente (ex: INR, caliemia) – Avaliação de sinais e sintomas – Determinação de parâmetros fisiológicos (ex: PA) Interações medicamentosas: aspetos importantes na prática de enfermagem • Nenhum profissional de saúde consegue ter presente todas as possíveis interações medicamentosas! • De acordo com a área de exercício profissional – Conhecer as interações com maior significado clínico e a sua gestão – Manter conhecimentos atualizados sobre esta matéria – Em caso de dúvida consultar: • Mais do que uma fonte de informação fiável, e/ou • Um farmacêutico (serviços farmacêuticos hospitalares, farmácia comunitária) ou um centro de informação de medicamentos Vamos retomar a questão das fontes de informação de medicamentos na segunda aula TP 72 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Terapêutica medicamentosa em grupos populacionais específicos Uso de medicamentos por grávidas Uso Inadvertido Doenças Crónicas: Epilepsia; Hipertensão Arterial; Diabetes Doenças Agudas e controlo de sintomas Diabetes Gestacional; Eclampsia; Pré- Eclampsia Necessário controlar os riscos no feto ou na criança. Ex. Digoxina – controlar taquicardia ou Ins. Cardiaca no feto Alterações fisiológicas durante a gravidez 73 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Parâmetros farmacocinéticos Desenvolvimento Embrionário 74 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Absorção Barreira placentária e Leite materno Classificação dos medicamentos com base no risco de teratogenecidade (FDA) •A possibilidade de risco fetal parece remota. Seguro para utilizar na grávida. Categoria A •Ausência de risco fetal demonstrada em experiencia animal ou em estudos humanos Categoria B •Risco fetal desconhecido, por falta de estudos alargados. O medicamento só deve ser usado se o beneficio justificar o risco Categoria C •Evidência de risco fetal em animais, mas a necessidade pode justificar o risco. Doenças graves, outros são medicamentos ineficazes Categoria D •Nocivo para o feto, o risco ultrapassa o benefício e está contra-indicado na gravidez Categoria X •Classificação com base em informação do fabricante Índice M 75 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Rotulagem de medicamentos FDA U.S. Food and Drug Administration Medicamentos Teratogénicos 76 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Medicamentos que podem ser administrados com cuidado 77 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Absorção, Leite materno Medicamentos na gravidez e aleitamento 78 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Medicamentos nas crianças Calculo das doses Medicamentos nas Crianças e Adolescentes IDADE PESO ÁREA DE SUPERFÍCIE Medicação nas Crianças Farmacocinética Via oral Absorção Gastrointestinal • Acidez Gástrica • Tempo de Esvaziamento • Integridade e motilidade intestinal Integridade e motilidade intestinal Peristaltismo irregular Rápido – diminui o efeito terapêutico Lento - possibilidade de toxicidade Absorção Retal Absorção rápida e eficaz Pode evitar efeito de 1ª passagem Alternativa a via IV ABSORÇÂO IRREGULAR – baixa eficácia ou toxicidade 79 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Absorção Intramuscular Não utilizar nos recém-nascidos Absorção percutânea Maior absorção no recém-nascido Falhas na integridade da pele Pode implicar TOXICIDADE Hidrocortisona , ácido salicílico(aspirina) Distribuição pH Composição e volume dos compartimentos do corpo • Água total do corpo • Água intra e extracelular • Tecido adiposo Ligação às proteínas plasmáticas Permeabilidade das membranas Fatores Hemodinâmicos • Débito cardíaco •Fluxo sanguíneo Água extracorporal aumentada Volume de Distribuição Aumentado Medicamentos Hidrossolúveis (Aminofilina, Ampicilina) Implica aumento da dose mg/Kg 80 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Pouco Tecido Adiposo Volume de Distribuição Diminuído Medicamentos (Diazepam) Doses mg/Kg baixas – recém-nascido Permeabilidade barreira hemato-encefálica Elevada no Recém-nascido Elevada Incidência das depressões Respiratórias (mães a fazer analgésicos opiáceos- Morfina e antidepressivos) Ligação às proteínas plasmáticas DIMINUIDA Aumento da fração livre Aumento do fármaco disponível para se ligar ao recetor Possibilidade de efeito tóxico Metabolismo Reacções Fase I ( Oxi-redução) e Fase II (Reacções Conjugação) Reduzidas nas crianças por imaturidade do sistema hepático Reduzido fluxo sanguíneo Capacidade reduzida das enzimas hepáticas - Citocromo P450 81 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Eliminação Resposta a um fármaco Presença de recetores Ligação fármaco-recetor Crescimento da CRIANÇA Maturidade Bioquímica Maturidade Estrutural GRUPOS TERAPEUTICOS com variabilidade farmacodinâmica: Antiinfecciosos MetilXantinas – Teofilina Antihistaminicos 82 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Trabalho autónomo Identificação dos Grupos Terapêuticos mais utilizados nas crianças Identificação dos medicamentos contraindicados nas crianças Descrever as alterações anatofisiológicas que interferem na resposta adequada ao medicamento 83 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 Medicamentos na Pessoa Idosa Pessoa Idosa Idade Cronológica 60-65 anos – Grupo muito heterogéneo Alterações Fisiológicas Multipatologias Polimedicados Utilização de serviços de saúde pelas pessoas idosas ALTERAÇÕES FISIOLÓGICAS DO IDOSO COM INFLUÊNCIA NA FARMACOCINÉTICA ABSORÇÃO Aumento do pH gástrico Diminuição da superfície de absorção Diminuição da perfusão dos orgãos abdominais Diminuição da motilidade gastrointestinal NÃO É SIGNIFICATIVA A DIMINUIÇÃO DA ABSORÇÃO NO IDOSO IDOSO Excepto: Indometacina, digoxina Difusão – retardam a motilidade intestinal: • Anti-depressivos triciclicos • Opioides • Anti-histamínicos • Anti-muscarínicos – anticolinérgicos (parasimpaticolíticos)- Atropina e Escopolamina ABSORÇÃO Cutânea pele atrofiada - menor eficiência e menor fluxo menor taxa de absorção 84 Farmacologia e Terapêutica Medicamentosa CLE 2014/2018 DISTRIBUIÇÃO
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