Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CENTRO-OESTE DEPARTAMENTO DE MEDICINA CASO CLÍNICO 1 Neoplasia de bexiga e diagnósticos diferenciais JOYCE MARIA DE OLIVEIRA BENDER RA: 61021140019 Turma Geral A Professor Felipe Dunin Guarapuava, 01 de agosto de 2021 1. Resumo do caso Homem de 55 anos, com histórico familiar negativo para doenças cardiovasculares, renais, câncer e diabetes, apresenta hematúria macroscópica, disúria e desconforto abdominal inferior. Paciente fumante (35 Maço Ano), hipertenso (faz uso de Losartana e Hidroclorotiazida) e sendentário. Apresenta urina com coloração vermelho-escuro com presença de coágulos. Afebril, sem histórico de traumas ou dores em outros locais. Sem dor a palpação de flancos ou à percussão lombar e toque retal normal. Paciente indica apresentar sintomas há alguns dias e piora nas últimas 24h. Uma tira de urina foi positiva apenas para sangue (4+). Exames de sangue todos normais. Ecografia da bexiga revelou 300ml de volume residual. 2. Diagnóstico principal Hematúria ou existência de células sanguíneas na urina é sinal comum em mais de uma centena de doenças ou de condições sistêmicas, sendo muito frequente na população geral. Em muitos casos, é o primeiro sinal clínico. As principais etiologias variam com a idade e as mais comuns são litíases, infecções e inflamações da bexiga ou da próstata. Em adultos, principalmente acima de 50 anos de idade, há mais risco de estar relacionada a patologia maligna. Assim, esse sinal associado aos demais sintomas do paciente fundamenta o diagnóstico principal de neoplasia urotelial da bexiga e os demais diagnósticos diferenciais apresentados nesse trabalho. Ao primeiro contato com o paciente a hipótese de infecção urinária poderia ser levantada, porém a ausência de organismos patogênicos nos exames permite o descarte desse diagnóstico. Outra causa possível para os sintomas do paciente poderia ser a hiperplasia da próstata, hipótese também descartada pelo resultado normal do toque retal. 2.1. Neoplasia urotelial É uma doença na qual células tumorais são encontradas na camada que reveste internamente as vias excretoras. Esta camada é denominada urotélio, e reveste também o interior da bexiga urinária. Desta forma, toda a urina produzida pelos rins ficará em contato com o urotélio até que seja eliminada. A presença constante de urina nas vias excretoras expõe o urotélio às diversas substâncias que são filtradas pelos rins e que, eventualmente, poderão ser carcinogênicas (propiciam alterações celulares, tornando-as cancerosas) para o tecido urotelial. O câncer das vias excretoras comporta-se de forma semelhante quer envolva os cálices e pelves renal ou ureteres, já que estes estão revestidos por um mesmo tecido. Entre os tumores das vias excretoras, 75% deles acometem a pelves ou os cálices renais, e apenas 25% são ureterais. São mais frequentes nos homens, mas as mulheres acometidas pela doença costumam evoluir de forma mais sombria. O sintoma principal da neoplasia urotelial é a hematúria (presença de sangue na urina). Contudo, este é um sintoma inespecífico, e pode ocorrer em diversas outras doenças, benignas ou malignas. Outro sintoma observado é a dilatação das vias excretoras determinada pela obstrução da passagem da urina, e a consequente retenção desta no sistema coletor, decorrente da presença do tumor. Essa situação pode ser identificada incidentalmente durante um exame ultrassonográfico do abdômen, solicitado para avaliar algum outro sintoma que o paciente possa vir a apresentar. 2.2. Neoplasia urotelial da bexiga A neoplasia, ou câncer, de bexiga é a segunda neoplasia maligna mais frequente do trato urinário, sendo mais prevalente na raça branca, mais comum em homens do que em mulheres (proporção 3:1), e apresentando maior prevalência a partir da sexta década de vida - cerca de 90% dos pacientes recebem o diagnóstico depois dos 55 anos. Em 2008 foram diagnosticados pelo menos 386.000 novos casos, com aproximadamente 150.000 mortes atribuídas a esta patologia. O tabagismo é o fator etiológico mais importante, responsável por quase 50% dos casos. Também são fatores de risco: trabalho em indústrias de corantes, borracha, tecidos, tintas, solventes, couros, papéis, carvão, produtos de combustão do diesel, alguns metais etc. Além disso, analgésicos contendo fenacetina, acetaminofen, citostáticos, ciclofosfamida e radioterapia pélvica, bem como alterações genéticas no P53, assim como de outros genes supressores. Habitualmente os tumores de células uroteliais (transicionais) correspondem a 90% de todos os tumores da bexiga, em regiões como a América do Norte e na Europa. Desta maneira, os tumores não uroteliais são responsáveis por uma minoria dos tipos histológicos encontrados. Outros tipos de tumores de bexiga são o carcinoma de células escamosas (CCE), que varia de acordo com as regiões de ocorrência, correspondendo a cerca de 3 a 7 % dos casos de tumores de bexiga nos Estados Unidos e 80 % no Egito e o adenocarcinoma de bexiga, que representa menos de 2% dos tumores vesicais e pode ser classificado em primário, de uraco ou não uraco, e secundário ou metastático com etiologia de: reto, estômago, endométrio, mama, próstata e ovário. Pacientes com tumores de bexiga apresentam uma “fragilidade” da mucosa de todo o sistema urinário, que se traduz em uma predisposição a formar tumores malignos em outras áreas desse sistema. Em aproximadamente 25% dos pacientes com diagnóstico de câncer de bexiga, em algum momento da vida surgirá um segundo tumor primário em outro local do sistema urinário. Diagnóstico O diagnóstico do câncer de bexiga consiste em diversas análises, desde sintomas apresentados pelo paciente até exames específicos. Dentre os métodos para avaliação, destacam-se: • Cistoscopia Consiste na introdução pela uretra de uma fibra óptica que possui uma luz forte na ponta, para iluminar a bexiga por dentro. É um exame semelhante às endoscopias realizadas para avaliar o esôfago e o estômago. Quando o médico encontra lesões suspeitas, é possível removê-las com uma pinça que há no aparelho. O material colhido nessas biópsias será analisado ao microscópio pelo médico patologista. Pelo fato de o câncer de bexiga frequentemente apresentar-se com múltiplos focos, os médicos normalmente realizam biópsias em outras partes da bexiga, mesmo que aparentemente normais. Outros exames podem ser solicitados para auxiliar a cistoscopia: ultrassonografia, tomografia computadorizada e ressonância nuclear magnética. • Citologia urinária Baseia-se na análise da urina com o objetivo de procurar células tumorais que se destacaram do tumor e se encontram em suspensão na urina. Esse exame, no entanto, só consegue detectar cerca de 20% a 30 % dos tumores de bexiga. Citologia negativa não afasta a possibilidade de câncer de bexiga; só a cistoscopia é capaz de fazê-lo. Prognóstico Os principais fatores relacionados com o prognóstico do tumor de bexiga são: • Grau histológico: classificação histológica antiga (1, 2 e 3) e atual (baixo grau, alto grau); • Estadiamento: determinado pela profundidade de invasão tumoral da parede vesical e dependente do anatomopatológico da ressecção transuretral (RTU) do tumor. • Carcinoma in situ: lesão formada por células malignas que ainda não invadiram as camadas mais profundas. • Multifocalidade: mais de 3 lesões; • Tamanho de lesões: > 3 cm; • Aspecto endoscópico da lesão tumoral: séssil ou sólido são piores • Tempo de recidiva após tratamento: menos que 1 ano, pior prognóstico. Tratamento O tratamento sistêmico da doença metastática da pelve renal ou ureter baseia-se em estudos compostos basicamente por pacientes com carcinoma urotelial de bexiga. Cerca de 40-50% dos pacientes com carcinoma urotelialde pelve renal desenvolverão tumores de bexiga, que pode ocorrer de forma sincrônica ou metacrônica. O tratamento padrão em primeira linha para pacientes com carcinoma urotelial metastático é baseado na combinação de quimioterápicos, incluindo a cisplatina. Entretanto, mais de 50% dos pacientes não são candidatos a tratamento contendo cisplatina por conta de pobre performance status, disfunção renal ou outras comorbidades. Dessa forma, podemos dividir o tratamento do carcinoma urotelial avançado em dois grandes grupos: candidatos e não candidatos ao tratamento com cisplatina. Estudos avaliando cirurgia após tratamento quimioterápico com esquema M-VAC demonstram taxas de sobrevida em 5 anos de 33%. Os melhores candidatos para ressecção cirúrgica, no cenário de doença metastática, são os pacientes com doença restrita a linfonodos e bexiga (localmente avançados, irressecáveis inicialmente). Considerar cirurgia em pacientes com recorrência em local isolado e, quando for possível, a ressecção completa. Não se deve considerar cirurgia em pacientes com recorrência em mais de um local, exceto em pacientes com doença em linfonodos pélvicos e retroperitoneais. • Ressecção transuretral (RTU) de bexiga A ressecção transuretral não é simples método de diagnóstico: já é uma etapa inicial do tratamento, porque serve também para retirar o tumor. A RTU é o procedimento inicial de escolha para diagnóstico e tratamento das lesões tumorais, sendo indicada para todos os casos de tumores ou de lesões vesicais suspeitas. • Tratamento complementar Após a ressecção completa da lesão, os tumores de baixo risco não necessitam de tratamento complementar, somente acompanhamento com cistoscopia. Já nos intermediários podem ser utilizados quimioterápicos ou BCG; os de alto risco devem ser submetidos ao tratamento de BCG. O esquema de ataque mais utilizado é indução semanal: 6 a 8 semanas, e manutenção; mensal ou série de miniciclos de três semanas, repetidos aos 3, 6, 12, 18, 24, 30 e 36 meses após o término do ciclo de indução (Esquema SWOG). • Cistectomia Cistectomia radical é o tratamento mais eficiente para tumor invasivo de bexiga. No entanto, alguns autores têm preconizado sua indicação em tumores superficiais de mau prognóstico. O principal argumento favorável a essa indicação são as taxas de sobrevida em 5 anos, que diminuem de 90% para 50% se o tratamento radical for realizado antes da recorrência ou progressão tumoral. A cistectomia no carcinoma vesical superficial está reservada a pacientes de alto risco após segunda falha no tratamento intravesical, sempre considerando taxas de morbi- mortalidades relacionadas à cirurgia. 3. Diagnósticos diferenciais 3.1. Carcinoma de Pelve Renal e de Ureter Tumores uroteliais de pelve renal e de ureter são raros e correspondem a aproximadamente 5% das neoplasias uroteliais, e entre 5 a 7% das renais, sendo 17 vezes menos frequentes do que tumores de bexiga. São mais comuns na sexta e sétima décadas de vida e incidem três vezes mais nos homens. Acometem todo o sistema coletor, porém são mais frequentes na pelve que no ureter, onde há mais envolvimento distal, seguido das porções média e proximal. Assim como os tumores uroteliais de bexiga, também apresentam características de recorrência. Acometem ambos os rins equitativamente, porém tendem a apresentar recorrências ipsilaterais, com apenas 3% de ocorrências contralaterais. Podem acometer entre 3 a 5% dos pacientes após cistectomias ou cistoprostatectomias radicais. Essa probabilidade aumenta com o tempo de seguimento, chegando a 10% em 5 anos, 26% em 10 anos e 34% em 15 anos. As causas dos tumores uroteliais altos aparentam ser as mesmas dos tumores uroteliais de bexiga. Exposição a tabaco, analgésicos e agentes químicos industriais, como derivados de indústrias de borracha e de têxteis. Infecções crônicas, inflamações, obstruções e cálculos urinários são relacionados a adenocarcinomas e carcinomas de células escamosas, também no trato urinário alto. Ciclofosfamida e cafeína têm sido associadas a essa neoplasia, assim como fatores hereditários. Múltiplas ressecções de tumores de bexiga são descritas como fator de risco para acometimento do trato urinário alto. Aproximadamente 70% dos pacientes com neoplasias uroteliais de pelve renal e 95% com neoplasias ureterais apresentaram ressecções prévias de neoplasias uroteliais de bexiga. Os principais sinais e sintomas dos tumores uroteliais do trato urinário alto incluem hematúria macroscópica em 60 a 75% dos pacientes, dor lombar em 30 a 40% e raramente massa palpável. Sintomas sistêmicos podem incluir anorexia, perda de peso e dor óssea, que geralmente estão associados a doença metastática. Falhas de enchimento visualizadas em exames contrastados, como urografia excretora e tomografia computadorizada (TC), são achados frequentes e sugestivos. Exames complementares incluem estudos citológicos seletivos do trato urinário alto, cistoscopias e uretero-pielografias retrógradas, particularmente indicadas para pacientes com azotemia e alergia a contrastes radiográficos. TC também pode excluir causas secundárias, como cálculos e coágulos intraluminais. Como tratamento para a doença pode-se citar a nefroureterectomia radical, a ureterectomia parcial, ressecções endoscópicas. A quimioterapia de escolha para neoplasias urotelias invasivas e metastáticas está na combinação de metotrexato, vinblastina, doxorrubicina e cisplatina (MVAC). Mesmo em neoplasias uroteliais de bexiga, que são muito mais prevalentes que os tumores urotelias de pelve e de ureter, ainda existem dúvidas quanto ao uso de quimioterapia adjuvante. Entretanto, resultados recentes indicam que quimioterapia adjuvante pode retardar recorrências, justificando seu uso em pacientes de alto risco. Estudos randomizados ainda são necessários e, até o momento, uso de quimioterapia adjuvante nos tumores uroteliais de pelve e de ureter baseia-se em extrapolações dos dados obtidos de tratamento de tumores de bexiga e de estudos com baixo número de pacientes. 3.2. Litíase ou cálculo renal A mineralização em todos os sistemas biológicos representa um tema comum em que os cristais e a matriz estão entrelaçados. Os cálculos urinários não são exceção, eles são agregados policristalinos compostos de quantidades variáveis de cristaloide e matriz orgânica. As teorias para explicar a litíase urinária são incompletas. Conhecida também como ‘pedras nos rins’, a patologia consiste na formação de cálculos no trato urinário pode ser entendida como uma forma de biomineralização. A nefrolitíase é, portanto, um processo de cristalização que ocorre em sistema biológico e é influenciada por ele. Nas suas diversas etapas, vários componentes e moduladores podem ser identificados. De modo simplificado, estes podem ser divididos em fatores físico-químicos, que influenciam a saturação urinária, nucleação, crescimento e agregação de partículas cristalinas, e fatores biológicos, relacionados primordialmente a macromoléculas urinárias que atuam como inibidoras da cristalização. A teoria da nucleação sugere que os cálculos urinários se originam de cristais ou corpos estranhos imersos na urina supersaturada. Essa teoria é contestada pelos mesmos argumentos que a apoiam. Cálculos nem sempre se formam em pacientes que são hiperexcretores ou que estão em risco de desidratação. Além disso, até um terço das coletas de urina de 24 horas de formadores de cálculos são completamente normais no que diz respeito às concentrações de íons formadores de cálculo. A teoria de inibidor de cristais alega que os cálculos se formam devido à ausência ou à baixa concentração de inibidores de cálculos naturais, inclusive magnésio, citrato, pirofosfato e uma variedade de metais-traço. Essa teoria não tem validade absoluta, pois muitas pessoas que carecem de tais inibidores podemnunca formar cálculos, e outras com uma abundância de inibidores podem, paradoxalmente, formá-los. Os cálculos mais comuns são os de oxalato de cálcio (80-85%), ácido úrico (7-10%), estruvita (ou fosfato amônio-magnesiano) e fosfato de cálcio (5-10% cada) e cistina (1-3%). Vários hábitos podem desencadear a doença, como a pouca ingestão de água, excessiva ingestão de sal e proteínas, obesidade, sedentarismo. Além disso, a diabetes e algumas bactérias também podem ser determinantes no desenvolvimento de cálculos renais. Os sintomas da doença são hematúria, cólica de rim, dor crônica na região lombar, náuseas, vômitos e febre e o diagnóstico pode ser feito realizando-se tomografia do abdome e pelve, ultrassonografia e exames de sangue e urina. A incidência de urolitíase na população é de 1 a 15% em áreas tropicais. O pico de incidência se dá entre a 3ª e 5ª décadas de vida, sendo os homens afetados duas a três vezes mais que as mulheres. A obesidade é fator de risco isolado para a litíase urinária. Os cálculos do trato superior frequentemente causam dor quando passam pelo ureter. O caráter da dor depende da localização. Cálculos pequenos o bastante para descerem pelo ureter, geralmente, têm dificuldade de ultrapassar a junção ureteropélvica ou de entrar na bexiga na junção vesicoureteral (Fig. 17-7). Mais de 60% dos pacientes apresentando cólica ureteral terão cálculos dentro de 3 cm da junção vesicoureteral. Havendo suspeita de cálculo renal deve-se realizar exames por imagem para o diagnóstico, podendo ser realizado um raio x simples de abdômen, ultrassonografia do trato urinário, tomografia computadorizada de abdômen ou à radiografia contrastada dos rins (urografia excretora). A sensibilidade da ultrassonografia em detectar cálculo renal é superior àquela da radiografia convencional e é pouco menor que quando combinados os métodos radiografia convencional e nefrotomografia. Atualmente o método com maior sensibilidade na detecção de litíase renal é a tomografia computadorizada sem contraste. A sensibilidade de detecção de ureterolitíase não é tão boa quanto a detecção intra-renal. A localização nos segmentos proximais e distais é consideravelmente mais fácil. Devido à maioria dos cálculos impactarem no ureter distal, é sempre recomendado o início do exame por este segmento. Pode ocorrer diagnóstico falso-positivo, devido a fatores como, por exemplo, cicatrizes de processos inflamatórios antigos e gordura ou ar no sistema coletor, que mimetizam a imagem de cálculo. As artérias podem aparecer como imagens ecogênicas, principalmente as de maior calibre, porém apresentam pulsação e atualmente podem ser diferenciadas através da técnica duplex-Doppler e color Doppler. Quando observamos placas ateromatosas o problema ainda é maior, porque estas se manifestam com ecos de forte intensidade, podendo apresentar sombra acústica posterior. O diagnóstico diferencial também pode ser dificultado em algumas colagenoses, como na esclerose sistêmica progressiva, nas quais podem ocorrer lesões arteriais. Quando o paciente tiver cálculo de ácido úrico, pode ser considerada a possibilidade de tomar medicamentos por via oral e o cálculo ser dissolvido quimicamente. Cálculos menores do que 6 milímetros podem ser expelidos sem tratamento específico, ressaltando que o paciente pode ter cólica renal durante a sua eliminação. Cálculos que não sejam de ácido úrico e tenham mais do que 6 milímetros devem ser tratados por algum método intervencionista. No caso da cirurgia, pode-se optar pela litotripsia (bombardeamento das pedras por ondas de choque para fragmentação e posterior eliminação pela urina), cirurgia endoscópica ou ureteroscopia. 3.3. Estenose da uretra Estenose uretral é um estreitamento de um segmento da uretra, que pode resultar em diminuição ou mesmo interrupção completa do fluxo urinário, acarretando em uma série de complicações. Não se conhece a incidência da estenose de uretra, pois muitos pacientes com sintomas leves, como infecção urinária de repetição, não são diagnosticados. Estima-se que seja de 1/10 mil homens aos 25 anos de idade e para cada mil homens aos 65 anos, com maior acometimento na raça negra. Ainda não se conhece totalmente a patologia da estenose de uretra. A descontinuidade total ou parcial da uretra pelo trauma, com consequente cicatrização e fibrose da uretra, é facilmente compreensível. Nas demais situações, mudanças no epitélio uretral e no tecido esponjoso subepitelial formam cicatrizes e consequente estreitamento da luz uretral. Após lesão tecidual, células fagocíticas infiltram o local, promovendo resposta inflamatória e resultando em depósito de tecido fibroso. Área de estenose agrava-se pela perda da integridade da mucosa uretral, que em muitos casos apresenta déficit do aporte vascular, contribuindo para formação de uma camada subepitelial de espongiofibrose, cuja extensão é difícil de ser estabelecida. Dentre as causas da estenose uretral pode-se citar: • Traumas ou lesões uretrais que, ao cicatrizarem, podem determinar uma deposição excessiva de tecido fibrótico, provocando diminuição do calibre do canal uretral; • Procedimentos médicos com manipulação uretral (cistoscopia, cirurgias de próstata, passagem de sondas uretrais, entre outros) e até radioterapia também podem produzir estenoses, mesmo quando feitos de forma adequada; • Infecções como uretrites causadas por doenças sexualmente transmissíveis (gonorreia ou clamídia). Mesmo com o tratamento adequado e cura da infecção, o processo cicatricial decorrente da inflamação tecidual pode causar estenoses; • Congênita – alguns recém-nascidos já nascem com estenose; • Câncer é uma causa rara de estenose. Geralmente o tumor primário está localizado na próstata ou bexiga. Já dentre os sintomas, pode-se citar: • Fluxo reduzido de urina geralmente é o primeiro sintoma • Dificuldade miccional é bastante comum, porém a interrupção completa do fluxo é rara • Jato espraiado ou duplo; • Gotejamento de urina após a micção; • Aumento da frequência miccional (necessidade de urinar mais vezes que o habitual); • Nictúria (acordar e levantar à noite para urinar); • Ardência no momento da micção; • Incontinência urinária em alguns casos. Para a detecção de estenose uretrais, podem ser realizados exames de urofluxometria, uretrocistografia e cistoscopia. A avaliação radiográfica por UCR e UCM ajuda a definir localização, tamanho, número e grau das estenoses uretrais. Sonouretrografia pode ser utilizada para orientar o planejamento e o tratamento adjuvante nos pacientes, com conhecida estenose da uretra bulbar, sendo considerada método complementar a UCR para estimar a extensão da lesão. O tratamento pode ser realização por meio de dilatação uretral, uretrotomia, cirurgia ou stents uretrais. Estenoses diafragmáticas podem responder à dilatação ou à uretrotomia visual. Outros estreitamentos devem ser tratados com visão direta por uretrotomia interna, com o uretrótomo pediátrico disponível atualmente. Pode ser necessário repetir esses procedimentos a fim de estabilizar o estreitamento. Reparo cirúrgico aberto em estágio único, por uretroplastia anastomótica, enxerto de mucosa bucal ou retalho peniano é desejável se a obstrução recorrer. Os stents uretrais devem ser empregados em casos difíceis e complexos quando outros tipos de tratamento não surtiram efeito ou quando as condições clínicas do paciente impedem uma cirurgia de maior porte. O alívio imediato costuma ser obtido, porém, com o passar do tempo, o tecido fibrótico vai envolvendo o stent de forma progressiva. 3.4. Doença cística renal Os cistos são as massas renais mais comuns. As anomalias congênitas ocorrem mais frequentemente no rim do que em qualquer outro órgão. Algumas não causam dificuldade alguma, mas muitas (p. ex., hipoplasia, rins policísticos) causam deficiênciada função renal. Do ponto de vista ultrassonográfico prático, podemos classificá-los em três grupos: cistos renais simples, cistos renais múltiplos e cistos renais atípicos ou complexos. A importância maior da US é a diferenciação com doenças mais sérias, como doença renal policística, abcessos renais e carcinomas do rim. Os cistos renais simples são de natureza benigna, podem apresentar infecção ou, pelo aumento de volume, levar à hipertensão induzida pela angiotensina. Em ambos os casos a punção aspirativa está indicada, pelo fato de os antimicrobianos não penetrarem no cisto e pela redução da compressão do parênquima renal com o esvaziamento do mesmo. Podem causar dor lombar e sensação de peso conforme o tamanho e a localização. Podem apresentar localização indiscriminada pelo córtex renal, porém são visualizados preferencialmente nos polos, principalmente no polo superior. Sua frequência aumenta com a idade e está presente na metade da população acima de 50 anos. Os cistos renais atípicos podem apresentar-se com múltiplas loculações. Como assinalamos anteriormente, o conteúdo de um cisto simples deve ser totalmente livre de ecos. Neste, porém, encontramos septações incompletas, permitindo a livre comunicação do líquido entre os vários lóculos. Estas estruturas não apresentam valor clínico significativo. Se houver dificuldade na visualização das superfícies internas dos septos, ou irregularidade nos mesmos, indica-se a punção aspirativa para esclarecimento diagnóstico, pois pode tratar-se de um tumor ou alteração do conteúdo, como pus ou sangue. Dentro da classificação de cistos renais múltiplos, a doença renal policística do tipo adulto, ou autossômica dominante, apresenta-se à US com aspecto característico (Fig. 18.I.7). Os rins encontram-se frequentemente aumentados de volume. A chave diagnóstica é o achado de várias lesões císticas de tamanhos diferentes, com localização difusa pela loja renal. Se houver dificuldade técnica na avaliação da imagem, sugerimos correlação com tomografia computadorizada ou ressonância magnética. O rim multicístico (displasia renal multicística) pode representar uma hidronefrose secundária a atresia do ureter, pelve ou ambos, durante o estágio metanéfrico do desenvolvimento intra-uterino. Dependendo da época ou do nível de obstrução, o espectro de formas varia desde um rim multicístico unilateral, displasia multicística focal ou segmentar, até o aspecto de doença renal multicística bilateral. Rins policísticos, ou doença renal policística (PKD, sigla de Polycistic Kidney Disease) é uma moléstia genética, relativamente comum, progressiva e hereditária, determinada por mutações nos genes PKD1 (85% dos casos) e PKD2 (15% dos casos). Ela se manifesta em ambos os sexos, não importa a idade nem a etnia. Pareça haver fatores ambientais envolvidos. Sua principal característica é a formação de inúmeras dilatações semelhantes a bolhas de diferentes tamanhos, em alguma parte do néfron (ou nefrônio), a unidade funcional dos rins encarregada de filtrar o sangue e eliminar a urina. Existem dois tipos de doença renal policística de caráter hereditário: doença renal policística autossômica recessiva (DRPAR) e doença renal policística autossômica dominante (DRPAD). São consideradas autossômicas, porque são transmitidas pelos genes não sexuais. A forma recessiva é mais rara, porém mais grave e de evolução mais rápida para a insuficiência renal crônica. Ela se manifesta na infância ou adolescência, não poupando os recém-nascidos, e pode estar associada a complicações hepáticas e pulmonares bastante graves, que colocam a vida em risco. A doença renal policística do adulto (ADPKD) é a nefropatia genética mais comum (1:800). Nessa doença ambos rins aumentam de tamanho e o parênquima é amplamente substituído por cistos. O diagnóstico é feito a partir de exames de imagem, avaliação clínica das comorbidades mais frequentes e estudo de história familiar. As causas dessa doença ainda não estão totalmente esclarecidas, mas em pelo 90% dos casos atribui-se a mutações nos genes de duas proteínas do túbulo: PKD1 e PKD2. A enfermidade pode ser descoberta por acaso durante exames de rotina, ou porque surgiram sintomas sugestivos de algum tipo de disfunção renal. Exames de imagem, como ultrassom, ressonância magnética e tomografia computadorizada do abdômen são recursos importantes para fundamentar o diagnóstico. Na grande maioria dos casos, no início, os cistos são assintomáticos. Com a evolução do quadro, porém, as queixas mais frequentes são dor nas costas, cansaço, edema (inchaço), náusea, sangue na urina (hematúria), infecções urinárias, cálculo renal. Hipertensão arterial, perda de proteínas pela urina que fica espumosa (proteinúria), doença diverticular do intestino, aneurisma intracraniano são comorbidades que podem estar associadas aos rins policísticos. Ainda não existe tratamento específico para curar a doença renal policística, mas estão em estudo várias drogas para inibir a evolução. Por enquanto, as atenções estão voltadas para alivio dos sintomas e controle das comorbidades e complicações. A pior delas é a insuficiência renal crônica que, muitas vezes, só é diagnosticada, quando os cistos praticamente destruíram todo o tecido renal sadio. Pacientes com insuficiência renal crônica e progressiva precisam recorrer à hemodiálise enquanto aguardam receber um rim saudável para transplante. Referências Bibliográficas CARDOSO, Ana Paula. Câncer de Bexiga - Tratamento. Instituto Vencer o Câncer, 2020. Disponível em: https://vencerocancer.org.br/tipos-de-cancer/cancer-de-bexiga-tipos-de- cancer/cancer-de-bexiga-tratamento/. Acesso em: 1 ago 2021. DE MEDEIROS, Rodrigo Bovolin et al. Câncer de Bexiga. In: SANTOS, Marcos et al. Diretrizes Oncológicas. 2. ed. São Paulo: Doctor Press Científica. 2019. Disponível em: https://diretrizesoncologicas.com.br/wp-content/uploads/2018/10/Diretrizes- oncol%C3%B3gicas-2_Parte25.pdf. Acesso em: 1 ago 2021. Grupo Instituto do Rim do Paraná. RINS POLICÍSTICOS. Disponível em: http://www.rim- online.com.br/rins-policisticos/. Acesso em: 1 ago 2021. Hospital Sírio Libanês. Especialidades médicas: Urologia. Disponível em: https://www.hospitalsiriolibanes.org.br/hospital/especialidades/nucleo-avancado- urologia/Paginas/default.aspx. Acesso em: 1 ago 2021. Hospital Sírio Libanês. Nefrologia e Diálise. Disponível em: https://www.hospitalsiriolibanes.org.br/hospital/especialidades/nefrologia- dialise/Paginas/calculo-renal.aspx Acesso em: 1 ago 2021. JÚNIOR, Archimedes N. et al. MANU: Manual de Urologia. Sociedade Brasileira de Urologia (SBU), São Paulo. Editora Planmark, 2010. JÚNIOR, Archimedes N. et al. Urologia Fundamental. Sociedade Brasileira de Urologia (SBU), São Paulo. Editora Planmark, 2010. MALUF, Fernando. Câncer de Bexiga - Diagnóstico. Instituto Vencer o Câncer, 2020. Disponível em: https://vencerocancer.org.br/tipos-de-cancer/cancer-de-bexiga-tipos-de- cancer/diagnostico-2/. Acesso em: 1 ago 2021. MCANINCH, Jack W.; LUE, Tom F. Urologia Geral – de Smith e Tanagho. AMGH Editora Ltda, 18ª Ed, 2014. MILANI, Vagner et al. CISTOGÊNESE E A EXPRESSÃO DAS POLICISTINAS NOS RINS POLICÍSTICOS. Grupo de Estudos em Nefrogenética (GEN), Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA), Porto Alegre, RS, 2006. Disponível em: https://www.lume.ufrgs.br/handle/10183/164306. Acesso em: 1 ago 2021. NARDI, Aguinaldo C. et al. Urologia Brasil. Sociedade Brasileira de Urologia (SBU), São Paulo. Editora Planmark, 2013. https://vencerocancer.org.br/tipos-de-cancer/cancer-de-bexiga-tipos-de-cancer/cancer-de-bexiga-tratamento/ https://vencerocancer.org.br/tipos-de-cancer/cancer-de-bexiga-tipos-de-cancer/cancer-de-bexiga-tratamento/ https://diretrizesoncologicas.com.br/wp-content/uploads/2018/10/Diretrizes-oncol%C3%B3gicas-2_Parte25.pdfhttps://diretrizesoncologicas.com.br/wp-content/uploads/2018/10/Diretrizes-oncol%C3%B3gicas-2_Parte25.pdf http://www.rim-online.com.br/rins-policisticos/ http://www.rim-online.com.br/rins-policisticos/ https://www.hospitalsiriolibanes.org.br/hospital/especialidades/nucleo-avancado-urologia/Paginas/default.aspx https://www.hospitalsiriolibanes.org.br/hospital/especialidades/nucleo-avancado-urologia/Paginas/default.aspx https://www.hospitalsiriolibanes.org.br/hospital/especialidades/nefrologia-dialise/Paginas/calculo-renal.aspx https://www.hospitalsiriolibanes.org.br/hospital/especialidades/nefrologia-dialise/Paginas/calculo-renal.aspx https://vencerocancer.org.br/tipos-de-cancer/cancer-de-bexiga-tipos-de-cancer/diagnostico-2/ https://vencerocancer.org.br/tipos-de-cancer/cancer-de-bexiga-tipos-de-cancer/diagnostico-2/ https://www.lume.ufrgs.br/handle/10183/164306
Compartilhar